Thursday, September 24, 2009

- EDITORIAIS 22/9/2009


DNA DO RACISMO
EDITORIAL
O GLOBO
22/9/2009

O no mínimo desrespeitoso comportamento do senador republicano Joe Wilson ao xingar de “mentiroso” Barack Obama durante um pronunciamento que o presidente fazia ao Congresso sobre a polêmica reforma no sistema de saúde americano destampou a contaminação racista no cerrado ataque que a Casa Branca enfrenta no debate sobre o tema. Coube ao expresidente Jimmy Carter colocar os pingos nos is e denunciar o viés racista na discussão.
Pois é deste país — em que o preconceito racial é parte da formação da sociedade, tanto que aflora de tempos em tempos — que, com o apoio do governo, insiste-se em importar para o Brasil um sistema de cotas criado pela história e realidade americanas. Enquanto no Senado encontra-se em fase de discussão um projeto de inspiração racialista de reserva de vagas no ensino superior em função da cor da pele, acaba de ser aprovado na Câmara de Deputados o Estatuto da Igualdade Racial. Originado de projeto do Senador Paulo Paim (PTRS), o Estatuto passou pelo Senado e chegou para o exame dos deputados com propostas agressivas: cotas para negros em peças de publicidade, novelas, filmes, mecanismos para facilitar a legalização de ditos quilombos, e assim por diante.
Alguns desses dispositivos foram retirados, mas outros, mantidos, como a revisão do currículo escolar para ser inoculado o conceito de raça — rejeitado pela ciência — na história do Brasil e África, e a imposição ao sistema público de saúde da ideia de “doenças de negros” — também contestada tecnicamente.
Institui-se, ainda, a concessão de incentivos a empresas que mantenham 20% de “negros” nos quadros. Se o Estatuto pode ter sido desidratado de algum teor tóxico, seu DNA racialista — inconstitucional, ao discriminar cidadãos pela cor da pele — continua intacto.
E por isso precisa ser rejeitado no retorno ao Senado, ou, caso sancionado, terá de ser arguido perante o STF.
O erro na aceitação de teses racialistas é duplo. Ao importar o modelo de uma sociedade construída sobre raças — mesmo nos EUA as cotas têm sido contestadas — e para um país cuja formação é outra, centrada na miscigenação. A Pnad, do IBGE, é cabal: de 2007 para 2008 caíram de 7,5% para 6,8% da população os que se autodeclaram “negros”, aumentou a proporção dos que se veem “pardos” (de 42,5% para 43,8%), e encolheu a parcela de “brancos”: 49,2% para 48,4%. Somos cada vez mais miscigenados.
Por isso é um desvario injetar nesta sociedade o vírus do racismo.

FOSSO NA EDUCAÇÃO
EDITORIAL
O GLOBO
22/9/2009

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) é aprimorada a cada ano pelo IBGE, e seus resultados têm sido importante fonte de informação para vários estudos sobre a situação social e econômica da população brasileira. A Pnad 2008, por exemplo, confirmou algumas tendências de consumo: 80% dos lares estão servidos por telefone (fixo ou móvel) e mais de 30% já contam com microcomputador (sendo que 24% dos imóveis estão conectados à internet). A energia elétrica está presente na quase totalidade das casas, e houve avanços, ainda que modestos, no fornecimento de água, na coleta de lixo e de esgoto. O Brasil é um país em que 70% dos imóveis são propriedades quitadas e há mais 5% sendo amortizados.
Há melhorias em indicadores sociais, tendência iniciada antes do governo Lula, que procura capitalizar sozinho os avanços por causa das eleições. Se por um lado a Pnad captou o efeito do crescimento do emprego e da ligeira redução da desigualdade (embora a pesquisa tenha sido feita antes de o país sentir o impacto do agravamento da crise financeira internacional), por outro mostrou indicadores preocupantes em relação à educação. O número absoluto de pessoas analfabetas com mais de 15 anos aumentou em 113 mil de 2007 para 2008, inaceitável diante do engajamento da própria sociedade civil para eliminar a mazela. Se é crescente a percentagem de crianças que entram na escola aos 4 e 5 anos (72% dos que estão nessa faixa etária), e 97,5% de todos os jovens estão matriculados, a escolaridade média da população até 24 anos ainda não chega a oito anos — período do ensino fundamental.
É grave porque o mercado de trabalho tem gerado mais oportunidades para aqueles que possuem onze ou mais anos de instrução.
Esse grupo passou a representar 41,2% dos trabalhadores, e somente em 2008 expandiu-se em em 8,5%. Há um fosso entre o que o mercado de trabalho demanda e o que o sistema de ensino vem conseguindo formar. Se essa defasagem não for corrigida, e rapidamente, a educação acabará se transformando em gargalo ainda mais sério do que os obstáculos da infraestrutura para o crescimento do país. Daí a urgência na prioridade de gastos para a educação, deixando-se o assistencialismo em segundo plano.
Os dados confirmam que estamos em uma fase de colher frutos do chamado “bônus democrático”.
Durante vinte ou trinta anos teremos um número declinante de crianças e jovens devido à queda da taxa média de fecundidade. Enquanto não se multiplicam os problemas decorrentes do envelhecimento da população, o país deve redobrar esforços para educar bem os jovens, permitindo que eles aproveitem as oportunidades profissionais que surgirão.

MATERIALISMO, MAS COM CIDADANIA
EDITORIAL
JORNAL DO BTRASIL
22/9/2009

RIO - Na economia, costuma-se chamar jogo de soma zero todas as interações em que não há ganhos mútuos. O benefício que alguém recebe é obtido na exata medida em que outro(s) participante(s) perde(m). Muitos jogos (damas, xadrez) e trocas feitos pelos indivíduos ao longo da vida são deste tipo. No espaço público, a grande política representa, no fundo, um conflito entre classes e grupos de interesses pelo controle dos recursos do Estado. É um jogo, em princípio, de soma zero – por exemplo, o que os pobres recebem em programas sociais é diminuído do montante que eventualmente poderia ir para políticas públicas que favoreçam outras camadas sociais. Este sempre foi o eixo da peleja entre esquerda e direita, mesmo após o advento do pós-materialismo, que tentou incorporar na agenda temas não econômicos como o ambientalismo e o feminismo.
A política, contudo, também pode ser entendida como um jogo de ganhos mútuos. O que se perde agora no conflito distributivo pode representar um benefício a longo prazo, com a construção de uma sociedade mais justa, educada, produtiva e menos desigual e violenta.
A transformação da lógica da soma zero em um sistema de ganhos mútuos, percebidos em trocas contínuas, deve ser uma meta do jogo democrático. Tanto no que se refere ao conflito de interesses entre os grupos da sociedade quanto na relação entre os cidadãos e o Estado.
No que tange a essa interação, duas medidas recentes, uma no âmbito do município do Rio e outra do governo federal, devem ser destacadas pela capacidade de terem otimizado os ganhos dos atores envolvidos.
A primeira diz respeito à aprovação pela Câmara dos Vereadores do Rio da lei que regulariza as ampliações verticais e horizontais de coberturas e casas. O tema desperta polêmica, sobretudo numa cidade preocupada com a expansão das favelas. Mas, diante da prática comum e das dificuldades de fiscalização, a proposta de se autorizarem as ampliações, dentro de um limite estabelecido pela prefeitura, dá ao assunto um tratamento menos hipócrita. Na própria aquisição de um apartamento de último andar, por exemplo, é assegurado o direito de uso da laje ao comprador. Incentivados por esta provisão, proprietários ampliam as áreas de seus imóveis, que, sem a legalização, ficam isentas do pagamento de imposto. Com a nova lei, que aguarda sanção do prefeito Eduardo Paes, cria-se um marco regulatório e aumenta-se a arrecadação do município em IPTU, já que a nova medida deverá atingir cerca de 40 mil imóveis cariocas. Ganham os moradores e o caixa da prefeitura.
A segunda medida, de âmbito federal, tem impacto sobre a vida de milhões de trabalhadores autônomos, que agora podem regularizar sua situação. Com a inclusão no Simples Nacional, 260 novas ocupações, do pipoqueiro ao mototaxista, ganham o status de atividade exercida por microempreendedor individual. São homens e mulheres que poderão sair da informalidade, pagar impostos de forma simplificada e mais barata (em torno de R$ 60) e ganhar direitos trabalhistas e previdenciários que não tinham como autônomos. Ganham o Tesouro Nacional, com o aumento na arrecadação, e os trabalhadores beneficiados pela medida. E conquista-se um subproduto de valor incalculável: cidadania.

O BRASIL ANTES DA CRISE
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
22/9/2009

Os números da mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), referentes a 2008, representam o ponto culminante de um robusto ciclo de expansão da economia, do emprego e da renda, com avanços sociais expressivos e alguma redução da desigualdade entre os brasileiros. O mais amplo levantamento anual da realidade do País ? baseado em entrevistas com cerca de 400 mil pessoas em 150 mil moradias ? confirmou o que uma coleção de indicadores isolados vinha apontando sobre a consolidação do processo de desenvolvimento econômico retomado em 2004. É bem verdade que, em setembro do ano passado, quando os pesquisadores do IBGE foram a campo, a desaceleração do ritmo de crescimento do produto e do emprego já estava no horizonte, acompanhando as tendências internacionais. Mas poucos previam a crise mundial que seria desencadeada pela quebra do Lehman Brothers naquele mesmo mês. Vistos os dados nessa perspectiva, a pergunta inevitável é se as perdas a serem contabilizadas com toda a probabilidade pela próxima Pnad serão menos ou mais intensas do que os ganhos desta em comparação com a de 2007.

Esses ganhos dão razão a todos quantos afirmam que é impossível superestimar o dinamismo da sociedade nacional e, notadamente, das suas forças produtivas. Desde 2001, por exemplo, não se registrava tamanho aumento no nível do emprego com carteira assinada, na contramão dos prognósticos sobre a inexorável informalização do trabalho nos mais diversos setores econômicos. Com 2,1 milhões de novas contratações, verificou-se um salto de 7,1% em relação ao período precedente. No momento da pesquisa, 34,5% da força de trabalho estava registrada ? um recorde histórico. A carteira de trabalho foi "o grande diferencial" da Pnad, aponta Cimar Azeredo, responsável pela pesquisa mensal de emprego do IBGE. A população ocupada em geral também aumentou. Eram 92,4 milhões de pessoas, ou 2,8% a mais do que em 2007. A taxa de desemprego retrocedeu para 7,2% (1 ponto porcentual menor), o melhor resultado desde 1996. A renda média do trabalho continuou a crescer, chegando a R$ 1.041. Mas continuou aquém do R$ 1.074 de 1998. A desigualdade seguiu em queda, porém em proporção menor do que de 2006 para 2007. Ficou em 0,521, numa escala de 0 a 1.

Segundo o economista Sérgio Besserman, ex-presidente do IBGE, mais uma vez se evidenciou "a nossa horrorosa distribuição de renda". De fato, o rendimento médio dos 10% mais ricos é 12 vezes superior ao dos 50% mais pobres. Os primeiros concentram 42,7% da riqueza nacional. Para Besserman, o Bolsa-Família (que alcança 11 milhões de famílias) não é um instrumento de combate à desigualdade. "Realmente ajuda a tirar famílias do limiar da pobreza", afirma. "Mas o que reduz a desigualdade é a distribuição do conhecimento." Em relação a isso, para todos os efeitos práticos, continuamos marcando passo. Embora 97,5% das crianças de 6 a 14 anos estivessem matriculadas em escolas ? índice que diminui para 84,1% na faixa de 15 a 17 anos ?, não só a taxa de analfabetismo se manteve em 9,2% (12% dos brasileiros acima de 25 anos não sabem ler), como a taxa de analfabetismo funcional é de 21% no contingente com 15 anos ou mais. O conceito identifica as pessoas que são incapazes de entender e reproduzir o que leram. Entre os brasileiros plenamente letrados e esses outros, são legiões os que chegam ao mercado de trabalho com preparo apenas precário para funcionar numa economia moderna. É o dano causado pela praga aparentemente inerradicável do ensino de baixa qualidade.

Já não basta o "desafio enorme", como diz o ministro da Educação, Fernando Haddad, de "atrair a juventude, sobretudo de perfil socioeconômico mais baixo, para a conclusão da educação básica". O conhecimento assimilado pela maioria dos que a concluem permanece escandalosamente aquém das demandas do sistema produtivo. E, quando se leva em conta que os números agregados da Pnad escondem fortes diferenças regionais ? os analfabetos funcionais, por exemplo, são 31,6% da população residente no Nordeste, ante 15,8% no Sudeste ?, o problema da má escola no conjunto do País assume feições nada menos que dramáticas. O Brasil, nesse sentido, pode ser equiparado a um carro potencialmente capaz de desenvolver altas velocidades, mas que roda com o freio de mão puxado.

A DÍVIDA DA ARGENTINA
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
22/9/2009

Depois de 17 anos sem comprar aviões, a Aerolíneas Argentinas ? controlada pelo governo ? está colocando no ar novos aparelhos, com autonomia para voos intercontinentais de 6 mil quilômetros. Mas esses aparelhos só podem ser utilizados em voos domésticos. Se voarem para outros países, poderão ser retidos por ordem judicial a pedido de credores do governo argentino que nada recebem desde a declaração da moratória da dívida externa do país, em 2001.

Para afastar de vez esse risco e superar outros problemas criados pela moratória ? o pior dos quais é o fechamento do mercado internacional para os financiamentos de que o país necessita ?, o governo argentino anunciou que está disposto a se acertar com os credores que não aceitaram as condições impostas em 2005 pelo então presidente Néstor Kirchner. Quem aceitou a troca dos títulos da dívida ? cujo total ultrapassava US$ 150 bilhões ? pelos papéis então oferecidos incorreu em pesadas perdas. Ou aceitavam isso ou não receberiam nada, ameaçava Kirchner.

Uma parte dos credores não aceitou. Os detentores de cerca de US$ 20 bilhões da dívida recusaram os termos ditados por Kirchner e vêm procurando meios legais para receber aquilo a que têm direito, inclusive apontando bens do governo argentino no exterior para sequestro judicial como garantia de pagamento.

A Argentina tem também uma dívida de US$ 6,9 bilhões com 19 países que formam o Clube de Paris ? entre os quais Estados Unidos, Alemanha, França e Japão ?, cuja renegociação está parada desde o início do governo de Cristina Kirchner, em dezembro de 2007. Segundo o jornal La Nación, a renegociação será um dos temas centrais da viagem que a presidente faz a Washington.

O ministro da Economia, Amado Boudou, confirmou que está negociando com os credores privados que não aceitaram as condições oferecidas em 2005 e também que estão em andamento as negociações para o pagamento da dívida com o Clube de Paris ? provavelmente em cinco anos, com a contrapartida de novos empréstimos para o país.

O parcelamento dessa dívida está condicionado ao monitoramento das finanças públicas da Argentina pelo FMI, alvo de pesadas críticas do governo. No fim de agosto, Boudou afirmara que o governo não aceitaria a intromissão do FMI na política econômica. Mas a necessidade do país de ser readmitido no sistema financeiro internacional ? do qual necessita para organizar suas finanças internas e obter recursos que sustentem seu crescimento ? está fazendo o governo mudar o discurso. Há dias, o mesmo ministro Amado Boudou disse que a Argentina estava disposta a aceitar o monitoramento do FMI, "desde que não seja do mesmo tipo do que foi feito no passado". Agora, confirma que está em entendimentos também com o FMI, "de modo que até o fim do ano haverá uma definição" sobre a parcela da dívida argentina ainda pendente de um acerto com os credores.

Se o governo fechar esses acordos, a Argentina poderá ter acesso novamente aos mercados internacionais de capitais e reduzir os custos dos financiamentos. Mas persistirá outra dúvida na área externa. Mesmo tendo imposto grandes prejuízos aos que aceitaram sua proposta de 2005, a Argentina continuou com dificuldades para honrar os compromissos e teve de rever as condições de um lote de papéis com vencimento entre 2009 e 2012. O governo anunciou na semana passada que obteve a adesão de 76% desses credores à proposta de troca dessa parte da dívida ? no valor de US$ 22 bilhões ? por títulos com vencimento em 2014 e 2015.

Analistas calculam que, apesar desse alívio, o governo terá dificuldades para honrar os outros compromissos que vencerão em 2010 e que somam US$ 13,2 bilhões. Até o ano passado, o governo Kirchner contou com o apoio financeiro do presidente venezuelano, Hugo Chávez, mas essa fonte secou, depois que a crise fez cair o preço do petróleo. O chefe de gabinete do governo argentino, Aníbal Fernández, garante que o país não terá problemas para pagar o que vencerá no ano que vem ? os credores gostariam de ter certeza disso.

SEGURANÇA PARA OS MERCADOS
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
22/9/2009

A maior crise financeira dos últimos 80 anos foi provocada, em grande parte, por executivos incentivados a gerar lucros a qualquer custo. Alguns deles continuaram recebendo bônus mesmo depois de iniciada a quebradeira no setor bancário. Tudo isso provocou indignação, censura e muita retórica moralista, mas só agora, um ano depois da falência do banco de investimentos Lehman Brothers, surge uma proposta sensata e com sentido econômico para eliminar a distorção. O plano, elaborado pelo Conselho de Estabilidade Financeira, formado por dirigentes de bancos centrais das maiores economias, será incluído na pauta da cúpula do Grupo dos 20 (G-20), que se reúne quinta e sexta-feira próximas em Pittsburgh, nos EUA.

Pela proposta, os bônus pagos a dirigentes de bancos serão condicionados não só ao resultado financeiro dos negócios, mas também à administração de riscos. Um dos critérios será a adequação do capital ao volume e ao tipo de operações de cada instituição. Isso deverá, segundo os autores do plano, funcionar como um freio para a busca de lucros em aplicações perigosas.

Executivos de bancos e até políticos têm rejeitado a imposição de controles ao pagamento de prêmios com uma alegação aparentemente sensata: a remuneração de profissionais do mercado é uma questão privada. Esse argumento pode valer na maior parte dos casos, mas não é aceitável quando os bônus servem de estímulo à irresponsabilidade e contribuem para a insegurança dos mercados. É papel dos órgãos de regulação cuidar do bom funcionamento dos sistemas e sua obrigação é combater, com os instrumentos legais, todo fator de instabilidade.

Essa intervenção será possível, se os governos aceitarem as propostas e forem capazes de implantá-las. "Reguladores poderão dizer: os bônus são excessivos para seu nível de capital; sua capitalização é insuficiente", explicou o presidente do Conselho de Estabilidade Financeira, Mário Draghi, chefe do banco central da Itália. Pela proposta, a limitação dos bônus deverá ser adotada juntamente com os novos padrões de capitalização e de segurança das instituições financeiras. Não se espera a adequação dos níveis de capital de um dia para o outro, explicou Draghi.

A ideia é promover um ajuste gradual, sem bloquear repentinamente a capacidade de empréstimos das instituições. O roteiro do ajuste foi definido, nas grandes linhas, por dirigentes de bancos centrais num encontro recente promovido pelo Banco de Compensações Internacionais (BIS), de Basileia.

As autoridades do G-20 ainda terão muitos detalhes para discutir, quando cuidarem da implantação das novas normas de Basileia e das propostas de limitação dos bônus pagos a executivos. O presidente da França, Nicolas Sarkozy, tem defendido a criação de um teto para os prêmios. Seu colega americano, Barack Obama, defende uma ampla reforma do sistema financeiro, mas tem descartado a adoção de um teto para os prêmios por desempenho. A proposta do Conselho de Estabilidade Financeira é mais flexível que a de Sarkozy, por não estabelecer um limite fixo, e talvez facilite uma convergência de posições.

Com mais técnica e menos moralismo, as autoridades monetárias abrem caminho para a elevação dos padrões de segurança no mercado financeiro. Não se trata de propor apenas uma ampliação do papel do Estado e um engessamento dos mercados, mas de zelar pela estabilidade do sistema.

As lições da crise recomendam uma nova divisão entre o espaço público e o espaço estritamente privado na condução dos negócios. A atividade empresarial envolve riscos e isso é da essência do capitalismo, mas o controle e a limitação do risco interessam ao próprio sistema. Isso dá sentido à cobrança de informações mais amplas das empresas para os mercados. Um dos objetivos da nova regulação elaborada pela Comissão de Valores Mobiliários é ampliar a informação sobre os padrões de segurança das empresas para evitar, entre outras consequências, a repetição das aventuras com derivativos tóxicos. Grandes empresas brasileiras perderam muito dinheiro, durante a crise, com operações especulativas. Pelas normas propostas e ainda em consulta pública, toda empresa deverá, no lançamento de ações, informar sua exposição a riscos e discriminar seus investimentos.

LULA QUER MEIRELLES ATÉ O FINAL DE 2010
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
22/9/2009

Segundo o jornal Valor Econômico, o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, a pedido de Lula, teria desistido de se candidatar ao governo de Goiás, e assim poderá ficar até dezembro de 2010 nas suas funções atuais.

Se isso se confirmar, surge uma perspectiva favorável para a contenção da inflação no próximo ano, quando um crescimento da economia, induzido por interesse eleitoral, poderá exigir medidas preventivas de controle.

O presidente Lula sempre soube que tinha de aceitar a política ortodoxa do Banco Central para conter a inflação. E o trabalho do BC favoreceu sua reeleição. Entre Henrique Meirelles e Lula parece haver um acordo: este resistiria às fortes pressões do seu próprio partido contra a política monetária e o BC não criticaria a política fiscal do governo. Esse acordo tácito parece ter sido respeitado pelas duas partes.

A pretensão de Meirelles de disputar o governo de Goiás, onde foi o deputado mais votado antes de assumir a presidência do BC, criava uma grande preocupação para o presidente da República, já que o presidente do BC poderia apresentar sua demissão já no momento de se filiar a um partido (a última data é 3 de outubro) ou seria obrigado a isso ao oficializar sua candidatura ao governo de Goiás em abril do próximo ano.

A saída do presidente do BC poderia ser interpretada como uma quebra com a ortodoxia e Lula teria dificuldades de escolher um sucessor para um período curto, numa fase em que todas essas decisões assumem caráter eleitoreiro.

A sucessão de Meirelles já vinha preocupando os investidores estrangeiros num período em que é preciso aumentar esses investimentos. Mas a maior preocupação do governo era saber como a forte demanda dos consumidores, neste final do ano, afetará os preços e como a perspectiva de um forte crescimento econômico, no ano que vem, em caso de abandono da austeridade fiscal da parte do governo, agravará aqueles efeitos.

Lula quer maiores gastos no ano eleitoral, mas sabe também que uma retomada da inflação em plena campanha teria impactos negativos no eleitorado. Precisa contar com um BC independente para combater as pressões inflacionistas, o que, aliás, a pesquisa Focus já mostra ao prever uma taxa Selic de 9,81% no final de 2010.

Entende-se, pois, o interesse de Lula na permanência de Meirelles na presidência do BC, para ser "culpado" pelo excesso de austeridade..

INIMIGO IMAGINÁRIO
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
22/9/2009

Dada a asfixiante carga de tributos, daqui para a frente qualidade do gasto público definirá o ritmo dos avanços sociais
PAIXÕES políticas à parte, é necessário reconhecer avanços institucionais, sociais e materiais no país quando se avaliam prazos mais longos, medidos em décadas. A mais recente Pnad (Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios) divulgada pelo IBGE confirma e ajuda a avaliar esses progressos, bem como os méritos e os deméritos da atuação do poder público no período.
Mais uma vez, os números apontam um lento, mas contínuo, processo de desconcentração dos rendimentos do trabalho. A metade mais pobre da população ampliou a participação na renda nacional para 17,6% em 2008, contra 14%, dez anos antes. Parece, e é, pouco, mas se trata de uma melhora inédita desde, pelo menos, os anos 1970, quando as taxas recordes de crescimento econômico eram maculadas pelo aumento também acelerado da desigualdade.
A pobreza segue trajetória de queda, ainda que irregular. Pelos critérios do economista Marcelo Neri, do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas, os pobres, que chegaram a somar 35% dos brasileiros em 1993, haviam caído para 16% em setembro no ano passado, antes da chegada da onda recessiva trazida pela crise global.
Em parte, os avanços obedecem a um padrão vegetativo observável em qualquer território que não viva sob guerras ou tragédias humanitárias. Mas, por mais que seja difícil estabelecer causa e efeito em estatísticas como essas, parece óbvia a conexão entre os indicadores e a vigorosa expansão do gasto público desde a redemocratização do país.
As relações entre um fenômeno e outro demandam uma discussão menos simplória do que, por exemplo, o ataque ao suposto "Estado mínimo" feito pela ministra Dilma Rousseff, provável candidata à Presidência, em entrevista à Folha.
Trata-se, no Brasil, de um inimigo imaginário. Mesmo antes da Constituição de 1988, o setor público já consumia um quarto da renda nacional, fatia comparável, por exemplo, à verificada nos Estados Unidos. De lá para cá, compromissos crescentes com previdência, saúde e assistência social, fora os pesados encargos da dívida pública, levaram a carga tributária nacional a 35% do PIB, similar à de nações que passaram por experiências social-democratas.
Diante de tal hipertrofia, os resultados sociais dos últimos anos já não parecem tão impressionantes. Basta lembrar que o rendimento médio do trabalhador ainda é inferior ao de 1998, ou que a taxa de analfabetismo permaneceu estagnada no ano passado -em elevados 9,8% da população adulta.
O debate que precisa ser feito é como extrair o máximo de eficácia da ação dos governos, sem permitir que a já anômala dose de impostos, taxas e contribuições sociais comprometa o crescimento da produção de bens e serviços -a menos que se imagine uma alta ininterrupta de despesas e receitas públicas até a conquista de padrões de renda e escolaridade equivalentes aos do mundo desenvolvido.

A RENOVAÇÃO DO ÁLCOOL
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
22/9/2009

O ZONEAMENTO agroecológico da cana-de-açúcar, prometido há mais de dois anos pelo governo Lula, deixou as gavetas do palácio. Com ele, o país reconhece que não há retorno na exigência, pelo mercado global, de certificados de boa procedência ambiental e social de commodities como o álcool combustível. É a imagem da maior inovação do país no campo sensível das energias renováveis que está em jogo.
Desde que os biocombustíveis entraram em voga mundial como alternativa parcial ao petróleo, o Brasil, na condição de maior exportador, esteve sob pressão. Condições degradantes de trabalho, poluição do ar pela queima da palha antes da colheita, ameaça à segurança alimentar na competição por terras e indução ao desmatamento pesavam sobre o álcool como supostas nódoas de origem, mesmo que infrequentes.
O pacote delineado no projeto de lei e no decreto relativos ao zoneamento constitui resposta à altura. Foi excluída toda a extensão dos biomas Amazônia e Pantanal das áreas mapeadas como aptas, assim como o entorno do segundo, onde nascem muitos dos seus rios. Proíbe-se suprimir vegetação nativa, em toda parte, para cultivar cana. O crédito oficial incentivará a ocupação de pastagens abandonadas.
O Ministério da Agricultura terá de certificar, em cada aumento de área, a ausência de risco para a produção de alimentos. A mecanização completa, com consequente abandono da queima da palha, ocorrerá até 2017.
A dúvida que resta atinge o Congresso, que dificilmente votará o projeto de lei ainda neste ano. É pequeno o risco, contudo, de que a demora desencadeie um processo preventivo de desmatamento. Os próprios produtores, tudo indica, já se convenceram de que a sustentabilidade das vendas e do lucro também depende de fazer a coisa certa.

G-20 TENTA AGORA AVANÇAR EM SUA AGENDA ECONÔMICA
EDITORIAL
VALOR ECONÔMICO
22/9/2009

As reuniões do G-20, o grupo dos maiores países desenvolvidos e emergentes, acabaram envoltas em expectativas que acompanhavam a gravidade da crise econômica. Em pleno auge da crise, os mercados se mostraram céticos de que de um time tão heterogêneo de países, com interesses tão conflitantes, pudesse resultar a necessária coordenação global para debelar uma catástrofe sem precedentes desde os anos 1930. Depois de vários pacotes fiscais e de ajuda financeira, e de trilhões de dólares no mercado, a economia global começou a reagir e a expectativa que agora ronda o encontro do G-20 esta semana é a de que ele não tem mais incentivos para tomar e executar decisões importantes, que seu ânimo arrefeceu e que os encontros voltaram a ser shows tediosos e inconclusivos. Essa perspectiva é falsa.
O G-20 se consolidou como um novo instrumento supra-nacional de decisão e ação muito mais rapida e satisfatoriamente do que mesmo os mais otimistas previam no início da crise. Algumas das principais questões sobre o novo formato da economia e do sistema financeiro estão em suas mãos e dele dependem as linhas gerais de ação que podem reger o mundo nos próximos anos. A magnitude e complexidade dos problemas, e a variedade de interesses envolvidos, tornam o esforço de mediação mais tortuoso e o consenso obtido fica mais perto do possível do que do desejável. Entretanto, houve avanços notáveis e o que o G-20 precisa fazer agora não é mais de rapidez nas decisões, e sim da definição de uma agenda de reconstrução econômica clara e de persistência em sua execução.
Há um surpreendente acordo, com uma ou outra divergência periférica, sobre as melhores maneiras de impedir que as instituições financeiras voltem a colocar o mundo novamente à beira do precipício. Há medidas corriqueiras sobre a mesa, algumas inovadoras e outras radicais. O G-20 soube até agora driblar a armadilha de constituição de um órgão multilateral com poderes de decisão sobre o sistema financeiro global, como queriam os europeus. As formas pactuadas de concordância entre nações podem até ter a desvantagem da lentidão, mas são uma alternativa ao conflito aberto e paralisante que uma nova estrutura com poderes intrusivos em decisões domésticas teria.
Os bancos sairão da crise com a obrigação de elevar seu capital, de ajustar o volume de capital ao estágio do ciclo econômico (maior nos período de crescimento, menor no de crises), de reduzir seu grau de alavancagem e de adequar prudentemente sua liquidez, reduzindo o financiamento de apostas de longo prazo com dinheiro de prazo muito curto. Os bônus milionários dos executivos serão cerceados, distribuídos ao longo dos anos, com uma parcela maior em ações, atrelados não mais a metas anuais, mas plurianuais e, também, obviamente atados a resultados gerados por vários exercícios. Há um diagnóstico claro e unânime sobre as causas da crise financeira e sobre os remédios para evitar sua repetição. A questão dos bônus é a que aparece de forma mais polêmica, embora não seja a mais importante. É nela que se concentram as necessidades de os governos darem justificativas políticas para entregarem dinheiro público a banqueiros irresponsáveis que procuram prêmios em meio à catástrofe financeira. As medidas até agora propostas para disciplinar os bônus não vão muito além do senso comum, embora vários executivos a coloquem como inibidoras da busca por talentos imprescindíveis aos negócios.
Não há e não haverá no G-20 consenso sobre uma solução acabada para os desequilíbrios estruturais da economia global. O G-20 pode desempenhar um papel relevante na contenção do protecionismo, mas tem pouca força de persuasão para, por exemplo, obrigar a China a valorizar sua moeda ou fazer com que o governo chinês se apoie mais na demanda doméstica do que nas exportações. Os países desenvolvidos saíram enfraquecidos da crise e os países emergentes, que se livraram rapidamente dela, querem obter mais poder na nova ordem internacional. Dessa forma, os avanços neste ponto tendem a ser muito menores, ainda que importantes. Se o G-20 implantar sua agenda financeira, fará um progresso extraordinário. Se evoluir na econômica, realizará uma proeza.

NOVA BATALHA POR RECURSOS
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
22/9/2009

A edição de A GAZETA de 16 de outubro de 2008 publicou neste espaço um editorial sobre a proposta de reforma tributária, em tramitação na Câmara dos Deputados, cujo texto assinalava: "(...) o FER (Fundo de Equalização de Receita) vai funcionar conforme o prometido? Essa é uma dúvida atroz. Se copiar o desempenho da Lei Kandir, os Tesouros estaduais vão sofrer frustrações. Historicamente, o fluxo de repasses compensatórios nunca foi cumprido à risca pela União. Tanto no governo de FHC quanto no de Lula (...)".

Pois bem, a frustração está em vias de ser agravada. O contingenciamento pode virar interrupção total dos repasses referentes à desoneração tributária prevista na Lei Kandir. Não consta dinheiro para esse ressarcimento no Orçamento Geral da União (OGU) de 2010. Nem um centavo.

De 1996 a 1999, as indenizações previstas na Lei Kandir foram calculadas de acordo com a arrecadação do ICMS. De 2000 a 2003, prevaleceu, para efeito de cálculo, a estimativa da receita do ICMS. A partir daí, portanto desde o início do governo Lula, foram feitos acordos entre o Ministério da Fazenda e os Estados, incluindo previsões orçamentárias.

O corte total dos repasses significa a quebra do entendimento, numa lamentável decisão unilateral tomada pela União. Contradiz discurso feito há poucos dias pelo presidente da República, incentivando o aumento das exportações.

Os Estados exportadores cobram a inclusão de pelo menos R$ 5,2 bilhões na proposta do OGU 2010, valor muito abaixo da renúncia fiscal de R$ 24,4 bilhões estimada para se realizar ao longo de 2009 – apesar do desaquecimento das vendas ao exterior, em função da crise global. Bancar a conta inteirinha parece demais para unidades da Federação.

O relator do OGU de 2010, deputado Geraldo Magela (PT-DF), afirma que existe um buraco da ordem de R$ 20 bilhões nas contas que o Planalto está apresentando – mesmo sem a provisão de recursos para a Lei Kandir.

O projeto enviado pelo Executivo não reserva dinheiro sequer para cobrir o reajuste que está sendo prometido aos aposentados e pensionistas que ganham mais de um salário mínimo. Parece uma estratégia para negociar com os congressistas o corte em outras áreas. Até porque, também não há verba prevista para cobrir o total das emendas parlamentares.

No caso das compensações estabelecidas pela Lei Kandir, o governo parece ter achado um pretexto para inibir quaisquer negociações. Está tentando levar a questão para o terreno jurídico – o que nunca havia feito antes.

O Planalto sustenta que a Constituição determina obrigatoriedade de pagar o ressarcimento do ICMS aos Estados após a aprovação de uma lei complementar que ainda não existe. Enquanto isso, estaria valendo a Lei Complementar 115, de 2002, que prevê o ressarcimento somente até 2006.

Há contestação. Governos estaduais argumentam que a Carta Magna, no artigo 91 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), prevê a obrigatoriedade de o Executivo federal ressarcir os Estados pelas perdas com a Lei Kandir. Consequentemente, seria inconstitucional a inexistência de recurso para esse fim no OGU de 2010. Já tem governo estadual examinando a possibilidade de impetrar uma ação direta de inconstitucionalidade (Adim) contra a União.

Como se vê, a batalha do pré-sal não é a única que o Espírito Santo e outros Estados têm de enfrentar no Congresso. Salvo melhor inspiração, a estratégia é formar alianças entre as bancadas de Estados que têm interesse comum.

SEARA DO TSE
EDITORIAL
ESTADO DE MINAS
22/9/2009

É competência do tribunal julgar recursos contra a diplomação de eleitos

Se depender do parecer da Procuradoria Geral da República (PGR), a competência para julgar os recursos contra a diplomação de governadores, senadores, deputados federais e estaduais é exclusiva do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), conforme a Constituição (artigo 121, parágrafo 4º). No documento entregue ao Supremo Tribunal Federal (STF), a vice-procuradora-geral Deborah Duprat defende a derrubada da liminar concedida pelo ministro Eros Grau, que interrompeu o andamento de todos os processos de cassação no TSE. O plenário do Supremo deve decidir no dia 30 se mantém ou não a liminar. Ao suspender os processos, Eros Grau atendeu a uma arguição de descumprimento de preceito fundamentais (ADPF) movida pelo PDT, que argumenta que cabe na verdade aos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) julgar a legalidade das eleições estaduais e federais. Ao TSE caberia apenas analisar eventuais recursos contra essas decisões, diferentemente do que diz sua jurisprudência há décadas.

Nos últimos meses, o TSE gerou polêmica ao cassar os mandatos de três governadores – Cássio Cunha Lima (PSDB), da Paraíba, Jackson Lago (PDT), do Maranhão, e Marcelo Miranda (PMDB), de Tocantins – por irregularidades no processo eleitoral, acusados especialmente de abuso de poder político e econômico. Pelo menos outros três governadores aguardam o julgamento da corte: Ivo Cassol (sem partido), de Rondônia, José de Anchieta Júnior (PSDB), de Roraima, e Marcelo Déda (PT), de Sergipe. Roseana Sarney (PMDB), que assumiu o governo do Maranhão depois da cassação de Jackson Lago. também pode perder o mandato.

Para a PGR, a jurisprudência do TSE está correta porque o “recurso contra a expedição de diploma eleitoral” – como o próprio nome diz – tem natureza recursal, ou seja, busca combater o ato de diplomação emanado pelo próprio tribunal regional. “A ideia de devido processo legal recomenda que, sempre que possível, o reexame de uma decisão seja feita não por aquele que a proferiu, já que se presume que o autor do ato questionado não será o agente mais imparcial para revê-lo”, pondera Deborah Duprat. De fato, o TSE tem condições de fazer um julgamento mais “imparcial”, já que estaria livre de “pressões locais indevidas”. Segundo ela, não deve ser evocado nesse caso o princípio do duplo grau de jurisdição, dadas as características do processo eleitoral. Destaca ainda que o retorno dos processos de cassação aos TREs traria insegurança jurídica e inviabilizaria o julgamento dos processos antes do término dos mandatos. “É vital, sob pena de inadmissível coroamento da impunidade na seara eleitoral, com gravíssimos reflexos sobre a legitimidade da representação política nacional, que os recursos contra a expedição do diploma sejam julgados pela Justiça Eleitoral, de forma definitiva, durante o curso do mandato dos candidatos eleitos, preferencialmente no seu início”, diz Duprat. Vale lembrar que, mesmo com o julgamento único no TSE, os processos têm levado anos para ser finalizados, o que, reconheçamos, não é nada bom para a democracia.

RIGOR NA FISCALIZAÇÃO DO TRÂNSITO
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
22/9/2009

O Distrito Federal colhe resultados positivos num setor trágico no país: o trânsito, uma das principais causas de morte no Brasil, com taxa anual superior a 35 mil casos. Nos últimos 14 anos, o índice de óbitos por grupo de 10 mil veículos caiu de 14,9 para 3,8 na capital federal, uma redução de 74,4%. Ou seja, em vez de o drama se agravar com o aumento da frota, que passou de 436 mil para mais de 1 milhão de veículos entre 1995 e 2009, o que se viu foi o contrário. Mas essa é uma batalha que jamais poderá ser dada como ganha. Ainda que a taxa de acidentes fatais fosse zerada, haveria necessidade de se manter a vigilância, com controle absoluto da situação.

Preocupa, pois, a notícia de que, no DF, 25% dos autos de infração expedidos mensalmente por agentes do Departamento de Trânsito (Detran) ou policiais militares são cancelados por falta de consistência. A fiscalização é um dos principais instrumentos, junto a campanhas educativas, para os avanços conquistados até aqui. Não pode cair no descrédito. Reportagem publicada ontem pelo Correio Braziliense revela erros que seriam hilários, não fosse a gravidade da situação. Por exemplo, um motociclista multado por não usar cinto de segurança. Ou um portador de necessidades especiais três vezes notificado por estacionar em vaga especial, mesmo com o adesivo que comprova a autorização colado no para-brisa do carro.

Observe-se que a quantidade exorbitante de multas irregulares poderia ser ainda maior, não fosse parte delas anulada em análise preliminar do Núcleo de Infrações do Detran. Ou seja, mesmo depois do pente-fino, um quarto das comunicações de violação da lei que chega aos condutores é infundada. Pior: o jornal também identificou caso em que a Junta Administrativa de Recursos de Infração (Jari) manteve multa absurda, rejeitando a alegação do motorista. Fica evidente a necessidade de revisão dos processos. A persistência no erro desgasta a autoridade de trânsito, causando, mais que transtornos e aborrecimentos pessoais aos diretamente envolvidos, danos à coletividade.

Nem a credibilidade das multas nem muito menos a do órgão responsável pela execução das leis nacionais de trânsito e a segurança das vias podem ser postas em dúvida. Ante hipóteses de aplicação de sanções financeiras e administrativas quando não há condutas a serem punidas, alimenta-se a cultura da incerteza sobre os métodos e os equipamentos do sistema fiscalizador. Abre-se a porta a índices mais elevados de desrespeito às convenções do tráfego e mais impugnações à imposição das reprimendas da lei.

JULGAMENTO POLÍTICO
EDITORIAL
DIÁRIO DE CUIABÁ (MT)
22/9/2009

A Câmara de Cuiabá começou a investigação sobre os supostos desvios cometidos na época em que o Legislativo municipal era presidido pelo vereador Lutero Ponce (PMDB).

Concretizada a cassação do vereador Ralf Leite (PRTB) por quebra de decoro parlamentar, a crise institucional na Câmara parece ter arrefecido. Mas é importante pontuar que, a despeito da aparente calmaria no Legislativo – com o fim do clamor por justiça -, os vereadores têm a obrigação de se empenhar e investigar o caso Lutero com rigor.

Pesa contra o vereador a acusação de que, sob o seu comando, nada menos que R$ 7,5 milhões teriam sido sugados por um esquema de desvio de recursos públicos, segundo concluiu uma auditoria contratada pela atual presidência.

A auditoria descobriu que empresas “laranjas”, instaladas em casebres na periferia de Cuiabá – fato aliás, mostrado em primeira mão pelo Diário -, “venderam” altas somas de produtos para o Legislativo, produtos estes jamais entregues.

A investigação policial está bastante encaminhada, com a possibilidade de que os acusados, incluindo Lutero Ponce, sejam denunciados pelo Ministério Público Estadual para futuro julgamento. O trabalho da Câmara, no entanto, ainda engatinha.

Ao eleitor, que fez coro pela cassação de Ralf Leite, cabe agora cobrar de seus vereadores uma posição firme em relação a Lutero Ponce. Porque se corrupção de menores e tentativa de corrupção constituem razão para se cassar um vereador, como de fato ocorreu com Ralf Leite, também será razão o desvio de recursos públicos, caso sejam provadas as acusações que pesam contra Lutero Ponce.

Não é necessário nenhum esforço intelectual para deduzir que a acusação contra Lutero Ponce é, de longe, bem mais grave do que aquela que derrubou Ralf Leite. Mas em política, nem sempre o óbvio é certo.

Enquanto, em tese, o Poder Judiciário julga com base em preceitos técnicos e amparado pelo rigor da lei, o julgamento político, feito por pares, é sujeito a variáveis nem sempre fáceis de se identificar. Por isso, será importante, a partir de agora, cobrar dos vereadores respeito ao interesse público, transparência nos atos e senso de Justiça.

“Ao eleitor, cabe agora cobrar de seus vereadores uma posição firme em relação à investigação”

APESAR DOS SENADORES
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
22/9/2009

Os atos secretos em série, usados pelos se¬¬nadores para nomear parentes e reajustar seus próprios salários, entre outros desvios, não passaram despercebidos aos eleitores brasileiros. Ainda bem. A noção exata das medidas decorrentes dos acordos políticos que atropelam quaisquer regras em nome da permanência no poder é vital para que o cidadão busque a transformação – e não apenas pelo voto, mas principalmente pela consciência da distância entre marketing e realidade. Da distância entre o PT da propaganda política, grande defensor da ética na vida pública, e o PT que, após alcançar o poder, adota um pragmatismo político sem precendentes para manter-se nele. Tudo o que se passou no Senado está gravado na memória dos cidadãos mais atentos.
Diante do quadro, é surpreendente que a imagem do Senado tenha, em boa medida, escapado do desgaste geral. É o que revela um levantamento nacional feito pelo Instituto Análise, divulgado nesta semana. A sondagem indica que o eleitor faz distinção entre a instituição e seus ocupantes temporários. Dos mil entrevistados no levantamento realizado no fim de agosto, 52% disseram concordar com a premissa de que o Senado é importante, assim como a Câmara, para “aprimorar as leis”.
Na mesma pesquisa, o porcentual dos que indicaram que o Legislativo brasileiro pode seguir adiante somente com a Câmara foi de significativos 35%. Mas talvez o dado mais animador do levantamento esteja oculto no que o eleitorado não disse: se há brasileiros dispostos a prescindir do parlamento, eles estão diluídos entre os 13% que não souberam ou não quiseram responder. Um saldo favorável e tanto considerando-se um cenário político de tantos desmandos no Senado e, não nos enganemos, também na Câmara e em outras instâncias do governo.
Os numerosos escândados do governo federal – mensalão, dossiês, condução da crise aérea, dentre outros – mostram que o presidente Lula não tem medido esforços para defender as oligarquias que sustentam seu governo. O pacto entre a velha oligarquia, bem personificada por José Sarney, e a nova elite de Lula é a etapa final de uma história anunciada, ao menos para aqueles que intuíam aonde chegaria o partido de inspiração marxista, disposto a pagar qualquer preço pelo poder.
A bandeira da ética – está claro – serviu bem para a propaganda ilusória. A máquina pública foi loteada e aparelhada pelo PT de modo a criar uma rede de proteção para o projeto político de perpetuação no poder. Nesse processo, incluiu-se também a ingerência do governo no Le¬¬gislativo, um dado que também transpareceu na sondagem do Instituto Análise. Pouco mais de um terço dos mil entrevistados afirmaram que o presidente tem como atribuição aprovar leis para o país. O que parece ser mero engano quanto ao papel dos poderes pode ser lido também como uma percepção da pressão, por meio da oferta de cargos e favores, do Executivo sobre os parlamentares.
O resumo da ópera é que o eleitor não é tolo. Sabe da importância do Legislativo e não embarca na perigosa ideia de um Congresso fechado. Resta agora canalizar essa percepção para um cenário em que a distinção dos três poderes que sustentam a democracia seja mais clara. Um cenário em que a vida pública não seja regida pela ânsia de poder a qualquer preço.

CONFUSÃO
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
22/9/2009

Quando o governo brasileiro anunciou que emprestaria 10 bilhões de dólares ao FMI, vozes surgiram dizendo que esse dinheiro deveria ser usado para um programa de obras públicas internas. A confusão de muitos é não entender que o Brasil formou reservas internacionais em dólares porque passou a ter superávits nas suas transações com o resto do mundo e que essas reservas em dólares pertencem ao país. Se o governo federal resolvesse apropriar-se dessas reservas para gastá-las em obras internas, ele teria que entregar os dólares ao Banco Central e trocar por reais a fim de pagar os executores das obras. O Banco Central mandaria, de novo, os dólares para aplicação no exterior e o Tesouro Nacional ficaria devendo, ao Banco Central, os reais que dele pegou na troca de moedas. Ou seja, seria o mesmo que obrigar o Banco Central a emitir dinheiro e emprestar ao governo. Enfim, trata-se de uma grande confusão sobre o complexo mundo das finanças internacionais. Dessa confusão nascem palpites equivocados, como o de muitos deputados aliados do próprio governo.

UM DIA SEM CARRO
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
22/9/2009

O Dia Mundial sem Carro volta a ser lembrado hoje ainda sem o grau de adesão necessário num país às voltas com o caos no trânsito e suas consequências no caso das grandes metrópoles, mas desta vez com o aval expresso do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) e do Ministério das Cidades. Há uma boa intenção no apoio oficial, mas também um pouco de demagogia: como estimular as pessoas a deixarem seus veículos em casa em cidades que não contam com ciclovias nem com transporte público eficiente, muitas das quais não dispõem nem mesmo de metrô? O problema é real, grave e urgente – e todos os cidadãos devem se conscientizar disso. Mas, para combatê-lo, não bastam atos simbólicos. O país precisa é de ações efetivas e permanentes em todos os níveis da administração pública.

Nas proporções alcançadas hoje, particularmente nas cidades de médio e grande portes, o colapso no sistema de transporte exige muito mais do que um dia para ser lembrado. A data, porém, tem o mérito de servir para reflexão e como alerta sob o ponto de vista ambiental e do trânsito. O drama enfrentado diariamente por quem circula hoje por vias urbanas e rodovias provoca consequências cujo enfrentamento não tem mais como ser adiado. Os efeitos precisam envolver tanto ações governamentais quanto a colaboração efetiva da sociedade, em conjunto e individualmente. Como em qualquer área relacionada às questões ambientais, também nessa a conscientização em relação ao problema e o esforço de cada um são essenciais para assegurar ganhos, por menores que sejam.

Sob o aspecto da qualidade do trânsito, é óbvio que qualquer melhoria depende tanto do menor uso de veículos particulares quanto de investimentos em alternativas eficientes de transporte coletivo. Mas, para assegurar avanços também sob o ponto de vista da qualidade do ar, é preciso haver mais cobrança e mais investimentos em favor de veículos menos poluentes. Embora a principal causa do chamado efeito estufa no país seja o desmatamento, não há como reduzir as emissões de gás carbônico nas proporções necessárias para conter os danos à saúde da população sem uma readequação imediata da política de transportes.

Emergencialmente, é importante pôr em prática ações como as previstas para hoje, como a preferência pelo transporte coletivo, a decisão de deixar o carro em casa ou de exercitar a carona solidária, e a de recorrer a deslocamentos a pé ou de bicicleta. Ainda assim, embora a conscientização sobre o problema venha aumentando, as últimas atividades marcadas para lembrar a data demonstram que o avanço ocorre num ritmo inferior ao necessário. A programação de hoje já terá cumprido seu papel se contribuir para reforçar a compreensão coletiva de que os problemas de trânsito começam a fugir ao controle e precisam ser incluídos logo, efetivamente, como prioridade na agenda do poder público.

O LIXO CONSOME A PRAIA
EDITORIAL
JORNAL DO COMMERCIO (PE)
22/9/2009

O sol escaldante, as águas mornas e a faixa larga de terra nua convidam para o prazer e o descanso. Mas um odor forte, objetos estranhos na água e sobras de comida e bebida na areia podem fazer qualquer um pensar duas vezes antes de voltar: o lixo da praia é a praia no lixo, que não se esconde e não tem desculpa, feito a casa desarrumada. O refugo ameaça o deleite, e o consumo na praia traz o risco da praia consumida.
No último dia 12, a Prefeitura do Recife, em parceria com a iniciativa privada, deu a partida no Projeto Praia Limpa, que visa à conscientização dos usuários em toda a extensão da costa recifense. A iniciativa é louvável, mas para que a mensagem da campanha seja assumida pela população e assimilada pelos turistas, a prefeitura tem que fazer a parte dela – e que vem a ser muito mais do que distribuir sacos reciclados e reclamar da sujeira dos outros. Um exemplo da culpa municipal é o esgoto que corre para a praia em pleno cartão-postal de Boa Viagem, situação que em nada colabora para o bem-estar de quem anda na areia, ou para a atividade turística. Sem falar na feia onda de sujeira que vem à tona, também em Boa Viagem, sempre que a maré baixa. A realização de “mutirões” de grande impacto midiático e baixa durabilidade não passam de paliativos, diante do recolhimento permanente, única solução confiável.
Durante o primeiro feriado prolongado do verão 2009/2010, em 7 de Setembro, as principais cidades litorâneas do Estado tiveram uma amostra dos transtornos que devem se repetir – e se agravar – entre dezembro e fevereiro. Entre eles está o acúmulo de dejetos deixado pelo afluxo elevado de pessoas que ocupam ambientes naturais desprotegidos e áreas urbanas mal guarnecidas de serviço de coleta e limpeza para o excesso de movimento.
Para se ter uma ideia, a estimativa da Prefeitura de Itamaracá é de que a população seja multiplicada por cinco vezes nos finais de semana no próximo período de veraneio. Um número de assustar qualquer gestor público. A prestação de serviços básicos torna-se um desafio. Quanto mais gente, mais sujeira, mau cheiro, entulhos e insetos. O prefeito afirmou, com toda razão, que o lixo será a grande dor de cabeça de Itamaracá neste verão.
Em Ipojuca, onde se situa Porto de Galinhas, a prefeitura anunciou, logo após o feriado, um conjunto de medidas emergenciais para tentar sanar o problema. Considerada por muitos como a praia mais bonita do Brasil, Porto não quer ser conhecida como o destino mais sujo do litoral.
Como a antecipação do verão é um fato consumado, adotar desde já uma estratégia de controle urbano, especialmente no que concerne à gestão de resíduos, deveria ser a regra para todos os municípios do nosso litoral. Em qualquer paradeiro do mundo, a paisagem mais bela, maculada pela sujeira, não faz o turista levar boa lembrança na bagagem. Além da má imagem, o lixo nas praias representa, a médio prazo, a redução de visitantes e a fuga de empreendimentos instalados ou projetados no local.
A poluição em contato direto com o corpo, como é o caso da poluição praieira, indica por outro lado a fragilidade exposta do poder público, incapaz de fiscalizar e fazer cumprir normas civilizadas de uso desses espaços. Campanhas educativas – como Praia Limpa – teriam que ser deflagradas o ano inteiro, com o objetivo de disciplinar comerciantes e visitantes, minimizando o dano ambiental e promovendo a desejável sustentabilidade. Se esta é uma tarefa que extrapola a capacidade dos municípios, que sejam firmadas parcerias com os governos estadual e federal, já que se trata de assunto de interesse coletivo que envolve todos os níveis de governo.
Para que a praia no verão não vire lixão, é importante apelar à cidadania, e exigir do turista a atitude responsável de zelar pelo meio ambiente, sem a agressão do desleixo. Depois, afinal, o consumidor que polui virá reclamar da poluição consumada, sem atentar para o dever que também é dele. Contudo, somente ações integradas de governo responderão pelas demandas urgentes de saneamento, controle e manutenção desses locais privilegiados para o desfrute do corpo e da alma, onde se pode usufruir, democraticamente, de um banho de sol à beira-mar.

OUTORGA PRECISA SER HONRADA
EDITORIAL
A CRÍTICA (AM)
22/9/2009

É grande o desafio e a responsabilidade do prefeito eleito de Coari, Arnaldo Mitouso. No último domingo, ele saiu-se vitorioso em eleição suplementar realizada pelo Tribunal Regional Eleitoral, o TRE, em função da vacância desse cargo gerada pela cassação do mandato do então prefeito Rodrigo Alves.

O resultado, apertado, mostra, por um lado, que houve manifesto desejo de mudança da população coariense e, por outro, que o grupo que estava no poder ainda respira, por assim dizer, em que pese aos desmandos de toda ordem e grau praticados à frente da coisa pública.

A contagem final dos votos atesta isso, pois Mitouso recebeu 16.256 deles contra 14.427 dados ao seu principal adversário, Manuel Vicente, num dia cívico em que, dos 40.619 eleitores aptos a votar, 9.030 deixaram de comparecer às urnas.

A propósito, essa expressiva ausência, mais do que um ato de desobediência cívica, sugere, entre outras coisas, profunda indiferença no que tange aos destinos da administração pública, quem sabe, animada pela ideia equivocada que muitos eleitores cultivam de que político é tudo “farinha do mesmo saco”.

Daí, em parte, vem o desafio que Mitouso terá pela frente, agora na condição de prefeito eleito do segundo município mais rico do Amazonas, graças, obviamente, aos royalties oriundos do petróleo e do gás natural extraídos na província de Urucu.

Caberá a ele provar, por exemplo, que é furada a tese de que gente de seu metiê é tudo a mesma coisa, visto que dela se aproveitam especialmente os maus políticos, desses que almejam o poder pelo poder e, uma vez no cargo, costumam agir como verdadeiros déspotas esclarecidos.

Esse desafio, no entanto, será tanto mais facilmente superado quanto maior for o nível de responsabilidade pública de Mitouso e do grupo político que lhe dá sustentação.

Nesse aspecto, para início de conversa, basta que o prefeito eleito faça um exame realmente crítico do legado do grupo derrotado, para daí se extraírem caminhos diversos que levem a um reencontro com a moralidade pública em Coari.

Sem esse cuidado elementar, por isso indispensável às pretensões da nova administração, Mitouso estará contribuindo para manter as coisas como estão e/ou sempre foram, o que não condiz com a procuração que lhe outorgou o povo coariense no último domingo. Ele que procure honrá-la.

24/9/2009 - EDITORIAIS

ZONA DE RISCO
EDITORIAL
O GLOBO
24/9/2009

A situação criada em Honduras com a volta do presidente deposto Manuel Zelaya e seu refúgio na Embaixada do Brasil põe o país à beira de um confronto imprevisível e deixa Brasília em situação muito desconfortável. Os choques entre forças do governo de fato e partidários de Zelaya já haviam causado uma morte, além de vários feridos e mais de cem presos. A posição delicada em que se encontra a diplomacia brasileira ficaria insustentável se surgissem indícios de que Brasília colaborou, de uma forma ou de outra, para o retorno do político. A desconfiança está no ar. O jornal “The New York Times” estampou ontem, com destaque, a foto do presidente deposto dormindo na embaixada, com a legenda: “Um longo caminho para casa, mas como ele chegou lá?” A versão oficial é de que não houve intervenção brasileira. Segundo o chefe do Departamento de América Central e Caribe do Itamaraty, Gonçalo Mourão, “(Zelaya) praticamente se materializou na embaixada”.
Continuamos em zona de risco, graças sobretudo ao padrão errático da diplomacia brasileira, que ora reflete a importância do país no mundo, ora se reveste de um superado terceiro-mundismo populista de viés esquerdista. Por exemplo, após a posse do presidente Lula para o primeiro mandato, houve uma atabalhoada intervenção do Brasil a fim de supostamente reduzir as tensões que se verificavam então na Venezuela entre o governo Chávez e as oposições.
Mas foi uma ação tendenciosa, a favor de Chávez. A criação do Grupo dos Amigos da Venezuela, com participação brasileira, afinal atenuou o mal-estar.
Ao abrir ontem, como de praxe, a Assembleia Geral da ONU, o presidente Lula foi aplaudido ao afirmar que “a comunidade internacional exige que Zelaya reassuma imediatamente a Presidência e deve estar atenta à inviolabilidade da Embaixada do Brasil”. É verdade que o retorno de Zelaya se trata de exigência internacional, e que a situação na embaixada, superlotada de partidários do presidente deposto e cercada por tropas, é muito difícil. A violência seria a pior saída.
O mais indicado é uma negociação multilateral, via OEA, com base no plano Oscar Árias, apresentado em julho e rejeitado pelo presidente de fato, Micheletti, e, em menor escala, por Zelaya. Ele prevê a volta deste à Presidência, com poderes reduzidos, um governo de unidade nacional sob supervisão internacional e eleições antecipadas.
Enquanto isso, o Brasil tem de se precaver ao máximo para se afastar de qualquer operação que tenha as impressões digitais bolivarianas.
Se é que isso ainda é possível.

MAU ENSAIO
EDITORIAL
O GLOBO
24/9/2009

A menos de dois meses e meio para a conferência de Copenhague, quando o mundo terá a grave responsabilidade de definir metas de redução de emissões que aceleram mudanças climáticas, mais de cem líderes aproveitaram a presença em Nova York, para a assembleia anual da ONU, e, na terça-feira, realizaram amplo encontro com vistas à reunião na capital da Dinamarca.
Não foi um bom ensaio.
Do encontro entre os representantes dos maiores poluidores do planeta, Barack Obama, pelos Estados Unidos, e Hu Jintao, pela China, pouco de concreto foi dito, embora respondam por 40% das emissões mundiais. Entende-se a posição de Obama. Ele depende do Congresso para aprovar um plano de corte de emissões, já avalizado pela Câmara dos Representantes e agora inscrito na agenda do Senado, mas onde todo o esforço de negociações tem sido despendido na tentativa de formulação de uma reforma politicamente palatável do sistema de saúde americano.
Mas a China, uma ditadura socialista de “mercado”, poderia ter sido mais objetiva. O país, reconheçase, dá demonstrações de ter acordado para o sério problema ambiental criado para os próprios chineses pelo longo período de crescimento econômico acelerado sem qualquer preocupação com a qualidade do ar, da água e do solo.
A China passou a fazer investimentos para limpar a matriz energética — por sinal, das mais sujas, pois se baseia fortemente em termelétricas a carvão. O presidente Jintao, entretanto, apenas prometeu reduzir emissões “por uma margem razoável”.
Que seja mesmo, pois o desafio para Copenhague é chegar-se a um acordo pelo qual a temperatura média mundial não ultrapasse o patamar de dois graus centígrados acima dos níveis pré-revolução industrial. E para isso, calculam cientistas, pelo menos as economias industrializadas terão de, até meados do século, diminuir em 80% as emissões.
Quanto aos Estados Unidos, as esperanças estão depositadas nas promessas de Obama de um grande salto tecnológico na busca de fontes energéticas limpas.
Brasil, China e Índia, por sua vez, já perceberam que o discurso de que corta mais quem poluiu mais — para jogar o maior peso das responsabilidades sobre os países industrializados — caiu em desuso. Afinal, tornaram-se, também, grandes emissores — no caso do Brasil, muito por causa de queimadas e desmatamentos.
A tepidez da reunião de terçafeira não poderá se repetir na estratégica conferência de dezembro na Dinamarca.

O JOGO DE EMPURRA DOS MANDA-CHUVAS
EDITORIAL
JORNAL DO BRASIL
24/9/2009

RIO - Foi frustrante o resultado do encontro sobre o clima na sede da ONU, em Nova York, em que ficou patente a falta de compromisso dos dois maiores poluidores do planeta, Estados Unidos e China, em reduzir suas emissões de gases do efeito estufa. Juntos, estes dois países respondem por 40% do CO2 do planeta, mas ficou claro que o jogo de empurra em assunto tão fundamental ainda tende a predominar no debate.
O presidente Barack Obama, cuja eleição foi saudada mundialmente como uma redenção pelo que traria de bons ares para a discussão, não disse a que veio. Habilidoso nas palavras, a forma foi apenas floreio para o vazio de conteúdo e a ausência de propostas concretas. Preferiu enfatizar que o problema ambiental é uma responsabilidade de todos os países, ricos e pobres, como se não houvesse maiores diferenças nos níveis de emissão entre eles.
Por sua vez, o presidente da China, Hu Jintao, espertamente, jogou o “planeta quente” para cima dos países desenvolvidos, afirmando que, historicamente, desde a Revolução Industrial, eles são os responsáveis pelo efeito estufa. Jintao até que tentou mostrar boa vontade. Disse que a China vai se comprometer a reduzir suas emissões de modo “notável” – o que é vago –, a ter 15% de sua energia limpa até 2020 e plantar árvores. É muito pouco.
Pelo que o encontro tem de premonitório, ficou-se com a impressão de que nuvens sombrias se aproximam de Copenhague, capital da Dinamarca, onde daqui a menos de três meses haverá a reunião de cúpula cujo objetivo é estabelecer novas metas que irão substituir o combalido Protocolo de Kyoto.
Obama, ainda que com uma dose de razão mas aproveitando lamentavelmente a existência de um obstáculo conjuntural, previu que os efeitos da crise econômica mundial serão um empecilho para a costura de um acordo auspicioso em Copenhague. Em meio à recessão, afirmou o presidente americano, os países irão priorizar a revitalização de suas economias, à custa de avanços ambientais. É mais um lance do jogo de empurra, que não contribui em nada para se enfrentar de vez, como cunhou o ex-vice-presidente dos Estados Unidos Al Gore, essa “verdade inconveniente”.
O resultado decepcionante da reunião envolvendo grandes líderes mundiais, no entanto, aconteceu no mesmo dia em que outro movimento, de caráter espontâneo, e com a participação do cidadão comum, trouxe esperanças da introdução não só de regras e metas mas de uma nova mentalidade. A adesão ao Dia Mundial sem Carro, pelos habitantes de cidades como o Rio de Janeiro, Curitiba e, em menor grau, de São Paulo, mostra como ações em prol do meio ambiente encontram terreno fértil, mesmo quando isso significa abdicar de certos hábitos arraigados. Dados da Prefeitura do Rio, por exemplo, indicam que houve uma substantiva redução do fluxo de carros, com a opção pela bicicleta e pelos meios de transporte público.
O movimento, surgido na Europa há 11 anos e que já se espalha por 40 países, é uma lição que vai de baixo para cima e empurra, positivamente, para os manda-chuvas a responsabilidade urgente: façam sua parte.

SELO DE QUALIDADE PARA O PAÍS
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
24/9/2009

O Brasil tem agora o selo de qualidade de três das principais agências de classificação de risco. Isso consolida sua posição como mercado não só atraente, mas também seguro para o capital internacional. Os dois primeiros selos foram atribuídos ao País em abril e em maio do ano passado, quando a Standard & Poor"s e a Fitch anunciaram sua elevação ao grau de investimento. A decisão da Moody"s, quase um ano e meio depois, não surpreendeu o mercado, mas tem um valor especial por dois motivos. Primeiro, por ter ocorrido antes da superação da crise mundial, quando várias grandes economias ainda patinam na recessão. Segundo, porque alguns fundos de investimento só podem aplicar o dinheiro de seus associados em países e empresas com a garantia de pelo menos três agências.

O Brasil atingiu essa condição e isso acabará influindo nas decisões daqueles fundos dentro de algum tempo. Não há pressa, neste momento, porque o País dispõe de reservas suficientes para sua segurança externa e também porque o mais importante, a curto prazo, é atrair investimentos diretos, isto é, destinados ao setor produtivo e não ao mercado de títulos.

A elevação do Brasil ao grau de investimento foi motivada em parte por seu desempenho econômico durante a crise global, segundo nota assinada pelo diretor da Moody"s para a América Latina, Mauro Leos. O País foi qualificado, nessa nota, como um dos "vencedores" identificados pela agência de classificação nesta fase de turbulência financeira. Mas a concessão do grau de investimento depende principalmente de fatores como o grau de solvência do setor público, a relativa estabilidade dos preços e a solidez das contas externas.

Essas condições dependem de políticas prudentes e firmes, nem sempre populares por seus efeitos de curto prazo. Durante a crise, o governo tomou medidas expansionistas, principalmente por meio de cortes de impostos para estimular o consumo em alguns setores. Além disso, a contração econômica afetou a receita de impostos e um dos efeitos foi o aumento da relação entre a dívida pública e o Produto Interno Bruto (PIB). Esses efeitos tendem a ser temporários, admitem os analistas da Moody"s, e a piora de alguns indicadores não os impediu de atribuir ao País, além do grau de investimento, uma perspectiva positiva.

Uma nova promoção dependerá, no entanto, de novos progressos na consolidação do quadro fiscal, isto é, das contas públicas. Trata-se de saber, portanto, se o governo será capaz não só de promover o crescimento da economia, nos próximos anos, mas também de apresentar resultados melhores na administração de suas contas. Os analistas da Moody"s, por enquanto, parecem otimistas quanto a essa possibilidade.

Mas outros especialistas têm mostrado crescente preocupação com a tendência das contas públicas brasileiras. No começo do mês, a Fitch, a segunda agência a atribuir ao Brasil o grau de investimento, chamou a atenção para a piora das contas brasileiras.

"A estrutura do gasto público do Brasil está-se deteriorando, porque uma parte significativa de seu aumento está relacionada com benefícios de aposentadoria e pagamento de pessoal", disse a diretora sênior do grupo de risco soberano da agência, Shelly Shetty.

A inversão da tendência será difícil, acrescentou a especialista, porque esse aumento da despesa não é classificável como estritamente anticíclico. Outros países combateram a recessão com elevação dos investimentos públicos e corte de impostos. As duas medidas, ao contrário da majoração de salários e de pensões, são reversíveis depois da crise.

Na semana passada, o governo anunciou planos equivalentes a um rebaixamento da meta fiscal de 2009. O ministro da Fazenda nega a intenção de reduzir o superávit primário, mas será esse o resultado, se o governo tirar do cálculo os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Se alguma folga for conseguida com esse expediente, será usada certamente para maiores gastos de custeio.

O grau de investimento atribuído ao País por três grandes agências é o reconhecimento do efeito ? acumulado ao longo de muitos anos ? de políticas acertadas. É o resultado de escolhas formuladas nos anos 90 e essencialmente mantidas pelo atual governo. A prioridade a interesses eleitorais pode comprometer essa conquista. Ainda se pode evitar esse erro.

O STF E OS REMÉDIOS DO SUS
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
24/9/2009

Recorrendo ao princípio da "repercussão geral", o Supremo Tribunal Federal (STF) avocou para si a responsabilidade de definir o destino de grande número de liminares que têm sido concedidas pelas instâncias inferiores da magistratura contra o poder público, obrigando-o a fornecer gratuitamente remédios de alto custo que não constam da lista do Sistema Único de Saúde (SUS), e abriu um precedente que terá, a partir de agora, de ser seguido por todos os tribunais do País. A "repercussão geral" é um mecanismo que permite à mais alta Corte do País agilizar o julgamento das chamadas "ações de massa" ? ou seja, dos processos que interessam a contingentes expressivos da população.

As autoridades municipais, estaduais e federais do setor de saúde vinham alegando que, pela legislação em vigor, elas são obrigadas a fornecer apenas os remédios previstos pela lista do SUS. Mas, baseando-se no artigo 196 da Constituição, que define a saúde como "direito de todos e dever do Estado", promotores de Justiça e defensores públicos, com apoio de ONGs, vinham pedindo à Justiça liminares para obrigar o poder público a fornecer, regular e gratuitamente, remédios de última geração para doenças específicas e de tratamento prolongado ? como aids, esclerose múltipla e doença renal crônica.

Para as autoridades de saúde, ao acolher os recursos impetrados pelos Ministérios Públicos estaduais e pelas Defensorias Públicas, as instâncias inferiores da magistratura estariam desorganizando o planejamento e as finanças dos municípios, dos Estados e até da própria União. Em São Paulo, por exemplo, onde tramitam mais de 25 mil ações, a Secretaria Estadual da Saúde gasta R$ 25 milhões por mês para cumprir ordens judiciais de distribuição de medicamentos que não constam da lista do SUS. No Rio Grande do Sul, onde foram impetradas 4,5 mil novas ações só no primeiro semestre de 2008, o gasto é de R$ 6,5 milhões mensais. Segundo o Ministério da Saúde, as diferentes instâncias governamentais já teriam destinado, este ano, R$ 2 bilhões para cumprir liminares.

Reclamando do que chamam do "excesso de ativismo" de promotores e defensores públicos e de "judicialização da saúde", as autoridades do setor também vinham afirmando que muitos dos remédios novos que são obrigadas a distribuir por determinação judicial custam muito caro, são comercializados somente no exterior e não foram registrados no Brasil por seus fabricantes. Segundo as autoridades da saúde,os medicamentos similares previstos pela lista do SUS, produzidos no País, sairiam mais baratos para os cofres públicos e teriam o mesmo efeito terapêutico. Refutando esse argumento, ONGs e entidades médicas alegam que a lista do SUS está sempre defasada e não acompanha a evolução da medicina.

Como a discussão envolve aspectos técnicos e interessa a toda a sociedade, o STF teve o cuidado de realizar audiências públicas. Foi a primeira vez que a Corte utilizou esse expediente, previsto por lei, para balizar suas decisões. E, ao julgar o caso, ela decidiu contrariamente às pretensões das autoridades do setor de saúde. Para o STF, em outras palavras, as instâncias inferiores da magistratura podem continuar concedendo liminares para obrigar o poder público a fornecer medicamentos que não constam da lista do SUS. Mas, para evitar abusos, a Corte enfatizou que, quem recorrer à Justiça, terá de demonstrar a "ineficácia ou impropriedade" dos remédios fornecidos pelo SUS. "A Corte teve bom senso. Claro que a prioridade é a política do SUS, sempre que não for comprovada a eficácia do tratamento solicitado", diz o defensor público da União Leonardo Mattar. "Ficou como já está. Melhor assim", afirmou Mário Scheffer, conselheiro do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde.

A decisão do STF já produziu efeito. Assim que foi divulgada, o Ministério da Saúde comunicou que, até dezembro, atualizará protocolos referentes a 83 doenças. A iniciativa mostra que o órgão finalmente descobriu que sai muito mais barato manter a lista do SUS atualizada do que ter de arcar com gastos para cumprir decisões judiciais.

A CPMI DO MST
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
24/9/2009

Na semana passada a senadora Kátia Abreu (DEM-TO) e os deputados Onix Lorenzoni (DEM-RS) e Ronaldo Caiado (DEM-GO) protocolaram no Senado um requerimento para a criação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) destinada a investigar os repasses de recursos públicos para o Movimento dos Sem-Terra (MST). Não era sem tempo e os parlamentares demonstraram sensibilidade para a importância do assunto, tanto que foram obtidas 192 assinaturas na Câmara dos Deputados ? quando bastariam 171 ? e 34 no Senado ? quando bastariam 27 ? para a instalação da comissão de investigação. Já contra a instalação da CPMI foi divulgado um manifesto com 60 assinaturas, entre elas as dos militantes Plínio de Arruda Sampaio, Leonardo Boff e Antonio Cândido, que protestam contra as tentativas "de criminalizar" as ações do MST.

O objetivo imediato da CPI mista é apurar a denúncia veiculada pela revista Veja, sobre convênios irregulares celebrados entre o governo federal e entidades ligadas ao MST ? já que este deliberadamente não tem existência legal, para não ser fiscalizado ?, e averiguar qual é a verdadeira origem de recursos repassados por ONGs nacionais e estrangeiras para esse movimento dito "social". Tratando-se de CPI mista, a leitura do requerimento para sua instalação será feita em sessão do Congresso.

Pelo exame das movimentações bancárias de quatro entidades consideradas as principais caixas-fortes do MST ? a Associação Nacional de Cooperação Agrícola (Anca), a Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil (Concrab), o Centro de Formação e Pesquisas Contestado (Cepatec) e o Instituto Técnico de Estudos Agrários e Cooperativismo (Itac) ? a reportagem da revista descobriu a fonte de financiamento das invasões, ocupações e outras atividades criminosas, revelando que "o MST montou, controla e tem a seu dispor uma gigantesca e intricada rede de abastecimento e distribuição de recursos, públicos e privados, que transitam por dezenas de ONGs". A matéria comprova aquilo que de há muito se sabia e o Estado sempre denunciou: o MST é movido por muito dinheiro, captado basicamente nos cofres públicos e junto a entidades internacionais. Assim, na invasão de prédios públicos, depredações e saques de cabines de pedágio, acampamentos em rodovias, invasões e ocupações de fazendas particulares, em tudo isso há o dinheiro dos impostos arrecadados dos contribuintes.

A CPMI terá um substancioso material para analisar. As quatro entidades, ligadas ao MST, já mencionadas, receberam R$ 43 milhões, em convênios com o governo federal, de 2003 a 2007 ? e não por acaso há uma grande concentração de gastos às vésperas das manifestações mais estridentes dos sem-terra. Essas quatro entidades receberam R$ 20 milhões em doações do exterior entre 2003 e 2007, sem que sua contabilidade fosse devidamente informada à Receita Federal. Parte substancial desses recursos foi repassada a empresas de transporte, gráficas e editoras vinculadas a partidos políticos e ao MST, havendo coincidências entre as datas de transferência do dinheiro para o Brasil e as campanhas eleitorais de 2004 e 2006.

Por outro lado, levantamentos oficiais indicam que entre 2003 e 2008 cerca de 30 entidades de trabalhadores rurais receberam do governo federal o equivalente a R$ 145 milhões, repassados em forma de convênios, em geral para cursos de treinamento. Mas o Tribunal de Contas da União já identificou irregularidades em vários desses cursos, tais como cadastro de alunos inexistentes e despesas não justificadas por notas fiscais ou lastreadas com notas frias. É de supor, pela expansão cada vez mais organizada do MST e de suas entidades conexas, com ou sem existência legal ? e que em suas operações de amplitude nacional afrontam o ordenamento jurídico do País ?, que haja muito mais a investigar. Como lembrou a senadora Kátia Abreu, "o MST não tem nem nunca teve nenhum propósito de conseguir um pedaço de terra. É um grupo criminoso, que age à margem da lei, que produz intranquilidade e violência no campo". Resta saber até que ponto o Estado Democrático de Direito, instalado no Brasil, ainda tem o poder de fazer cumprir a lei. A CPMI do MST será uma boa oportunidade de o demonstrar.

A VOLTA DOS USURÁRIOS DA IDADE MÉDIA
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
24/9/2009

Os cartões de crédito usados pelas pessoas físicas são largamente favorecidos pelas instituições financeiras, que os oferecem sem análise criteriosa da capacidade de endividamento dos mutuários. Mas a preferência por eles vai muito além das comodidades que oferecem.

Com efeito, quando se compra um automóvel ou outro bem de consumo durável, a operação está garantida pelo bem, que pode ser recuperado pelo vendedor. Um empréstimo bancário não liquidado faz com que o devedor tenha seu nome inscrito na Serasa. No entanto, uma dívida no cartão de crédito pode ser refinanciada nas instituições financeiras, embora a um custo exorbitante (em julho, de 237,9% ao ano).

As dívidas acumuladas em cartões de crédito somavam, em julho, R$ 26,49 bilhões, com concessões acumuladas no mês de R$ 14,566 bilhões, a uma média diária de R$ 633 milhões (era de R$ 466 milhões em julho de 2008), com prazo médio de 62 dias (30 dias um ano atrás).

O crédito pessoal, em julho, somava R$ 164,3 bilhões, dos quais R$ 65,1 bilhões no modelo consignado, com taxa de juros de 28% ao ano. A diferença dessa taxa para a dos cartões mostra por que os bancos se interessam em promover o crédito por meio deste instrumento de pagamentos, apesar dos juros absurdos exigidos para financiar os atrasos. Isso deveria justificar uma regulamentação da distribuição de cartões e dos prazos para esse tipo de crédito.

Com efeito, como mostramos em nossa edição de ontem, um empréstimo de R$ 1 mil, aos juros atuais, depois de um ano representará uma dívida de R$ 3,379 mil. No momento em que se quer favorecer o comércio varejista, seria certamente necessário promover uma campanha para dissuadir as famílias de atrasarem o pagamento das suas dívidas com cartões.

Segundo a Serasa, em agosto a inadimplência dos consumidores caiu 5,1% em relação a julho. Porém nos oito primeiros meses do ano aumentou 9,5% em relação ao mesmo período de 2008.

Os débitos com bancos representam 44,2% da inadimplência, ante 43,2% no mesmo período de 2008. A dívida com cartões de crédito participa em 36,5% da inadimplência, mas cresceu muito em relação a 2008 (32,5%). Essa evolução mostra que cabe às autoridades monetárias fixar normas que impeçam as famílias de cair num mecanismo que se mostra tão pernicioso quanto eram os empréstimos dos usurários da Idade Média.

DO GOLPE À AVENTURA
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
24/9/2009

Nada é unívoco na crise em Honduras, agravada pela presença do líder deposto Manuel Zelaya na embaixada brasileira

A CRISE política em Honduras alcança novos patamares de tensão com a presença do presidente deposto, Manuel Zelaya, na embaixada brasileira em Tegucigalpa -onde se encontra abrigado desde segunda-feira.
A embaixada está cercada por forças militares. Cortaram-se suas comunicações telefônicas. Organizações não-governamentais levam mantimentos às dezenas de pessoas apinhadas no local -que, conforme as convenções internacionais, constitui território brasileiro soberano.
A suspensão imediata do cerco acrescenta mais um item relevante ao conjunto de condições apresentadas pela comunidade internacional para superar-se o isolamento em que se encontra o atual governo hondurenho.
As forças golpistas, entretanto, resistem a qualquer concessão. O governo Micheletti rejeitou a proposta de acordo apresentada por Oscar Arias, presidente da Costa Rica e Prêmio Nobel da Paz, que previa a volta de Zelaya ao poder, num governo de conciliação nacional, com anistia a todos os envolvidos na crise. Esse continua sendo o melhor caminho para superá-la.
Todavia, não são as resistências do atual governo o único fator de agravamento da situação. Nada é unívoco no quadro hondurenho, e as atitudes de Zelaya não correspondem em absoluto ao papel de mártir da democracia que lhe tem sido atribuído.
Zelaya tentou aplicar, contra uma cláusula pétrea da Constituição de seu país, o modelo chavista da permanência no poder, viabilizada por plebiscito popular. Naquela altura, já estava em curso a campanha para a sucessão presidencial -em que seu candidato tinha poucas chances de vencer.
A tentativa de tumultuar o processo democrático -vale dizer, de golpe plebiscitário- foi condenada pelo Congresso e barrada na Corte Suprema. Roberto Micheletti, presidente do Congresso, assumiu conforme a linha sucessória estabelecida pela Constituição -já que o vice-presidente havia renunciado para concorrer nas eleições, marcadas para 29 de novembro. Foi o ato abusivo de expulsar Zelaya do país, "manu militari", que configurou a ilegitimidade do atual governo.
A partir de então, o justificado repúdio internacional ao golpe propiciou a Zelaya ocasiões para exercer, como nunca, o aventureirismo tumultuário que culmina em seu peculiar "asilo" na embaixada brasileira. De asilo político, a rigor, não se trata: o presidente deposto não se refugiou na embaixada para proteger-se da perseguição de seus inimigos, mas sim para retornar a seu país, contando com uma tribuna privilegiada para inflamar os seus correligionários.
Se às autoridades brasileiras cabe protestar contra o cerco da embaixada, é também imperativo que se definam de pronto as condições para a estada de Zelaya. Ele precisa ser impedido de servir-se do espaço brasileiro como um palanque, dando novo combustível a uma crise que já ameaça desaguar num surto de violência civil.

AMEAÇA AOS EXPORTADORES
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
24/9/2009

UMA antiga e modorrenta pendência entre a União e os Estados ameaça agora produzir consequências negativas para a economia do país. Sem acordo em torno dos repasses federais para ressarcir alegadas perdas com a queda da tributação das vendas ao exterior, São Paulo anunciou a intenção de suspender a concessão de créditos fiscais aos exportadores a partir de 2010. Outros governos estaduais podem fazer o mesmo.
As empresas têm direito aos créditos para compensar o ICMS relativo aos bens embarcados para fora. Podem usá-los, por exemplo, para pagar fornecedores. Sem o benefício, na prática, a exportação volta a ser tributada, com prejuízo para a competitividade do produto nacional.
O impasse resulta de um acúmulo de casuísmos desde a aprovação da Lei Kandir, de 1996, que desonerou as exportações. Na época, foi concebido um sistema de ressarcimento de perdas de receitas a vigorar até 2002 -e depois renovado, sem regras claras, até 2006. Nos últimos anos, a transferência do dinheiro se mantém à base de pressões políticas e barganhas congressuais.
De 1996 até o ano passado, a arrecadação do ICMS subiu de 7,2% para 7,6% da renda nacional, o que derruba temores de abalo nas finanças estaduais. Resta, porém, um dispositivo constitucional, introduzido em 2003, que prevê uma nova lei para regulamentar a entrega de recursos aos Estados. Pelo texto, os repasses durarão até que a receita do imposto, hoje concentrada nos locais de origem dos produtos, passe aos locais de consumo.
Já tarda em excesso, portanto, a solução definitiva: uma lei que fixe valores e, de preferência, data final para os pagamentos -ou a supressão do dispositivo constitucional. Inadmissível é submeter um setor tão importante da economia a essa desnecessária instabilidade normativa.

AVANÇOS IMPORTANTES PARA UM ACORDO EM COPENHAGUE
EDITORIAL
VALOR ECONÔMICO
24/9/2009

Os principais atores da conferência do clima em Copenhague, que começa em 7 de dezembro, fizeram alguns de seus lances mais importantes nos últimos dias. Há impasses em várias áreas para um futuro acordo, mas são muito relevantes as concessões apresentadas pelos países que compõem o primeiro pelotão do ranking das emissões de gases que provocam o efeito estufa. China e Índia, dois dos países mais avessos à fixação de metas de redução, concordaram quase que simultaneamente com o que se pedia deles - uma progressiva redução na taxa de crescimento da emissão de CO2 na atmosfera. Em relação às datas-limite, 2020 e 2050, esses países não apresentarão proposta de redução absoluta. Deles são exigidas ações que levem a curva das emissões a uma trajetória declinante.
Paradoxalmente, as ações dos EUA, que estiveram fora do Protocolo de Kyoto e agora prometem participação ativa, os sinais positivos de indianos e chineses e o mais que necessário ativismo brasileiro não deverão resultar em um acordo ao fim da conferência. O tempo conspira contra um consenso e há sérias divergências nos principais pontos perseguidos pela Organização das Nações Unidas: metas de emissão de curto e longo prazo, financiamento para corte de emissões e adaptação a mudanças climáticas e mecanismos de financiamento do tipo "cap and trade" (Fiona Harvey, "Financial Times", 23 de setembro). Ao que tudo indica, os progressos obtidos na última semana não serão suficientes para que a conferência de Copenhague termine com a resolução de todas as pendências. Entretanto, a maior parte delas poderá ter um bom encaminhamento, que permita estabelecer concordâncias em torno de alguns pontos e novos prazos para conclusão dos demais.
A China, campeã de emissões, se comprometeu anteontem, em reunião de 100 países promovida pela ONU, a diminuir a emissão de carbono por unidade do PIB até 2020, com margens "notáveis" em relação a 2005. Hu Jintao, presidente chinês, não apresentou metas, mas o avanço na posição chinesa é evidente. Esse avanço foi detectado também em relatório da Agência Internacional de Energia (AIE), que apontou que, se as metas próprias estabelecidas pelo governo chinês forem cumpridas, a China será o país que mais desacelerará suas emissões no mundo até 2020 (F. H., "Financial Times", 21 de setembro). Há poucas dúvidas de que essas ações poderão facilmente se enquadrar na categoria das "mensuráveis e verificáveis" de contenção das emissões de CO2 que se exige dos países emergentes.
Os EUA, o segundo maior emissor do mundo, estão envolvidos em uma batalha por uma nova lei ambiental. Por isso, o presidente Barack Obama teve pouca coisa a apresentar na reunião da ONU, além de sinceros votos de boa vontade e engajamento na agenda ambiental de Copenhague. A meta americana congela as emissões quase ao nível de 2005. De 1990 - ano-base para o corte no Protocolo de Kyoto, ao qual os EUA não aderiram - a 2005 o despejo americano de CO2 na atmosfera cresceu 16%. O país quer agora um corte de 17% até 2020, com base no nível de 2005. Não é tão pouco como parece, mas mesmo assim esta meta está sendo duramente bombardeada pelos republicanos, que empurrarão a lei ambiental para 2010 no Senado. O governo Obama está sem muita margem de manobra para referendar propostas mais ambiciosas em Copenhague e esse é um dos principais motivos pelos quais ela não deve ser conclusiva.
O Japão, terceiro emissor mundial, deu um salto à frente com o novo governo e aceita uma meta de corte de 25% até 2020. A Índia, o quarto maior, cedeu ao sinalizar com metas "implícitas" de redução, que serão materializadas na legislação doméstica. E o quinto maior emissor, o Brasil, vai enfim adotar metas, como admitiu, em um sinal de sensibilidade política, o presidente Lula.
Os passos dados são meio caminho andado, mas não todo ele. A questão do financiamento dos países ricos aos em desenvolvimento para combate ao aquecimento e mitigação de seus efeitos avança pouco e é crucial. Mas, assim como os países emergentes aprimoraram suas propostas, é possível que até Copenhague os países ricos façam ofertas mais compatíveis com a urgência que o aquecimento global requer.

MAIS VEREADORES
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
24/9/2009

A maioria da população se manifestou, por meio de inúmeras pesquisas, contrária ao aumento do número de vereadores, mas de nada adiantou. Deputados e senadores também não deram atenção ao clamor de diversas entidades de classe para que não fossem inchadas, mais do que já estão, as câmaras municipais. Mas não houve jeito. O Congresso promulgou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que aumenta em 7.709 o número total de vereadores nas cidades brasileiras. Só no Espírito Santo foram abertas mais 153 vagas de vereadores.

Essa é uma demonstração cabal de que o modelo de representação parlamentar em vigor já não consegue cumprir bem o seu papel. É capaz de produzir situação que afronta a vontade dos representados, o que configura um paradoxo. E, assim, vai sendo ampliado o desgaste da classe política, notadamente de parlamentares.

Em momento de indiscutível franqueza, o presidente Lula declarou que as cidades não melhorarão se tiverem mais vereadores. Essa é também a opinião predominante no seio da sociedade. Infelizmente, não foi respeitada na aprovação da PEC dos Vereadores.

Conforme mostram pesquisas junto à sociedade, somente poucas pessoas imaginam que, com mais edis, a representação popular ganhará em qualidade. Na visão de muitas pessoas, serão mais vereadores a se dedicar a tarefas sem repercussão no dia a dia da população – como dar nomes a ruas e prestar homenagens orientadas por conveniência política. Essas tarefas são intensivas, conforme mostram os balanços de atividades de muitas câmaras. Isso deveria ter sido pensado antes de ser ampliado o total de edis.

Então, o que justifica o país ter mais 7.709 vereadores, passando dos atuais 51.748 (número já gigantesco) para 59.457? Isso atende ao interesse dos próprios políticos – segundo interpretação corrente na sociedade. A ampliação dos quadros municipais coloca no campo da garimpagem de votos um contingente maior de pessoas envolvidas no objetivo de eleger nomes para as prefeituras, para as Assembléias Legislativas, para a Câmara dos Deputados, para o Senado, etc. É um modo de multiplicar os chamados cabos eleitorais.

É verdade que a PEC dos Vereadores reduziu o volume de dinheiro repassado pelas prefeituras para os legislativos municipais. Os percentuais passarão a ser menores, embora ainda sejam considerados elevados. Atualmente, as transferências para as câmaras variam de 5% a 8% da receita das municipalidades, de acordo com o número de habitantes das cidades. Com a PEC, o repasse irá de 3,5% a 7%.

Ainda assim, não se justifica criar mais vagas nas câmaras. Os recursos poderiam ter sido cortados sem ampliar o quadro de legisladores. O gasto é muito alto. No Espírito Santo, o repasse aos legislativos municipais somou R$ 168,5 milhões em 2008.

Aos setores da população descontentes com o aumento do número de vereadores resta um pequeno consolo. Essa decisão pode não valer imediatamente. Só a partir de 2012, o que impediria os suplentes de assumirem. Está sendo criado um impasse jurídico a esse respeito.

A Ordem dos Advogados do Brasil não aceita a retroatividade a 2008 da PEC aprovada ontem. Promete impetrar no Supremo Tribunal Federal uma ação direta de inconstitucionalidade (Adim).

Tanto o presidente do STF, Gilmar Mendes, quanto o do Tribunal Superior Eleitoral, Carlos Ayres Britto, já disseram que os efeitos da emenda só valem para a eleição municipal de 2012. Aguardemos o desfecho.

GRAU DE RESPEITO
EDITORIAL
ESTADO DE MINAS
24/9/2009

Desempenho do Brasil na economia segue em alta no exterior

A conquista pelo Brasil do selo grau de investimento concedido pela importante agência de classificação de risco Moody’s elevou a nota do país para Baa3, o que demonstra a boa estrutura da economia brasileira, que passou por forte pressão causada pela crise financeira mundial, eclodida há um ano nos Estados Unidos. Em 30 de abril, o Brasil se tornou grau de investimento pela avaliação da Standard & Poor’s e, em 29 de maio de 2008, foi a vez de a Fitch atribuir essa nota ao país. A classificação de risco é uma ferramenta usada pelos investidores estrangeiros na hora de decidir em que país vão fazer suas aplicações. Ela reflete o risco que ele tem de não honrar o pagamento de seus títulos. Quanto melhor é a avaliação, menor é o temor e, portanto, maior é a capacidade de ele atrair investimentos. Com o grau obtido, os investidores veem que o risco de calote é bem baixo. Muitos fundos de investimento estrangeiros direcionam recursos apenas para países que têm esta classificação. A Moody’s Investors Service elevou os ratings de dívida do governo do Brasil em moeda local e estrangeira do grau especulativo Ba1 para Baa3, patamar inicial para créditos com grau de investimento. A elevação reflete o reconhecimento pela Moody"s de que a capacidade de absorção de choques, incluindo a de resposta das autoridades, aponta para uma melhora significativa do perfil de crédito soberano do Brasil.
Pena que, paralelamente a esse clima favorável no campo econômico, no político, ainda pululam fatos que dão conta de corrupção, nepotismo, malversação de recursos do erário e outras venalidades, muitas delas comunadas com procedimentos de empresários e servidores públicos pouco preocupados com a ética e o bem-estar coletivo. Pena, pois evidências de robusta flexibilidade econômica e financeira, tipicamente associada a créditos com grau de investimento, podem ser vistas na rápida recuperação do Produto Interno Bruto (PIB), no enfraquecimento mínimo das posições de reservas internacionais do país, na moderada deterioração dos indicadores de dívida do governo e na ausência de estresse financeiro no sistema bancário. Estas características sugerem que o Brasil é um “vencedor”, se comparado aos outros países globalmente integrados classificados pela Moody’s.
Ainda que a economia apresente crescimento negativo do PIB este ano e as contas fiscais sofram deterioração em relação aos anos anteriores, o desempenho geral do Brasil provou ser melhor do que o da maioria dos países classificados como grau de investimento na categoria Baa. A elevação do rating é parte de um processo contínuo para identificar países que se tornaram vitoriosos durante o período de turbulência financeira e econômica global, que se mostrou agudo no início deste ano. Portanto, se o Brasil conseguir mostrar ao mundo que o combate à corrupção e aos desmandos administrativos em alguns setores está em curso determinado; que o índice de inadimplência interno é razoável; e que as desigualdades sociais têm combate sistemático, esse grau de confiança será cada vez mais elevado e capaz de induzir um desenvolvimento econômico paulatinamente mais robusto e sustentável.

REGULAÇÃO LIBERTADORA PARA O PRÉ-SAL
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
24/9/2009

A ampla discussão sobre a riqueza do pré-sal deve ser calcada em dois pré-requisitos: o de que se trata de patrimônio dos brasileiros, propriedade de que o Estado não pode abrir mão, e o de que o dinheiro que jorrar dos poços precisa ter destinação específica para a criação de um fundo social exclusivo para a educação e de um fundo de investimento internacional que não seja soberano. Essa é a posição do presidente dos Diários Associados, Álvaro Teixeira da Costa, que abriu na terça-feira, em Brasília, o seminário Pré-sal e o futuro do Brasil, promovido pelo Correio Braziliense e Estado de Minas.

Álvaro Teixeira contestou o conceito de fundo soberano em que a administração dos recursos é critério único do gestor do momento. A aplicação de parte do dinheiro no mercado internacional, ressaltou, será importante para o país dispor de um colchão de proteção da moeda nacional. Porém, é imprescindível garantir que o tesouro do pré-sal seja gerido com regras transparentes, capazes de assegurar o melhor retorno à nação. “Não podemos correr o risco de, por exemplo, financiarmos revoluções de republiquetas primitivas”, disse, lembrando ainda o cuidado que se deve ter com os descaminhos da burocracia e da corrupção.

O regime de partilha é agora o mais apropriado. Primeiro, por manter os poços sob a propriedade da União. Afinal, o petróleo é patrimônio dos brasileiros, não pode ser privatizado. Segundo, porque as reservas representam baixo risco exploratório e perspectivas de alta rentabilidade. Com esse modelo, caberá ao Estado a maior parte da fortuna produzida. A propósito, o cenário é favorável a que o país se torne uma potência do petróleo, sem inibir a vocação multifacetada do parque industrial brasileiro, notadamente a produção de energia renovável. Dessa forma, qualquer que seja a energia preponderante do futuro, o Brasil será autossuficiente. “Em um período em que o mundo discute a administração da escassez, nós discutimos a destinação da abundância.”

A contribuição dos Diários Associados ao debate do pré-sal visa evitar que o país repita o erro de outras nações grandes produtoras de petróleo, cujo poder e cuja riqueza não servem aos cidadãos. Nenhum país é forte se o povo vive na miséria. O Brasil está diante de oportunidade histórica. Não pode desperdiçar a chance de tornar-se protagonista de um mundo mais justo e humano, com educação e saúde de qualidade, tecnologia de ponta, distribuição equilibrada da renda. O marco regulatório para a exploração das novas jazidas petrolíferas deve ser escrito com espírito libertador, os olhos postos no futuro, sem concessões com as amarras do atraso.

A própria história da Petrobras é de um de nossos melhores exemplos de sucesso e orgulho.

TRANSFORMAÇÕES
EDITORIAL
DIÁRIO DE CUIABÁ (MT)
24/9/2009

Grandes transformações urbanas exigem planejamento, recursos financeiros, ousadia administrativa e visão de estadista. Foi graças a esses predicados que Cuiabá ganhou em 31 de maio de 2007 o moderno Ginásio Poliesportivo Professor Aecim Tocantins.

Antes desse moderno ginásio que com seu nome reverencia um dos vultos mais respeitados da política mato-grossense, o professor Aecim Tocantins, Cuiabá convivia com uma crescente demanda reprimida para a prática de esportes de quadra. Porém, a ousadia administrativa e a visão de estadista do governador Blairo Maggi dotaram Mato Grosso de uma das referências continentais para a realização de jogos de vôlei, basquete e outras modalidades. Mas, para que o projeto do Aecim saísse do papel e ganhasse forma no aço e concreto foi preciso a elaboração detalhada de um arrojado projeto, irrigado pelas finanças estaduais.

Desde ontem os olhos da América miram Cuiabá. Mas precisamente o Aecim, onde seleções disputam o torneio continental de basquete feminino, que além do título garante vagas ao mundial da modalidade.

A Copa América está em disputa, mas bem antes dela, ao construir o Aecim, Maggi preparou Cuiabá para a realização de eventos desse porte. Exatamente o que se fez no passado em relação ao esporte de quadra, será executado em prol da Copa do Pantanal, porém, numa escala bem maior e que também desencadeará uma verdadeira revolução em infraestrutura urbana nas duas margens do rio que empresta o nome à Capital e que a une ao vizinho município de Várzea Grande.

Não se pode retirar o quesito “político” da qualificação de Maggi. Porém, é preciso observar sempre que se trata de político com perfil empresarial, condição essa que faz o governador assumir alguns posicionamentos de vanguarda que sempre apresentam bons resultados.

Mato Grosso do Sul tratou com indiferença a escolha do país que seria sede do Mundial de 2014. Maggi ficou ao lado do presidente da Confederação Brasileira de Futebol, Ricardo Teixeira, quando o martelo foi batido favoravelmente ao Brasil. Na definição das subsedes Mato Grosso saiu à frente do vizinho ao sul e seu concorrente direto, quando o governador revelou que o Estado teria R$ 400 milhões para construir o novo Verdão, e que tais recursos estariam assegurados por meio do Fundo de Desenvolvimento do Estado de Mato Grosso (Fundesmat), de natureza extra-orçamentária, para bancar a principal obra necessária à Copa.

Ao planejamento que inclui captação de recursos na esfera federal e motivação do empresariado para investimento no setor turístico, e ao lastro financeiro próprio do Estado, se somam a ousadia administrativa e a visão de estadista de Maggi. A população tem motivos de sobra para comemorar a arrancada para a Copa do Pantanal na terra do Ginásio Aecim Tocantins.

“Maggi preparou Cuiabá para a realização de eventos desse porte”

EXCESSOS EM HONDURAS
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
24/9/2009

A situação em Honduras é tensa e complexa. E o Brasil acabou por se envolver nos problemas daquela nação.
Para se começar a entender o imbróglio, é preciso lembrar que José Manuel Zelaya Rosales foi eleito presidente de Hon¬¬duras em 2005 e que, recentemente, anunciou a sua intenção de realizar uma consulta popular para verificar a possibilidade de que a população hondurenha, nas eleições gerais previstas para o mês de novembro deste ano, se manifestasse também acerca de uma eventual mudança da Constituição da República de Honduras.
Revelada a intenção, notoriamente o primeiro passo para uma tentativa de continuidade no poder, o Congresso Nacional daquele país manifestou-se contrariamente à pretensão de Zelaya e inclusive aprovou uma lei para impedir a realização de qualquer espécie de referendo ou plebiscito nos 180 dias antecedentes às eleições gerais. Com isso, a consulta de Zelaya não teria nenhuma validade jurídica.
Em seguida, o chefe do Estado Maior das Forças Armadas, Romeo Vasquez, recusou-se a dar apoio logístico à consulta e, como resposta, foi afastado de suas funções pelo governo.
Uma decisão judicial, avalizada pela Su¬¬prema Corte, indicou que a consulta era in¬¬constitucional. Mas isso não demoveu o então presidente de suas intenções. É nesse ponto que se respaldam as análises que consideram o próprio Zelaya como golpista.
Por outra parte, é corrente a visão dos que consideram que a decisão deveria estar nas mãos do povo. Para estes, Zelaya é que teria sido vítima do golpe que seu deu no dia 28 de junho, quando os militares invadiram o palácio presidencial, prenderam o presidente e o enviaram para fora do país. A sustentar esta tese está também o teor da consulta que o então presidente queria propor aos cidadãos hondurenhos: “Está de acordo com que nas eleições gerais de novembro de 2009 se instale uma quarta urna para decidir sobre a convocação de uma Assembleia Constituinte que aprove uma nova Constituição política?” Em outras palavras, ao menos em um primeiro momento, estava-se diante de uma “consulta da consulta”.
Desde a saída de Zelaya do poder, o governo não foi reconhecido e nem aceitou os reiterados convites da Organização dos Estados Ame¬¬ricanos para uma solução negociada. Zelaya, por sua vez, também manteve um tom beligerante. Da Nicarágua, onde esteve, lançou uma campanha cujo mote era: pátria, restituição ou morte.
Até esse ponto, pairavam dúvidas e instabilidade política (não social), mas as manifestações de outros países e organizações sobre a situação de Honduras concentravam-se no campo dos apelos diplomáticos.
Tudo mudou com o retorno voluntário de Zelaya ao país. Ele obteve abrigo na embaixada brasileira, mas não pediu, formalmente, asilo político, condição que o impediria de conduzir ações políticas dentro da embaixada. O resultado foi a volta da violência às ruas de Tegu¬¬cigalpa. É neste pon¬¬to que o Brasil poderia ter agido de ma¬¬neira distinta à que adotou. Poderia ter contribuído para apaziguar os ânimos. Se Zelaya estivesse na embaixada sob a condição de asilado político, ficaria mais clara sua intenção de dialogar. Sem exigir tal condição para a permanência do político, o Brasil transforma sua embaixada em um centro de resistência. A evidência concre¬¬ta disso é que ninguém na embaixada se opôs ao fato de Zelaya fazer discursos para o povo diretamente do prédio.
Com a tradição diplomática que tem, o Brasil pode aproveitar a oportunidade para tomar decisões que contribuam para acabar com os distúrbios de rua antes que se chegue ao derramamento de sangue em larga escala. Tais decisões passam pelos apelos feitos por Lula na ONU, pelo estímulo ao diálogo, mas também pela escolha de medidas que indiquem bandeira branca e não convite ao confronto.
Por ora, nossa diplomacia em Honduras age de modo a interferir em assuntos internos de outra nação. Não se pode negar a hipótese de excessos por parte das forças hondurenhas, mas é inegável que Zelaya contribuiu, em boa medida, para incitar a violência em Honduras. E com aval brasileiro.

CONTRA A NAÇÃO
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
24/9/2009

Apesar da contrariedade geral da nação, avançou no Congresso a proposta de emenda constitucional que aumentou o número de vereadores no país em mais 7.709 vagas. Junto com ela, aprovou-se também a redução dos percentuais máximos da receita municipal que podem ser gastos pelas Câmaras. As duas PEC foram aprovadas em segundo turno pela Câmara de Deputados, por 380 votos a favor, 29 contrários e duas abstenções. Com as galerias lotadas de suplentes de vereadores, seus familiares e dirigentes partidários, os parlamentares aceitaram o que, inequivocamente, representa um inchaço desnecessário das estruturas municipais. Mesmo que o percentual a ser alocado para as Câmaras tenha sido disciplinado e até reduzido, essa decisão em nada justifica a ampliação das vagas de vereadores. Apenas evidencia que, sem essas mais de 7 mil vagas, o percentual de redução poderia ter sido ainda maior.

Consumada a ampliação das vagas em emenda constitucional que será promulgada solenemente pelo Congresso Nacional, restam de um lado os aspectos imediatos a serem considerados e, de outro, subsiste a necessidade de longo prazo de uma rediscussão sobre o tamanho que o poder público precisa ter para cumprir seu papel institucional. A questão imediata tem a ver com a vigência ou não da decisão do Congresso em relação à composição das atuais Câmaras. A Ordem dos Advogados do Brasil, atenta a essa questão, decidiu recorrer ao Supremo Tribunal Federal para evitar a posse imediata dos suplentes de vereadores, entendendo que, se tal ocorrer, estará sendo ferido o princípio constitucional da anterioridade. É coerente o entendimento da OAB, que é partilhado também por outras áreas jurídicas. No entanto, mais do que ferir normas ou princípios, o que a emenda fere é a clara vontade do país de contar com estruturas parlamentares adequadas e eficientes.

VACINA À VISTA
EDITORIAL
JORNAL DO COMMERCIO (PE)
24/9/2009

Boa notícia: em janeiro próximo, o Brasil estará fabricando a vacina preventiva da gripe A(H1N1) popularmente conhecida como gripe suína. Ela será produzida pelo Instituto Butantã, de São Paulo, e posteriormente outros laboratórios públicos poderão entrar no processo. Essa pandemia continua assustando e preocupando a humanidade. O anúncio feito pelo governador de São Paulo, José Serra, é assim muito bem-vindo e a produção da vacina aqui constitui passo importante para a imunização de pacientes brasileiros. Até abril, terão sido fabricados 18 milhões de unidades por uma instituição de renome internacional, o que garante sua qualidade.
Enquanto isso, nos Estados Unidos, a secretária de Saúde Kathleen Sebelius informava que a distribuição da vacina naquele país começa em outubro, com o envio direto para localidades de todos os Estados, e ela estará disponível para uso imediato. A descoberta, por pesquisadores, de que uma só dose da vacina, em vez de duas, pode ser suficiente para imunizar adultos saudáveis e de que a proteção pode vir dentro de dez dias após a aplicação, em vez de três semanas, foi saudada com entusiasmo porque tornará disponível um número maior de vacinas para aplicação.
O problema para a fabricação de vacinas patenteadas por laboratórios privados é que eles se recusam a facilitar as coisas para diversos países que querem produzir suas versões. Daí que os chefes de Estado do Mercosul tenham feito um apelo à Organização Mundial de Saúde (OMS) para que lidere um processo de flexibilização de patentes de vacinas e medicamentos para combate à pandemia. O Brasil já quebrou patentes de medicamentos antiaids.
É consensual que o sentido da patente é proteger a propriedade intelectual, e sua atenuação ou mesmo quebra se justifica em casos como os da gripe A (H1N1) e da aids. O que teria o significado de atender a urgência social e humanitária. Independentemente de contrato, parceria ou quebra de patente, o Butantã está pesquisando sua própria vacina para a mais nova pandemia de gripe. Já no mês de outubro, começa testes com cobaias e, em novembro, passa a fazê-los com voluntários. Pretende que ela seja eficaz com uma única dose e, a partir de janeiro, espera produzir 4,5 milhões de doses. Elas serão repassadas ao Ministério da Saúde para distribuição nacional.
As atenções das autoridades se voltam agora para o próximo inverno meridional e elas estão atentas aos resultados obtidos no hemisfério norte, onde o frio do outono já está presente. Para o infectologista David Uip, diretor do Hospital Emílio Ribas de São Paulo, referência na especialidade, “o que temos de fazer é preparar as equipes para lidar com os casos graves. A vantagem que teremos em relação a este ano é já conhecer a doença”. É preciso ressaltar que, mesmo que o Butantã atinja a produção que calcula inicialmente, que poderá chegar, durante o ano, aos 30 milhões de doses, isso não será suficiente para vacinar todo mundo.
É o que disse, em audiência pública na Câmara dos Deputados, o diretor do instituto, Isaías Raw. Ele garante que não há capacidade industrial, nem no Brasil nem no mundo, para produzir vacinas para todos. Sendo assim, as autoridades têm de estar atentas às prioridades quanto à sua distribuição e aplicação. Destacou ainda que a prioridade é saúde pública e não lucro. Um modo de pensar que passa a milhares de quilômetros de distância das prioridades dos laboratórios multinacionais, em relação à vacina ou qualquer outro medicamento.
De início, falávamos na boa notícia da breve disponibilização de vacinas contra a gripe A (H1N1) em nosso País. Outra boa notícia é que, no Recife, os casos de dengue tiveram uma queda de mais de 90%. De janeiro a agosto deste ano, a PCR confirmou 218 casos da doença, contra 3.287 registrados no mesmo período de 2008. Além disso, não há óbitos nem suspeita da versão hemorrágica, mais perigosa e com maior capacidade letal. O que se deve à articulação de trabalhos com o Estado, Forças Armadas e sociedade.

RUIM PARA TODOS
EDITORIAL
A CRÍTICA (AM)
24/9/2009

O esvaziamento na maior parte dos locais em que se realizaram, ontem, as audiências públicas sobre o Plano Diretor é uma denúncia. Expõe o tamanho do interesse do governo municipal em ter as representações populares participando desse momento. As audiências vêm perdendo importância diante da instituição de outros modelos de gestão pública que veem na participação popular um obstáculo. No Executivo e no Legislativo, esse instrumento tornou-se fragilizado e está sob asfixia.

Nas audiências de ontem, a intenção anunciada (debater com os segmentos populares o Plano Diretor a ser revisado) ficou profundamente prejudicada. Talvez, a Prefeitura Municipal possa dizer que cumpriu com o ritual exigido, mas para que ele serve, nas condições dadas da sua realização? A cidade, em última instância, será a mais prejudicada porque a tendência exposta é de fazer prevalecer uma visão mais grupal do que atrapalha e do que desenvolve o lugar. Abandona-se a perspectiva coletiva que, enfim, deve ser a grande marca de uma cidade.

A reduzida participação das populações também pode ser compreendida como a vitória de uma tática de silenciamento ou de transferência de responsabilidade: uns poucos assumirão a tarefa de reordenamento de Manaus, mas todos serão afetados pelas medidas a serem efetuadas mais tarde em nome dessa reorganização. É questionável igualmente a decisão do Executivo de realizar, simultaneamente, as audiências.

A maturidade, a sensibilidade e a responsabilidade deveriam ser os eixos norteadores de uma revisão de um plano diretor. Tais categorias, nesse momento, parecem perdidas diante de urgências que poderão representar um massacre de uma cidade já bastante maltratada e que aguarda, com esse novo exame do seu plano, ser referência de mudanças positivas, proporcionadoras de vida com mais qualidade e do estabelecimento de regras que garantam um planejamento fincado nas exigências de humanização.

Manaus vive o dilema das grandes cidades e as decisões tomadas para enfrentá-lo seguem o rastro de experiências fracassadas em outros lugares. Revisar o plano diretor é ter coragem de ouvir muito, olhar profundamente a cidade de hoje e a cidade a uma década, a duas décadas, de unir saberes e conhecimentos e balizar os interesses a fim de que o plano diretor revisado seja uma das garantias de que Manaus se nega ao caos e quer a humanização.

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