Saturday, April 24, 2010

Uma zebra britânica


O liberal-democrata Nick Clegg brilha nos debates pela
televisão, sobe nas pesquisas e sacode o bipartidarismo
inglês. Agora só falta sobreviver aos escândalos


Duda Teixeira

Ken Mckay/Reuters
NOVIDADE
Clegg, Cameron e Brown (da esq. para a dir.) em debate na TV. À direita, jornais da semana passada com denúncias contra o azarão da campanha inglesa


Há um século a política inglesa é dominada por dois partidos, o Trabalhista e o Conservador. Bastou surgir uma novidade - os primeiros debates ao vivo pela televisão da história do país - para que as eleições marcadas para 6 de maio perdessem a tradicional sonolência. A estrela dos embates televisivos, incluindo o ocorrido na quinta-feira passada, foi Nick Clegg, de 43 anos, líder do partido Liberal Democrata. Aproveitando-se da condição de político com a imagem (ainda) imaculada, Clegg galgou 10 pontos porcentuais nas pesquisas de opinião. Ateu, adepto da meditação transcendental e fluente em cinco idiomas, ele tem agora 30% das intenções de voto. Está logo atrás do conservador David Cameron (33%), e pouco à frente do primeiro-ministro trabalhista, Gordon Brown (27%).

Mansell/Time&Life Pictures/Getty Images
FAZ TEMPO
David Lloyd George: o pai do estado de bem-estar social foi o último primeiro-ministro liberal-democrata, entre 1916 e 1922


Clegg agradou aos eleitores fartos do escândalo de corrupção que envolveu parlamentares trabalhistas e conservadores no ano passado. Com a verba do gabinete, os políticos reformaram seus jardins e alugaram filmes pornográficos. Como era de esperar em uma verdadeira democracia, tão logo ascendeu nas pesquisas Clegg perdeu o status de candidato café com leite e teve sua vida devassada pela imprensa. Alguns jornais resgataram um artigo escrito por ele em 2002. No texto, Clegg critica a arrogância dos ingleses em relação aos alemães, os perdedores da II Guerra Mundial. As manchetes exageraram ao tratar o artigo como uma apologia do nazismo. Na mais séria das denúncias, Clegg foi acusado de receber doações de três empresários diretamente na sua conta-corrente, entre 2006 e 2008. Ele diz ter usado o dinheiro, o equivalente a 2 000 reais, para pagar o salário de um assessor. Mesmo se resistir à campanha nas próximas duas semanas, Clegg tem poucas chances de se tornar chefe de governo, pois, pelo sistema distrital do país, não basta receber o maior número de votos em nível nacional para consagrar-se vencedor. O último primeiro-ministro liberal-democrata foi David Lloyd George, escolhido em 1916 com o apoio dos conservadores. Na atual eleição, nenhum partido deve alcançar maioria no Parlamento, o que forçará novas alianças. Nesse cenário, Clegg terá derrubado o bipartidarismo de fato existente no país e ganhará um papel relevante nas decisões nacionais.

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