Saturday, June 06, 2009

Muy amigos - Merval Pereira

O Globo - 05/06/2009

Embora interesse ao governo adiar a instalação da CPI da Petrobras o mais possível, o que está acontecendo é um reflexo da disputa, muito séria e mais ampla, entre PMDB e PT, que vai definir os palanques regionais para a eleição de 2010. O PMDB, além de querer sempre mais poder, mais cargos, maior participação no governo, teme muito o apetite do PT e sabe que, se não fosse Lula garantindo a intermediação dessa disputa, o PT já o teria engolido há muito tempo.

Imagine então o que os demais partidos aliados, mais fracos politicamente, não temem. O temor generalizado é de que a ministra Dilma Rousseff não tenha força para controlar o PT se eventualmente chegar à Presidência.

E tudo indica que não terá: apesar da fama de enérgica, ela não é uma candidata nascida dentro do PT, mas sim imposta pelo presidente Lula ao establishment do partido - aliás muito bem imposta, uma boa sacada política de Lula, que está dando certo, como mostram as últimas pesquisas - nem tem história no partido.

O PT não tem nada a ver com essa subida de Dilma nas pesquisas. A única coisa que fez, inteligentemente, foi desistir de resistir à escolha de Lula e entender que era melhor acompanhar a sua aposta do que ficar brigando internamente.

Desse ponto de vista, o PT teve mais inteligência emocional que o PSDB, que mais uma vez tem uma disputa interna para a escolha de seu candidato.

O PT engoliu em seco a candidatura da Dilma e hoje já a tem como sua candidata, com uma boa perspectiva de poder.

Só que Dilma, se superar a questão da saúde e vencer as eleições presidenciais, corre o risco de vir a ser uma presidente manipulada pela cúpula petista, pois não tem força política dentro do partido nem esquema de suporte fora dele para resistir às pressões dos diversos grupos políticos que atuam dentro do PT e dos movimentos sociais que gravitam em torno dele.

Assim como o senador José Sarney teve um governo completamente tumultuado pela ação do PMDB, partido ao qual teve que se filiar por circunstâncias da legislação eleitoral.

Vindo do PDS, formou com dissidentes de seu partido a Frente Liberal, que foi fundamental para a vitória de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral.

Mas, pela legislação, o vice teria que ser do mesmo partido que o candidato a presidente, e Sarney transferiu-se para o PMDB, sem história prévia que pudesse respaldá-lo no partido.

Quem comandava o PMDB era Ulysses Guimarães, depois presidente da Constituinte, que não deu trégua ao presidente acidental, talvez arrependido de ter aberto mão do cargo.

Quando Tancredo Neves não pôde ser empossado por problemas de saúde, muita gente achou que Ulysses, como presidente da Câmara, deveria assumir a Presidência interinamente.

O próprio Sarney abriu mão para Ulysses, mas quem decidiu mesmo, a favor de Sarney, que era seu amigo, foi o então ministro do Exército Leônidas Pires Gonçalves.

Perguntado por que havia aceitado tão rapidamente a decisão, Ulysses explicou na ocasião, segundo o senador Pedro Simon: "Me chega o Sarney com o seu jurista, o ministro do Exército. Se eu não aceitasse, a crise estava armada".

Seja por que motivo fosse, o fato é que, presidente do PMDB e da Constituinte, Ulysses Guimarães foi a grande eminência parda do governo Sarney, tendo chegado a vetar a nomeação do então governador do Ceará, Tasso Jereissatti, como ministro da Fazenda, já escolhido por Sarney.

Para não ter seu mandato cortado em dois anos, Sarney teve que usar toda a sua experiência política e conhecimento das negociações no Congresso. Acabou ficando com um mandato de 5 anos.

O mesmo risco correrá a ministra Dilma Rousseff caso venha a ser eleita presidente da República, agravado pelo fato de que ela não tem a experiência política que o senador José Sarney já tinha na ocasião.

Além de convencer os eleitores de que sua candidatura representa a continuidade do governo Lula, Dilma terá que convencer os partidos da base aliada de que eles terão lugar no seu governo.

Por isso, todos esses pequenos partidos que giram na órbita do governo - PP, PR, PDT, PSB - e até mesmo o PMDB procuram o governador de Minas, Aécio Neves, para deixar uma porta aberta caso ele seja escolhido o candidato do PSDB à Presidência da República.

Eles vêem em Aécio o tipo de político que é capaz de fazer esses acordos que o presidente Lula vem costurando. O governador de São Paulo, José Serra, embora tenha fama de ser menos flexível que Aécio, também já demonstrou ser capaz de fechar acordos importantes, como o com o PMDB paulista.

Um político experimentado como Orestes Quércia não abriria mão de uma aliança potencialmente vencedora com o PT nacional, com o presidente Lula no auge da popularidade, se não cheirasse no ar dificuldades em relação aos compromissos políticos que o PT teria que cumprir, como apoiá-lo na campanha para o Senado em 2010.

Assim como a aliança do PT em Minas com o PSDB de Aécio foi bombardeada pela direção nacional do PT, e poderia levar a uma grande aliança em 2010, juntando ainda o PSB de Ciro Gomes.

O que facilita as negociações do PSDB é que ele é um partido de líderes, mas não é nacionalmente bem estruturado, não tem deputados federais em diversos estados, e por isso está mais aberto aos acordos regionais.

Assim como a denúncia do mensalão nasceu de uma disputa dentro dos Correios entre o PT e o PTB, também na Petrobras há essa disputa, e essa é uma das grandes preocupações de ambos os lados. O PMDB tem receio de ser alvo de "fogo amigo" petista. E a recíproca é verdadeira.

A insensatez - Mírian Leitão

O Globo - 05/06/2009

O confronto entre ruralistas e ambientalistas é completamente insensato. Mesmo se a questão for analisada apenas do ponto de vista da economia, são os ambientalistas quem têm razão. Os ruralistas comemoram vitórias que se voltarão contra eles no futuro. Os frigoríficos terão que provar aos supermercados do Brasil que não compram gado de áreas de desmatamento.

O mundo está caminhando num sentido, e o Brasil vai em direção oposta. Em acelerada marcha para o passado.

O debate, as propostas no Congresso, a aprovação da MP 458, os erros do governo, a cumplicidade da oposição, tudo isso mostra que a falta de compreensão é generalizada no país.

A fritura pública do ministro Carlos Minc, da qual participou com gosto até o senador oposicionista Tasso Jereissati (PSDB-CE), é um detalhe. O trágico é a ação pluripartidária para queimar a Amazônia.

Até a China começa a mudar. Nos Estados Unidos, o governo George Bush foi para o lixo da história. O presidente Barack Obama começa a dirigir o país em outro rumo. Está tramitando no Congresso americano um conjunto de parâmetros federais para a redução das emissões de gases de efeito estufa. O que antes era apenas um sonho da Califórnia, agora será de todo o país.

Neste momento em que a ficha começa a cair no mundo, no Brasil ainda se pensa que é possível pôr abaixo a maior floresta tropical do planeta, como se ela fosse um estorvo.

A MP 458, agora dependendo apenas de sanção presidencial, é pior do que parece. É péssima. Ela legaliza, sim, quem grilou e dá até prazo. Quem ocupou 1.500 hectares antes de primeiro de dezembro de 2004 poderá comprá-la sem licitação e sem vistoria. Tem preferência sobre a terra e poderá pagar da forma mais camarada possível: em 30 anos e com três de carência. E, se ao final da carência quiser vender a terra, a MP permite. Em três anos, o imóvel pode ser passado adiante. Para os pequenos, de até quatrocentos hectares, o prazo é maior: de dez anos. E se o grileiro tomou a terra e deixou lá trabalhadores porque vive em outro lugar? Também tem direito a ficar com ela, porque mesmo que a terra esteja ocupada por "preposto" ela pode ser adquirida. E se for empresa? Também tem direito.

Os defensores da MP na Câmara e no Senado dizem que era para regularizar a situação de quem foi levado para lá pelo governo militar e, depois, abandonado.

Conversa fiada. Se fosse, o prazo não seria primeiro de dezembro de 2004.

Disseram que era para beneficiar os pequenos posseiros. Conversa fiada. Se fosse, não se permitiria a venda ocupada por um preposto, nem a venda para pessoa jurídica.

A lei abre brechas indecorosas para que o patrimônio de todos os brasileiros seja privatizado da pior forma. E a coalizão que se formou a favor dos grileiros é ampla. Inclui o PSDB. O DEM nem se fala porque comandou a votação no Senado, através da relatoria da líder dos ruralistas, Kátia Abreu.

Mais uma vez, Pedro Simon (PMDB-RS), quase solitário, estava na direção certa.

A ex-ministra Marina Silva diz que o dia da aprovação da MP 458 foi o terceiro pior dia da vida dela.

- O primeiro foi quando perdi meu pai, o segundo, quando Chico Mendes morreu - desabafou.

Ela sente como se tivesse perdido todos os avanços dos últimos anos.

Minha discordância com a senadora é que eu não acredito nos avanços. Acho que o governo Lula sempre foi ambíguo em relação ao meio ambiente, e o governo Fernando Henrique foi omisso. Se tivessem tido postura, o Brasil não teria perdido o que perdeu.

Só nos dois primeiros anos do governo Lula, 2003 e 2004, o desmatamento alcançou 51 mil Km. Muitos que estavam nesse ataque recente à Floresta serão agora "regularizados".

O Greenpeace divulgou esta semana um relatório devastador. Mostrando que 80% do desmatamento da Amazônia se deve à pecuária. A ONG deu nome aos bois: Bertin, Marfrig, JBS Friboi são os maiores. O BNDES é sócio deles e os financia. Eles fornecem carne para inúmeras empresas, entre elas, as grandes redes de supermercados: Carrefour, Wal-Mart e Pão de Açúcar.

Reuni ontem no programa Espaço Aberto, da Globonews, o coordenador do estudo, André Muggiatti e o presidente da Abras (Associação Brasileira de Supermercados), Sussumu Honda. O BNDES não quis ir.

A boa notícia foi a atitude dos supermercados. Segundo Sussumu Honda, eles estão preocupados e vão usar seu poder de pressão contra os frigoríficos, para que eles mostrem, através de rastreamento, a origem do gado cuja carne é posta em suas prateleiras.

Os exportadores de carne ameaçam processar o Greenpeace. Deveriam fazer o oposto e recusar todo o fornecedor ligado ao desmatamento. O mundo não comprará a carne brasileira a esse preço. Os exportadores enfrentarão barreiras. Isso é certo.

O Brasil é tão insensato que até da anêmica Mata Atlântica tirou 100 mil hectares em três anos.

Nossa marcha rumo ao passado nos tirará mercado externo. Mas isso é o de menos. O trágico é perdermos o futuro. Símbolo irônico das nossas escolhas é aprovar a MP 458 na semana do Meio Ambiente.

Olha o novo socialismo aí Nelson Motta


O Globo - 05/06/2009

Pena que os velhos anarquistas mais libertários não viveram para ver um instrumento tão livre, poderoso e igualitário como a internet, que justamente por isso é tão temida pelas tiranias de esquerda ou de direita. Cada vez mais acessível a mais gente, ela nivela e aproxima, dá voz e imagem a todos e a qualquer um, é um espaço de liberdade e independência que cresce em proporção aos avanços tecnológicos que tornam as máquinas mais rápidas e potentes, mais leves e baratas.

É nesse território livre que surgem as primeiras evidências do que Chris Anderson chama de - whaall! - "Novo Socialismo" em texto-bomba na revista "Wired". A Wikipedia é um exemplo da socialização da informação, gratuita e mantida por contribuições voluntárias. Sem nenhuma interferência do Estado. Assim como as novas formas de compartilhamento, de troca de arquivos, os sites de buscas, o You Tube, significam uma inédita socialização da informação, do lazer, da arte e da opinião.

A diferença é que não são conquistas feitas pelos métodos totalitários e repressivos de Estados fortes, mas pela liberdade e o empreendedorismo só possíveis em sociedades abertas. Nenhum Estado comunista investiria nessas tecnologias de informação e comunicação, só para fins militares ou de propaganda. Se alguém ler para Hugo Chávez o texto da "Wired", o Beiçola vai levar um susto ao descobrir que o que ele chama de socialismo do século XXI é do XIX: o do terceiro milênio está na internet. Bytes o muerte, compañero!

Enquanto isso, em Brasília, anuncia-se mais um "fórum" para tentar encontrar instrumentos da democracia para instituir controles e limitações à imprensa, com o objetivo de "democratizar a informação", como se nossos jornais, rádios e televisões já não disputassem ferozmente a preferência do público e dos anunciantes, todos competindo pelas melhores produções, para todos os gostos.

Mas, com as lan houses se espalhando pelas cidades, computadores cada vez mais baratos e redes sem fio por toda parte, como é que eles vão fazer o "controle social" de 65 milhões de brasileiros on-line? Estão atrasados, mais uma vez.

Puro sangue Dora Kramer

O Estado de S. Paulo - 05/06/2009
Não houve acaso nem coincidências. Foi tudo bem pesado e medido: a ocasião, o recado, o mensageiro e até a ausência de Fernando Henrique Cardoso e José Serra no encontro nacional de mulheres do PSDB, quarta-feira em Brasília, tiveram um significado específico.

A ideia era deixar o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, comandar o espetáculo exibido no primeiro palco disponível depois da divulgação de duas pesquisas de opinião confirmando o crescimento dos índices da ministra Dilma Rousseff na simulação de intenções de voto para presidente da República em 2010.

Aécio foi porta-voz de duas mensagens. Na explícita, atacou duramente o governo federal, defendeu a gestão do ex-presidente Fernando Henrique (coisa rara no PSDB), pregou a necessidade de ampliação do quadro de alianças partidárias e anunciou que o tucanato começará a "tratar da campanha" ainda em 2009, a partir do segundo semestre.

Na implícita, avisou aos navegantes que acabou a hora do recreio. Esgota-se o tempo regulamentar do jogo da divisão interna e, portanto, é chegado o momento de começar a falar sério, pois a espinhosa empreitada não deixará vivos os amadores.

E por que Aécio no papel de mestre da cerimônia se as pesquisas mostram Serra na dianteira?

Naquele dia, o governador mineiro deu parte da resposta por duas vezes. Primeiro, no próprio encontro, quando informou que o colega paulista pedira que fizesse dele suas palavras. Como adversário na disputa interna pela candidatura a presidente, ninguém melhor que Aécio para falar em nome de Serra, a fim de construir a imagem da unidade.

Logo depois, em entrevista à TV Brasil, Aécio discorreu sobre a escolha da candidatura tucana, ressaltando que hoje as chances de Serra são muito maiores. Não capitulou, mas também não falou como oponente em campanha, cujo discurso natural seria o de salientar a possibilidade de virar o jogo nas prévias.

Além disso, a presença de Aécio à frente de um ato de cunho francamente eleitoral, valoriza o capital dele, ajuda o entendimento com os partidários do mineiro e permite ao partido dar os primeiros sinais de vida sem que José Serra altere seus planos de só entrar na campanha em 2010.

O governador de São Paulo teme uma reação negativa do eleitorado paulista, que já o viu quebrar a promessa de ficar na prefeitura da capital até o fim o mandato. Na avaliação dele - certamente baseada em pesquisas - a população não gostaria de vê-lo abandonar a administração do Estado para se dedicar à candidatura presidencial menos de três anos depois de eleito.

O gesto de comprometimento do governador de Minas também serve para enfraquecer especulações sobre a hipótese de Aécio sair candidato por outro partido.

Na segunda-feira mesmo, o ministro do Trabalho e presidente licenciado do PDT, Carlos Lupi, aventou a possibilidade de apoiar o mineiro. Obviamente, excluído o PSDB.

Esse tipo de investida é resquício da esperança dos governistas de que Aécio disputasse a eleição contra Serra e sinal do receio de uma possível chapa unindo os governadores de São Paulo e Minas Gerais.

Nova edição

O ex-deputado Luiz Eduardo Greenhalgh negou a existência do mensalão em seu depoimento como testemunha de defesa dos acusados, com uma nova versão da história.

Segundo ele, a prova seria sua derrota na disputa pela presidência da Câmara, pois, se houvesse a aludida mesada aos deputados da base aliada, "o resultado talvez fosse outro".

Nem Greenhalgh perdeu por falta de pagamento nem a acusação é esta. A denúncia é que o PT financiou campanhas eleitorais de partidos amigos com repasses ilegais de verbas. Em parte públicas, em parte obtidas mediante empréstimos bancários fraudulentos.

Em fevereiro de 2005, Luiz Eduardo perdeu a eleição porque a direção do PT impôs sua candidatura para agradar a ala esquerda do partido e uma ala da bancada reagiu lançando a candidatura de Virgílio Guimarães. Dividido e referido em suas questões internas, o PT abriu espaço para a eleição de Severino Cavalcanti.

Do avesso

"Uma coisa é certa: perco o pescoço, mas não perco o juízo", avisou a então ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, um ano e meio antes de se demitir do cargo por se recusar a adaptar a gestão da política ambiental ao ritmo exigido pelo calendário das obras em que Lula gostaria de deixar sua assinatura.

Já o sucessor, Carlos Minc, recebe críticas da oposição e da situação, é ironizado publicamente pelo presidente Lula por fazer "algazarra" na ausência dele e, ainda assim, anuncia que fica "até o fim do governo".

Ficando ou não, uma coisa é certa: entre o pescoço e o juízo, o ministro preserva o que lhe resta.

De volta à realidade Celso Ming

O Estado de S. Paulo - 05/06/2009
Quarta-feira foi Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), que entendeu ser necessário pregar mais cautela para o resto do mundo. Advertiu que a crise não acabou, que o desemprego pode aumentar, que há muita indigestão financeira a enfrentar.

Ontem foi a vez de Jean-Claude Trichet, presidente do Banco Central Europeu (BCE) de admitir que a situação da área do euro está bem pior do que a que predomina no epicentro da crise, os Estados Unidos, uma vez que o tombo do PIB do bloco não será de apenas 2,7%, como antes se previa, mas de 4,6%, com ameaça de aumento do desemprego.

Há algumas semanas havia uma espécie de euforia no ar. As apostas em que a economia mundial estivesse em franca recuperação se multiplicavam em todo o planeta. A velocidade com que os capitais abandonaram os refúgios de segurança em busca do risco mostrou isso. Agora, os presidentes dos dois maiores bancos centrais do mundo se viram na obrigação de trazer os agentes econômicos de volta à realidade.

A euforia anterior foi uma reação ao restabelecimento do princípio de que nenhuma instituição capaz de provocar risco sistêmico pode quebrar. Em setembro do ano passado, esse pacto informal entre os dirigentes dos países avançados foi rompido quando o então secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Henry Paulson, deixou que o banco de investimentos Lehman Brothers fosse à falência.

Os resultados foram catastróficos. De lá para cá, não quebram mais nem grandes bancos de depósitos (caso do Citigroup), nem sociedades de crédito imobiliário (caso do Northern Rocks), nem seguradoras de porte (AIG), e nem mesmo grandes empresas (GM e Chrysler). Enfim, a sensação de que não há mais grandes riscos a temer trouxe alívio e, além disso, a percepção de que aventuras financeiras voltaram a ser autorizadas.

A intervenção do Estado está custando caro. Só o Fed enfiou US$ 2 trilhões no mercado financeiro americano. O Tesouro dos Estados Unidos está rodando um déficit público que, neste ano, deverá ultrapassar o US$ 1,8 trilhão. O alto custo pode não ser o maior problema. Há coisas mais graves a temer. Existe o risco de que novas bolhas estejam sendo assopradas e, mais do que isso, há a possibilidade de que um turbilhão inflacionário possa estar em formação.

Agora, quem está chamando o resto do mundo de volta às leis da vida é Bernanke, o presidente do Fed. E isso não deixa de ser contraditório, na medida em que Bernanke foi até agora quem mais inundou os mercados com alta liquidez, quem mais usou o arsenal do seu banco central para financiamentos então condenáveis numa autoridade monetária e foi quem mais veio apregoando o princípio de que grandes instituições não podem quebrar.

Por aí se vê que o momento não é mais de enaltecer a pronta, agressiva e eficiente intervenção do Estado no combate ao incêndio. A ocasião é de procurar o limite para isso e a maneira de restabelecer o princípio, hoje suspenso, de que as escolhas têm de garantir retribuição. Se forem acertadas, terão o prêmio merecido. Se forem equivocadas, terão o castigo, também merecido.

Confira

Cara e focinho -
O gráfico mostra como a curva de valorização do real coincide com a dos preços da soja. Assim, o câmbio parece mais relacionado com os preços das commodities do que com a evolução dos juros.

E tudo se dissipou no ar

E tudo se dissipou no ar

O voo 447 era para ser uma celebração da vida. 
Mas, por um breve espaço de tempo, foi melhor 
sonhar a vida do que vivê-la


Ronaldo Soares e Camila Pereira

Fotos Arquivo Pessoal e Ag. O Globo
JUNTOS ATÉ O FIM 
De cima para baixo, o cirurgião plástico gaúcho Roberto Chem, sua mulher, Vera, e a filha mais nova do casal,Letícia: os três viajavam para passar quinze dias na Grécia. O empresário Paulo Vale e a psicóloga Luciana Seba, ambos de Niterói, que voavam com os pais dele: ela queria visitar em Paris os locais onde o avô fora homenageado por criar uma vacina. A médica Bianca Machado Cotta e o procurador Carlos Eduardo Lopes de Mello, de Niterói: casamento no sábado antes do voo, com festa para 500 convidados


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As notícias sobre o voo 447

Por quatro minutos, por 240 segundos, foi melhor sonhar a vida do que vivê-la. E quantos sonhos, e quantas vidas, e quantas vidas de sonho, e quantos sonhos de vida! O sonho do maestro carioca Silvio Barbato, de 50 anos, regente titular da orquestra sinfônica do Teatro Nacional de Brasília, era ampliar o acesso à música erudita no Brasil. Fez espetáculos juntando orquestras sinfônicas a bandas de música pop ou a grupos de meninos pobres que tocavam com instrumentos de lata. Apresentou-se ao lado tanto de grandes nomes do canto lírico, como Plácido Domingo e Montserrat Caballé, quanto de músicos populares, como Martinho da Vila. O casal de advogados Marcelo Parente, de 38 anos, e Marcelle Fonseca Lima, de 33, planejava um filho para o ano que vem. Marcelle vinha fazendo um tratamento de fertilização para engravidar. Na vida profissional, eles também tinham muitos projetos. Marcelle andava às voltas com a ampliação do escritório de advocacia do casal. Marcelo acabara de assumir a chefia de gabinete da prefeitura do Rio de Janeiro. O administrador de empresas Pedro Luiz Orleans e Bragança, de 26 anos, trineto da princesa Isabel, morava em Luxemburgo. Pretendia viajar muito, ganhar bagagem cultural e experiência no mercado financeiro. Solteiro, estava à procura de uma princesa nas rodas europeias.

O comissário de bordo brasileiro do voo 447, Lucas Domingues, de 24 anos, adorava voar, mas não queria permanecer na profissão pelo resto da vida. Pensava em retomar a faculdade de direito, que abandonara, e se especializar em direito internacional. Domingues tinha um entusiasmo notável por aprender idiomas. Falava com fluência francês, inglês, italiano e espanhol. Recentemente, começou a se aventurar também pelas línguas do Leste Europeu. Aprendeu russo, polonês, eslovaco e estava estudando romeno. O carioca Nelson Marinho, de 40 anos, mecânico especializado em plataformas de petróleo, estava radiante. Candidatara-se a um emprego na italiana Saipem, uma das maiores empresas de engenharia de petróleo do mundo, e conseguira a vaga. Ele e a mulher, Karla dos Santos, queriam comprar uma nova casa e ter um filho.

A MÚSICA SE CALOU 
O maestro carioca Silvio Barbato, 
da orquestra do Teatro Nacional de Brasília: esforço constante para popularizar a música clássica no Brasil. Ele dividiu o palco tanto com estrelas do canto lírico, como a soprano Montserrat Caballé, quanto com ídolos da música popular, como Martinho da Vila e Jamelão

A cantora brasiliense Juliana Ferreira Braga de Aquino, de 29 anos, passou os últimos meses ensaiando para dar o passo mais ambicioso de sua carreira – estrelar a versão alemã do musicalWicked, sucesso da Broadway, em Stuttgart. Ela começou a estudar música aos 4 anos e, ainda menina, aprendeu piano e canto clássico. Aos 15 anos, já cantava em musicais. Em 2003, um produtor europeu esteve no país e convidou-a para uma produção alemã do musical O Rei Leão. O bom desempenho lhe assegurou papéis em outros espetáculos. No ano passado, ela interpretou Maria Madalena em Jesus Cristo Superstar, na Áustria.

O dentista José Ronnel, de 35 anos, paraibano criado em Niterói, morava em Londres desde 2001 e juntava dinheiro para montar no Brasil um consultório com o mesmo padrão daquele em que trabalhava – como empregado – na Inglaterra. Queria se casar com a namorada, uma economista francesa, e comprar uma casa na praia niteroiense de Itacoatiara. Para tanto, segundo seus cálculos, faltavam entre cinco e dez anos de trabalho em Londres. O cirurgião plástico gaúcho Roberto Chem, especialista em transplante de pele, organizava um congresso médico a ser realizado em setembro, em Porto Alegre. Há um mês, ele vinha comemorando a classificação num concurso que lhe garantiu uma vaga de professor titular da Universidade Federal de Ciências da Saúde. Parte da celebração seria uma viagem de quinze dias pela Grécia. O engenheiro Marco Antônio Mendonça, de 44 anos, diretor da Vale, preparava-se para o maior passo de sua carreira. Em Dubai, nos Emirados Árabes, assumiria a presidência do Instituto Internacional do Manganês. Seria o primeiro brasileiro a ocupar esse posto. A funcionária pública Deise Possamai, 34 anos, era persistente em suas tentativas de ascender profissionalmente e, neste mês, começaria a cursar na Itália uma especialização em direito tributário. Achava que, com o curso, além da fluência no idioma italiano, poderia ganhar mais no emprego. O argentino Pablo Dreyfus e a brasileira Ana Carolina Rodrigues, casados há menos de dois anos, decidiram viajar numa segunda lua de mel. Conhecer Paris era um sonho da psicóloga Luciana Seba, de 31 anos, de Niterói. Ela incluiu em seu roteiro duas visitas incomuns em viagens turísticas: a Universidade Sorbonne e o Instituto Pasteur. A explicação para isso é que, na década de 1970, seu avô, Roched Seba, ex-diretor do Instituto Vital Brazil, fora homenageado nesses locais por ter criado a vacina dupla contra meningite. Luciana estudava francês e pretendia fazer doutorado na Europa.

O PALCO FICOU VAZIO
A cantora Juliana Ferreira Braga de Aquino, de Brasília: ensaios nos últimos meses para dar o passo mais ambicioso de sua carreira, estrelar a versão alemã do musical Wicked, sucesso da Broadway. Desde 2003 ela atuou em vários musicais na Europa. Em Jesus Cristo Superstar, fez o papel de Maria Madalena

O potiguar Soluwellington de Sá, de 40 anos, contava os dias para, no fim do ano, mudar de vida e passar mais tempo com a mulher e as duas filhas. Ele conseguiu juntar algum dinheiro como comandante de embarcações que buscam petróleo em águas rasas. Nessa função, viajou pelo mundo, mas se cansou de ficar longe de casa. Tudo o que queria era comprar uma casinha no interior do Rio Grande do Norte. O empresário alemão Mathias Peter, dono de uma loja em Stuttgart, era apaixonado pelo Rio de Janeiro, que elegeu como sua segunda cidade e onde comprou um apartamento. Peter passou a segunda quinzena de maio no Rio e comentou com os amigos que voltaria para as festas de fim de ano.

No sábado passado, Carlos Eduardo Lopes de Mello, procurador federal da Comissão de Valores Mobiliários, e Bianca Machado Cotta, médica, ambos de Niterói, casaram-se e deram uma festa para 500 pessoas. Iriam passar a lua de mel em Roma, com escala em Paris. O oceanógrafo Leonardo Veloso Dardengo, de Vitória, cursava doutorado na França, veio ao Brasil para um congresso e aproveitou a viagem para oficializar seu noivado com a namorada, Mariane Maciel. A carioca Adriana Moreira Henriques estava entusiasmada com sua primeira viagem à Europa. Em Portugal, iria encontrar tios e um primo.

No domingo, todos esses sonhos, de matizes tão diversos, de pessoas tão diferentes, se desmancharam no ar, afundaram no mar, caíram por terra.

 

Fotos Reprodução/Ag. O Dia, Marcos D'Paula/AE, Reprodução e Álbum de família

CEIFADOS NO AUGE
Da esquerda para a direita: Soluwellington de Sá, comandante de barcos; Lucas Domingues, o comissário de bordo brasileiro do voo 447; o cientista político argentinoPablo Dreyfus, casado com a brasileira Ana Carolina Rodrigues; o empresário alemãoMathias Peter, que tinha casa no Rio de Janeiro; a funcionária pública Deise Possamai;o oceanógrafo Leonardo Dardengo; a carioca Adriana Henriques



O PRÍNCIPE E O MECÂNICO
O economista Pedro Luiz Orleans e Bragança (à esq.), trineto da princesa Isabel, morava em Luxemburgo. Pretendia viajar muito pelo mundo e ganhar experiência no mercado financeiro. Também estava à procura de uma princesa nas rodas europeias. Nelson Marinho (à dir.), mecânico especializado em plataformas de petróleo, andava feliz. Ele havia conseguido um cargo numa das maiores empresas de engenharia de petróleo do mundo, sediada na Itália

 


Com reportagem de Alexandre Oltramari, Silvia Rogar, Marcelo Bortoloti e Renata Moraes

A tragédia com o mais

A tragédia com o mais
moderno dos aviões

O desastre com o jato da Air France no meio do Atlântico
reacende a questão: encher o avião de novas tecnologias
torna a viagem mais segura?


Laura Ming

Fotos AP e Eraldo Peres/AP

O LUTO E OS CORPOS
Funcionárias da Air France na missa pelas vítimas na Catedral de Notre Dame, em Paris. Acima, as caixas com embalagens para corpos desembarcam em Fernando de Noronha



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As probabilidades de alguém estar num jato comercial que se envolva em acidente com pelo menos uma morte são de uma em 8,47 milhões. Em outras palavras, é mais provável que uma pessoa morra de desastre de carro, de infarto ou atingida por uma bala do que voando numa altitude maior que a do Pico do Everest a uma velocidade bem próxima à do som. O Conselho Nacional de Segurança dos Estados Unidos tem números que mostram que é 25 vezes mais provável alguém perder a vida a caminho do aeroporto do que na queda do avião que vai tomar. Ainda assim, é impossível ver o carrão bem polido na garagem e enxergar nele algo mais perigoso do que um avião. Voar, no entanto, produz sensações contraditórias. Embora o avião pareça mais perigoso, quando um deles se acidenta, como o Airbus da Air France, a surpresa, a revolta, a busca por explicações técnicas são muito maiores e mais frenéticas do que quando um carro capota ou um ônibus despenca no abismo, deixando vítimas fatais. O medo irracional de voar estaria, então, em eterno conflito com a constatação estatística irrefutável de que é seguro deixar-se elevar a 12 000 metros preso a uma poltrona e respirando um ar pressurizado, mas mesmo assim tão rarefeito quanto o das montanhas mais altas. Sim, existe conflito. Mas o desaparecimento súbito de centenas de pessoas em acidentes aéreos de grandes proporções comove e intriga infinitamente mais do que a lenta e esparsa ceifada da morte em acidentes de automóvel nas madrugadas.

"Não é mesmo natural para o homem ficar suspenso a quilômetros de altura, dentro de uma estrutura enorme que exige o perfeito funcionamento de centenas de máquinas e dispositivos", diz o piloto de Boeing Juan Vergara, que dá palestras a pessoas com medo de voar. Em 2007, logo depois da tragédia do Airbus da TAM em São Paulo, o Ibope perguntou aos brasileiros se eles estavam com medo de voar. O resultado: 74% disseram que sim. Em 1998, esse número era de 42%. A média mundial é de 30%.

O desaparecimento de um hipermoderno Airbus A330-200 com 228 pessoas a bordo no meio do Atlântico, no domingo passado, reúne todos os componentes que fazem as pessoas se perguntar se é seguro voar. Vidas despedaçadas em frações de segundo, entre elas crianças e recém-casados, causam dor no coração. O desastre do voo 447 da Air France, na rota Rio-Paris, também reacende uma questão específica: encher um avião de novas tecnologias digitais torna as viagens mais arriscadas? A pergunta é relevante porque o Airbus A330-200 é a mais automatizada das máquinas no ar e o protótipo da aeronave do futuro. Com base mais uma vez em estatísticas, a resposta só pode ser sim. Desde 1988, quando os Airbus com controle eletrônico de voo apareceram nos aeroportos, o número de acidentes com jatos comerciais reduziu-se em praticamente 70%. A taxa de acidentes caiu de 2,5 para 0,7 a cada milhão de decolagens em 2007. Se comparado aos anos 60, a queda foi de espantosos 98%. A melhora da segurança não pode ser totalmente atribuída aos aviões do consórcio europeu – mas está comprovado que mais tecnologia a bordo e nos aeroportos contribuiu de forma decisiva para esse resultado.

A controvérsia se desdobra em outro campo – o da autonomia do piloto. Dois princípios divergentes regem as maiores fabricantes de aviões comerciais, a Boeing e a Airbus. A posição da empresa americana é que é vital dar ao piloto a última palavra no comando da aeronave. A europeia acredita que é mais seguro delegar aos computadores (eles podem ser mais de seis dezenas) o poder de contrariar o piloto. Os europeus têm bons números para embasar seus argumentos: sete de cada dez acidentes aéreos são causados por falha humana, entre controladores, mecânicos e comandantes. A maioria dos desastres ocorre mesmo por erro do piloto. O Airbus dispõe do mais completo sistema de computação destinado a se sobrepor aos pilotos quando eles dão comandos capazes de pôr em risco a integridade do avião ou a vida dos passageiros. A ideia dos projetistas foi harmonizar as ordens do piloto com a capacidade da máquina de obedecer. Todos os modernos jatos comerciais utilizam também o sistema fly-by-wire, em que sensores eletrônicos interpretam a pressão das mãos e dos pés do piloto sobre o manche, os manetes de potência e os pedais e a transmitem às partes móveis (o aileron, o profundor e o leme). Antes do fly-by-wire, introduzido na aviação pelos caças F-16 americanos, os comandos dos pilotos sobre os manetes de potência, por exemplo, chegavam às turbinas não por meio de sinais elétricos, mas por cabos de aço e conduítes de óleo – ambos muito pesados e mais propensos a falhas. A Boeing optou por manter instalado, para uso em caso de falha do fly-by-wire, um sistema auxiliar à moda antiga que replica mecanicamente a maioria dos comandos eletrônicos. Nos mais modernos modelos do Airbus, como o A330, que fazia o voo 447, se o fly-by-wire entra em pane total, como ocorreu agora, o piloto é obrigado a comandar o avião usando apenas os pedais e umas rodinhas (já presentes no 14 Bis de Santos Dumont) conhecidas como "elevator trim", que servem para estabilizar o avião. "Há situações que só um piloto de carne e osso pode solucionar", diz Luiz Bassani, ex-comandante da Varig e, claramente, partidário da filosofia da Boeing.

Sergio Castro/AE
POUSO POR INSTRUMENTOS
Avião desce no Aeroporto de Guarulhos, em São Paulo


"São raríssimos os acidentes cujo desfecho se pode atribuir ao excesso de tecnologia embarcada e à diminuição da possibilidade de pilotar o avião manualmente", diz Gustavo Cunha Mello, analista de riscos aeronáuticos. Não há, por enquanto, como saber se o desastre do voo 447 foi causado por excesso de dependência de tecnologia digital, que, por razões ainda misteriosas, virou de repente um painel enegrecido diante do piloto. O mais provável é que tenha havido, como na imensa maioria dos desastres aéreos, uma sucessão de falhas. A rota entre o Brasil e a Europa passa por um trecho de permanente mau tempo na altura do Equador. Uma centena de voos intercontinentais passa diariamente pela região. De modo geral, eles tentam evitar as nuvens com maior risco para a aviação, os cúmulos-nimbos, conhecidos como CB. O último contato feito pelo AF 447, em mensagem de texto, informava que o avião iria entrar numa zona de CB.

Fatores meteorológicos isolados raramente provocam desastres com aviões do porte de um Airbus A330. A fuselagem é metálica, permitindo que um raio contorne toda a sua parte externa sem provocar estragos nos computadores da aeronave. As asas e as turbinas do motor são equipadas com sistemas anticongelamento para se proteger dos cristais de gelo e do granizo. "Os ventos ascendentes e descendentes são mais perigosos no momento da decolagem e da aterrissagem, quando o avião está mais lento, mas é pouco provável que sejam capazes de derrubar um avião como o Airbus", disse a VEJA o meteorologista Carlos Morales, da Universidade de São Paulo. A maioria dos pilotos prefere contornar o paredão de cúmulos-nimbos para evitar riscos e desconforto aos passageiros. Mas não é incomum que eles optem por "rachar a CB", como se diz no jargão da aviação. O avião da Airbus estava a 12000 metros de altitude, alto demais para encontrar granizo, mas com temperatura de 40 graus negativos e onde há formação de gelo. O certo é que, dez minutos depois, o Acars, sistema que faz comunicação via satélite com a central da companhia na França, passou a emitir mensagens de pane. Só se pode supor o que ocorreu – mas a se-quên-cia de mensagens dá boas pistas das possibilidades (veja o quadro).

Na sexta-feira, a Air France anunciou que iria substituir os Pitot de toda a sua frota. Esses tubos, instalados na fuselagem, ajudam a medir a velocidade do ar. A troca indica que a companhia desconfia que a leitura errada da velocidade possa estar na origem da tragédia. Muito vai depender da localização da caixa-preta, que grava dados essenciais para os investigadores. Em 98% dos acidentes, o equipamento é resgatado e responde às principais questões. Mas o Airbus da Air France caiu numa região com profundidade de 4000 metros. Ainda que caixas-pretas já tenham sido recuperadas de grandes abismos, a tarefa é extremamente difícil. No fim de semana, oito aviões e dois helicópteros vasculhavam uma área de 185000 quilômetros quadrados em busca de indícios. Na quinta-feira, a FAB avisou que um dos objetos encontrados – uma estrutura de madeira – não fazia parte do Airbus. Era simplesmente lixo marinho. Outros achados, como uma poltrona e pedaços de metal avistados, podem ser do Airbus. Caso a caixa-preta do A330 não seja encontrada, o acidente com o A330 poderá ser mais um dos raros a ficar sem explicação.

O enredo

Na cauda do Comet

Na cauda do Comet

Os desastres do primeiro jato comercial, o Comet, 
e o do Boeing da Lauda Air quarenta anos depois 
contam a mesma história: segurança é tentativa e erro

Corbis/Latinstock
JANELÕES O Comet tinha janelas como as dos trens. Isso foi fatal


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Nesta edição
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A dor, o medo.... e os números
• O cenário do desastre
• O enredo
• A tragédia com o mais moderno dos aviões
• E tudo se dissipou no ar
Exclusivo on-line
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Cronologia dos acidentes aéreos
• 
As notícias sobre o voo 447

Nada ilustra melhor a aviação comercial do que a máxima de que a solução parcial de um problema acaba criando novos problemas. Essa condenação começou a se manifestar de maneira trágica com o primeiro jato comercial da história, o Comet, fabricado em 1949 pela Havilland. Ele veio resolver os problemas de conforto, privacidade e segurança dos seus antecessores a hélice. Com quatro turbinas e o comprimento de um Boeing 737 atual, o Comet causaria um impacto que só seria igualado nos anos 70 ao do supersônico Concorde. Como o Concorde, porém, o Comet foi precocemente aposentado depois de um acidente – para ser mais preciso, depois de cinco acidentes. Ao contrário do Concorde que pegou fogo na decolagem em 2000 na França, os modelos Comet se desintegravam em pleno ar, à luz do dia, em perfeitas condições meteorológicas. Depois da mais extensa e cara investigação científica da história dos desastres aéreos, as autoridades inglesas concluíram que, para satisfazer o gosto dos viajantes, os projetistas desenharam janelas panorâmicas no Comet. Isso tornava as viagens muito mais agradáveis. Mas, como o vidro e o metal reagem de forma diferente às pressões aerodinâmicas, a estrutura do Comet acabava cedendo e o avião se desintegrava. Devemos às vítimas dos desastres do Comet o fato de as janelas dos jatos comerciais serem até hoje apenas umas aberturinhas ovaladas, pavor dos claustrofóbicos, mas orgulho dos engenheiros de segurança.

O mais intrigante é que as modernas tecnologias digitais embarcadas, ao invés de mitigar os desafios colocados aos projetistas, tornaram-nos ainda mais flagrantes. Uma dessas esteve no centro de algumas tragédias: o dispositivo digital projetado para impedir que os freios aerodinâmicos do avião, em especial aqueles que invertem o fluxo de ar das turbinas, os reversos, fossem acionados em pleno voo. Melhor: eles seriam acionados automaticamente quando do pouso. Os engenheiros basearam seu dispositivo no que parecia ser algo infalível. Um leitor digital de altitude trancava os reversos mesmo que o piloto os acionasse manualmente. A inovação destinada a resolver um problema acabaria criando vários. Em 1991, um Boeing 767 da Lauda Air caiu na Tailândia depois que, sem explicação aparente, os reversos se abriram em pleno voo. A investigação mostrou que o avião perdeu altitude em uma turbulência e o computador interpretou o fenômeno como um pouso, acionando os freios. Como resolver isso sem perder a automação? Os engenheiros modificaram o dispositivo de acionamento dos reversos, de modo que os sensores informariam ao computador para abri-los apenas depois que os dois conjuntos de pneus do trem de pouso tocassem o solo. A modificação foi considerada perfeita e adotada universalmente pelos fabricantes. Mas... e há sempre um mas... dois anos depois um Airbus A320 da Lufthansa não conseguiu acionar os reversos ao pousar na pista gelada do Aeroporto de Varsóvia, matando dois dos setenta passageiros. A causa? Ventos laterais fortes fizeram com que o trem de pouso da esquerda tocasse o solo nove segundos depois do da direita. O computador, fiel a sua programação, não acionou os reversos e impediu os pilotos de ativá-los até que todos os pneus tivessem tocado o solo. Mais uma modificação foi feita, então, no desenho do dispositivo. Agora ele apenas informa o piloto, que decide quando acionar os freios.

Sipa Press
FREIO NO AR O ex-piloto Niki Lauda no local dos destroços 
do seu avião, que abriu o reverso em voo de cruzeiro

O cenário do desastre

Quadro: Mas lá em cima não é seguro?

O PAC visto de perto

O PAC visto de perto

VEJA TAMBÉM
Nesta edição
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PAC: ele existe, é bom que exista, mas a maior parte ainda está no papel
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Por dentro das obras do PAC
Do arquivo
• O câncer no palanque (6/5/2009)

Além de analisar os números do PAC, VEJA enviou quatro repórteres a campo, acompanhados de fotógrafos, para visitar obras incluídas no programa. Os projetos foram escolhidos pela sua grandiosidade ou pela capacidade que terão de mudar a vida das pessoas que habitam seu entorno. Tudo somado, nossa equipe viajou 45 000 quilômetros de avião e 8 500 quilômetros de carro. Os repórteres e fotógrafos passaram por 48 municípios, espalhados por catorze estados. Parte do resultado desse trabalho está a seguir.

Leo Caldas/Ag. Titular
Eclusa, em Tucuruí: paredões
de 45 metros
 

Um feito magnífico
Hidrelétrica de Tucuruí, no Pará, é a maior obra de engenharia já realizada na Amazônia. Feita entre 1979 e 1992, responde sozinha por 10% de toda a energia gerada no país. Mas sua construção interrompeu a navegação no Rio Tocantins, porque uma parte do projeto foi ignorada: a edificação de eclusas que permitissem às embarcações vencer o desnível de 69 metros entre o lago da barragem e o leito do rio. No fim de 2006, a Eletronorte, que administra a usina, foi incumbida de fazer as eclusas de Tucuruí. Quem vê a estrutura fica embasbacado com seu gigantismo. Do alto, só é possível divisar caminhões e guindastes – os operários, de tão minúsculos, perdem-se na paisagem. Com dois tanques de 210 metros de comprimento, 33 de largura e 45 de altura, as eclusas permitirão o transporte por barco de 40 milhões de toneladas de carga por ano. Deverão ser inauguradas no meio do ano que vem.
Leonardo Coutinho, de Tucuruí (PA)


Fernanda Preto

BR-319, no Amazonas: este é um dos melhores trechos da rodovia

Asfalto, só nas pontas
Inaugurada em 1973, a BR-319 ligava Manaus, no Amazonas, a Porto Velho, em Rondônia, num percurso de 877 quilômetros. Depois de duas décadas sem manutenção, a estrada se esfacelou. Nos dois extremos, o asfalto ficou esburacado. Num trecho de 400 quilômetros, ele deixou de existir: os habitantes o chamam de "meião", por ficar exatamente na metade do trajeto. O meio é um lamaçal tão espesso que nem tratores conseguem atravessar. Quem vive nessa região remota só se locomove pelos rios Madeira, Castanho, Tupana e Luna. Nunca pela BR-319. Da estrada, estão sendo recuperados os trechos próximos a Manaus e a Porto Velho. O "meião" continuará debaixo da lama até que sejam liberadas as licenças ambientais para mexer ali. Sem asfalto em mais da metade do trajeto, a obra jamais cumprirá seu objetivo de ligar as duas capitais.
Igor Paulin, de Careiro (AM)


Leo Caldas/Ag. Titular

Esqueleto do novo Aeroporto de Macapá: a inauguração deveria ter ocorrido em 2006

Interrompido pela corrupção
O Amapá não possui ligação rodoviária com nenhum outro estado. Só é possível chegar lá de barco ou avião. Como uma viagem fluvial partindo de Belém – a capital mais próxima – leva 24 horas, a forma mais racional de chegar ou sair é pelo ar. O novo Aeroporto de Macapádeveria ter ficado pronto em 2006, mas a construção foi interrompida porque a Gautama, empreiteira que tocava a obra, desviou metade dos 113 milhões de reais investidos no projeto. Dele só há o esqueleto de concreto e aço exposto às intempéries amazônicas. Será necessário fazer outra licitação para concluí-lo. A população segue usando o aeroporto velho, que parece uma rodoviária de interior, com cadeiras encardidas e puídas. Quando dois aviões pousam ao mesmo tempo, ele fica superlotado. A Infraero desativou a área ocupada por lojas para aumentar o saguão e ergueu uma barraca de lona encostada ao aeroporto que serve de sala de embarque. 
L.C., de Macapá (AP)


Manoel Marques

Transposição do São Francisco: em Pernambuco, operários perfuram o solo rochoso para a passagem do futuro canal

A água demorará a chegar
transposição do Rio São Franciscopara regiões afetadas pela seca é um dos orgulhos do PAC. A obra envolve a construção de dois megacanais: o Eixo Norte, de 426 quilômetros de extensão, levará água para municípios do Ceará e do Rio Grande do Norte, e o Eixo Leste, de 287 quilômetros, beneficiará Paraíba e Pernambuco. Ambos terão, em média, 25 metros de largura e 6 de profundidade. O objetivo é transferir água de forma contínua para rios e açudes que secam em períodos de estiagem. Ao longo do trajeto, há serras, penhascos, rodovias e rios. Para ultrapassá-los, o projeto prevê 87 passarelas, 64 pontes, 42 aquedutos, 27 barragens e cinco túneis, um deles com 15 quilômetros de extensão. Até agora, porém, nenhuma dessas obras foi concluída. Dos 100 quilômetros de canais já escavados, apenas 2% estão concretados. Uma grande dificuldade é abrir caminho para os canais entre as árvores espinhentas da caatinga. Esse trabalho é feito no braço. VEJA deparou com uma equipe de quatro operários, todos com motosserra à mão, desbastando a vegetação. Sua meta era derrubar um trecho com 20 quilômetros de extensão. Sob o sol de 43 graus, eles afirmaram avançar apenas 200 metros a cada dia. Técnicos calculam que, com sorte, até o fim de 2010 estará pronto o canal do Eixo Leste, mas sem todos os equipamentos necessários ao seu funcionamento. 
José Edward, de Cabrobó (PE)


Leo Caldas/Ag. Titular

Terminal fluvial, em Santarém: a construção foi paralisada pela cheia do Rio Tapajós

Surpreendidos pelo rio
A Amazônia, com 25 000 quilômetros de rios navegáveis, depende do transporte fluvial para movimentar pessoas e cargas. O embarque e o desembarque nas cidades da região são caóticos. Para disciplinar a navegação, o governo decidiu construir 38 terminais hidroviários, com papel semelhante ao de rodoviárias. Em Santarém, a cidade mais importante a receber um desses portos, a obra foi paralisada depois de ter sido encoberta por uma das cheias do Rio Tapajós. Elementar: na Amazônia os rios sobem todo ano no inverno e baixam no verão. O Porto de Manaus, por exemplo, construído por ingleses no início do século passado, nunca foi inundado porque usa plataformas flutuantes. Os engenheiros do PAC reconhecem o erro em Santarém e afirmam que seguirão a receita correta. 
L.C., de Santarém (PA)

Fernanda Preto

Canteiro de obras de Jirau: a usina está sendo feita a 10 quilômetros de seu ponto original

A usina da discórdia
Situada no caudaloso leito do Rio Madeira, no interior de Rondônia, ahidrelétrica de Jirau teve sua construção iniciada graças a uma permissão provisória do Ibama. A empresa responsável, entretanto, começou a erguer a estrutura (que vai consumir 700 000 metros cúbicos de concreto, oito vezes a quantidade usada no Estádio do Maracanã) em um ponto que fica a 10 quilômetros do lugar onde estava prevista sua instalação original. Isso porque, no local, há uma ilhota bem no meio do rio – a Ilha do Padre – que facilitará o trabalho de represamento das águas. Ao tomar essa liberdade, além de burlar o edital de licitação, a empresa invadiu áreas de preservação ambiental. Para completar, durante as escavações foram encontrados quatro sítios arqueológicos indígenas. Resultado: o governo de Rondônia barrou o prosseguimento da construção em maio. Na semana passada, finalmente, ele concordou em autorizar a obra, em troca de uma indenização de 45 milhões de reais. 
I.P., de Porto Velho (RO)

Manoel Marques

Ferrovia Norte-Sul: operário limpa trilhos recém-colocados no Tocantins

Por enquanto, só trilhos
Ferrovia Norte-Sul avança a ritmo de maria-fumaça. As obras começaram em 1987, mas o primeiro trecho, entre Maranhão e Tocantins, só ficou pronto uma década depois. Em 2003, o governo retomou o projeto, mas a construção só ganhou velocidade em 2007, graças ao dinheiro da Vale, que arrendou um trecho da estrada de ferro. No Tocantins, foram colocados 350 quilômetros de trilhos. Lula já foi ao estado para tirar fotos ao lado de uma locomotiva com vagões carregados de soja, o principal produto da região. Infelizmente, a imagem era uma simulação. Os grãos produzidos à beira da Norte-Sul continuam sendo transportados em carretas até o Maranhão, a 300 quilômetros, para dali ser exportados. Os trilhos ainda não beneficiam os agricultores porque não foi feito nenhum terminal para embarcar a soja nos trens. "Os trilhos chegaram, mas o trem não veio", resume o produtor rural Celso Stülp, cuja fazenda é cortada pela Norte-Sul. O governo afirma que aprontará tudo até o fim do ano. Não será fácil. Além dos terminais, faltam 150 quilômetros de trilhos até Palmas, a capital do Tocantins, quatro pátios intermodais e seis pontes. Isso no trecho norte da ferrovia. No sul, entre Tocantins e São Paulo, muitos pedaços nem sequer foram licitados. 
J. E., de Colinas do Tocantins (TO)


Oscar Cabral

Área da Refinaria Abreu e Lima: nem a terraplenagem foi concluída

Sociedade com Hugo Chávez
Uma sucessão de obstáculos ameaça aRefinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. A pedra fundamental foi lançada em 2005, mas nem a terraplenagem está concluída. Primeiro, o Tribunal de Contas da União apontou sobrepreço de 20% em alguns contratos. Depois, o orçamento para a construção da refinaria bateu em 23 bilhões de reais, o dobro do que a Petrobras pretendia gastar. Para completar, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que havia prometido bancar 40% do projeto, não entrega o dinheiro. Diante de tantas dificuldades, a Petrobras decidiu fazer nova rodada de licitações para baixar custos. Até agora, porém, a empresa não divulgou os resultados. Na grande área vazia onde deveria estar a refinaria, o que se vê são máquinas paradas, operários fazendo pequenos serviços e dezenas de moradores pobres da região indagando onde podem se inscrever para trabalhar na construção quando ela realmente engrenar.
Raquel Salgado, de Ipojuca (PE)

Leo Caldas/Ag. Titular
Trecho da BR-163, no Pará: um verdadeiro rali 

O pavimento não vai durar
A vocação da BR-163 é unir o maior polo do agronegócio brasileiro, Mato Grosso, ao Porto de Santarém, no Pará. Mas, com cerca de metade de seus 1 780 quilômetros sem asfalto, a estrada jamais cumpriu esse papel. Quando chove, ela vira um grande atoleiro; quando faz sol, ela some na poeira. O PAC pretende mudar o cenário, mas o ritmo e a qualidade da obra são desanimadores. Por falta de investimentos, os trabalhos, que estão a cargo da divisão de engenharia do Exército, avançam lentamente. No Pará, foram pavimentados só 20 quilômetros da rodovia em dois anos de trabalho. No outro extremo, em Mato Grosso, as obras alcançam 53 quilômetros. Entre esses dois canteiros, há um estirão de 842 quilômetros de terra, onde não existe nenhum tipo de trabalho sendo feito. E não há previsão de que a situação vá mudar em breve. Para piorar, nos trechos em que a pavimentação está sendo feita, os engenheiros decidiram não usar asfalto. Eles optaram pelo tratamento superficial duplo – uma cobertura mais barata que o asfalto usinado, mas com vida útil bem mais curta: varia de dois a sete anos, dependendo do tráfego que recebe. 
L.C., de Rurópolis (PA)

Oscar Cabral

Ferrovia Nova Transnordestina, no Ceará: o trabalho apenas começou

1 700 quilômetros de quase nada
Em junho de 2006, o presidente Lula foi até Missão Velha, no interior do Ceará, anunciar a construção da Ferrovia Nova Transnordestina. O projeto deveria integrar o interior de Ceará, Pernambuco, Alagoas e Piauí a dois dos maiores portos do Nordeste, Pecém e Suape. Três anos depois, não há um só trilho colocado nos 1 700 quilômetros por onde a estrada de ferro deveria passar. Só há obras ao longo de um trecho de 250 quilômetros, entre Ceará e Pernambuco – e por lá operários ainda podem ser vistos arrancando mato. No restante do trajeto, não há sequer autorização ambiental para o início dos trabalhos. Em Alagoas, o único sinal de atividade é a remodelação de um antigo ramal férreo, construído em 1855, a ser interligado à nova linha. "Muitas empresas poderiam se fixar aqui, pois temos terra e mão de obra barata, mas não vêm porque o transporte de mercadorias para as capitais ainda é muito caro", diz Marcones Sá, prefeito de Salgueiro, a cidade pernambucana que abrigará o maior entroncamento da Transnordestina. 
R.S., de Salgueiro (PE)

Por dentro das obras do PAC

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