Editoriais dos principais jornais do Brasil
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O ESTADO DE S. PAULO
É extremamente positiva a imagem projetada pelo presidente Lula, no mundo, desde que assumiu o governo. Alvo de interesse e curiosidade compatíveis com a singularidade de sua biografia e trajetória política, dele se sabia que era o primeiro dirigente de um país do porte do Brasil a vir de muito baixo na escala social e que ascendera pela força de sua determinação e o impulso de seu invulgar talento para liderar. Pesava contra ele, no entanto, a imagem de radical raivoso, construída na condução de um partido que propunha "acabar com tudo isso que está aí". Não faltava quem desconfiasse de que a América Latina produzira mais um populista falastrão, cuja falta de preparo explicava a sua hostilidade à democracia liberal e à economia de mercado. E não faltava quem deplorasse, antes de conhecê-lo, o contraste com o seu antecessor.
Surpreendendo os céticos e desarmando os pessimistas, em pouco tempo Lula adquiriu junto aos dignitários, investidores e formadores de opinião do mundo desenvolvido um prestígio e até uma simpatia que beneficiaria imensamente o Brasil. De fato, não havia na cena internacional, nesse começo de século, um chefe de governo que combinasse como ele duras experiências pessoais, escassa escolaridade, aguda sensibilidade social, mas também instintiva facilidade para estabelecer improváveis relacionamentos calorosos - que o diga o ex-presidente George W. Bush - e, principalmente, capacidade de ouvir e assumir posições razoáveis no trato das questões que o levavam a correr o mundo. Esse notável Lula que aqui se evoca é como se não tivesse existido perto do Lula que acaba de se destacar na grande imprensa estrangeira por soltar uma bobajada que ninguém estranharia se tivesse saído da boca de um Hugo Chávez ou de um Mahmoud Ahmadinejad. E, o que é pior, na mais inapropriada das circunstâncias.
Ao lado do primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, na entrevista que se seguiu ao encontro de ambos, no Palácio da Alvorada, Lula dissertou sobre a crise mundial, atribuindo-a a "comportamentos irracionais de gente branca, de olhos azuis, que antes parecia que sabia tudo e que, agora, demonstra não saber nada". Ficasse nisso, a tirada xenófoba já seria suficientemente constrangedora. Mas ele se desmoralizou de vez na resposta a um perplexo jornalista britânico que lhe perguntou se essa visão não exprimia um viés ideológico. "Como eu não conheço nenhum banqueiro negro ou índio", emendou num raciocínio trôpego, "só posso dizer que não é possível que essa parte da humanidade que é a mais, eu diria, vítima do mundo (sic) pague por uma crise." De fato, ele não conhece, nem de ouvir falar, o negro Stan O?Neil, ex-presidente do Merrill Lynch, ou o negro Frank Raines, ex-presidente da Fannie Mae, duas instituições financeiras americanas cujo comportamento irracional ajudou a desencadear o colapso de Wall Street. E, se fossem brancos de olhos azuis, que diferença faria?
Não é preciso muita imaginação para adivinhar o que terá pensado nessa hora o premier britânico, que fez uma parada no Brasil a caminho de um evento no Chile, para tratar com Lula da reunião dos líderes dos países que integram o G-20, a se realizar na próxima quinta-feira, em Londres - e que poderá ser um marco na busca de soluções para a crise. Brown, um dos mais ativos líderes mundiais da atualidade, foi um dos primeiros a valorizar a participação do Brasil nessa espinhosa empreitada, respaldando o protagonismo do presidente brasileiro. Não havia no encontro entre ambos, portanto, ambiente para tiradas populistas ou estocadas inoportunas como a alusão de Lula ao "preconceito contra os imigrantes nos países desenvolvidos". Esse é um problema crescente na Grã-Bretanha, mas nada tem que ver com a crise, muito menos com o empenho de Brown em reavivar o comércio mundial - ele anunciou em Brasília que proporá na cúpula do G-20 a criação de um fundo de US$ 100 bilhões para financiar a retomada do intercâmbio de bens e serviços.
Quando sobe aos palanques, Lula se compraz em dizer o que lhe dá na telha, sem se preocupar com as consequências. Desta vez, a queda pela demagogia o traiu e envergonhou o País, que, aliás, sob o seu governo, se beneficiou mais do que qualquer outro dos resultados fabulosamente positivos do "comportamento irracional da gente branca de olhos azuis", para a economia global, até o estouro da bolha.
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O GLOBO
O presidente Lula sempre gostou de simplificar as coisas, o que o leva a fazer constantes metáforas de fácil compreensão para a média dos brasileiros. Mas leva também ao pé da letra certas simplificações. Para ele, o mundo se divide entre ricos e pobres, entre paises do Norte contra países do Sul, entre os brancos de olhos azuis e os paises explorados por eles, e essa visão estreita do mundo se reflete em muitas das tomadas de posição na nossa política externa.
E acaba se voltando contra nós, como na rodada de Doha, que acabou sendo abortada por posições de países como China e Índia, que não aceitaram um acordo que o Brasil havia fechado com a União Européia e os Estados Unidos.
Exatamente porque os interesses brasileiros no comércio internacional às vezes coincidem mais com os dos ricos do que com o dos emergentes. Foi assim que ele deu uma das maiores gafes de um chefe de Estado, com a declaração racista de que a crise internacional foi provocada por brancos de olhos azuis.
A simplificação das disputas, sejam elas internas ou internacionais, vai muito bem para o objetivo de Lula, que obviamente estava querendo dar uma demonstração de que não se intimida diante de representantes do primeiro mundo, no caso o primeiro ministro inglês, Gordon Brown.
E ele aparece diante de seus eleitores de baixa renda como aquele que defende os pobres e os desvalidos diante dos colonizadores. Mas, quando se está num encontro internacional, preparando o próximo encontro do G-20, em que o país pretende ter uma atuação proeminente, querendo lugar de destaque nos grandes organismos internacionais como o Conselho de Segurança da ONU, não se pode simplificar as questões dessa maneira.
Ele, com uma tirada dessas, se aproxima mais do seu colega Hugo Chávez do que do estadista que pretende ser. O presidente Lula, quando leva a discussão pra um campo ideológico reduzido, perde a capacidade de influenciar a política internacional. Lembra Chávez, que, na tribuna da ONU, disse que sente cheiro de enxofre porque o presidente dos Estados Unidos acabara de sair.
Não é preciso nem mesmo lembrar que quando perguntado se o que dizia tinha sentido ideológico, ele tentou minimizar dizendo que não conhecia nenhum banqueiro negro, ou índio. Além de mostrar desinformação – o ex presidente do Merrill Lynch, Stanley O Neal, era negro e foi dos banqueiros mais influentes em Wall Street, e o atual presidente do Citibank é o indiano Vikram Pandit -, o presidente Lula tenta mais uma vez jogar as perdas da crise internacional no colo dos estrangeiros, sem assumir nossas culpas, como se o pais estivesse em perfeitas condições.
Mas essa crise é importada ou fabricada. No ultimo trimestre do ano passado, o PIB brasileiro teve uma queda de 3.6%, mas, se adotarmos o critério da maioria dos países, inclusive os europeus e os Estados Unidos, que anualizam as perdas, a queda do PIB brasileiro seria de extraordinários 15,2%.
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