- EDITORIAIS 22/9/2009
EDITORIAL
O GLOBO
22/9/2009
O no mínimo desrespeitoso comportamento do senador republicano Joe Wilson ao xingar de “mentiroso” Barack Obama durante um pronunciamento que o presidente fazia ao Congresso sobre a polêmica reforma no sistema de saúde americano destampou a contaminação racista no cerrado ataque que a Casa Branca enfrenta no debate sobre o tema. Coube ao expresidente Jimmy Carter colocar os pingos nos is e denunciar o viés racista na discussão.
Pois é deste país — em que o preconceito racial é parte da formação da sociedade, tanto que aflora de tempos em tempos — que, com o apoio do governo, insiste-se em importar para o Brasil um sistema de cotas criado pela história e realidade americanas. Enquanto no Senado encontra-se em fase de discussão um projeto de inspiração racialista de reserva de vagas no ensino superior em função da cor da pele, acaba de ser aprovado na Câmara de Deputados o Estatuto da Igualdade Racial. Originado de projeto do Senador Paulo Paim (PTRS), o Estatuto passou pelo Senado e chegou para o exame dos deputados com propostas agressivas: cotas para negros em peças de publicidade, novelas, filmes, mecanismos para facilitar a legalização de ditos quilombos, e assim por diante.
Alguns desses dispositivos foram retirados, mas outros, mantidos, como a revisão do currículo escolar para ser inoculado o conceito de raça — rejeitado pela ciência — na história do Brasil e África, e a imposição ao sistema público de saúde da ideia de “doenças de negros” — também contestada tecnicamente.
Institui-se, ainda, a concessão de incentivos a empresas que mantenham 20% de “negros” nos quadros. Se o Estatuto pode ter sido desidratado de algum teor tóxico, seu DNA racialista — inconstitucional, ao discriminar cidadãos pela cor da pele — continua intacto.
E por isso precisa ser rejeitado no retorno ao Senado, ou, caso sancionado, terá de ser arguido perante o STF.
O erro na aceitação de teses racialistas é duplo. Ao importar o modelo de uma sociedade construída sobre raças — mesmo nos EUA as cotas têm sido contestadas — e para um país cuja formação é outra, centrada na miscigenação. A Pnad, do IBGE, é cabal: de 2007 para 2008 caíram de 7,5% para 6,8% da população os que se autodeclaram “negros”, aumentou a proporção dos que se veem “pardos” (de 42,5% para 43,8%), e encolheu a parcela de “brancos”: 49,2% para 48,4%. Somos cada vez mais miscigenados.
Por isso é um desvario injetar nesta sociedade o vírus do racismo.
FOSSO NA EDUCAÇÃO
EDITORIAL
O GLOBO
22/9/2009
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) é aprimorada a cada ano pelo IBGE, e seus resultados têm sido importante fonte de informação para vários estudos sobre a situação social e econômica da população brasileira. A Pnad 2008, por exemplo, confirmou algumas tendências de consumo: 80% dos lares estão servidos por telefone (fixo ou móvel) e mais de 30% já contam com microcomputador (sendo que 24% dos imóveis estão conectados à internet). A energia elétrica está presente na quase totalidade das casas, e houve avanços, ainda que modestos, no fornecimento de água, na coleta de lixo e de esgoto. O Brasil é um país em que 70% dos imóveis são propriedades quitadas e há mais 5% sendo amortizados.
Há melhorias em indicadores sociais, tendência iniciada antes do governo Lula, que procura capitalizar sozinho os avanços por causa das eleições. Se por um lado a Pnad captou o efeito do crescimento do emprego e da ligeira redução da desigualdade (embora a pesquisa tenha sido feita antes de o país sentir o impacto do agravamento da crise financeira internacional), por outro mostrou indicadores preocupantes em relação à educação. O número absoluto de pessoas analfabetas com mais de 15 anos aumentou em 113 mil de 2007 para 2008, inaceitável diante do engajamento da própria sociedade civil para eliminar a mazela. Se é crescente a percentagem de crianças que entram na escola aos 4 e 5 anos (72% dos que estão nessa faixa etária), e 97,5% de todos os jovens estão matriculados, a escolaridade média da população até 24 anos ainda não chega a oito anos — período do ensino fundamental.
É grave porque o mercado de trabalho tem gerado mais oportunidades para aqueles que possuem onze ou mais anos de instrução.
Esse grupo passou a representar 41,2% dos trabalhadores, e somente em 2008 expandiu-se em em 8,5%. Há um fosso entre o que o mercado de trabalho demanda e o que o sistema de ensino vem conseguindo formar. Se essa defasagem não for corrigida, e rapidamente, a educação acabará se transformando em gargalo ainda mais sério do que os obstáculos da infraestrutura para o crescimento do país. Daí a urgência na prioridade de gastos para a educação, deixando-se o assistencialismo em segundo plano.
Os dados confirmam que estamos em uma fase de colher frutos do chamado “bônus democrático”.
Durante vinte ou trinta anos teremos um número declinante de crianças e jovens devido à queda da taxa média de fecundidade. Enquanto não se multiplicam os problemas decorrentes do envelhecimento da população, o país deve redobrar esforços para educar bem os jovens, permitindo que eles aproveitem as oportunidades profissionais que surgirão.
MATERIALISMO, MAS COM CIDADANIA
EDITORIAL
JORNAL DO BTRASIL
22/9/2009
RIO - Na economia, costuma-se chamar jogo de soma zero todas as interações em que não há ganhos mútuos. O benefício que alguém recebe é obtido na exata medida em que outro(s) participante(s) perde(m). Muitos jogos (damas, xadrez) e trocas feitos pelos indivíduos ao longo da vida são deste tipo. No espaço público, a grande política representa, no fundo, um conflito entre classes e grupos de interesses pelo controle dos recursos do Estado. É um jogo, em princípio, de soma zero – por exemplo, o que os pobres recebem em programas sociais é diminuído do montante que eventualmente poderia ir para políticas públicas que favoreçam outras camadas sociais. Este sempre foi o eixo da peleja entre esquerda e direita, mesmo após o advento do pós-materialismo, que tentou incorporar na agenda temas não econômicos como o ambientalismo e o feminismo.
A política, contudo, também pode ser entendida como um jogo de ganhos mútuos. O que se perde agora no conflito distributivo pode representar um benefício a longo prazo, com a construção de uma sociedade mais justa, educada, produtiva e menos desigual e violenta.
A transformação da lógica da soma zero em um sistema de ganhos mútuos, percebidos em trocas contínuas, deve ser uma meta do jogo democrático. Tanto no que se refere ao conflito de interesses entre os grupos da sociedade quanto na relação entre os cidadãos e o Estado.
No que tange a essa interação, duas medidas recentes, uma no âmbito do município do Rio e outra do governo federal, devem ser destacadas pela capacidade de terem otimizado os ganhos dos atores envolvidos.
A primeira diz respeito à aprovação pela Câmara dos Vereadores do Rio da lei que regulariza as ampliações verticais e horizontais de coberturas e casas. O tema desperta polêmica, sobretudo numa cidade preocupada com a expansão das favelas. Mas, diante da prática comum e das dificuldades de fiscalização, a proposta de se autorizarem as ampliações, dentro de um limite estabelecido pela prefeitura, dá ao assunto um tratamento menos hipócrita. Na própria aquisição de um apartamento de último andar, por exemplo, é assegurado o direito de uso da laje ao comprador. Incentivados por esta provisão, proprietários ampliam as áreas de seus imóveis, que, sem a legalização, ficam isentas do pagamento de imposto. Com a nova lei, que aguarda sanção do prefeito Eduardo Paes, cria-se um marco regulatório e aumenta-se a arrecadação do município em IPTU, já que a nova medida deverá atingir cerca de 40 mil imóveis cariocas. Ganham os moradores e o caixa da prefeitura.
A segunda medida, de âmbito federal, tem impacto sobre a vida de milhões de trabalhadores autônomos, que agora podem regularizar sua situação. Com a inclusão no Simples Nacional, 260 novas ocupações, do pipoqueiro ao mototaxista, ganham o status de atividade exercida por microempreendedor individual. São homens e mulheres que poderão sair da informalidade, pagar impostos de forma simplificada e mais barata (em torno de R$ 60) e ganhar direitos trabalhistas e previdenciários que não tinham como autônomos. Ganham o Tesouro Nacional, com o aumento na arrecadação, e os trabalhadores beneficiados pela medida. E conquista-se um subproduto de valor incalculável: cidadania.
O BRASIL ANTES DA CRISE
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
22/9/2009
Os números da mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), referentes a 2008, representam o ponto culminante de um robusto ciclo de expansão da economia, do emprego e da renda, com avanços sociais expressivos e alguma redução da desigualdade entre os brasileiros. O mais amplo levantamento anual da realidade do País ? baseado em entrevistas com cerca de 400 mil pessoas em 150 mil moradias ? confirmou o que uma coleção de indicadores isolados vinha apontando sobre a consolidação do processo de desenvolvimento econômico retomado em 2004. É bem verdade que, em setembro do ano passado, quando os pesquisadores do IBGE foram a campo, a desaceleração do ritmo de crescimento do produto e do emprego já estava no horizonte, acompanhando as tendências internacionais. Mas poucos previam a crise mundial que seria desencadeada pela quebra do Lehman Brothers naquele mesmo mês. Vistos os dados nessa perspectiva, a pergunta inevitável é se as perdas a serem contabilizadas com toda a probabilidade pela próxima Pnad serão menos ou mais intensas do que os ganhos desta em comparação com a de 2007.
Esses ganhos dão razão a todos quantos afirmam que é impossível superestimar o dinamismo da sociedade nacional e, notadamente, das suas forças produtivas. Desde 2001, por exemplo, não se registrava tamanho aumento no nível do emprego com carteira assinada, na contramão dos prognósticos sobre a inexorável informalização do trabalho nos mais diversos setores econômicos. Com 2,1 milhões de novas contratações, verificou-se um salto de 7,1% em relação ao período precedente. No momento da pesquisa, 34,5% da força de trabalho estava registrada ? um recorde histórico. A carteira de trabalho foi "o grande diferencial" da Pnad, aponta Cimar Azeredo, responsável pela pesquisa mensal de emprego do IBGE. A população ocupada em geral também aumentou. Eram 92,4 milhões de pessoas, ou 2,8% a mais do que em 2007. A taxa de desemprego retrocedeu para 7,2% (1 ponto porcentual menor), o melhor resultado desde 1996. A renda média do trabalho continuou a crescer, chegando a R$ 1.041. Mas continuou aquém do R$ 1.074 de 1998. A desigualdade seguiu em queda, porém em proporção menor do que de 2006 para 2007. Ficou em 0,521, numa escala de 0 a 1.
Segundo o economista Sérgio Besserman, ex-presidente do IBGE, mais uma vez se evidenciou "a nossa horrorosa distribuição de renda". De fato, o rendimento médio dos 10% mais ricos é 12 vezes superior ao dos 50% mais pobres. Os primeiros concentram 42,7% da riqueza nacional. Para Besserman, o Bolsa-Família (que alcança 11 milhões de famílias) não é um instrumento de combate à desigualdade. "Realmente ajuda a tirar famílias do limiar da pobreza", afirma. "Mas o que reduz a desigualdade é a distribuição do conhecimento." Em relação a isso, para todos os efeitos práticos, continuamos marcando passo. Embora 97,5% das crianças de 6 a 14 anos estivessem matriculadas em escolas ? índice que diminui para 84,1% na faixa de 15 a 17 anos ?, não só a taxa de analfabetismo se manteve em 9,2% (12% dos brasileiros acima de 25 anos não sabem ler), como a taxa de analfabetismo funcional é de 21% no contingente com 15 anos ou mais. O conceito identifica as pessoas que são incapazes de entender e reproduzir o que leram. Entre os brasileiros plenamente letrados e esses outros, são legiões os que chegam ao mercado de trabalho com preparo apenas precário para funcionar numa economia moderna. É o dano causado pela praga aparentemente inerradicável do ensino de baixa qualidade.
Já não basta o "desafio enorme", como diz o ministro da Educação, Fernando Haddad, de "atrair a juventude, sobretudo de perfil socioeconômico mais baixo, para a conclusão da educação básica". O conhecimento assimilado pela maioria dos que a concluem permanece escandalosamente aquém das demandas do sistema produtivo. E, quando se leva em conta que os números agregados da Pnad escondem fortes diferenças regionais ? os analfabetos funcionais, por exemplo, são 31,6% da população residente no Nordeste, ante 15,8% no Sudeste ?, o problema da má escola no conjunto do País assume feições nada menos que dramáticas. O Brasil, nesse sentido, pode ser equiparado a um carro potencialmente capaz de desenvolver altas velocidades, mas que roda com o freio de mão puxado.
A DÍVIDA DA ARGENTINA
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
22/9/2009
Depois de 17 anos sem comprar aviões, a Aerolíneas Argentinas ? controlada pelo governo ? está colocando no ar novos aparelhos, com autonomia para voos intercontinentais de 6 mil quilômetros. Mas esses aparelhos só podem ser utilizados em voos domésticos. Se voarem para outros países, poderão ser retidos por ordem judicial a pedido de credores do governo argentino que nada recebem desde a declaração da moratória da dívida externa do país, em 2001.
Para afastar de vez esse risco e superar outros problemas criados pela moratória ? o pior dos quais é o fechamento do mercado internacional para os financiamentos de que o país necessita ?, o governo argentino anunciou que está disposto a se acertar com os credores que não aceitaram as condições impostas em 2005 pelo então presidente Néstor Kirchner. Quem aceitou a troca dos títulos da dívida ? cujo total ultrapassava US$ 150 bilhões ? pelos papéis então oferecidos incorreu em pesadas perdas. Ou aceitavam isso ou não receberiam nada, ameaçava Kirchner.
Uma parte dos credores não aceitou. Os detentores de cerca de US$ 20 bilhões da dívida recusaram os termos ditados por Kirchner e vêm procurando meios legais para receber aquilo a que têm direito, inclusive apontando bens do governo argentino no exterior para sequestro judicial como garantia de pagamento.
A Argentina tem também uma dívida de US$ 6,9 bilhões com 19 países que formam o Clube de Paris ? entre os quais Estados Unidos, Alemanha, França e Japão ?, cuja renegociação está parada desde o início do governo de Cristina Kirchner, em dezembro de 2007. Segundo o jornal La Nación, a renegociação será um dos temas centrais da viagem que a presidente faz a Washington.
O ministro da Economia, Amado Boudou, confirmou que está negociando com os credores privados que não aceitaram as condições oferecidas em 2005 e também que estão em andamento as negociações para o pagamento da dívida com o Clube de Paris ? provavelmente em cinco anos, com a contrapartida de novos empréstimos para o país.
O parcelamento dessa dívida está condicionado ao monitoramento das finanças públicas da Argentina pelo FMI, alvo de pesadas críticas do governo. No fim de agosto, Boudou afirmara que o governo não aceitaria a intromissão do FMI na política econômica. Mas a necessidade do país de ser readmitido no sistema financeiro internacional ? do qual necessita para organizar suas finanças internas e obter recursos que sustentem seu crescimento ? está fazendo o governo mudar o discurso. Há dias, o mesmo ministro Amado Boudou disse que a Argentina estava disposta a aceitar o monitoramento do FMI, "desde que não seja do mesmo tipo do que foi feito no passado". Agora, confirma que está em entendimentos também com o FMI, "de modo que até o fim do ano haverá uma definição" sobre a parcela da dívida argentina ainda pendente de um acerto com os credores.
Se o governo fechar esses acordos, a Argentina poderá ter acesso novamente aos mercados internacionais de capitais e reduzir os custos dos financiamentos. Mas persistirá outra dúvida na área externa. Mesmo tendo imposto grandes prejuízos aos que aceitaram sua proposta de 2005, a Argentina continuou com dificuldades para honrar os compromissos e teve de rever as condições de um lote de papéis com vencimento entre 2009 e 2012. O governo anunciou na semana passada que obteve a adesão de 76% desses credores à proposta de troca dessa parte da dívida ? no valor de US$ 22 bilhões ? por títulos com vencimento em 2014 e 2015.
Analistas calculam que, apesar desse alívio, o governo terá dificuldades para honrar os outros compromissos que vencerão em 2010 e que somam US$ 13,2 bilhões. Até o ano passado, o governo Kirchner contou com o apoio financeiro do presidente venezuelano, Hugo Chávez, mas essa fonte secou, depois que a crise fez cair o preço do petróleo. O chefe de gabinete do governo argentino, Aníbal Fernández, garante que o país não terá problemas para pagar o que vencerá no ano que vem ? os credores gostariam de ter certeza disso.
SEGURANÇA PARA OS MERCADOS
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
22/9/2009
A maior crise financeira dos últimos 80 anos foi provocada, em grande parte, por executivos incentivados a gerar lucros a qualquer custo. Alguns deles continuaram recebendo bônus mesmo depois de iniciada a quebradeira no setor bancário. Tudo isso provocou indignação, censura e muita retórica moralista, mas só agora, um ano depois da falência do banco de investimentos Lehman Brothers, surge uma proposta sensata e com sentido econômico para eliminar a distorção. O plano, elaborado pelo Conselho de Estabilidade Financeira, formado por dirigentes de bancos centrais das maiores economias, será incluído na pauta da cúpula do Grupo dos 20 (G-20), que se reúne quinta e sexta-feira próximas em Pittsburgh, nos EUA.
Pela proposta, os bônus pagos a dirigentes de bancos serão condicionados não só ao resultado financeiro dos negócios, mas também à administração de riscos. Um dos critérios será a adequação do capital ao volume e ao tipo de operações de cada instituição. Isso deverá, segundo os autores do plano, funcionar como um freio para a busca de lucros em aplicações perigosas.
Executivos de bancos e até políticos têm rejeitado a imposição de controles ao pagamento de prêmios com uma alegação aparentemente sensata: a remuneração de profissionais do mercado é uma questão privada. Esse argumento pode valer na maior parte dos casos, mas não é aceitável quando os bônus servem de estímulo à irresponsabilidade e contribuem para a insegurança dos mercados. É papel dos órgãos de regulação cuidar do bom funcionamento dos sistemas e sua obrigação é combater, com os instrumentos legais, todo fator de instabilidade.
Essa intervenção será possível, se os governos aceitarem as propostas e forem capazes de implantá-las. "Reguladores poderão dizer: os bônus são excessivos para seu nível de capital; sua capitalização é insuficiente", explicou o presidente do Conselho de Estabilidade Financeira, Mário Draghi, chefe do banco central da Itália. Pela proposta, a limitação dos bônus deverá ser adotada juntamente com os novos padrões de capitalização e de segurança das instituições financeiras. Não se espera a adequação dos níveis de capital de um dia para o outro, explicou Draghi.
A ideia é promover um ajuste gradual, sem bloquear repentinamente a capacidade de empréstimos das instituições. O roteiro do ajuste foi definido, nas grandes linhas, por dirigentes de bancos centrais num encontro recente promovido pelo Banco de Compensações Internacionais (BIS), de Basileia.
As autoridades do G-20 ainda terão muitos detalhes para discutir, quando cuidarem da implantação das novas normas de Basileia e das propostas de limitação dos bônus pagos a executivos. O presidente da França, Nicolas Sarkozy, tem defendido a criação de um teto para os prêmios. Seu colega americano, Barack Obama, defende uma ampla reforma do sistema financeiro, mas tem descartado a adoção de um teto para os prêmios por desempenho. A proposta do Conselho de Estabilidade Financeira é mais flexível que a de Sarkozy, por não estabelecer um limite fixo, e talvez facilite uma convergência de posições.
Com mais técnica e menos moralismo, as autoridades monetárias abrem caminho para a elevação dos padrões de segurança no mercado financeiro. Não se trata de propor apenas uma ampliação do papel do Estado e um engessamento dos mercados, mas de zelar pela estabilidade do sistema.
As lições da crise recomendam uma nova divisão entre o espaço público e o espaço estritamente privado na condução dos negócios. A atividade empresarial envolve riscos e isso é da essência do capitalismo, mas o controle e a limitação do risco interessam ao próprio sistema. Isso dá sentido à cobrança de informações mais amplas das empresas para os mercados. Um dos objetivos da nova regulação elaborada pela Comissão de Valores Mobiliários é ampliar a informação sobre os padrões de segurança das empresas para evitar, entre outras consequências, a repetição das aventuras com derivativos tóxicos. Grandes empresas brasileiras perderam muito dinheiro, durante a crise, com operações especulativas. Pelas normas propostas e ainda em consulta pública, toda empresa deverá, no lançamento de ações, informar sua exposição a riscos e discriminar seus investimentos.
LULA QUER MEIRELLES ATÉ O FINAL DE 2010
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
22/9/2009
Segundo o jornal Valor Econômico, o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, a pedido de Lula, teria desistido de se candidatar ao governo de Goiás, e assim poderá ficar até dezembro de 2010 nas suas funções atuais.
Se isso se confirmar, surge uma perspectiva favorável para a contenção da inflação no próximo ano, quando um crescimento da economia, induzido por interesse eleitoral, poderá exigir medidas preventivas de controle.
O presidente Lula sempre soube que tinha de aceitar a política ortodoxa do Banco Central para conter a inflação. E o trabalho do BC favoreceu sua reeleição. Entre Henrique Meirelles e Lula parece haver um acordo: este resistiria às fortes pressões do seu próprio partido contra a política monetária e o BC não criticaria a política fiscal do governo. Esse acordo tácito parece ter sido respeitado pelas duas partes.
A pretensão de Meirelles de disputar o governo de Goiás, onde foi o deputado mais votado antes de assumir a presidência do BC, criava uma grande preocupação para o presidente da República, já que o presidente do BC poderia apresentar sua demissão já no momento de se filiar a um partido (a última data é 3 de outubro) ou seria obrigado a isso ao oficializar sua candidatura ao governo de Goiás em abril do próximo ano.
A saída do presidente do BC poderia ser interpretada como uma quebra com a ortodoxia e Lula teria dificuldades de escolher um sucessor para um período curto, numa fase em que todas essas decisões assumem caráter eleitoreiro.
A sucessão de Meirelles já vinha preocupando os investidores estrangeiros num período em que é preciso aumentar esses investimentos. Mas a maior preocupação do governo era saber como a forte demanda dos consumidores, neste final do ano, afetará os preços e como a perspectiva de um forte crescimento econômico, no ano que vem, em caso de abandono da austeridade fiscal da parte do governo, agravará aqueles efeitos.
Lula quer maiores gastos no ano eleitoral, mas sabe também que uma retomada da inflação em plena campanha teria impactos negativos no eleitorado. Precisa contar com um BC independente para combater as pressões inflacionistas, o que, aliás, a pesquisa Focus já mostra ao prever uma taxa Selic de 9,81% no final de 2010.
Entende-se, pois, o interesse de Lula na permanência de Meirelles na presidência do BC, para ser "culpado" pelo excesso de austeridade..
INIMIGO IMAGINÁRIO
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
22/9/2009
Dada a asfixiante carga de tributos, daqui para a frente qualidade do gasto público definirá o ritmo dos avanços sociais
PAIXÕES políticas à parte, é necessário reconhecer avanços institucionais, sociais e materiais no país quando se avaliam prazos mais longos, medidos em décadas. A mais recente Pnad (Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios) divulgada pelo IBGE confirma e ajuda a avaliar esses progressos, bem como os méritos e os deméritos da atuação do poder público no período.
Mais uma vez, os números apontam um lento, mas contínuo, processo de desconcentração dos rendimentos do trabalho. A metade mais pobre da população ampliou a participação na renda nacional para 17,6% em 2008, contra 14%, dez anos antes. Parece, e é, pouco, mas se trata de uma melhora inédita desde, pelo menos, os anos 1970, quando as taxas recordes de crescimento econômico eram maculadas pelo aumento também acelerado da desigualdade.
A pobreza segue trajetória de queda, ainda que irregular. Pelos critérios do economista Marcelo Neri, do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas, os pobres, que chegaram a somar 35% dos brasileiros em 1993, haviam caído para 16% em setembro no ano passado, antes da chegada da onda recessiva trazida pela crise global.
Em parte, os avanços obedecem a um padrão vegetativo observável em qualquer território que não viva sob guerras ou tragédias humanitárias. Mas, por mais que seja difícil estabelecer causa e efeito em estatísticas como essas, parece óbvia a conexão entre os indicadores e a vigorosa expansão do gasto público desde a redemocratização do país.
As relações entre um fenômeno e outro demandam uma discussão menos simplória do que, por exemplo, o ataque ao suposto "Estado mínimo" feito pela ministra Dilma Rousseff, provável candidata à Presidência, em entrevista à Folha.
Trata-se, no Brasil, de um inimigo imaginário. Mesmo antes da Constituição de 1988, o setor público já consumia um quarto da renda nacional, fatia comparável, por exemplo, à verificada nos Estados Unidos. De lá para cá, compromissos crescentes com previdência, saúde e assistência social, fora os pesados encargos da dívida pública, levaram a carga tributária nacional a 35% do PIB, similar à de nações que passaram por experiências social-democratas.
Diante de tal hipertrofia, os resultados sociais dos últimos anos já não parecem tão impressionantes. Basta lembrar que o rendimento médio do trabalhador ainda é inferior ao de 1998, ou que a taxa de analfabetismo permaneceu estagnada no ano passado -em elevados 9,8% da população adulta.
O debate que precisa ser feito é como extrair o máximo de eficácia da ação dos governos, sem permitir que a já anômala dose de impostos, taxas e contribuições sociais comprometa o crescimento da produção de bens e serviços -a menos que se imagine uma alta ininterrupta de despesas e receitas públicas até a conquista de padrões de renda e escolaridade equivalentes aos do mundo desenvolvido.
A RENOVAÇÃO DO ÁLCOOL
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
22/9/2009
O ZONEAMENTO agroecológico da cana-de-açúcar, prometido há mais de dois anos pelo governo Lula, deixou as gavetas do palácio. Com ele, o país reconhece que não há retorno na exigência, pelo mercado global, de certificados de boa procedência ambiental e social de commodities como o álcool combustível. É a imagem da maior inovação do país no campo sensível das energias renováveis que está em jogo.
Desde que os biocombustíveis entraram em voga mundial como alternativa parcial ao petróleo, o Brasil, na condição de maior exportador, esteve sob pressão. Condições degradantes de trabalho, poluição do ar pela queima da palha antes da colheita, ameaça à segurança alimentar na competição por terras e indução ao desmatamento pesavam sobre o álcool como supostas nódoas de origem, mesmo que infrequentes.
O pacote delineado no projeto de lei e no decreto relativos ao zoneamento constitui resposta à altura. Foi excluída toda a extensão dos biomas Amazônia e Pantanal das áreas mapeadas como aptas, assim como o entorno do segundo, onde nascem muitos dos seus rios. Proíbe-se suprimir vegetação nativa, em toda parte, para cultivar cana. O crédito oficial incentivará a ocupação de pastagens abandonadas.
O Ministério da Agricultura terá de certificar, em cada aumento de área, a ausência de risco para a produção de alimentos. A mecanização completa, com consequente abandono da queima da palha, ocorrerá até 2017.
A dúvida que resta atinge o Congresso, que dificilmente votará o projeto de lei ainda neste ano. É pequeno o risco, contudo, de que a demora desencadeie um processo preventivo de desmatamento. Os próprios produtores, tudo indica, já se convenceram de que a sustentabilidade das vendas e do lucro também depende de fazer a coisa certa.
G-20 TENTA AGORA AVANÇAR EM SUA AGENDA ECONÔMICA
EDITORIAL
VALOR ECONÔMICO
22/9/2009
As reuniões do G-20, o grupo dos maiores países desenvolvidos e emergentes, acabaram envoltas em expectativas que acompanhavam a gravidade da crise econômica. Em pleno auge da crise, os mercados se mostraram céticos de que de um time tão heterogêneo de países, com interesses tão conflitantes, pudesse resultar a necessária coordenação global para debelar uma catástrofe sem precedentes desde os anos 1930. Depois de vários pacotes fiscais e de ajuda financeira, e de trilhões de dólares no mercado, a economia global começou a reagir e a expectativa que agora ronda o encontro do G-20 esta semana é a de que ele não tem mais incentivos para tomar e executar decisões importantes, que seu ânimo arrefeceu e que os encontros voltaram a ser shows tediosos e inconclusivos. Essa perspectiva é falsa.
O G-20 se consolidou como um novo instrumento supra-nacional de decisão e ação muito mais rapida e satisfatoriamente do que mesmo os mais otimistas previam no início da crise. Algumas das principais questões sobre o novo formato da economia e do sistema financeiro estão em suas mãos e dele dependem as linhas gerais de ação que podem reger o mundo nos próximos anos. A magnitude e complexidade dos problemas, e a variedade de interesses envolvidos, tornam o esforço de mediação mais tortuoso e o consenso obtido fica mais perto do possível do que do desejável. Entretanto, houve avanços notáveis e o que o G-20 precisa fazer agora não é mais de rapidez nas decisões, e sim da definição de uma agenda de reconstrução econômica clara e de persistência em sua execução.
Há um surpreendente acordo, com uma ou outra divergência periférica, sobre as melhores maneiras de impedir que as instituições financeiras voltem a colocar o mundo novamente à beira do precipício. Há medidas corriqueiras sobre a mesa, algumas inovadoras e outras radicais. O G-20 soube até agora driblar a armadilha de constituição de um órgão multilateral com poderes de decisão sobre o sistema financeiro global, como queriam os europeus. As formas pactuadas de concordância entre nações podem até ter a desvantagem da lentidão, mas são uma alternativa ao conflito aberto e paralisante que uma nova estrutura com poderes intrusivos em decisões domésticas teria.
Os bancos sairão da crise com a obrigação de elevar seu capital, de ajustar o volume de capital ao estágio do ciclo econômico (maior nos período de crescimento, menor no de crises), de reduzir seu grau de alavancagem e de adequar prudentemente sua liquidez, reduzindo o financiamento de apostas de longo prazo com dinheiro de prazo muito curto. Os bônus milionários dos executivos serão cerceados, distribuídos ao longo dos anos, com uma parcela maior em ações, atrelados não mais a metas anuais, mas plurianuais e, também, obviamente atados a resultados gerados por vários exercícios. Há um diagnóstico claro e unânime sobre as causas da crise financeira e sobre os remédios para evitar sua repetição. A questão dos bônus é a que aparece de forma mais polêmica, embora não seja a mais importante. É nela que se concentram as necessidades de os governos darem justificativas políticas para entregarem dinheiro público a banqueiros irresponsáveis que procuram prêmios em meio à catástrofe financeira. As medidas até agora propostas para disciplinar os bônus não vão muito além do senso comum, embora vários executivos a coloquem como inibidoras da busca por talentos imprescindíveis aos negócios.
Não há e não haverá no G-20 consenso sobre uma solução acabada para os desequilíbrios estruturais da economia global. O G-20 pode desempenhar um papel relevante na contenção do protecionismo, mas tem pouca força de persuasão para, por exemplo, obrigar a China a valorizar sua moeda ou fazer com que o governo chinês se apoie mais na demanda doméstica do que nas exportações. Os países desenvolvidos saíram enfraquecidos da crise e os países emergentes, que se livraram rapidamente dela, querem obter mais poder na nova ordem internacional. Dessa forma, os avanços neste ponto tendem a ser muito menores, ainda que importantes. Se o G-20 implantar sua agenda financeira, fará um progresso extraordinário. Se evoluir na econômica, realizará uma proeza.
NOVA BATALHA POR RECURSOS
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
22/9/2009
A edição de A GAZETA de 16 de outubro de 2008 publicou neste espaço um editorial sobre a proposta de reforma tributária, em tramitação na Câmara dos Deputados, cujo texto assinalava: "(...) o FER (Fundo de Equalização de Receita) vai funcionar conforme o prometido? Essa é uma dúvida atroz. Se copiar o desempenho da Lei Kandir, os Tesouros estaduais vão sofrer frustrações. Historicamente, o fluxo de repasses compensatórios nunca foi cumprido à risca pela União. Tanto no governo de FHC quanto no de Lula (...)".
Pois bem, a frustração está em vias de ser agravada. O contingenciamento pode virar interrupção total dos repasses referentes à desoneração tributária prevista na Lei Kandir. Não consta dinheiro para esse ressarcimento no Orçamento Geral da União (OGU) de 2010. Nem um centavo.
De 1996 a 1999, as indenizações previstas na Lei Kandir foram calculadas de acordo com a arrecadação do ICMS. De 2000 a 2003, prevaleceu, para efeito de cálculo, a estimativa da receita do ICMS. A partir daí, portanto desde o início do governo Lula, foram feitos acordos entre o Ministério da Fazenda e os Estados, incluindo previsões orçamentárias.
O corte total dos repasses significa a quebra do entendimento, numa lamentável decisão unilateral tomada pela União. Contradiz discurso feito há poucos dias pelo presidente da República, incentivando o aumento das exportações.
Os Estados exportadores cobram a inclusão de pelo menos R$ 5,2 bilhões na proposta do OGU 2010, valor muito abaixo da renúncia fiscal de R$ 24,4 bilhões estimada para se realizar ao longo de 2009 – apesar do desaquecimento das vendas ao exterior, em função da crise global. Bancar a conta inteirinha parece demais para unidades da Federação.
O relator do OGU de 2010, deputado Geraldo Magela (PT-DF), afirma que existe um buraco da ordem de R$ 20 bilhões nas contas que o Planalto está apresentando – mesmo sem a provisão de recursos para a Lei Kandir.
O projeto enviado pelo Executivo não reserva dinheiro sequer para cobrir o reajuste que está sendo prometido aos aposentados e pensionistas que ganham mais de um salário mínimo. Parece uma estratégia para negociar com os congressistas o corte em outras áreas. Até porque, também não há verba prevista para cobrir o total das emendas parlamentares.
No caso das compensações estabelecidas pela Lei Kandir, o governo parece ter achado um pretexto para inibir quaisquer negociações. Está tentando levar a questão para o terreno jurídico – o que nunca havia feito antes.
O Planalto sustenta que a Constituição determina obrigatoriedade de pagar o ressarcimento do ICMS aos Estados após a aprovação de uma lei complementar que ainda não existe. Enquanto isso, estaria valendo a Lei Complementar 115, de 2002, que prevê o ressarcimento somente até 2006.
Há contestação. Governos estaduais argumentam que a Carta Magna, no artigo 91 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), prevê a obrigatoriedade de o Executivo federal ressarcir os Estados pelas perdas com a Lei Kandir. Consequentemente, seria inconstitucional a inexistência de recurso para esse fim no OGU de 2010. Já tem governo estadual examinando a possibilidade de impetrar uma ação direta de inconstitucionalidade (Adim) contra a União.
Como se vê, a batalha do pré-sal não é a única que o Espírito Santo e outros Estados têm de enfrentar no Congresso. Salvo melhor inspiração, a estratégia é formar alianças entre as bancadas de Estados que têm interesse comum.
SEARA DO TSE
EDITORIAL
ESTADO DE MINAS
22/9/2009
É competência do tribunal julgar recursos contra a diplomação de eleitos
Se depender do parecer da Procuradoria Geral da República (PGR), a competência para julgar os recursos contra a diplomação de governadores, senadores, deputados federais e estaduais é exclusiva do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), conforme a Constituição (artigo 121, parágrafo 4º). No documento entregue ao Supremo Tribunal Federal (STF), a vice-procuradora-geral Deborah Duprat defende a derrubada da liminar concedida pelo ministro Eros Grau, que interrompeu o andamento de todos os processos de cassação no TSE. O plenário do Supremo deve decidir no dia 30 se mantém ou não a liminar. Ao suspender os processos, Eros Grau atendeu a uma arguição de descumprimento de preceito fundamentais (ADPF) movida pelo PDT, que argumenta que cabe na verdade aos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) julgar a legalidade das eleições estaduais e federais. Ao TSE caberia apenas analisar eventuais recursos contra essas decisões, diferentemente do que diz sua jurisprudência há décadas.
Nos últimos meses, o TSE gerou polêmica ao cassar os mandatos de três governadores – Cássio Cunha Lima (PSDB), da Paraíba, Jackson Lago (PDT), do Maranhão, e Marcelo Miranda (PMDB), de Tocantins – por irregularidades no processo eleitoral, acusados especialmente de abuso de poder político e econômico. Pelo menos outros três governadores aguardam o julgamento da corte: Ivo Cassol (sem partido), de Rondônia, José de Anchieta Júnior (PSDB), de Roraima, e Marcelo Déda (PT), de Sergipe. Roseana Sarney (PMDB), que assumiu o governo do Maranhão depois da cassação de Jackson Lago. também pode perder o mandato.
Para a PGR, a jurisprudência do TSE está correta porque o “recurso contra a expedição de diploma eleitoral” – como o próprio nome diz – tem natureza recursal, ou seja, busca combater o ato de diplomação emanado pelo próprio tribunal regional. “A ideia de devido processo legal recomenda que, sempre que possível, o reexame de uma decisão seja feita não por aquele que a proferiu, já que se presume que o autor do ato questionado não será o agente mais imparcial para revê-lo”, pondera Deborah Duprat. De fato, o TSE tem condições de fazer um julgamento mais “imparcial”, já que estaria livre de “pressões locais indevidas”. Segundo ela, não deve ser evocado nesse caso o princípio do duplo grau de jurisdição, dadas as características do processo eleitoral. Destaca ainda que o retorno dos processos de cassação aos TREs traria insegurança jurídica e inviabilizaria o julgamento dos processos antes do término dos mandatos. “É vital, sob pena de inadmissível coroamento da impunidade na seara eleitoral, com gravíssimos reflexos sobre a legitimidade da representação política nacional, que os recursos contra a expedição do diploma sejam julgados pela Justiça Eleitoral, de forma definitiva, durante o curso do mandato dos candidatos eleitos, preferencialmente no seu início”, diz Duprat. Vale lembrar que, mesmo com o julgamento único no TSE, os processos têm levado anos para ser finalizados, o que, reconheçamos, não é nada bom para a democracia.
RIGOR NA FISCALIZAÇÃO DO TRÂNSITO
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
22/9/2009
O Distrito Federal colhe resultados positivos num setor trágico no país: o trânsito, uma das principais causas de morte no Brasil, com taxa anual superior a 35 mil casos. Nos últimos 14 anos, o índice de óbitos por grupo de 10 mil veículos caiu de 14,9 para 3,8 na capital federal, uma redução de 74,4%. Ou seja, em vez de o drama se agravar com o aumento da frota, que passou de 436 mil para mais de 1 milhão de veículos entre 1995 e 2009, o que se viu foi o contrário. Mas essa é uma batalha que jamais poderá ser dada como ganha. Ainda que a taxa de acidentes fatais fosse zerada, haveria necessidade de se manter a vigilância, com controle absoluto da situação.
Preocupa, pois, a notícia de que, no DF, 25% dos autos de infração expedidos mensalmente por agentes do Departamento de Trânsito (Detran) ou policiais militares são cancelados por falta de consistência. A fiscalização é um dos principais instrumentos, junto a campanhas educativas, para os avanços conquistados até aqui. Não pode cair no descrédito. Reportagem publicada ontem pelo Correio Braziliense revela erros que seriam hilários, não fosse a gravidade da situação. Por exemplo, um motociclista multado por não usar cinto de segurança. Ou um portador de necessidades especiais três vezes notificado por estacionar em vaga especial, mesmo com o adesivo que comprova a autorização colado no para-brisa do carro.
Observe-se que a quantidade exorbitante de multas irregulares poderia ser ainda maior, não fosse parte delas anulada em análise preliminar do Núcleo de Infrações do Detran. Ou seja, mesmo depois do pente-fino, um quarto das comunicações de violação da lei que chega aos condutores é infundada. Pior: o jornal também identificou caso em que a Junta Administrativa de Recursos de Infração (Jari) manteve multa absurda, rejeitando a alegação do motorista. Fica evidente a necessidade de revisão dos processos. A persistência no erro desgasta a autoridade de trânsito, causando, mais que transtornos e aborrecimentos pessoais aos diretamente envolvidos, danos à coletividade.
Nem a credibilidade das multas nem muito menos a do órgão responsável pela execução das leis nacionais de trânsito e a segurança das vias podem ser postas em dúvida. Ante hipóteses de aplicação de sanções financeiras e administrativas quando não há condutas a serem punidas, alimenta-se a cultura da incerteza sobre os métodos e os equipamentos do sistema fiscalizador. Abre-se a porta a índices mais elevados de desrespeito às convenções do tráfego e mais impugnações à imposição das reprimendas da lei.
JULGAMENTO POLÍTICO
EDITORIAL
DIÁRIO DE CUIABÁ (MT)
22/9/2009
A Câmara de Cuiabá começou a investigação sobre os supostos desvios cometidos na época em que o Legislativo municipal era presidido pelo vereador Lutero Ponce (PMDB).
Concretizada a cassação do vereador Ralf Leite (PRTB) por quebra de decoro parlamentar, a crise institucional na Câmara parece ter arrefecido. Mas é importante pontuar que, a despeito da aparente calmaria no Legislativo – com o fim do clamor por justiça -, os vereadores têm a obrigação de se empenhar e investigar o caso Lutero com rigor.
Pesa contra o vereador a acusação de que, sob o seu comando, nada menos que R$ 7,5 milhões teriam sido sugados por um esquema de desvio de recursos públicos, segundo concluiu uma auditoria contratada pela atual presidência.
A auditoria descobriu que empresas “laranjas”, instaladas em casebres na periferia de Cuiabá – fato aliás, mostrado em primeira mão pelo Diário -, “venderam” altas somas de produtos para o Legislativo, produtos estes jamais entregues.
A investigação policial está bastante encaminhada, com a possibilidade de que os acusados, incluindo Lutero Ponce, sejam denunciados pelo Ministério Público Estadual para futuro julgamento. O trabalho da Câmara, no entanto, ainda engatinha.
Ao eleitor, que fez coro pela cassação de Ralf Leite, cabe agora cobrar de seus vereadores uma posição firme em relação a Lutero Ponce. Porque se corrupção de menores e tentativa de corrupção constituem razão para se cassar um vereador, como de fato ocorreu com Ralf Leite, também será razão o desvio de recursos públicos, caso sejam provadas as acusações que pesam contra Lutero Ponce.
Não é necessário nenhum esforço intelectual para deduzir que a acusação contra Lutero Ponce é, de longe, bem mais grave do que aquela que derrubou Ralf Leite. Mas em política, nem sempre o óbvio é certo.
Enquanto, em tese, o Poder Judiciário julga com base em preceitos técnicos e amparado pelo rigor da lei, o julgamento político, feito por pares, é sujeito a variáveis nem sempre fáceis de se identificar. Por isso, será importante, a partir de agora, cobrar dos vereadores respeito ao interesse público, transparência nos atos e senso de Justiça.
“Ao eleitor, cabe agora cobrar de seus vereadores uma posição firme em relação à investigação”
APESAR DOS SENADORES
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
22/9/2009
Os atos secretos em série, usados pelos se¬¬nadores para nomear parentes e reajustar seus próprios salários, entre outros desvios, não passaram despercebidos aos eleitores brasileiros. Ainda bem. A noção exata das medidas decorrentes dos acordos políticos que atropelam quaisquer regras em nome da permanência no poder é vital para que o cidadão busque a transformação – e não apenas pelo voto, mas principalmente pela consciência da distância entre marketing e realidade. Da distância entre o PT da propaganda política, grande defensor da ética na vida pública, e o PT que, após alcançar o poder, adota um pragmatismo político sem precendentes para manter-se nele. Tudo o que se passou no Senado está gravado na memória dos cidadãos mais atentos.
Diante do quadro, é surpreendente que a imagem do Senado tenha, em boa medida, escapado do desgaste geral. É o que revela um levantamento nacional feito pelo Instituto Análise, divulgado nesta semana. A sondagem indica que o eleitor faz distinção entre a instituição e seus ocupantes temporários. Dos mil entrevistados no levantamento realizado no fim de agosto, 52% disseram concordar com a premissa de que o Senado é importante, assim como a Câmara, para “aprimorar as leis”.
Na mesma pesquisa, o porcentual dos que indicaram que o Legislativo brasileiro pode seguir adiante somente com a Câmara foi de significativos 35%. Mas talvez o dado mais animador do levantamento esteja oculto no que o eleitorado não disse: se há brasileiros dispostos a prescindir do parlamento, eles estão diluídos entre os 13% que não souberam ou não quiseram responder. Um saldo favorável e tanto considerando-se um cenário político de tantos desmandos no Senado e, não nos enganemos, também na Câmara e em outras instâncias do governo.
Os numerosos escândados do governo federal – mensalão, dossiês, condução da crise aérea, dentre outros – mostram que o presidente Lula não tem medido esforços para defender as oligarquias que sustentam seu governo. O pacto entre a velha oligarquia, bem personificada por José Sarney, e a nova elite de Lula é a etapa final de uma história anunciada, ao menos para aqueles que intuíam aonde chegaria o partido de inspiração marxista, disposto a pagar qualquer preço pelo poder.
A bandeira da ética – está claro – serviu bem para a propaganda ilusória. A máquina pública foi loteada e aparelhada pelo PT de modo a criar uma rede de proteção para o projeto político de perpetuação no poder. Nesse processo, incluiu-se também a ingerência do governo no Le¬¬gislativo, um dado que também transpareceu na sondagem do Instituto Análise. Pouco mais de um terço dos mil entrevistados afirmaram que o presidente tem como atribuição aprovar leis para o país. O que parece ser mero engano quanto ao papel dos poderes pode ser lido também como uma percepção da pressão, por meio da oferta de cargos e favores, do Executivo sobre os parlamentares.
O resumo da ópera é que o eleitor não é tolo. Sabe da importância do Legislativo e não embarca na perigosa ideia de um Congresso fechado. Resta agora canalizar essa percepção para um cenário em que a distinção dos três poderes que sustentam a democracia seja mais clara. Um cenário em que a vida pública não seja regida pela ânsia de poder a qualquer preço.
CONFUSÃO
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
22/9/2009
Quando o governo brasileiro anunciou que emprestaria 10 bilhões de dólares ao FMI, vozes surgiram dizendo que esse dinheiro deveria ser usado para um programa de obras públicas internas. A confusão de muitos é não entender que o Brasil formou reservas internacionais em dólares porque passou a ter superávits nas suas transações com o resto do mundo e que essas reservas em dólares pertencem ao país. Se o governo federal resolvesse apropriar-se dessas reservas para gastá-las em obras internas, ele teria que entregar os dólares ao Banco Central e trocar por reais a fim de pagar os executores das obras. O Banco Central mandaria, de novo, os dólares para aplicação no exterior e o Tesouro Nacional ficaria devendo, ao Banco Central, os reais que dele pegou na troca de moedas. Ou seja, seria o mesmo que obrigar o Banco Central a emitir dinheiro e emprestar ao governo. Enfim, trata-se de uma grande confusão sobre o complexo mundo das finanças internacionais. Dessa confusão nascem palpites equivocados, como o de muitos deputados aliados do próprio governo.
UM DIA SEM CARRO
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
22/9/2009
O Dia Mundial sem Carro volta a ser lembrado hoje ainda sem o grau de adesão necessário num país às voltas com o caos no trânsito e suas consequências no caso das grandes metrópoles, mas desta vez com o aval expresso do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) e do Ministério das Cidades. Há uma boa intenção no apoio oficial, mas também um pouco de demagogia: como estimular as pessoas a deixarem seus veículos em casa em cidades que não contam com ciclovias nem com transporte público eficiente, muitas das quais não dispõem nem mesmo de metrô? O problema é real, grave e urgente – e todos os cidadãos devem se conscientizar disso. Mas, para combatê-lo, não bastam atos simbólicos. O país precisa é de ações efetivas e permanentes em todos os níveis da administração pública.
Nas proporções alcançadas hoje, particularmente nas cidades de médio e grande portes, o colapso no sistema de transporte exige muito mais do que um dia para ser lembrado. A data, porém, tem o mérito de servir para reflexão e como alerta sob o ponto de vista ambiental e do trânsito. O drama enfrentado diariamente por quem circula hoje por vias urbanas e rodovias provoca consequências cujo enfrentamento não tem mais como ser adiado. Os efeitos precisam envolver tanto ações governamentais quanto a colaboração efetiva da sociedade, em conjunto e individualmente. Como em qualquer área relacionada às questões ambientais, também nessa a conscientização em relação ao problema e o esforço de cada um são essenciais para assegurar ganhos, por menores que sejam.
Sob o aspecto da qualidade do trânsito, é óbvio que qualquer melhoria depende tanto do menor uso de veículos particulares quanto de investimentos em alternativas eficientes de transporte coletivo. Mas, para assegurar avanços também sob o ponto de vista da qualidade do ar, é preciso haver mais cobrança e mais investimentos em favor de veículos menos poluentes. Embora a principal causa do chamado efeito estufa no país seja o desmatamento, não há como reduzir as emissões de gás carbônico nas proporções necessárias para conter os danos à saúde da população sem uma readequação imediata da política de transportes.
Emergencialmente, é importante pôr em prática ações como as previstas para hoje, como a preferência pelo transporte coletivo, a decisão de deixar o carro em casa ou de exercitar a carona solidária, e a de recorrer a deslocamentos a pé ou de bicicleta. Ainda assim, embora a conscientização sobre o problema venha aumentando, as últimas atividades marcadas para lembrar a data demonstram que o avanço ocorre num ritmo inferior ao necessário. A programação de hoje já terá cumprido seu papel se contribuir para reforçar a compreensão coletiva de que os problemas de trânsito começam a fugir ao controle e precisam ser incluídos logo, efetivamente, como prioridade na agenda do poder público.
O LIXO CONSOME A PRAIA
EDITORIAL
JORNAL DO COMMERCIO (PE)
22/9/2009
O sol escaldante, as águas mornas e a faixa larga de terra nua convidam para o prazer e o descanso. Mas um odor forte, objetos estranhos na água e sobras de comida e bebida na areia podem fazer qualquer um pensar duas vezes antes de voltar: o lixo da praia é a praia no lixo, que não se esconde e não tem desculpa, feito a casa desarrumada. O refugo ameaça o deleite, e o consumo na praia traz o risco da praia consumida.
No último dia 12, a Prefeitura do Recife, em parceria com a iniciativa privada, deu a partida no Projeto Praia Limpa, que visa à conscientização dos usuários em toda a extensão da costa recifense. A iniciativa é louvável, mas para que a mensagem da campanha seja assumida pela população e assimilada pelos turistas, a prefeitura tem que fazer a parte dela – e que vem a ser muito mais do que distribuir sacos reciclados e reclamar da sujeira dos outros. Um exemplo da culpa municipal é o esgoto que corre para a praia em pleno cartão-postal de Boa Viagem, situação que em nada colabora para o bem-estar de quem anda na areia, ou para a atividade turística. Sem falar na feia onda de sujeira que vem à tona, também em Boa Viagem, sempre que a maré baixa. A realização de “mutirões” de grande impacto midiático e baixa durabilidade não passam de paliativos, diante do recolhimento permanente, única solução confiável.
Durante o primeiro feriado prolongado do verão 2009/2010, em 7 de Setembro, as principais cidades litorâneas do Estado tiveram uma amostra dos transtornos que devem se repetir – e se agravar – entre dezembro e fevereiro. Entre eles está o acúmulo de dejetos deixado pelo afluxo elevado de pessoas que ocupam ambientes naturais desprotegidos e áreas urbanas mal guarnecidas de serviço de coleta e limpeza para o excesso de movimento.
Para se ter uma ideia, a estimativa da Prefeitura de Itamaracá é de que a população seja multiplicada por cinco vezes nos finais de semana no próximo período de veraneio. Um número de assustar qualquer gestor público. A prestação de serviços básicos torna-se um desafio. Quanto mais gente, mais sujeira, mau cheiro, entulhos e insetos. O prefeito afirmou, com toda razão, que o lixo será a grande dor de cabeça de Itamaracá neste verão.
Em Ipojuca, onde se situa Porto de Galinhas, a prefeitura anunciou, logo após o feriado, um conjunto de medidas emergenciais para tentar sanar o problema. Considerada por muitos como a praia mais bonita do Brasil, Porto não quer ser conhecida como o destino mais sujo do litoral.
Como a antecipação do verão é um fato consumado, adotar desde já uma estratégia de controle urbano, especialmente no que concerne à gestão de resíduos, deveria ser a regra para todos os municípios do nosso litoral. Em qualquer paradeiro do mundo, a paisagem mais bela, maculada pela sujeira, não faz o turista levar boa lembrança na bagagem. Além da má imagem, o lixo nas praias representa, a médio prazo, a redução de visitantes e a fuga de empreendimentos instalados ou projetados no local.
A poluição em contato direto com o corpo, como é o caso da poluição praieira, indica por outro lado a fragilidade exposta do poder público, incapaz de fiscalizar e fazer cumprir normas civilizadas de uso desses espaços. Campanhas educativas – como Praia Limpa – teriam que ser deflagradas o ano inteiro, com o objetivo de disciplinar comerciantes e visitantes, minimizando o dano ambiental e promovendo a desejável sustentabilidade. Se esta é uma tarefa que extrapola a capacidade dos municípios, que sejam firmadas parcerias com os governos estadual e federal, já que se trata de assunto de interesse coletivo que envolve todos os níveis de governo.
Para que a praia no verão não vire lixão, é importante apelar à cidadania, e exigir do turista a atitude responsável de zelar pelo meio ambiente, sem a agressão do desleixo. Depois, afinal, o consumidor que polui virá reclamar da poluição consumada, sem atentar para o dever que também é dele. Contudo, somente ações integradas de governo responderão pelas demandas urgentes de saneamento, controle e manutenção desses locais privilegiados para o desfrute do corpo e da alma, onde se pode usufruir, democraticamente, de um banho de sol à beira-mar.
OUTORGA PRECISA SER HONRADA
EDITORIAL
A CRÍTICA (AM)
22/9/2009
É grande o desafio e a responsabilidade do prefeito eleito de Coari, Arnaldo Mitouso. No último domingo, ele saiu-se vitorioso em eleição suplementar realizada pelo Tribunal Regional Eleitoral, o TRE, em função da vacância desse cargo gerada pela cassação do mandato do então prefeito Rodrigo Alves.
O resultado, apertado, mostra, por um lado, que houve manifesto desejo de mudança da população coariense e, por outro, que o grupo que estava no poder ainda respira, por assim dizer, em que pese aos desmandos de toda ordem e grau praticados à frente da coisa pública.
A contagem final dos votos atesta isso, pois Mitouso recebeu 16.256 deles contra 14.427 dados ao seu principal adversário, Manuel Vicente, num dia cívico em que, dos 40.619 eleitores aptos a votar, 9.030 deixaram de comparecer às urnas.
A propósito, essa expressiva ausência, mais do que um ato de desobediência cívica, sugere, entre outras coisas, profunda indiferença no que tange aos destinos da administração pública, quem sabe, animada pela ideia equivocada que muitos eleitores cultivam de que político é tudo “farinha do mesmo saco”.
Daí, em parte, vem o desafio que Mitouso terá pela frente, agora na condição de prefeito eleito do segundo município mais rico do Amazonas, graças, obviamente, aos royalties oriundos do petróleo e do gás natural extraídos na província de Urucu.
Caberá a ele provar, por exemplo, que é furada a tese de que gente de seu metiê é tudo a mesma coisa, visto que dela se aproveitam especialmente os maus políticos, desses que almejam o poder pelo poder e, uma vez no cargo, costumam agir como verdadeiros déspotas esclarecidos.
Esse desafio, no entanto, será tanto mais facilmente superado quanto maior for o nível de responsabilidade pública de Mitouso e do grupo político que lhe dá sustentação.
Nesse aspecto, para início de conversa, basta que o prefeito eleito faça um exame realmente crítico do legado do grupo derrotado, para daí se extraírem caminhos diversos que levem a um reencontro com a moralidade pública em Coari.
Sem esse cuidado elementar, por isso indispensável às pretensões da nova administração, Mitouso estará contribuindo para manter as coisas como estão e/ou sempre foram, o que não condiz com a procuração que lhe outorgou o povo coariense no último domingo. Ele que procure honrá-la.