Sunday, September 06, 2009

Partilha no pré-sal pode afastar investidores

O ESTADO DE S.PAULO

Segundo analistas europeus, modelo reduz rentabilidade do negócio

Andrei Netto




A criação do novo marco regulatório para a exploração de petróleo em grandes profundidades na costa sudeste brasileira não chocou especialistas em energia na União Europeia. Segundo os experts, o novo modelo brasileiro se enquadra na "abordagem clássica" da partilha de lucro originário da extração do petróleo, mesmo que a presença do Estado, por meio da Petrobrás e da Petro-Sal, seja crescente. O risco, alertam, é não atrair empresas privadas que possam financiar a extração do óleo, ao oferecer lucratividade menor em um momento de crise econômica.

A análise foi feita a pedido do Estado por economistas especializados no setor energético na Europa, e se antecipa à Agência Internacional de Energia (AIE), que até o momento não divulgou estudos específicos sobre o impacto das novas jazidas brasileiras no mercado energético mundial.

Para Maité Jauréguy-Naudin, diretora do Programa de Energia do Instituto Francês de Relações Internacionais (Ifri), de Paris, a mudança na legislação criada em 1997, que torna agora a Petrobrás a operadora de todos os blocos de exploração da camada pré-sal, com participação mínima de 30% nos lucros, ainda se enquadra nos padrões contratuais aceitáveis pelas grandes petrolíferas.

"O mais importante é que as regras do jogo não sejam alteradas durante o jogo. A parceria precisa ter diretrizes claras desde o início do processo de exploração", alerta Maité. "O Brasil, como democracia estável que vem estabelecendo parcerias de longo prazo com os atores de mercado petrolífero, reúne todas as condições de obter sucesso na exploração da camada pré-sal."

Apesar do otimismo sobre o marco regulatório, a especialista vê adversidades no caminho da Petrobrás e da Petro-Sal. "A exploração no Brasil depende enormemente do preço do barril", entende Maité, chamando a atenção para a relação entre os custos de produção elevados em grande profundidade e o baixo preço do barril no momento - embora a tendência seja de aumento proporcional à retomada da demanda.

PERDAS

Posição semelhante tem a alemã Susanne Nies, professora do Instituto de Estudos Políticos (Science Po), de Paris, e especializada em energia. "O preço baixo do petróleo levou as grandes petrolíferas a enormes perdas financeiras em meio à crise, o que compromete de certa forma sua disposição para investimentos de grande magnitude neste momento", afirma.

Sem ter estudado em profundidade o novo modelo brasileiro, Susanne entende que o passo mais importante, o de transformar as companhias privadas em parceiras do Estado, e não simples prestadoras de serviço, foi garantido. "Se fossem apenas contratos de prestação de serviço, as empresas estariam muito menos interessadas, porque em algum momento elas ficariam de fora do negócio."

Em artigo publicado na quinta-feira, o gabinete Sia Conseils, especializado em energia e meio ambiente, também fez críticas positivas ao modelo. "O gigante verde sonha com o ouro negro, e seu sonho está a um passo de se tornar realidade", afirma o relatório, fazendo uma ressalva: "O Estado não poderá assumir sozinho o custo da exploração das jazidas - estimadas em US$ 600 bilhões - e precisa encontrar um meio termo justo para não afugentar as empresas privadas e, ao mesmo tempo, melhorar a repartição dos lucros em seu favor".

Segundo o escritório, em razão das novas jazidas "o Brasil se apresenta como um parceiro político e econômico cada vez mais influente nos próximos anos".

TRAÇO NACIONALISTA

George Friedman, Ph.D. em Economia e fundador do escritório de inteligência estratégica Stratfor, com sede no Texas, nos Estados Unidos, também fez uma análise ponderada da mudança do marco regulatório, em artigo publicado pela FXStreet, site europeu especializado em comércio exterior.

Segundo o especialista, o novo modelo contém "um traço nacionalista" que concede ao governo amplas possibilidades de intervenção no desenvolvimento das reservas, mas, diz Friedman, a regulamentação do setor de energia está em linha com a estratégia de interesses do Estado brasileiro.

"Está claro que o Brasil vê suas reservas pré-sal como um bem que precisa ser protegido pelo Estado, mesmo com o risco de tornar mais lento o influxo de capital externo e de tecnologia que o país está tentando atrair para impulsionar o desenvolvimento de suas reservas," afirma o especialista.

6/9/2009 - EDITORIAIS

O QUE PENSA A MÍDIA
6/9/2009 - EDITORIAL
DEVER DE CASA
EDITORIAL
O GLOBO
6/9/2009

O presidente Lula mostrou que poderia levar o Brasil a uma posição de destaque contra o aquecimento global ao afirmar que as propostas a serem levadas à Conferência Internacional do Clima, em Copenhague, em dezembro, “devem ser mais radicais que muitas das que estão sendo discutidas no momento”.
Lula prometeu trabalhar para compatibilizar as propostas de diversos países — citou Brasil, Alemanha e EUA, além de “outros países importantes que precisam assumir responsabilidades”.
A retórica é agressiva, mas não basta. O Brasil necessita fazer o dever de casa, começando por conter o desmatamento e as queimadas na Amazônia, responsáveis por 60% a 70% das emissões de CO2 produzidas pelo país e por sua inclusão no ranking dos maiores poluidores.
Outra providência é deter a tendência de “sujar” a matriz energética brasileira. Nos últimos anos, com a falta de investimentos em hidrelétricas e o atraso na construção de algumas por problemas ambientais, o país se viu obrigado a ampliar o uso de usinas termelétricas a carvão e óleo combustível. Tiro no pé.
A emissão do principal gás causador do efeito estufa pelas térmicas aumentou 122% entre 1994 e 2007, passando de 10,8 milhões de toneladas de CO2 para 24,1 milhões de toneladas. Diante disso, é necessário incentivar a operação de usinas a gás ou biomassa e aumentar a participação das centrais nucleares na matriz energética. Se Lula demonstra disposição de avançar, o empresariado brasileiro, mais rápido, começa a tomar medidas para reduzir as emissões poluentes e a exigir mais ação: por exemplo, defende que o Brasil vá a Copenhague disposto a negociar para que suas empresas possam receber créditos de carbono, conforme previsto no Protocolo de Kioto. A iniciativa privada entendeu que o desafio não é apenas ambiental, mas econômico.
Se os EUA de Barack Obama e a China demonstram hoje muito mais sensibilidade aos efeitos das mudanças climáticas, é preciso obter a adesão de emergentes importantes, como a Índia, que acaba de anunciar que suas emissões poluentes devem triplicar em duas décadas.
São países ainda aferrados à postura de atribuir às nações desenvolvidas maior responsabilidade pelo combate ao aquecimento global.
Relatórios sobre derretimento do gelo glacial e aumento da temperatura e do nível dos oceanos mostram que não há mais tempo para atribuição de culpas.
Contudo, há uma responsabilidade que de fato recai sobre os países ricos: financiar os investimentos para que os emergentes possam limpar as matrizes energéticas, deter queimadas e desmatamento, e reduzir as emissões da indústria e dos transportes.

MAIS UM CASO
EDITORIAL
O GLOBO
6/9/2009

O Ministério Público do Rio puxa a meada de uma rede de corrupção que sangrou os cofres da Secretaria estadual de Saúde e do Detran. Em dois inquéritos criminais, três grupos de empresas fornecedoras de mão de obra terceirizada para o governo são investigados por desvio de recursos públicos dos dois órgãos estaduais. Os inquéritos, em andamento, tratam de supostos crimes praticados em 2006, último ano da gestão de Rosinha Garotinho à frente do Executivo fluminense.
Puxa-se o fio, e os rastros levam a grupos empresariais — que continuam, na administração de Sérgio Cabral, entre os principais fornecedores do estado em suas áreas de atuação — responsáveis por cevar a campanha eleitoral de um deputado federal apoiado pelo ex-governador Anthony Garotinho, marido de Rosinha. As impressões digitais da rede se estendem, segundo as investigações do MP, a outras campanhas e alcançam pessoas ligadas a antigas autoridades estaduais.
Não se trata de história particularmente original — e eis aí a face mais preocupante revelada por essa nova investida do Ministério Público contra grupos que se especializam em drenar verbas dos cofres públicos para contas particulares, abastecendo interesses que passam ao largo da destinação que deveria ser dada ao dinheiro do contribuinte.
Graças a uma legislação frouxa no controle da origem dos recursos que robustecem campanhas eleitorais e enriquecem ilicitamente pessoas e empresas, esquemas de desvio de verbas se sucedem teimosamente na crônica da corrupção nos diversos níveis da administração pública.
Neste caso particular, as altas movimentações em espécie detectadas nos inquéritos do MP são indicações de formação de grupos ligados a lavagem de dinheiro e manutenção de caixas 2. Não faltam na história outros crimes, como o assassinato de um soldado do Corpo de Bombeiros ligado a uma das empresas investigadas, na qual a vítima teria como chefe um oficial da corporação. O MP está, portanto, diante de claras evidências de afronta ao estado de direito — mais uma. Só a punição efetiva poderá vacinar a máquina pública e a vida política contra um tipo de crime que perigosamente se banaliza.

EM PREPARO UMA HERANÇA MALDITA
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
6/9/2009

O Brasil vive a era das contrarreformas, com o governo empenhado em desfazer alguns dos mais importantes avanços institucionais dos anos 90 e do início desta década, diz o ex-presidente do Banco Central (BC) Gustavo Loyola em artigo publicado no Estado da última segunda-feira. Há uma contrarreforma fiscal, uma previdenciária e outra do Estado. Já se delineia uma quarta, trabalhista, proposta pelas centrais sindicais e apoiada publicamente pelo ministro do Trabalho, Carlos Lupi, com o beneplácito do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O ex-presidente do BC sintetizou numa palavra a tendência dominante no governo e já apontada em mais de um comentário nesta página: promover um retrocesso histórico, desfazendo alguns dos principais fatores da modernização recente do País. Sem esses fatores, a economia brasileira não teria alcançado o vigor necessário para resistir sem danos muito importantes à crise internacional iniciada há dois anos.

O governo federal tem sido elogiado pelas medidas de estímulo econômico adotadas a partir do ano passado quando a crise nos atingiu. As únicas medidas sérias foram aquelas tomadas pelo BC - para aumentar o crédito bancário e as operações de apoio aos exportadores - e a redução de impostos para alguns setores. O espaço para o alívio tributário teria sido muito menor, se o governo federal não houvesse mantido, embora com empenho cada vez menor, a política de metas fiscais inaugurada pela administração anterior. A relativa estabilidade de preços é uma conquista consolidada pelo regime de metas de inflação. Também o fortalecimento do setor externo é o resultado de longo prazo de estratégias adotadas há muito tempo, como privatização de grandes empresas exportadoras, a modernização agrícola, a abertura da economia brasileira e o câmbio flexível.

Mas esse governo, beneficiário das ações de modernização empreendidas em gestões anteriores, se mostra empenhado, cada vez mais claramente, em desenterrar os vícios do passado. A maior parte da expansão fiscal dos últimos 12 meses - e dos últimos anos - foi causada não pelo investimento crescente, mas pelo continuado aumento das despesas de custeio, especialmente dos gastos com a folha de pessoal. Passada a crise, não haverá como interromper a expansão do gasto ocorrida neste período, porque a elevação das despesas foi concentrada nas despesas permanentes.

Em 2010 o Orçamento federal será mais inflexível que nos anos anteriores, porque não se cortam facilmente a folha de salários e os encargos trabalhistas. Da mesma forma, os gastos previdenciários terão muito mais que um crescimento vegetativo, não só pelo aumento do salário mínimo, mas também pelas vantagens prometidas a aposentados com rendimentos superiores ao mínimo. Mas as mudanças negociadas pelo governo com as centrais sindicais são mais amplas e deverão resultar, se concretizadas, no enfraquecimento do chamado fator previdenciário, criado para desestimular as aposentadorias precoces. O mesmo acordo envolveu a prorrogação, até 2023, da fórmula de aumento do salário básico. Da parte do governo, foi mais uma notável demonstração de irresponsabilidade e demagogia.

Também no sentido do retrocesso vão os esforços, iniciados na primeira gestão petista, para sujeitar as agências de regulação aos interesses partidários e eleitorais dos grupos no governo e para restabelecer os níveis de intervenção estatal observados até o começo dos anos 90.

Nesse sentido, a divulgação das normas para o pré-sal completa de forma ominosa o quadro do retrocesso com a adoção, pelo governo, de um projeto nacional-estatizante de exploração do petróleo que, segundo declarações do ministro de Minas e Energia, deverá ser seguido por outro do mesmo tipo para a área de mineração. Preferimos acreditar que não se trata de uma adesão "ideológica" ao modelo autoritário bolivariano, do caudilho venezuelano Hugo Chávez, mas de um mero e lamentável "erro de cálculo" do presidente Lula, que acreditou que o nacional-estatismo tem maiores possibilidades de salvar a insossa candidatura Dilma Rousseff do que a continuação com as políticas que lhe granjearam a popularidade que desfruta hoje.

Mas, seja como for, seu sucessor pode ir se preparando para receber pesada herança maldita.

O IMPOSTO DO LIVRO
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
6/9/2009

Embora a vendagem de livros tenha aumentado e o preço médio dos livros tenha caído no ano passado, apesar da crise, como revela um recente estudo da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), o governo está propondo a criação de um novo tributo para constituir um fundo destinado a estimular a leitura no País. Essa é a segunda tentativa feita pelo governo, em menos de um mês, para criar novos impostos. Em agosto, o ministro da Saúde, com o apoio de parlamentares da base aliada, voltou a defender a criação de uma nova CPMF, alegando que precisa de recursos para financiar o combate à gripe suína.

No caso dos livros, o governo quer instituir uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), com uma alíquota de 1% sobre o faturamento anual das editoras, distribuidoras e livrarias. Formulada pelo Ministério da Cultura (Minc), a proposta é apresentada justamente no momento em que o governo adota medidas para desonerar a atividade econômica nos mais diversos setores de atividade.

Como a Cide seria cobrada em todas as etapas do setor de publicações, a alíquota de 1% para cada elo da cadeia editorial se converteria em 2,1% no preço final do produto. Isso pode ser mortal para os pequenos distribuidores de livros, cuja margem de lucro já é muito reduzida, não comportando mais uma taxação. O mesmo pode ocorrer com as pequenas e médias livrarias, que hoje sofrem uma acirrada competição com os grandes grupos especializados em vendas de produtos culturais - livros, CDs, DVDs - pela internet. Lutando para sobreviver nas cidades do interior do País, elas não têm condições de absorver mais esse custo.

Por seu lado, as editoras alegam que a venda de livros é muito sensível ao preço e que qualquer elevação tem efeito direto no volume de vendas. Elas afirmam que, com a cobrança da Cide, terão de reajustar os preços de seus catálogos. E, como os livros ficarão mais caros, elas temem uma queda nas vendas e, por tabela, uma redução no número de novos lançamentos de autores nacionais. Os editores também dizem que terão de suspender o patrocínio de fóruns de debates e dos projetos de "salas de leituras" e de "espaços infanto-juvenis", que criaram junto a escolas e comunidades para incentivar o hábito de ler.

A proposta do Minc é mais uma dessas ideias insensatas - tão do gosto do atual governo - que pode trazer resultados diametralmente opostos aos desejados. A ideia de se criar uma "contribuição" incidente sobre o setor editorial surgiu pela primeira vez em 2004, meses após o presidente Lula ter reduzido a zero a alíquota do PIS e da Cofins para toda a cadeia produtiva do livro. Na época, foi classificada como incoerente por autores, editores, distribuidores e livreiros.

Ao justificar a retomada da proposta de quatro anos atrás, o governo alega que a receita gerada pela Cide irá para um Fundo Pró-Leitura, que será constituído com quatro objetivos - todos embalados numa retórica politicamente correta: "democratização do acesso; fomento à leitura e formação de mediadores; valorização de leitura e comunicação; desenvolvimento da economia do livro".

Retórica à parte, a medida mais absurda é a instituição da figura dos "mediadores" de leitura - ou seja, pessoas que tentariam incentivar o hábito de ler na população. Como se vê, o governo do presidente Lula não abandonou a compulsão pelo "dirigismo cultural", que foi evidenciada, em seu primeiro mandato, pelas tentativas de criação de um Conselho Federal de Jornalismo (CFJ) e de uma Agência Nacional de Cinema e Audiovisual (Ancinav). Quem serão esses "mediadores" de leitura? De que modo serão escolhidos? Em que medida isso não pode levar a um festival de contratações de "companheiros"? Acima de tudo, o que garante que os "mediadores" sejam mais eficientes do que os professores de ensino básico e como evitar que convertam seu trabalho em mero proselitismo partidário-ideológico?

A extravagante ideia de criação de um imposto para estimular o hábito da leitura só poderia vir de um governo cujo chefe já afirmou várias vezes que não gosta de livros e que não lê "porque dá sono".

RESTAURANDO PARTE DOS DIREITOS
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
6/9/2009

Ao aprovar o relatório do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) sobre a proposta de emenda constitucional (PEC) que muda as regras para o pagamento dos precatórios, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara retirou parcialmente do texto uma das disposições mais prejudiciais aos cidadãos e empresas que, por sentença judicial, têm a receber da União, dos Estados ou dos municípios: a quebra da ordem cronológica dos pagamentos. Mas manteve pontos que beneficiam excessivamente os devedores, como a possibilidade de pagamento de metade do valor devido sem respeitar a ordem e a não fixação de prazo para a liquidação dos precatórios em atraso. Por isso, a Câmara terá de alterar ainda mais a PEC, se quiser preservar os direitos dos credores.

Pressionado por governadores e prefeitos que nos últimos anos deixaram acumular o montante de dívidas decorrentes de condenação judicial - em geral por não cumprirem as condições de pagamento que lhes foram oferecidas -, o Senado aprovou em abril a PEC que oferece novas facilidades para os devedores. De autoria do senador Renan Calheiros (PMDB-AL), a PEC cria um regime especial para os precatórios pendentes de pagamento e que, de acordo com os levantamentos mais recentes, totalizam R$ 100 bilhões nos Estados e municípios.

Entre outras alterações, o parecer de Cunha elimina o artigo 2º da PEC aprovada pelo Senado, por considerá-lo inconstitucional. O texto eliminado acrescentava um artigo, que seria o de número 97, ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal, estabelecendo duas opções de pagamento: 60% dos recursos reservados para a quitação seriam destinados a pagamento por leilão, decidido pelo critério de maior desconto oferecido pelo credor; os restantes 40% seriam destinados ao pagamento à vista "em ordem única e crescente de valor".

Esses critérios significavam o fim da ordem cronológica dos pagamentos, estabelecida de acordo com a data da emissão do precatório - que é a sentença judicial definitiva, determinando à Fazenda Pública que faça o pagamento devido. Ou seja, credores que já estavam na fila para receber perderiam seu lugar e só receberiam aquilo a que têm direito, assegurado em caráter definitivo por decisão judicial, se e quando o governante devedor quisesse pagar. Essa medida, no entender do relator da PEC na Câmara, fere o direito adquirido dos credores - e direito adquirido é cláusula pétrea da Constituição.

O parecer retira da PEC outras vantagens oferecidas aos governos devedores, entre as quais a eliminação da obrigatoriedade de incluir no orçamento as verbas necessárias para a liquidação dos precatórios.

Se aprovada pelo plenário, esta será a terceira moratória constitucional para o pagamento dos precatórios judiciais, que, segundo alegam alguns governadores e prefeitos, desorganizam as finanças públicas, mas que, concretamente, resultam do fato de que o Estado não paga o que deve aos cidadãos nem mesmo quando a Justiça manda que o faça. A primeira foi estabelecida pela Constituição de 1988, que, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, estabeleceu o prazo de oito anos - considerado razoável, visto que muitos governantes tinham déficits herdados de gestões anteriores - para a Fazenda Pública quitar todos os precatórios.

Com o acúmulo de dívidas judiciais atrasadas, nova moratória foi aprovada em 2000, por meio de emenda constitucional. Essa emenda concedeu prazo adicional de dez anos para a quitação, mas sem alterar a ordem cronológica dos pagamentos nem mudar a forma de correção da dívida, estabeleceu que o precatório poderia ser cedido (o que criou um mercado secundário para esses direitos) e permitiu quitar dívidas tributárias com parcelas não pagas dos precatórios.

Mas nem dispondo de novas facilidades os governantes quitaram as dívidas. Um dos argumentos a favor da PEC em discussão é o de que ela formaliza uma situação de fato e prevê medidas que podem ser menos danosas aos credores. Mas o reconhecimento de uma situação de fato, diz o relatório de Cunha, "não autoriza a revogação de princípios e regras constitucionais que não comportam revogação ou modificação". Ou seja, não pode implicar a violação de direitos adquiridos.

O FGTS AJUDA AS EMPRESAS
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
6/9/2009

Entre julho de 2008 e junho de 2009, período de crédito escasso, o Fundo de Investimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FI-FGTS) liberou R$ 4 bilhões para empresas, dos quais R$ 3,3 bilhões para a aquisição de debêntures emitidas pelas beneficiárias. Recursos carimbados, para a aplicação em projetos de infraestrutura, atenderam - ao que tudo indica - a necessidades imediatas das companhias.

Criado em 2007, o FI-FGTS recebeu do FGTS aportes de R$ 17 bilhões, dos quais R$ 15 bilhões já contratados. Os recursos não provêm dos depósitos feitos no FGTS pelas empresas, em nome dos trabalhadores, mas do patrimônio líquido do Fundo, que obtém com as aplicações remuneração mais alta do que a propiciada por financiamentos habitacionais. Tramita no Congresso um projeto de lei que faculta aos trabalhadores aplicar mais R$ 5 bilhões no FI-FGTS.

O custo dos fundos do FI-FGTS é atraente para os tomadores, como a Santo Antônio Energia, que recebeu R$ 1,5 bilhão e está construindo uma hidrelétrica no Rio Madeira. A Usiminas recebeu R$ 600 milhões em dezembro, para pagar em 2020, ao custo do CDI mais 0,5% ao ano; e a CCR recebeu R$ 500 milhões, para pagar em dez anos, com juros de 14,75% ao ano. Nesses dois casos, não houve vinculação direta com investimentos, segundo o jornal Valor. A CCR prometeu investir o dinheiro nas subsidiárias em até 18 meses. Um diretor da CCR, Arthur Piotto, notou que a operação favoreceu a gestão de caixa. “Financiamento de dez anos era uma mosca branca no mercado”, declarou.

O FI-FGTS aplicou recursos na Ferronorte, Malha Sul e Ferroban, que pertencem à ALL, nas Centrais Elétricas de Pernambuco, além de destinar R$ 7,025 bilhões ao BNDES. Comprou cotas de fundos da Energisa, da Amazônia Energia e da estatal gaúcha CEEE, além de ações de usinas da Alupar e da Embraport. E, junto com a Cemig, investirá na construção de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) em Minas Gerais. Mas são poucos os tomadores.

Num sentido estrito, as aplicações do FI-FGTS deveriam ser feitas na construção, reforma, ampliação ou implantação de projetos de infraestrutura (rodovias, portos, hidrovias, ferrovias, energia e saneamento). Mas, ao oferecer liquidez, esse fundo também participou do esforço anticrise, inclusive aportando recursos ao BNDES. É uma política que poderá ser contestada por quem precisou, mas não conseguiu crédito do FI-FGTS para infraestrutura.

ESPAÇO ABERTO
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
6/9/2009

Na campanha eleitoral, não faz sentido tratar a internet, livre, como o rádio e a TV, que são concessões públicas

IMPOSSÍVEL entender a sanha de alguns legisladores contra a internet.
Espaço absoluto da liberdade de opinião, e como tal consagrada num voto do ministro Carlos Ayres Britto, do Supremo Tribunal Federal, a web continua a causar temores entre os políticos de plantão.
Avulta, entre todos, a figura do senador tucano Eduardo Azeredo, arvorado em especialista no assunto. Cogita, agora, um recuo. A internet não seria equiparável, ao contrário do que projetava o senador, às emissoras de TV.
Um preâmbulo, na lei eleitoral, relembraria o preceito constitucional da liberdade de expressão, aplicando à internet algo que sempre foi sua razão de vida.
Salvam-se o senador Azeredo e seus congêneres, que hesitavam em deixar vigente a liberdade que, de modo incontrolável, faz da internet um espaço público.
O raciocínio, no fundo, é dos mais claros. Emissoras de televisão são concessões de Estado. Nada identifica as emissoras de TV com os portais da internet. A própria lógica do meio impõe a liberdade de escolha ao cidadão e ao eleitor.
Pode este, num mero clique de computador, rejeitar o viés eleitoreiro de um site, ou contribuir para uma candidatura na qual confie. Esse espaço de livre movimentação e expressão, em suma, está acima das tentativas congressuais de regulá-lo.
Decerto essa característica também faz da internet um terreno livre, mais livre do que seria desejável, para as grosserias verbais, a calúnia, a injúria e a difamação. Reconhecer essa realidade, contudo, não significa admitir uma lei especial para "regular" a internet.
Quanto à incivilidade e à grosseria, só se pode esperar que diminuam com o tempo. Quanto às ofensas mais graves, cabe a aplicação do Código Penal -nem mais, nem menos.
O que prevalece, na atitude de alguns parlamentares como o senador Eduardo Azeredo, é uma espécie de paixão pela tutela. Trata-se de um ultrainformado excesso de zelo.
Em torno das inovações da informática, parlamentares inventam regras a fim de preservar, na esfera pública, ordenamentos que os favoreçam, que possam diminuir o teor das críticas contra os políticos. Cidadãos comuns no exercício de seu direito à expressão -seja na rua, seja nos jornais, seja na internet- não podem ser censurados.
Que se tenha desistido disso é uma boa notícia para a democracia brasileira.
O exemplo recente da candidatura de Barack Obama, nos Estados Unidos, é animador. A internet agregou-se aos meios tradicionais de mobilização e ajudou a tirar o debate eleitoral americano do marasmo. A própria prática das doações financeiras a candidatos, sempre aberta a suspeitas várias, democratizou-se e dispersou-se em parte.
Não há dúvida: a internet, para fins de regulação em tempos de campanha eleitoral, deve alinhar-se não às redes de TV e de rádio (que são concessões), mas a jornais e revistas, como espaço aberto, caracterizado pela livre escolha e pela livre iniciativa e independente da tutela estatal.

PARADA PRECOCE
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
6/9/2009

COMO JÁ era esperado, o Banco Central interrompeu nesta semana a trajetória de queda dos juros básicos da economia ao manter em 8,75% a meta da taxa Selic.
A decisão é reveladora do excesso de conservadorismo do BC. De fato, desde o ano passado, após o colapso do banco de investimentos americano Lehman Brothers, o Copom manteve por três reuniões seguidas a Selic em 13,75%. Iniciou o movimento de queda apenas a partir de janeiro de 2009, quando o país já estava em franca retração.
A trajetória de redução dos juros, a partir daí, foi caracterizada pelo gradualismo, a despeito dos indicadores da economia. Essa política impôs um custo excessivamente alto ao sistema produtivo, suprimindo desnecessariamente empregos e ocasionando redução da renda.
Na situação atual, embora a economia já dê sinais de recuperação, os indicadores da melhora ainda são preliminares, e não há indícios preocupantes de aceleração inflacionária.
Assim, faria mais sentido reduzir o ritmo da queda, em vez de interrompê-la. Corre-se o risco de impor prejuízo a uma recuperação incipiente, mantendo-se o custo financeiro em patamar excessivamente elevado, o que se reflete especialmente nos empréstimos a empresas e famílias.
Sabe-se, entretanto, que reduções muito pronunciadas dos juros no Brasil, embora desejáveis, são impossíveis no atual quadro institucional. A remuneração da caderneta de poupança -6% acima da Taxa Referencial- ainda representa um limite à queda dos juros domésticos.
Ironicamente, contudo, é o próprio governo que acaba contribuindo para impedir um corte mais pronunciado dos juros ao não encaminhar a resolução do problema da caderneta.

A BANCADA DO PRÉ-SAL
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
6/9/2009

O pagamento de royalties pela exploração do pré-sal gera disputa entre Estados. O palco da batalha é o Congresso. Produtores de petróleo, como o Espírito Santo, seriam prejudicados pela modificação dos projetos do governo

A defesa dos interesses do Estado deve levar capixabas a formar a bancada do pré-sal para se articular no Congresso

Aincorreta mistura de regras de exploração petrolífera com interesses eleitorais tenderia a ser politicamente explosiva, causando efeitos imprevisíveis.

É o que está acontecendo desde o anúncio do governo sobre o sistema de partilha de royalties e a participação especial dos Estados produtores. O pré-sal passou a temperar uma guerra federativa movida pela cobiça a esses recursos.

Lula e a ministra Dilma Rousseff, sua preferida para a sucessão, procuram ocupar todos os espaços do palanque do pré-sal, cheio de ufanismo nacionalista e decorado com tons eleitorais. Pena. Questão de Estado não deveria ser tratada assim. É descaminho.

Mas o fato é que aliados da coalizão governista – os menos prestigiados –, também querem lugar no palanque. Por isso, levantam vozes, com todo sentimento regionalista que conseguem exprimir. Cada um procura puxar para o seu Estado uma fatia de recursos da nova mina petrolífera da qual ainda nem se sabe o tamanho.

Já existe até governador enfrentando colega por causa (aparentemente) dos royalties. Na semana passada, em diálogo pouco cordial com Sérgio Cabral (RJ), Eduardo Campos (de Pernambuco) disse não aceitar os termos da proposta do Palácio do Planalto para partilha do pré-sal, e que em função disso haverá "guerra" no Congresso. Uma agressiva teatralização política, como há muito não se via.

Já a oposição aproveita o leilão de palpites, reivindicações e emoções para se colocar estrategicamente. Por certo, olha o embate quanto à possibilidade de render dividendos eleitorais. A máscara nacionalista é um apelo eleitoral. Cabe em muitos rostos, suprapartidariamente. Pode servir para alguns oposicionistas.

O argumento dos descontentes é a defesa generosa e indiscriminada da partilha. Apregoam que o petróleo é uma riqueza pertencente ao país – até aí, tudo bem –, mas escorregam ao achar que por isso os royalties devem ser divididos igualitariamente entre todas as unidades da Federação. É a apologia de uma injustiça. Ou será que os Estados não produtores estão dispostos a financiar parte dos investimentos socioeconômicos exigidos pelo impacto das atividades petrolíferas? Será que eles também ajudariam nos custos de projetos de proteção ambiental e de reparação de danos à natureza em caso de acidentes? É o caso de consultá-los.

O palco da batalha petrolífera é o Congresso. É lá que os três grandes Estados produtores – Espírito Santo, Rio e São Paulo – terão de defender os seus direitos, conforme previsto nos projetos do Palácio do Planalto – que não lhes concede favor algum.

Os 70 deputados federais paulistas, mais os 46 representantes do Rio e mais os 10 parlamentares capixabas na Câmara não perfazem número suficiente para garantir a aprovação dos projetos sobre o pré-sal, da forma como estão redigidos. Ao todo, são 513 deputados federais.

Nessa conta aritmética existem fatores políticos que teoricamente podem ajudar a fechar uma soma de votos a favor de ES, RJ e SP, na guerra federativa do petróleo. É que nem todos os nove Estados nordestinos estão obstinados em tirar fatia dos futuros recursos do pré-sal. Há racha de posições. Existem visões mais arejadas.

Ademais, os royalties diferenciados e as participações especiais aos produtores do pré-sal podem ser trabalhados em termos de uma grande aliança no Congresso integrada por deputados e senadores do ES, RJ, SP, pelos dissidentes do Nordeste e por representantes das demais regiões do país – o Norte, o Sul e o Centro-Oeste. Nossos parlamentares têm habilidade de sobra para essa missão. E a causa é nobre. Trata-se do que é melhor para o país.

AS LIÇÕES DA CONVIVÊNCIA
EDITORIAL
ESTADO DE MINAS
6/9/2009

Mercado Central faz 80 anos e ensina como se ganha com a tradição e a sabedoria

Os 80 anos que o Mercado Central de Belo Horizonte comemora amanhã são muito mais do que um marco em sua história de sucesso. São uma lição que merece ser aprendida e aplicada em todo o resto da cidade. Trata-se de um desafio vencido: o de manter de pé uma série de pontes que parecem impossíveis. Entre o passado e o presente, com a certeza de futuro. Entre o simples e o sofisticado. Entre o comercial e o pessoal, o humano. Entre o negócio e a cordialidade. É uma mistura natural e instintiva de quase tudo que as mais modernas técnicas de marketing propõem e almejam alcançar no ambiente urbano com a melhor face da tradição, aquela que vem de profundas raízes rurais. Do cheiro ao gosto, o mercado conseguiu o milagre de trazer o campo para o convívio da cidade, de colocar a maneira antiga e sem truques de produzir o doce, o queijo ou linguiça ao alcance da praticidade moderna do cartão de crédito. Tudo isso acontece, enquanto a aparente simplicidade das instalações e movimentação sem pressa de seus corredores se encarregam de desmontar peconceitos e anular a ansiedade trazida das ruas da cidade grande. Sem fazer força, o mercado realiza o sonho de todo cientista da promoção comercial: lá, todo mundo fica à vontade.

O respeito à tradição e a preservação dos valores herdados dos antepassados não teriam produzido, por exemplo, as pichações que emporcalham muros e fachadas por toda parte, num festival de desrespeito e agressão à cidade. Longe do que se vê no Mercado Central, essa é um prova de desamor e de falta de compromisso dos autores com o lugar onde vivem e com as pessoas com quem são incapazes de conviver. O mercado é também uma prova de como é possível manter-se atualizado sem a estupidez da destruição, basta que se saiba somar sentimento com conhecimento. É, certamente, mais fácil jogar tudo ao chão e erguer um espigão que não guarda a menor relação com a história e com as vidas que fizeram, por gerações, a felicidade e as emoções do lugar. É como o egoísmo de proprietários incultos e gananciosos tem tratado os casarões que um dia compuseram a beleza e a personalidade da cidade. O prejuízo é a perda das referências mais valiosas, do ambiente, do aconchego e daquilo que sobra no Mercado Central: uma irresistível vontade de voltar.

Hoje com muito mais lojistas – são 400 – do que quando foi inaugurado em 1929, o Mercado Central também ensina que é possível crescer e abrigar soluções modernas sem perder o principal: o espírito. Um novo projeto de atualização está em andamento, sem o menor prejuízo da cerveja gelada, servida no balcão alto, com jiló, moela e cebolas. O estacionamento interno está sendo ampliado, a rede elétrica será trocada. E o tradicional mercado tem, agora, atualíssimas preocupações ambientais. Adaptações no telhado vão permitir a captação da luz solar e o aproveitamento da água da chuva para a lavação dos corredores. Há um permanente trabalho de separação do lixo, para facilitar a reciclagem de papelões e prensagem da parte orgânica. Ambiente de agradável convivência, mais do que centro de compras, o mercado resume a expectativa de que seu sucesso sensibilize as pessoas para o que realmente vale a pena preservar.

A CRISE DO ENSINO UNIVERSITÁRIO
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
6/9/2009

Diagnóstico que se repete como eco dos gastos insuficientes para arrimo das políticas públicas de educação, afirmar que está mal o ensino superior no Brasil não vai além de um truísmo. Quando se espera algum avanço de qualidade, pesquisas revelam que grande parte das instituições universitárias, incluídos aí centros e faculdades isoladas, continua a exibir baixo rendimento pedagógico. Dão testemunho da anomalia duas avaliações feitas pelo Ministério da Educação.

A primeira reprovou 588 (36,4%) das 1.613 unidades submetidas a investigação qualificatória mediante aplicação do Conceito Preliminar de Curso (CPC) e do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade). O primeiro critério avalia os cursos. O segundo é aplicado para apurar o grau de aprendizado do aluno. Ambos usam referencial que vai de 1 a 5, o número maior como representação do melhor desempenho. A reprovação situou os estabelecimentos que tiveram nota entre 1 e 2. Apenas 1,3% do total objeto do inquérito realizado pelo MEC obteve o nível 5.

No segundo levantamento, abrangente apenas das disciplinas admitidas nos currículos de graduação, mais de 20% dos cursos, relativos a cerca de 15 áreas de conhecimento, receberam as piores notas — 1 e 2. Os resultados foram apontados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais. No Distrito Federal, das 149 iniciativas de formação especializada, 40,27% não foram acima da nota 2. Salvou-se a Universidade de Brasília (UnB) em quatro áreas — matemática à frente — com a maior avaliação. Outras, como o UniCeub, Faculdades Integradas da Terra, UniEuro e Universidade Católica, que alcançaram o patamar de 3 em alguns cursos, também apresentaram desempenho satisfatório.

Para agravar o quadro já de si preocupante, estudo específico do MEC mostra que um em cada quatro dos professores em processo de formação frequentam instituições de má qualidade. Nada menos de 71 mil alunos que estudam pedagogia em 292 cursos receberam os mais baixos conceitos avaliativos. Só nove dos 763 estabelecimentos pesquisados mereceram qualificação ideal. O trabalho do MEC se refere a 2008.

Sobre a massa das graves disfunções do ensino superior, o Ministério da Educação realiza tarefa de monitoramento das universidades, centros e faculdades especializadas que não ofertam ensino de qualidade. Quando não consegue reverter o quadro adverso, estabelece punições que vão da proibição para realizar vestibulares até o simples fechamento da unidade naufragada na incompetência. Precisa ir mais adiante. Cuidar para que os estudantes, mediante medidas preventivas, não sejam prejudicados por formação desqualificante. Significa dizer, também, que deve lhes assegurar transferência para educandários qualificados, quando as irregularidades anotadas não forem corrigidas.

INVESTIGAR O PAC
EDITORIAL
DIÁRIO DE CUIABÁ (MT)
6/9/2009

A oposição na Câmara Municipal de Cuiabá vem encontrando dificuldades para instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) na Capital. A reação à CPI, como haveria de ser natural, parte do bloco de sustentação do prefeito Wilson Santos, comandado pelo PSDB, e tem a simpatia de alguns vereadores de outros partidos – caso do PP – que são aliados, mas não são muito de “botar a mão no fogo” pelo tucano.

A idéia de se criar uma CPI surgiu, por assim dizer, “na onda” da Operação Pacenas, a ação da Polícia Federal e do Ministério Federal que, no dia 10 de agosto, desvendou um esquema de fraudes em licitações de obras do PAC, em Cuiabá e Várzea Grande. Em princípio, a proposta sugere um ato demagógico – quando nada, oportunista -, considerando que as investigações sobre esse polêmico caso ainda não foram concluídas pela PF.

Não se pode perder de vista, no entanto, que a investigação parlamentar é um expediente normal e natural de um Poder, como o Legislativo, que busca sempre enfatizar sua independência – questionada, em alguns aspectos – e que tem todo o direito de averiguar o andamento das obras desse polêmico programa federal de obras. Assim, a CPI também se reveste de uma enorme importância, no contexto da atividade parlamentar.

Na semana que passou, dois fatos importantes depuseram a favor da denominada “CPI do PAC”. O primeiro foi a declaração do líder do prefeito da Câmara, Paulo Borges (PSDB), de que, num primeiro momento, a bancada tucana é contra a comissão; num segundo, não afasta a possibilidade de o partido apoiar sua instalação.

O outro fato foi a admissão, por parte de Wilson Santos, de que os indícios de fraudes no PAC, apontados pela PF e MPF, merecem ser levados em conta. Ademais, o prefeito admitiu, também, que pode punir os servidores acusados de envolvimento com a quadrilha. Para completar, o vereador Ivan Evangelista (PPS) anunciou que vai assinar o requerimento, de autoria do vereador Lúdio Cabral (PT,) que pede a abertura de uma CPI do PAC. O socialista é um notório defensor da gestão tucana no Palácio Alencastro. Sua posição, portanto, é um indicador de que, mais tempo, menos tempo, a comissão será uma realidade.

Uma vez que seu nome não foi citado pela Operação Pacenas e costuma emitir atestado de idoneidade a si mesmo e aos seus principais assessores envolvidos com o PAC, não haveria por que Wilson Santos declarar guerra ao Legislativo, apenas porque este quer colocar em pratos limpos um assunto que interessa muito à coletividade.

“Se Wilson Santos não tem nenhum envolvimento com fraudes, não há por que ser contra a CPI do PAC”

QUANTO VALE O SHOW?
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
6/9/2009

“Nunca antes nesse país...” A frase já virou chacota, clichê e dá engulhos nos espíritos mais sensíveis a lugares-comuns. Mas em se tratando de cultura, “nunca antes nesse país” se teve tanta informação quanto agora.
Um dos motivos, por certo, é a consolidação da chamada indústria do entretenimento, a terceira do mundo e um guarda-chuva gigantesco o bastante para abrigar dos estúdios de Hollywood ao milionário futebol europeu, passando pela música erudita e pelo balé clássico. Outro é a reação dos governos ao ato e potência da cultura, acionando para tanto o banco de dados do Pnad e do Ministério da Cultura, dando gás nas políticas públicas.
Nessa indústria há lugar, vale dizer, para as manifestações mais resistentes à padronização corporativa, como o cinema alternativo, a poesia e as avançadíssimas artes plásticas. Com tamanha complexidade, dá-lhe polca. Foi preciso gerar números. E números com capacidade para satisfazer a fome dos investidores de setores econômicos mais confiáveis, sem os quais a cultura permaneceria passando o chapéu.
Para quem participa das artes, a ordem e o progresso aplicados à cultura deram uma ressaca digna de caipirinha com pinga de alambique. A aproximação demasiada com a produção para consumo soa como uma concessão perigosa, da qual a criação mais radical e digna desse nome sai arranhada.
Mas tudo indica que é caminho sem volta. A cultura se profissionaliza sem direito a ré. E não se pode negar, em meio a perdas e danos, que essa organização digna de multinacionais alemãs serviu para que se soubesse mais sobre as práticas culturais, seja na Califórnia, seja em Mangue Seco. O mesmo informe que serve a investidores se presta a retratar para o homem comum detalhes desse mundo desconhecido das letras, imagens e quetais.
É lucro. E é de ficar pasmo, por exemplo, diante da informação de que havia mais cadeiras de cinema no Brasil da década de 70 do que no dos anos 2000. E que as grandes editoras nacionais se contentam em vender livros para 17% da população. O que se esconde por trás desses e outros dados é que a cultura, revestida de indústria do entretenimento, se tornou popular no que há de pior e elitista no que há de melhor. Pode ser regra de mercado, mas essa regra é estranha ao imaginário construído em torno da arte ao longo de todo o século 20. Não seria um genocídio?
Em miúdos, o desejo da modernidade – tão bem entendido por intelectuais como o britânico Terry Eagleton, um dos críticos mais ferozes do que está aí – é que o que nos une é a cultura. Shakespeare revela ao gari e ao investidor de Wall Street que ambos têm uma natureza em comum. A industrialização da cultura transformou esse sonho da humanidade numa loja de departamentos, onde a regra é o consumo rápido, um iê-iê-iê dos infernos.
O saldo é que por mais que seja difícil se safar da lógica comercial do entretenimento e do lazer – e da nova ideologia de valores que esse mundo traz – o fantasma da cultura soberana e sagrada permanece assombrando nalgum canto da casa. É uma demanda de séculos. Vira e mexe, a indignação diante das novas regras da cultura chateia, embrutece e revolta. A arte, como o ar, tem de ser para todos. Quanto isso não acontece, tem batuque na cozinha.
Para bons entendedores, o que se tem a dizer é que essa equação é digna da Nasa. Os pragmáticos dirão que a vitória será dos mais fortes. Os idealistas, por sua vez, lembrarão que é mais fácil mover montanhas do que mudar uma cultura. Os realistas pedirão passagem para esse debate: é o telectch dos deuses. Vai ajudar a responder quanto vale o show e certamente recolocar a arte na ordem do dia.
Como dizia o escritor americano John Updike, numa das tiradas mais simples e sábias de que se tem notícia, “tudo tende a dar certo.” Graças à indústria, hoje se pode mensurar tanto a inanição cultural quanto o poder de fogo da leitura, do cinema e do teatro. Sabe-se quase tanto sobre isso quanto sobre carros. E graças à ideologia da cultura como bem comum, a indústria há de entender que não se pode subestimar o som e a fúria de quem experimentou, com se dizia em tempos muito idos, o belo e o bom. Melhor não desdenhar.

RECADO DAS TORRES
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
6/9/2009

A melhor notícia da Semana da Pátria foi a inauguração de uma biblioteca formada por 2 mil livros recolhidos do lixo por carrinheiros da Vila das Torres, em Curitiba. A revelação de que os catadores encontram obras de literatura e de direito, entre outras, nos mesmos latões que comportam coadores de café, fraldas descartáveis e embalagens de maionese, deixou muitos boquiabertos. Com razão.
O livro não é visto como objeto de escambo. Recomenda-se que seja doado e tratado com aquele respeito que os antigos dedicavam ao pão velho – beijado e transformado em bolinho ou pudim. Ao que parece, era o tempo da delicadeza, para o pão e para o livro, diga-se.
Mas chega de saudade. A biblioteca da Vila das Torres, embora modesta e acanhada, guarda tantos significados que será praticamente impossível esquecê-la tão cedo. O que é uma boa notícia.
Os catadores de papel respondem por mais de 90% do lixo reciclado da cidade. E pelo menos 30% dos moradores da vila vivem dessa atividade, fazendo do local uma espécie de “centro nervoso da reciclagem”. Ao separarem o livro do joio, puseram à mostra não só sua vontade de criar um espaço para a leitura como fizeram soar o alerta.
Se os livros foram parar no lixo é por que alguma coisa está fora de ordem entre os mais letrados. E se outro alguém – menos instruído se compadece e o recolhe – é porque o tal do mundo bom bate à nossa porta.
A propósito, não é de hoje que a Vila das Torres dá um olé na lógica das aparências. Tem Clube de Mães, restaurante popular, agenda 21 e até sessão de cinema para os pequenos. Agora monta uma biblioteca. Esse papel não é para pesar e vender. É para ler. E quem lê, tem o que dizer. É o que o pessoal das Torres manda avisar.

O BRASIL DO PRÉ-SAL
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
6/9/2009

O debate em torno da exploração do petróleo do pré-sal tem muitos pontos sob controvérsias e pelo menos uma questão de consenso. A complexidade do tema estimula debates em torno do chamado novo marco regulatório, cujos projetos foram recentemente enviados pelo governo ao Congresso. É saudável que se discuta, por exemplo, se a Petrobras deve mesmo, como defende o Executivo, ser a única operadora do pré-sal e se o modelo de exploração deve seguir o novo sistema de partilha ou as normas já vigentes, de concessão a grupos privados. Esses são alguns dos focos de divergência, que estimulam a troca de pontos de vista e já municiam o Congresso, que tem a tarefa de aprovar, com eventuais alterações, as regras propostas pelo governo.

O consenso, no debate de natureza estritamente técnica e mesmo na discussão política que se dá na Câmara e no Senado, é a proposta de criação de um fundo social para absorver parte dos ganhos com a exploração da riqueza. Não há quem conteste a ideia de que os recursos devem ser destinados a educação, ciência, tecnologia e cultura, como investimento concreto no futuro. O fundo social, previsto no marco regulatório, oferece ao país uma chance que não pode ser desperdiçada. Recursos com cifras grandiosas estarão à disposição especialmente das políticas de melhoria da qualidade do ensino.

O fundo permitirá a partilha igualitária dessas cifras e fará com que todos os Estados sejam beneficiados, e não só os que receberão royalties diretos pelo fato de as jazidas estarem localizadas em alto-mar à margem de seus territórios. Esforços pela educação – que englobam não só o ensino formal, mas também os investimentos em todas as áreas da pesquisa e da inovação – transformaram regiões com escassos recursos naturais em nações prósperas, como ocorreu nas últimas décadas com algumas países asiáticos. O Brasil desperdiçou, em momentos de crescimento da economia, chances valiosas de transformar melhoria de produção, emprego e renda em saltos qualitativos alavancados na educação.

As circunstâncias criadas pelo pré-sal oferecem agora uma oportunidade inédita ao país. Ao dispor de recursos financeiros em abundância, como se prevê, o fundo social terá o desafio de transformar tanto dinheiro em iniciativas concretas que criem novas perspectivas de futuro. Tal desafio requer também capacidade de gestão e uma fiscalização rigorosa da aplicação de tais verbas, para que se evitem distorções e o sempre presente risco de corrupção.

Os resultados dessas ações terão reflexos profundos na melhor formação de muitas gerações, se o governo não repetir erros do passado, quando programas semelhantes – de destinação de recursos públicos para custear projetos na área social – foram desvirtuadas pelo próprio Executivo. Como questão de fundo, que se sobrepõe a toda a discussão do pré-sal, apresenta-se a convicção de que a riqueza a ser explorada está, por determinação constitucional, sob controle do Estado, mas é um patrimônio de todo o país.

MOEDA DE BARGANHA
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
6/9/2009

Preocupado em desfazer uma ameaça de boicote na Câmara à votação de matérias de seu interesse imediato, o Planalto promete liberar nesta semana o equivalente a R$ 1 bilhão em emendas parlamentares. Ainda que esse seja um instrumento legítimo, por meio do qual os deputados alegam contemplar interesses específicos das comunidades nas quais são eleitos, é sempre preocupante o fato de se prestar como moeda de barganha. Esse é o tipo de problema que só ocorre porque falta à democracia brasileira uma base de partidos mais sólidos em que os políticos possam embasar suas decisões em programas claramente definidos.

Além de comprometer a boa política e até mesmo arranhar a ética, a volta do toma lá dá cá no Congresso tem um custo financeiro particularmente elevado para os contribuintes. Uma das questões sobre as quais o Congresso precisará se definir é a volta do imposto sobre o cheque, agora com alíquota menor do que a da CPMF e sob o nome de Contribuição Social para a Saúde (CSS). E é difícil aceitar que, mesmo diante de um orçamento para o próximo ano que não prevê sequer o reajuste dos aposentados, os parlamentares resistam em abrir mão das verbas das emendas. Para complicar, a cada ano, o volume a que têm direito se mostra maior, ao mesmo tempo que se ampliam as carências para outras áreas.

Ainda em 2003, cada parlamentar tinha direito a R$ 2 milhões por ano em emendas individuais. No ano passado, o valor já havia saltado para R$ 10 milhões e há quem defenda hoje algo próximo de R$ 15 milhões. Nesse ritmo, a tendência é de que as carências orçamentárias se ampliem cada vez mais.

Num cenário político como o brasileiro, dificilmente os parlamentares admitiriam abrir mão desse mecanismo. É importante, por isso, que prevaleça o bom senso, com uma definição clara e objetiva sobre as prioridades dos investimentos públicos.

ACORDOS NEVOADOS
EDITORIAL
GAZETA DE ALAGOAS
6/9/2009

Não é questão secundária a polêmica sobre o anunciado “fim da greve” do Detran. Algo mais que a autoridade da direção do órgão está em jogo, ameaçando, novamente, a população com a perspectiva de intensificação da impunidade.
Indiscutível é o direito de greve, mas a ele correspondem, em igual medida, deveres e responsabilidades. A sustentabilidade do Estado de Direito é garantida pela repartição das atribuições, pelo respeito às decisões judiciais e aos ritos do processo legal.
Acordos entre as partes são sempre bem-vindos no sentido de eliminação de impasses, mas é essencial que tais acordos não tenham o poder de desmoralizar as decisões judiciais e a autoridade constituída, pois nessa hipótese, toda a sociedade é desmoralizada e o Estado de Direito passa a se amoldar às conveniências de momentos e de grupos de pressão, o que corresponde a um esgarçamento perigoso do tecido democrático constitucional.
Afinal, o que mesmo foi definido como arcordo entre as partes para o término da greve ilegal levada adiante por parte dos servidores do Detran/AL? Perigosamente, os termos desse compromisso apresentam-se sob penumbra, nebuloso em seus detalhes mais importantes. Pelo anunciado pelas lideranças grevistas, o acordado nos bastidores coloca em sono eterno decisões judiciais expressas e legítimas, transformando-as em letra morta e sepultada.
Em assim sendo, melhor a Justiça afastar-se das querelas entre sindicatos e governo, afinal, nos capítulos finais, fica o dito pelo não dito, cai dinheiro do céu. E, entre beijos e abraços dos contedores de ontem, amanhã a conta da novela será paga, inapelavelmente, pela população – sempre chamada a desempenhar o papel de vítima a quem o tempo perdido, o futuro espoliado, as oportunidades roubadas jamais lhes serão devolvidas, sejam quais forem os enevoados acordos de bastidores.

A GUERRA DA RECEITA
EDITORIAL
JORNAL DO COMMERCIO (PE)
6/9/2009

Poucas vezes um termo tão simples – agilizar – gerou tanto conflito como vem acontecendo na política brasileira desde quando a ex-secretária da Receita Federal, Lina Maria Vieira, declarou tê-lo ouvido da ministra Dilma Rousseff. Esse é um capítulo da vida pública que antecipa a eleição de 2010 e só chegou à dimensão que tem exatamente por estar misturado com o processo eleitoral. Não fosse isso, seria impensável que a simples expressão “agilizar” ocupasse tanto tempo de debate no Congresso quanto espaço nos meios de comunicação. E por isso mesmo merece maior atenção, porque significa bem mais que a definição da Academia Brasileira de Letras: tornar mais ágil, ativo ou diligente. Pelo critério político, seria um meio de engavetar as investigações em torno do filho do presidente do Senado. Uma definição política, bem mais complicada, pois.
O fato é que, além das versões aí postas e que tomam tanto tempo da vida nacional, mais que lançar suspeição sobre uma ministra, com a enorme confusão gerada por um suposto encontro de natureza administrativa, as declarações da ex-secretária Lina Vieira atingiram a Receita Federal, e isso é muito ruim para o País. Sempre que uma instituição nacional é atingida, seus estilhaços caem sobre todas as demais instituições. Por isso é pertinente ir buscar em outros personagens, que não os diretamente envolvidos, alguma luz para se ter uma ideia mais precisa do que aconteceu com a Receita e de que forma isso pode prejudicar um instrumento fundamental para o funcionamento da República.
Poucos brasileiros estão mais bem aparelhados para falar da Receita Federal que o pernambucano Everardo Maciel. Trata-se de um profissional sobre o qual nunca pesou qualquer dúvida quanto à capacidade técnica ou a postura de servidor público. Rigoroso em suas avaliações – até porque, ao que se sabe, nunca padeceu do mal dos que têm “culpa em cartório” – o ex-secretário da Fazenda de Pernambuco e ex-secretário da Receita Federal foi procurado para opinar sobre o que estava acontecendo na instituição que tão bem conhece e o que ele disse alterou substancialmente o que estava sendo mostrado como a expressão da verdade, as declarações da ex-secretária Lina Vieira.
Everardo Maciel desmontou alguns monumentos que tentaram construir em torno da ex-secretária, como a mudança no estilo de fiscalização com foco nas grandes empresas. Com a objetividade acadêmica que tanto incomoda a linguagem política, o pernambucano de Pesqueira mostrou como não eram verdades algumas declarações de Lina Vieira, a quem atribuiu a desarticulação da fiscalização. E tudo mais que cercou esse episódio rumoroso, como a saída de servidores em cargos de confiança, recebeu do ex-secretário um corte cirúrgico que certamente não deve ter animado os que gostariam de fazer da ex-secretária uma figura de palanque para o ano eleitoral que está se aproximando. E isso, curiosamente, quando Everardo Maciel é visto como uma figura ligada à oposição, por ter dirigido a Receita no governo de Fernando Henrique Cardoso.
Pelo contraditório, o episódio pode servir como depurador e como advertência para o risco de se transformar instituições públicas em palanques eleitorais. Caberia, no caso, mais cautela dos nossos políticos, cada vez mais fascinados com as imagens geradas pelos sistemas de TV da Câmara e do Senado, com frequência flagrados em encenações que seriam pouco comuns, ou inexistentes, não fosse a tribuna uma espécie de espaço de propaganda eleitoral gratuita. Neste caso, em especial, ficaram bem marcados os espaços reservados aos que são do governo e os que são contra ele, tendo como tema central a discussão em torno da expressão “agilizar”, de um encontro que para uns é indiscutível e para outros não existiu, lançando mais dúvidas ainda sobre a qualidade da classe política que temos.

MUDANÇA POLÊMICA
EDITORIAL
DIÁRIO DO NORDESTE (CE)
6/9/2009

Na trilha dos atentados contra a dignidade urbana de Fortaleza e de sua integridade como metrópole, repercute, no momento, a anunciada transferência dos artesãos da feirinha da Avenida Beira-Mar para a Praça Cristo Redentor, no Centro da cidade. Referido logradouro público localiza-se em frente ao Centro Dragão do Mar, um dos mais visitados pontos turísticos e artístico-culturais da Capital cearense.

Sua importância estratégica, dentro do contexto citadino, serve de principal argumento aos defensores da tese de que a ocupação da praça resultará na criação de um novo e incontrolável "camelódromo".

Acredita-se que a medida pode abrir outro ameaçador precedente para a invasão de espaços destinados à circulação de pedestres, já tão carentes de áreas livres para se locomoverem no perímetro central.

Embora autoridades municipais assegurem não pretender permitir a presença, no local, de camelôs, vendedores ambulantes e comerciantes de artigos piratas, mas apenas a dos artesãos cadastrados semana passada pela Secretaria Executiva Regional (SER) II, nada consegue convencer aos críticos do plano que o acesso de intrusos será evitado nos meses seguintes, haja vista o que tem ocorrido em outros logradouros destinados a esse tipo de comércio.

Calcula-se que existam atualmente cerca de 7,5 mil ambulantes ilegais ocupando as principais ruas e avenidas de Fortaleza.

Entre as razões citadas pelos opositores da mudança, estão flagrantes irregularidades a ferir, acintosamente, a Lei Orgânica do Município, tais como a desrespeitosa invasão das ruas vizinhas à Catedral Metropolitana, exatamente por parte dos ambulantes que anteriormente estavam proibidos de se localizarem na Praça da Sé.

Já se tornou comum, entre as ocupações indevidas de locais públicos, tornadas comuns na paisagem urbana, a falta de observância, na prática, de um mínimo das exigências e normas prescritas pelas leis do município, no sentido de ordenar o comércio de rua, visando, de um lado, atender as necessidades do mercado informal de trabalho, e, de outro, respeitar os cidadãos comuns no seu direito de livre trânsito por aquela área central.

Embora com sua execução aparentemente projetada a partir de pressupostos de organização e controle, a mudança da feirinha da orla marítima para a Praça do Cristo Redentor configura-se como algo inaceitável no conceito dos preservadores das tradições da urbe.

Mesmo com as características enunciadas para o projeto pelos administradores municipais, que afirmam ser a localização sugerida para a feira uma forma de qualificar o logradouro vizinho ao Centro Dragão do Mar, os fortalezenses levam em conta não existirem registros recentes de que as normas congêneres de controle tenham conseguido impedir a deturpação de propósitos iniciais alardeados para esse tipo de ocupação.

Se até hoje o poder municipal não conseguiu sequer retirar do local em questão, a despeito das constantes denúncias da mídia, a inusitada favela de papelão existente ao pé do monumento erigido em homenagem ao Cristo Redentor, a população há de ter justificáveis motivos de se preocupar seriamente com a polêmica mudança ora sugerida, que pode culminar em novos desregramentos, em prejuízo de todos.

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