Sunday, September 27, 2009

27/9/2009 - EDITORIAIS


O DEUS ESTADO
EDITORIAL
O GLOBO
27/9/2009

Por esperteza político-eleitoral, ideologia ou ambos — o mais provável —, há uma febre de “estadolatria” em Brasília. Talvez porque tenha funcionado no segundo turno de 2006 o estratagema de tachar tucanos de “privatistas”, a defesa do Estado passou a aparecer com mais frequência em discursos do presidente Lula e da candidata Dilma Rousseff. Explora-se com alguma competência a ideia tosca, ainda existente na população, de que o “Estado é do povo”, assim como suas empresas. Confunde-se o “estatal” com o “coletivo”, como se não existisse a expropriação privada do bem público pelo patrimonialismo, exercido de maneiras mais sutis ou escancaradas, como nas mordomias do Executivo e no nepotismo de Legislativo e Judiciário.
Com responsabilidade de governante, é verdade que Lula não tem brincado em serviço: embora não deva discordar que os críticos do novo modelo de exploração do présal, de figurino estatizante, sejam adjetivados de “entreguistas”, apressou-se a permitir que a participação de investidores estrangeiros dobre no capital do Banco do Brasil, pois se trata da única forma de abrir espaços para ampliar a capitalização do BB.
Em recente entrevista à “Folha de S.Paulo”, a ministra Dilma tratou de criticar a ideia do “Estado mínimo”, pressupondo que haja alguém, no mundo de hoje, que ainda defenda um modelo de laissez-faire com tinturas do século XIX. A preocupação que se tem é com o “Estado máximo”, com o qual autoridades de primeiro escalão do governo parecem sonhar. Em outra entrevista, esta de Lula ao jornal “Valor”, o presidente anunciou o envio ao Congresso da “Consolidação das Leis Sociais” — não bastasse o engessamento do mercado de trabalho, em prejuízo dos trabalhadores, causado por uma outra “consolidação”, a CLT getulista. Mais uma vez: pode ser tática eleitoral — para atiçar a oposição a se colocar contra o “povo” — e também ideologia. Tratase de outro princípio da “estadolatria”, pelo qual toda “bondade” precisa ser transformada em lei, para que o Estado imponha seu cumprimento.
Uma ilusão, como demonstra a CLT, principal causa de a metade dos trabalhadores sobreviver na informalidade.
Mas não é só discursos. Há efetivos avanços do Estado sobre espaços da sociedade. Um exemplo é a tentativa da Anvisa de proibir e regular anúncios de alimentos e remédios, embora a própria Advocacia Geral da União diga ser esta função exclusiva do Congresso. Está claro que os estatistas querem tutelar uma sociedade que consideram imatura e despreparada para cuidar da própria sobrevivência.

CORREÇÃO URGENTE
EDITORIAL
O GLOBO
27/9/2009

A volatilização do traficante Polegar, numa fuga que, de tão anunciada, poderia ter sido acompanhada desde o momento em que o bandido deixou a prisão para gozar do benefício do regime semiaberto, e a possibilidade de cinco chefões do tráfico do Rio saírem da cadeia bem antes de cumprirem as penas são dois exemplos a evidenciar o óbvio: o país precisa mudar com urgência a Lei de Execuções Penais.
Nela, a figura da suposta regeneração do preso deixou de ser — principalmente no que diz respeito a evidentes favorecimentos de condenados de alta periculosidade — uma filosofia louvável em seus princípios correcionais para se tornar a chave que abre prematuramente as portas para a liberdade de criminosos que voltam às ruas para aterrorizar a sociedade.
Ao prender aqueles que optam por agir ao arrepio da lei, o Estado tem a obrigação de fazê-los expiar sua culpa — mas deve, paralelamente, oferecer-lhes condições de regeneração e reinclusão na sociedade.
Para isso, a Lei de Execuções Penais cria alternativas correcionais, que, no entanto, não deveriam ser adotadas automaticamente na concessão de benefícios como a progressão de pena. Não se pode empregar o mesmo peso correcional na análise de prontuários como o do ladrão eventual, que na cadeia mostra potencial de recuperação social, e o do traficante ou o autor de crimes hediondos em geral, que precisam ser afastados do convívio com a sociedade até que efetivamente cumpram as condenações por seus atos. Quando nada, para desestimular aqueles que pensam em se aventurar numa vida de crimes estimulados pela conhecida tibieza da legislação.
É inadiável rever o espírito da lei e criar novos critérios que permitam aos magistrados distinguir na população carcerária aqueles que realmente mereçam a chance da reconstrução da vida e façam da regeneração uma profissão de fé. A abertura indiscriminada das portas a bandidos perigosos atende mais à sagacidade dos advogados que os assistem que ao princípio da ressocialização. Isto se torna evidente na comparação entre a facilidade com que se solta um chefão do tráfico e as estatísticas que dão conta da existência de presos que ficam esquecidos nas celas mesmo depois de terem expiado suas culpas.
Uma recente inspeção do Conselho Nacional de Justiça descobriu, em presídios de apenas quatro estados, cerca de mil pessoas nessa situação, a maioria por não ter recursos para pagar a advogados que comuniquem ao juiz o cumprimento da pena. Há, portanto, flagrantes distorções na lei que precisam ser corrigidas no sistema penitenciário do país.

BC APONTA PERIGO DA GASTANÇA
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
27/9/2009

A gastança federal é um fator de risco para o Brasil, segundo o Banco Central (BC). Essa é a novidade principal do Relatório de Inflação divulgado na sexta-feira em Brasília. Os autores comentam com franqueza maior que a habitual a piora das contas públicas e apontam seus possíveis efeitos inflacionários a médio prazo. O tom se mantém diplomático e a palavra "gastança" obviamente não é usada, mas a preocupação aparece muito mais claramente do que em relatórios e atas divulgados nos últimos dois anos. Por um longo período, os diretores do BC evitaram discutir a política orçamentária abertamente, como se cumprissem um pacto de não-intervenção nos assuntos fiscais. Mas esse pacto, se existiu, nunca foi estritamente respeitado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, nem por outros ministros. Em seus comentários, eles sempre reconhecem a jurisdição do BC sobre a política de juros, mas não se abstêm de dar palpites sobre a condução da política.

O Relatório de Inflação, publicado a cada três meses, contém um panorama da economia brasileira, cenários prospectivos e uma descrição do quadro internacional. As perspectivas para 2009 e 2010 são basicamente otimistas. Os autores mantêm para este ano a estimativa de expansão econômica de 0,8%, já indicada na edição anterior. A evolução dos indicadores "sugere o início de um novo ciclo de crescimento", a partir de uma recuperação facilitada pelas medidas anticrise ? política monetária mais flexível e corte de impostos para estimular o consumo. Com a recuperação, as importações crescerão mais velozmente que as importações em 2010, o superávit comercial cairá de US$ 27 bilhões para US$ 19 bilhões e o déficit em conta corrente passará de US$ 18 bilhões para US$ 29 bilhões, segundo as novas estimativas.

O BC projeta 4,2% de inflação para este ano e 4,4% para 2010, abaixo do centro da meta oficial, 4,5%. Pressões de alta, no entanto, deverão manifestar-se mais sensivelmente a partir do terceiro trimestre do próximo ano, quando a capacidade ociosa da economia deverá ser bem menor que a atual. Isso dependerá da velocidade da recuperação econômica e da retomada, por enquanto incerta, dos investimentos em bens de produção. Além disso, vários preços continuam sujeitos à indexação ? como aluguéis e tarifas ? e isso dificulta o controle da inflação. O quadro ficará mais complicado se a esses fatores se adicionar a piora da situação fiscal.

A situação das contas públicas, segundo os autores do relatório, reflete dois conjuntos de fatores. Em primeiro lugar, há os efeitos da crise internacional: a arrecadação foi afetada este ano pela contração econômica e também pela redução de impostos, adotada como estímulo ao consumo. Em segundo lugar, há uma "tendência de expansão dos gastos". Essa tendência poderá ser mais moderada, mas não será facilmente revertida, advertem os especialistas do BC. O governo poderá eliminar os incentivos fiscais quando julgar oportuno, mas a maior parte das novas despesas tende a ser duradoura. Noutra passagem, há uma referência literal a "certa rigidez dos gastos governamentais". Essa rigidez tende a afetar a realização dos superávits primários, a economia destinada aos compromissos da dívida pública.

Na linguagem típica dos comunicados do BC, os autores acrescentam: "Caso os superávits primários sejam incrementados nos próximos anos, não deve ocorrer inflexão significativa e consistente da tendência de redução da razão dívida sobre produto." Tradução: o governo precisará aumentar o superávit primário para manter em queda a proporção entre a dívida pública e o PIB.

É um ponto de enorme relevância. A dívida pública brasileira ainda é considerada um problema sério pelos analistas do setor financeiro. A relação dívida/PIB vinha caindo, mas voltou a crescer neste ano. Esta consequência é normal num período de crise. Também deveria ser normal o retorno à tendência de queda, a partir da normalização da economia. Mas a elevação do gasto permanente pode tornar difícil esse retorno. A ministra e candidata à Presidência da República, Dilma Rousseff, sustenta opinião diferente. Segundo ela, os fundamentos da economia permitirão um novo corte dos juros básicos. Seria menos preocupante se ela defendesse a contenção das despesas permanentes. Aí, sim, seria bem mais fácil continuar baixando os juros.

O BARATO VAI SAIR CARO
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
27/9/2009

Da maneira como o governo o anunciou, na época, o resultado do leilão de sete trechos rodoviários federais ? entre os quais as ligações de São Paulo com Belo Horizonte e com Curitiba ?, realizado em outubro de 2007, parecia atender tão bem aos interesses das empresas particulares vencedoras da disputa, dos usuários e do próprio governo, que justificava o entusiástico comentário feito então pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva: "Espetacular." O entusiasmo do presidente devia-se também ao fato de que o resultado poderia fortalecer politicamente a candidata que já estava sendo preparada, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, responsável pela definição do modelo de concessão utilizado.

O que se constata agora, no entanto, é que, se houve algum espetáculo, foi de natureza puramente político-eleitoral, pois aqueles resultados, baseados nas tarifas mais baixas apresentadas pelas concorrentes, deram ao governo a oportunidade para dizer que defendia em primeiro lugar o interesse da população, com a redução do pedágio. O que só seria verdade se, dali para a frente, tudo funcionasse como o governo garantia que funcionaria. Não funcionou.

Os descontos oferecidos, alguns excessivamente altos ? uma empresa vencedora comprometeu-se a cobrar um pedágio 65% menor do que o valor básico ?, levantaram, já na ocasião, muitas dúvidas a respeito da viabilidade da operação no médio e no longo prazos. Dois anos depois, as dúvidas transformaram-se em certezas. Como mostrou o Estado na quinta-feira, em reportagem de Renée Pereira, as empresas que venceram a disputa graças ao enorme desconto que ofereceram estão recorrendo ao governo para acertar suas finanças.

Intensamente comemorados por Lula e por Dilma ? críticos das modalidades de concessão utilizadas no governo Fernando Henrique Cardoso e no governo do Estado de São Paulo ?, os resultados dos leilões ameaçam a higidez das empresas vencedoras, que querem alguma forma de recomposição de suas finanças. Os pedidos de reajuste, que têm o nome técnico de reequilíbrio econômico-financeiro, foram apresentados à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).

As concessionárias pedem o aumento das tarifas ? cujo valor atual foi por elas mesmas calculado e que deveriam assegurar a rentabilidade das operações ? ou a prorrogação dos prazos para a realização dos investimentos que se comprometeram a fazer. Alegam que foram prejudicadas pela burocracia governamental. Em alguns casos, dizem, a demora na concessão do licenciamento ambiental prejudicou a construção das praças de pedágio. Em outros, o problema foi a demora na publicação do decreto de desapropriação das áreas a serem ocupadas pelas praças de pedágio, que estavam fora da faixa de domínio da rodovia.

A ANTT diz que examinará caso por caso. O atraso na cobrança dos pedágios decorrente de fatores sobre os quais as concessionárias não tinham responsabilidade será compensado com o aumento das tarifas ou o adiamento dos investimentos. Em qualquer dos casos, quem sairá perdendo é o usuário, por pagar mais ou por pagar por um serviço de que não poderá dispor no prazo inicialmente previsto.

Até agora, Lula e sua candidata podiam afirmar, sem exemplos que contestassem sua afirmação, que o modelo por eles escolhido para a concessão de rodovias, o de menor tarifa, é o melhor.

Um modelo diferente, chamado oneroso, foi utilizado na concessão da operação, manutenção e melhoria de rodovias paulistas. Nesse caso, a empresa se compromete a realizar um volume determinado de investimentos e oferece um preço para obter a concessão. Vence a disputa quem oferecer mais. O governo, de sua parte, compromete-se a aplicar na malha rodoviária todo o dinheiro arrecadado nas concessões.

A qualidade da malha rodoviária paulista e os investimentos na sua melhoria deixam claro que as concessões onerosas funcionam muito bem. Seria bom para todos que também o modelo de menor tarifa defendido pelo governo federal resultasse em rodovias de melhor qualidade com tarifas adequadas para concessionárias e usuários. O pedido das concessionárias mostra, porém, que esse modelo só funcionou como propaganda da candidata Dilma Rousseff ? que agora tratará de aparar o golpe.

LIBERDADE DEMAIS PARA OS FUNDOS?
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
27/9/2009

O Conselho Monetário Nacional aumentou de 50% para 70% do patrimônio dos fundos a parcela que pode ser aplicada em títulos de renda variável. Se aos 70% se acrescentarem os 20% que poderão seguir para fundos estruturados e imobiliários, chega a 90% o máximo das aplicações sujeitas a risco.

O objetivo é permitir que os fundos recuperem a rentabilidade que obtinham ao aplicar em papéis de renda fixa, aproveitando o regime de juros reais elevados. Com a mudança, o potencial de alterações nas carteiras é enorme, num setor com R$ 450 bilhões de patrimônio e que aplica principalmente em títulos públicos.

No exterior, segundo o secretário de Previdência Complementar, Ricardo Pena, "cerca de 60% dos ativos dos fundos estão em renda variável e 40%, em renda fixa". Mas, no exterior, alguns fundos sofreram vultosas perdas, o que não ocorreu no Brasil, onde a maioria cumpriu as metas atuariais e foi pouco afetada pela crise.

Neste ano, com os juros básicos de 8,75% ao ano, a gestão das carteiras ficou difícil e o superávit diminuiu. Os fundos operam com menos gorduras.

Sem mudanças, a saída seria aumentar as contribuições de trabalhadores e empresas ou reduzir benefícios. O maior problema é dos fundos estatais de benefício definido, que garantem o valor da aposentadoria.

Mas aplicar mais em renda variável não assegurará melhores rendimentos. Isso depende de fatores imponderáveis, como a tendência das bolsas, além da gestão qualificada. E o governo, admitiu Pena, quer induzir os fundos a aplicarem em infraestrutura e setores como imobiliário, exportador, agronegócio e ambiental. Esse não é o papel deles, cujo único compromisso é aplicar bem os recursos para suportar o pagamento dos benefícios.

Sem fiscalização rigorosa, a mudança de regras traz o risco de se repetirem casos de má gestão, frequentes em outros países, como os Estados Unidos, onde a liberdade dos fundos é maior. Poderá haver custos extras para as patrocinadoras estatais ou para o controlador, o Estado. E o risco cresce com o interesse dos partidos políticos nos fundos. O PMDB quer comandar o Real Grandeza, de Furnas, com reservas de R$ 6,4 bilhões.

A limitação de aplicação em derivativos, ora determinada, é pouco relevante para reduzir riscos. A ameaça consiste em reduzir os recursos para financiar a dívida pública. E, pior, ampliar o controle sobre os investimentos, pois 2/3 dos recursos dos fundos têm origem estatal.

AUDÁCIAS DA ESPERANÇA
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
27/9/2009

Fatores políticos internos tendem a prejudicar mudanças pretendidas pelo presidente dos EUA no âmbito internacional

A O NUNCIAR uma "nova era de engajamento" dos Estados Unidos no cenário global, o discurso de estreia de Barack Obama na Assembleia Geral das Nações Unidas formalizou uma nítida mudança de perspectivas diante da inflexibilidade que caracterizou a Era Bush.
A virada na política externa de Washington não se resume a lances de retórica, ainda que seja este um campo que Barack Obama domina com particular facilidade. Para citar um exemplo comezinho, mas sem dúvida expressivo, observe-se que as desconfianças do governo Bush com relação à ONU levaram os Estados Unidos ao ponto de nem mesmo honrar seus compromissos com a manutenção financeira da entidade. Saldou-se, com Obama, a dívida material -e o passivo político, por sua vez, parece aos poucos reequilibrar-se também.
Por mais necessário que seja afastar expectativas irrealistas quanto ao papel das Nações Unidas, o governo Barack Obama sem dúvida está correto em investir nas capacidades de influência e de negociação dos Estados Unidos sobre a entidade, em vez de contar exclusivamente com as primazias de sua posição como superpotência militar.
Outro sinal importante no rumo das iniciativas multilaterais foi a presença pessoal de Obama na reunião do Conselho de Segurança da ONU, onde nesta quinta-feira aprovou-se por unanimidade uma resolução histórica contra a proliferação das armas nucleares. O clima para esse compromisso foi sem dúvida facilitado por um gesto concreto de distensão com a Rússia: o recuo americano no projeto de instalar mísseis no Leste Europeu.
Não são poucos, todavia, os obstáculos à relativa abertura proposta pela gestão democrata na política externa. Dificilmente os Estados Unidos poderão contribuir para a definição de metas específicas na questão do aquecimento global, objeto de conferência a ser realizada em Copenhague (Dinamarca) no próximo mês de dezembro. Obama depende, para qualquer proposta concreta nesse sentido, do beneplácito do Congresso.
Como ocorre com outras iniciativas no plano interno -vale citar a polêmica, que polariza as forças políticas do país, em torno de seu projeto de assistência à saúde-, tudo depende da capacidade de Obama para manter o elã renovador que acompanhou sua vitória eleitoral. Esvaiu-se nitidamente, contudo, o capital político do novo presidente. Desde o início do ano, subiram de 20% para 40% os seus índices de reprovação.
Dos dilemas no Afeganistão ao encaminhamento da recuperação econômica, o cerco da realidade concreta vai estreitando a margem de atuação do presidente americano -e seu desempenho internacional, embora lhe renda dividendos no curto prazo, depende de uma sustentação interna que parece bastante insatisfatória no momento.

LOBBY DO CAIXA DOIS
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
27/9/2009

DEPOIS de criarem mais um programa de vantagens excepcionais para devedores em atraso com a Receita, os congressistas brasileiros decidiram remover as fronteiras de sua generosidade fiscal. Um projeto da base aliada ao Palácio do Planalto destinado a incentivar, por meio de anistia, a repatriação de dinheiro enviado ilegalmente ao exterior deixou para trás quatro anos de merecido limbo e foi aprovado pela Comissão de Finanças da Câmara.
Pelo texto, de iniciativa do deputado José Mentor (PT-SP), os responsáveis pela evasão de divisas poderão trazer de volta os recursos ao país sem punição pelo crime cometido. Será cobrado apenas um tributo de 10% ou 15%, sem multas ou juros de mora -enquanto os demais contribuintes estão sujeitos a um Imposto de Renda de até 27,5%. Proposição de objetivo similar também tramita no Senado.
Os defensores do projeto argumentam que a instabilidade econômica e a alta carga tributária impulsionaram a sonegação fiscal no passado. A anistia, já adotada em países como Itália e Alemanha, estimularia a regularização de empresas e pessoas físicas. E, atrativo apresentado ao público com mais ênfase, a medida permitiria o ingresso de até US$ 150 bilhões na economia.
A cifra grandiloquente, se levada a sério, depõe contra a proposta. O Brasil se debate hoje com excesso, não falta, de dólares, o que obriga o governo a se endividar em moeda nacional para adquirir ao menos parte das sobras para as reservas do Banco Central. A hipotética entrada de tal volume traria ou um aumento extra da dívida interna ou a derrocada das exportações com a sobrevalorização do real.
Como de hábito no lobby parlamentar, interesses particulares são vendidos como benefícios coletivos. Não há recompensa social que justifique o prêmio oferecido a práticas como caixa dois e lavagem de dinheiro.

CONFIANÇA FORTALECIDA
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
27/9/2009

A condição do Brasil de ser um dos primeiros países a sair do quadro mundial de recessão faz bem psicologicamente à população e anima os investidores.

Pesquisas mostram isso. O ICEI, Índice Nacional de Expectativa do Consumidor, calculado pela CNI (Confederação Nacional da Indústria), cresceu 4,7%, alcançando 115,4 pontos neste terceiro trimestre, ante 110,3 nos três meses anteriores.

Assim, neste final de setembro, exatamente um ano após o agravamento das dificuldades internacionais, a confiança dos brasileiros nos rumos da economia voltou aos níveis pré-crise. O ICEI em 115,4 pontos é estatisticamente igual ao do terceiro trimestre de 2008, quando somou 115,6 pontos. E está apenas 0,6 ponto abaixo do recorde histórico atingido no terceiro trimestre de 2006, com 116 pontos.

O otimismo reflete a expectativa de crescimento superior a 2% do PIB brasileiro no trimestre julho/agosto/setembro e intensificaria o dinamismo retomado no 2º trimestre com a expansão do PIB em 1,9%. Um dos determinantes do resultado do ICEI é o aumento da renda da população. A soma das respostas subiu de 110,5 pontos na pesquisa anterior para 113,8 pontos, na atual.

De fato, a renda do trabalhador brasileiro continua se elevando, baseada na variação da inflação e nos reajustes do salário mínimo. Em agosto, a média foi de R$ 1.336,80, alta de 0,9% frente a julho, e de 2,2% sobre agosto de 2008. De janeiro a agosto/2009 a renda média é de R$ 1.335,11, alta de 3,8% na comparação com os mesmos meses do ano passado. É recorde para esse período desde 2003.

A propósito, é pertinente lembrar que o emprego com carteira assinada no setor privado apresentou, em 2009, o nível mais elevado para um mês de agosto, dentro da série histórica da PME (Pesquisa Mensal do Emprego), que o IBGE elabora desde 2002. Do total da população ocupada, 44,5% estavam nesta situação no mês passado.

Uma coisa puxa outra. Com expansão do emprego e da renda, o endividamento da população está menor. O indicador aumentou de 104,5 pontos para 109 pontos (nesse caso, quanto mais alto o total de pontos menor o volume da dívida).

E a vontade de ir às compras cresceu na sociedade. O ICEI também mostra os consumidores mais dispostos a adquirir bens semiduráveis e duráveis, portanto de maior valor. O indicador subiu de 108,7 pontos para 112,1 pontos.

Em função desse quadro, a Confederação Nacional da Indústria afirma, em nota, o que se mostra previsível: "Aumento de demanda nos próximos meses". A posição da entidade reforça a expectativa de que os setores fabris voltados para o mercado interno, o comércio e as atividades de serviços terão Natal superior ao de 2008.

O horizonte do otimismo da população vai além do Natal. Uma outra pesquisa, a CNI/Ibope, realizada de 11 a 14 deste mês em todo o país, revela boa expectativa em relação à evolução da economia nos próximos seis meses. Os aspectos de maior destaque apontados pelos entrevistados mostram melhoria dos níveis de emprego formal, de renda e baixos índices de inflação – fatores que decorrerão do crescimento continuado.

Nesse quadro, se encaixa uma outra pesquisa. É o Índice de Confiança da Indústria (ICI), elaborado pela Fundação Getúlio Vargas, que alcançou 105,7 pontos, em agosto, o maior patamar desde setembro do ano passado.

Então, só falta o governo atender à disposição das empresas para realizar novos investimentos. É necessário prosseguir a redução dos juros e diminuir a carga fiscal em várias atividades. Pelo menos isso, já que não se fala em melhorar as leis trabalhistas, nem em outras medidas.

A PEC DOS VEREADORES E A CONSTITUIÇÃO
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
27/9/2009

Não é possível qualificar senão como manobra política oportunista, marcada com o sinete da imoralidade, a decisão do Congresso de atrelar às câmaras municipais mais 7.343 cargos de vereadores. A emenda constitucional que viabilizou a indecência (PEC n° 336/09) não ficou apenas na criação das cadeiras, já de si iniciativa inconveniente a todos os títulos. Ordenou a posse imediata de igual número de suplentes. Raras vezes Câmara e Senado ocuparam-se em promover, em um só instrumento legislativo, tantas afrontas às convenções morais e violações à Constituição.

A impostura do Congresso foi confeccionada apenas com o tecido da malandragem política, à vista da inexistência de qualquer movimento popular em favor da medida. Salvo — explique-se — as pressões dos próprios beneficiários da prebenda espúria. Os deputados e senadores que deram quorum à aprovação da matéria agiram para aumentar o lastro de apoio nos municípios com o olho nas eleições de 2010. Para tanto, não se pejaram em legar à ordem jurídica verdadeiro queijo suíço, tanto os furos abertos na Carta Política.

Todo o conjunto das disposições aprovadas está, antes do exame de qualquer outra impertinência legal, vulnerado por vício incorrigível de inconstitucionalidade. O art. 16 da Lei Maior sanciona que as regras eleitorais precisam ser aprovadas um ano antes da eleição, advertência que inclui o número de vagas nas Câmaras. Se o objetivo nuclear da PEC fere a Constituição, todos os demais pontos secundários desabam pelo princípio da contaminação. Quando muito, por efeito de interpretação indulgente, poderia o aumento das cadeiras valer para o pleito de 2012.

Observe-se, ainda, que os destinatários do privilégio indecoroso são vereadores suplentes, não suplentes de vereadores, como sucede no caso de suplentes de senadores. Não foram, portanto, eleitos. Logo, a criação das vagas e a posse imediata teriam efeito de eleição indireta, como bem advertiu o ministro (aposentado) do Supremo Tribunal Federal Carlos Veloso, também ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral. Ora, a Constituição estabelece que a soberania é um dos fundamentos da República (art. 1, inciso I). E o artigo 14 sanciona que “a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto (…)”. Não há amparo para a via eleitoral indireta.

No aranzel das muitas agressões ao texto constitucional, colhe-se que a eventual aplicação da PEC implicará mudança dos dados pertinentes à formação do cociente eleitoral dos partidos. Em consequência, muitos vereadores eleitos deverão ser afastados para ceder lugar aos que chegam pela decisão obscena do Congresso. A invalidação de mandatos outorgados segundo os mandamentos da lei corresponderia a inadmissível fraude à consciência popular. A esperança é a de que o STF recomponha a ordem política mediante remessa da malsinada PEC ao baú das aventuras insanas.

PROJETO COPA DO MUNDO
EDITORIAL
DIÁRIO DE CUIABÁ (MT)
27/9/2009

Calendário e obrigações nunca foram levados ao pé da letra pelo governo federal no mandato do presidente Lula da Silva e de seus antecessores, nos últimos anos.

O descompromisso com o setor agrícola é visível, e a chamada área econômica do governo federal muda as regras contratuais com a lavoura em curso. Essa falta de princípio também se aplica na questão ambiental e do uso do solo. O cidadão, calejado por tantos descompassos, não se surpreende mais com medidas radicais e falta de posicionamento oficial sobre assuntos relevantes.

Descompromisso da União foi o que se viu na sexta-feira, na reunião da delegação mato-grossense chefiada pelo vice-governador Silval Barbosa, com a esfera ministerial, em Brasília, para alinhavar entendimentos sobre a Copa do Pantanal em 2014. Ao invés de serem informados sobre o cronograma de liberação de recursos para as obras necessárias ao Mundial, os representantes de Mato Grosso foram informados da escassez orçamentária que dificultará e – pasmem! - até mesmo poderá inviabilizar a realização do maior evento do futebol em algumas subsedes, incluindo Cuiabá.

A realidade é que a União estaria disposta a investir cerca de R$ 420 milhões em cada subsede do Mundial. Esse montante é ínfimo para a demanda mato-grossense, e some-se a esse fato a insolvência financeira da prefeitura de Cuiabá e as limitações do governo estadual, o que estrangula o sonho de se alcançar R$ 6 bilhões para executar o calendário de encargos exigidos pela Fifa, e que uma vez implantado daria novo aspecto urbanístico a Capital.

O que Mato Grosso ouviu em Brasília também foi dito aos representantes das demais subsedes do Mundial. Ainda não se trata da batida definitiva do martelo, porque restam canais políticos para que o governador Blairo Maggi tente mudar esse cenário. Porém, é preciso ponderar que no plano nacional o projeto Copa do Mundo começou mal e que será preciso uma corrida contra o tempo, contra a burocracia e interesses inconfessáveis, para viabilizá-lo.

Cuiabá não tem que se sentir ameaçada de derrota pela “não” do governo federal, pois prevalecendo o resultado negativo o grande perdedor será o Brasil, país capaz de feitos memoráveis dentro das quatro linhas, como demonstra ao longo dessa competição da Fifa, mas absolutamente incapaz de alcançar níveis administrativos compatíveis com sua tradição esportiva e sua importância geopolítica.

Mato Grosso passa a conviver com a dualidade do projeto Copa do Mundo. Internamente está preparado. No entanto, a parte que toca ao Brasil – verdadeiro promotor do evento – capenga, não tem organização, está à deriva perdida no labirinto do gigantismo do poder central.

“Cuiabá não tem que se sentir ameaçada de derrota”

PARA O STF, O MELHOR
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
27/9/2009

A sabatina de José Antonio Dias Toffoli para a vaga do Supremo Tribunal Federal (STF), está marcada para ocorrer no Senado Federal na próxima quarta-feira, dia 30. Toffoli, que é advogado-geral da União (AGU), foi indicado pelo presidente Lula para ocupar a vaga deixada pelo ex-mi¬¬nistro Carlos Alberto Menezes Direito, falecido no início do mês.
Em seu artigo 101, a Constituição Federal diz que “o Supremo Tribunal Federal compõe-se de 11 ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 e menos de 65 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada”. Os requisitos são, portanto, de três ordens: a) idade; b) conhecimento jurídico; e c) re¬¬putação ilibada. O artigo diz ainda que os ministros de¬¬vem ser nomeados pelo presidente da República, após aprovação da escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.
Trata-se de selecionar as melhores cabeças para a corte máxima do país, à qual compete, essencialmente, a guarda da Constituição, conforme definido em seu artigo 102. Por isso cada etapa do processo pe¬¬de rigor máximo.
Há quem acuse o presidente Lula de fazer indicações políticas para o STF. Ora, é natural que a escolha recaia sobre aqueles que são admirados pelo presidente – seja Lula, com sua inimitável marca de oito indicações, seja qualquer outro. Ou seja, o presidente e o escolhido terão, no mais das vezes, uma visão de mundo em comum. É assim agora. Foi assim na história recente do Brasil, com outros presidentes à frente do governo, e é também assim nos Estados Uni¬¬dos, onde Barack Obama aproveitou, recentemente, para indicar o nome de Sonia Sottomayor para a Corte Suprema.
Depois de um processo de fôlego, cujo ponto alto foram os quatro dias de sabatina no Senado, a mulher de origem hispânica teve seu nome aprovado. Foi uma escolha claramente política, mas que nem por isso prescindiu de estritos requisitos técnicos.
No caso em andamento no Brasil, o Senado terá a importante missão de avaliar, com seriedade e objetividade, se Toffoli cumpre todos os requisitos constitucionais definidos para o cargo.
Como é óbvio, Toffoli, que tem 41 anos, atende ao primeiro requisito, o da idade mínima. A favor de seu saber jurídico contam a graduação em Direito pela Universidade de São Paulo, uma das mais respeitáveis instituições de ensino do país; a especialização em Direito Eleitoral e os anos de docência em Direito Constitucional e Direito de Família. Quem pode dizer, objetivamente, se esse conjunto é frágil ou se é o bastante para atribuir-lhe notório saber jurídico? A resposta é subjetiva. Mais certo é dizer que não faltariam para Lula, dentro do raio de seus simpatizantes, opções de figuras cujo peso do conhecimento, colocado na balança, ficaria mais evidente, mesmo sem os títulos de mestre e doutor cuja falta tem sido apontada como ponto fraco de Toffoli, assim como sua reprovação em dois concursos para juiz, nos anos 90.
Objetivamente, pode-se dizer que sua carreira orbitou em torno do PT. Ele ingressou na Câmara dos Deputados em 1995, como assessor parlamentar da liderança do partido. Também foi advogado do presidente Lula nas campanhas presidenciais de 1998, 2002 e 2006. Com a chegada do PT ao Planalto, foi subchefe de assuntos jurídicos da Casa Civil, e desde 2007 é o chefe da AGU, órgão responsável pela defesa e representação oficial do governo federal perante a Justiça. Essa proximidade não é, de modo algum, impedimento para a escolha. Mas a indicação ganharia força se o currículo do advogado paulista reunisse também experiências alheias ao PT.
Mas é no campo da reputação que se encontra o maior desafio para atestar a qualidade da indicação do advogado-geral da União. O escritório de Toffoli e o ex-governador João Alberto Capiberibe foram condenados pela Justiça do Amapá a devolver ao estado um montante em dinheiro que, atualizado, pode passar dos R$ 700 mil. A decisão judicial, da 2.ª Vara Cível e Fazenda Pública, é referente a uma ação popular movida por Anníbal Barcellos. Segundo o Diário de Justiça Eletrônico do TJ do Amapá, Barcellos questiona a contratação dos advogados para prestação de serviços ao estado, em 2001. O texto diz que “ao arrepio da lei, foram nomeados colaboradores eventuais do Estado do Amapá, profissionais da relação de amizade do ex-governador.”
É bem verdade que, no último dia 21, o juiz Mário Mazurek, titular da 2.ª Vara da Fazenda Pública de Macapá, suspendeu a execução da condenação. Mas analisemos bem o caso: a decisão também não significa a absolvição de Toffoli no processo, que ainda terá seu mérito julgado.
Tudo somado, não seria demais perguntar: por que razão insistir em um candidato com tantas inconsistências para ocupar uma das cadeiras da máxima corte do Brasil? Afinal, há no país, o Paraná incluído, figuras mais maduras, com currículos mais densos e sobre os quais não pesa qualquer condenação e nem mesmo suspeita. Ter mais de 35 anos não basta.

A INDIGNAÇÃO REPRIMIDA
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
27/9/2009

Foi tão grande a reação popular ao episódio do estudante pichador de uma escola de Viamão, que os próprios veículos de comunicação se surpreenderam com a repercussão da notícia. Não era um fato extraordinário, nem um crime hediondo ou espetacular. Tratava-se, isto sim, de uma ocorrência rotineira na rede pública de ensino do país, em todos os seus níveis. Basta visitar qualquer escola de periferia para se constatar a existência de paredes sujas, mesas e cadeiras riscadas, muros grafitados, equipamentos esportivos danificados e outras manifestações de vandalismo contra o patrimônio coletivo. Nem mesmo o corretivo aplicado pela professora no caso referido pode ser considerado inédito. Embora a regra geral seja a impunidade, de vez em quando alguns diretores e professores mais corajosos fazem valer a autoridade que a sociedade lhes conferiu – e enquadram os infratores nos códigos disciplinares de suas instituições. Então, o que teria gerado tantas mensagens, telefonemas e opiniões inflamadas de apoio à mestra? De cada cem pessoas que se posicionaram sobre o assunto, 98 deram inteira razão à professora, sem levar em conta o alerta de especialistas sobre os danos que o fato poderia causar ao jovem punido.

A explicação para este fato está no estado de indignação dos brasileiros com a desonestidade e a impunidade institucionalizadas. Vítimas frequentes de falcatruas no andar de cima do Edifício Brasil e expostos diariamente à violência do andar de baixo, os cidadãos aproveitam qualquer oportunidade para gritar em coro sua inconformidade. Ao aplaudir a professora, muitas pessoas estão querendo dizer que o país precisa de governantes responsáveis e autoridades cumpridoras de suas atribuições. Ao condenar o jovem transgressor e criticar seus pais, os cidadãos manifestam-se inequivocamente pela imposição de limites educacionais mais rígidos no ambiente familiar. Ao aceitar e apoiar o castigo imposto ao infrator, os brasileiros passam claramente o recado de que não estão mais dispostos a conviver com a impunidade.

Nesta catarse coletiva de moralidade, porém, o indivíduo não pode ser esquecido. Do outro lado da revolta, há um jovem que errou, mas que nem por isso deve ser excluído do convívio social. A atitude da professora e a polêmica despertada em torno do episódio só terão sentido se servirem para corrigir as distorções, assegurando o retorno do jovem à escola e a uma vida normal.

Para isso, é importante que todos os envolvidos no caso entendam que não se tratou apenas de uma questão pessoal – mas, sim, da condenação simbólica a uma transgressão. A mensagem tem que ser interpretada de forma mais ampla: a maioria dos brasileiros condena pichadores insensíveis aos direitos dos outros, assim como repudia desmandos, falcatruas, abusos de poder, desvios de comportamento e burlas de qualquer espécie.

A maioria dos brasileiros condena pichadores, assim como repudia desmandos, falcatruas, abusos de poder, desvios de comportamento e burlas de qualquer espécie.

O DEVER DA TRANSPARÊNCIA
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
27/9/2009

A liminar concedida pelo Conselho Nacional de Justiça suspendendo o pagamento da diferença relativa à URV para magistrados e servidores gaúchos, por divergências no cálculo da compensação, evidencia a necessidade de o Judiciário se ajustar aos parâmetros de transparência que a nação exige de todas as instituições públicas. A questão nasceu e cresceu polêmica, desde que, em 1º de março de 1994, os valores da moeda de então, o cruzeiro real, foram convertidos a uma unidade real de valor, a URV, num processo que se destinava a driblar a alta inflação que corroía preços e salários. Num mecanismo que passou a ser contestado, o Judiciário gaúcho considerou que a compensação para as perdas era de 11,98% para os servidores e de 16,12% para os magistrados. A polêmica em torno dessa compensação, que a imprensa registrou na época em que foi definida, chegou ao Tribunal de Contas da União, cujo relatório de fiscalização considerou que a conversão foi feita com base em critérios indevidos. Agora, liminar do Conselho Nacional de Justiça confirma esse entendimento e determina a suspensão do pagamento extra a partir deste mês de setembro.

Não se trata de algo pequeno ou irrelevante. Está em causa um salário complementar que, somado, chega a R$ 1,4 bilhão, que teria sido pago indevidamente. O Tribunal de Justiça do RS defende o pagamento, considerando que foi feito com base em procedimentos regulares. A decisão do CNJ, que tem caráter liminar, apenas revela a necessidade de que cálculos e pagamentos que envolvem recursos públicos sejam comandados pelo critério do interesse público e sejam feitos com absoluta transparência, especialmente quando, como é o caso, haja dúvidas quanto aos critérios utilizados para calcular as compensações, inclusive entre os próprios agentes beneficiados. É constrangedor que só agora, tantos anos depois da autoconcessão do reajuste, se chegue à conclusão de que parte do pagamento pode ter sido indevida.

INSERÇÃO NA INDÚSTRIA NAVAL
EDITORIAL
JORNAL DO COMMERCIO (PE)
27/9/2009

Entre 1952 e 1958, o padre francês Louis-Joseph Lebret esteve no Brasil estudando cenários de desenvolvimento para São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e Região Nordeste. Em Pernambuco, suas sugestões incluíram a instalação de um porto industrial ao Sul do Recife, de uma refinaria de petróleo e de um estaleiro.
Mais de meio século mais tarde, a intuição do padre Lebret se torna realidade. O Estaleiro Atlântico Sul, que chegou a ser apelidado de "estaleiro virtual", começou a contagem regressiva para a entrega do primeiro navio, que também será o marco de uma nova fase da indústria naval brasileira. No último dia 11, em solenidade que teve a presença, mais uma vez, do presidente Lula, foi posto no fundo do dique seco o bloco de aço para a quilha do primeiro petroleiro, dos 22 já encomendados para os próximos anos. O casco da plataforma P-55 da Petrobras completa o rol das encomendas contratadas, que respondem por 60% da capacidade instalada de processamento de 160 mil toneladas de aço por ano. O primeiro navio sairá do dique em que está sendo construído para o mar até fevereiro de 2010.
Empreendimento de grande porte – é o maior estaleiro do hemisfério – tido como estruturador da nova economia estadual, o Atlântico Sul venceu o período de desconfiança, instalando-se em Suape e dando uma face concreta ao futuro do Estado. O que foi concebido como a semente do Polo Naval hoje se apresenta como importante realização: Pernambuco tem uma indústria naval de nível internacional. O Estaleiro Atlântico Sul nos insere no mapa-múndi da produção de navios, e o início efetivo de suas operações traz a possibilidade de atração de empreendimentos similares – como um outro estaleiro – de várias empresas que fazem parte da cadeia produtiva, produzindo e fornecendo equipamentos para o setor. Sem esquecer que a retomada do desenvolvimento brasileiro passa a ter aqui um centro irradiador, com as repercussões políticas inerentes à reconfiguração da dinâmica regional.
Vale a pena recordar que o projeto original do Atlântico Sul precisou ser ampliado duas vezes, em virtude do volume crescente de encomendas, feitas pela Transpetro. A ampliação em curso ainda envolve milhares de operários da construção civil, além dos funcionários contratados para a operação propriamente dita. Juntas, as equipes de obras civis e do estaleiro somam atualmente 9 mil trabalhadores. Para sair do plano do projeto para o factual, o estaleiro topou o desafio de formar um negócio exemplar do ponto de vista econômico, social e ambiental: proporcionar educação, emprego e renda para a população da região, sem deixar de seguir à risca as indicações da CPRH para que a área de Suape não sofresse impactos desnecessários devido ao empreendimento.
Seguindo essa diretriz, o presidente da empresa, Ângelo Bellelis, aproveitou a ocasião festiva do batimento de quilha da primeira embarcação para anunciar a construção de uma vila operária com 1.500 casas, em uma área de 71 hectares em Ipojuca. A construção será financiada pela Caixa Econômica Federal em nome dos funcionários, e as prestações serão pagas pelo estaleiro. A previsão é que as obras tenham início no próximo ano, quando parte das habitações também deverá ser entregue.
De outra parte, a inovação como base competitiva faz da indústria naval pernambucana uma referência em tecnologia de ponta. O Atlântico Sul, ele próprio um case de engenharia, agrega o que de melhor existe no planeta para a produção de navios, colocando-nos em posição de destaque no cenário global. Com isso, também ganha a nossa juventude, que pode entrar em contato com essa tecnologia, convivendo com processos e materiais de última geração, buscando conhecimentos para sua utilização e contribuindo com seu aperfeiçoamento.
É com satisfação e otimismo que vemos o sucesso de um empreendimento que parece ter, em sua gênese, o espírito humanista do padre Lebret – para quem a economia e o homem deviam ser objeto da mesma atenção, partilhando os frutos da mesma conquista.

O PODER DO LIVRO IMPRESSO
EDITORIAL
DIÁRIO DO NORDESTE (CE)
27/9/2009

Quando a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) e o Congresso americano, aliados a outras parcerias culturais, lançaram no início do milênio a Biblioteca Digital Mundial (BNM), o referido portal deu início a um imenso acervo virtual, que atinge mais de 7 milhões de obras anteriormente publicadas em livro. A partir de então, outros projetos foram desenvolvidos objetivando a sobrevivência das publicações convencionais, em face da massificadora concorrência impulsionada pelo advento das novas tecnologias. Nesse contexto, proliferaram as utilizações, pelo setor livreiro, de inúmeras oportunidades digitais.

Criadora de uma forma de expressão cultural, a Internet, com todos seus defeitos e qualidades, obrigou a repensar tendências anteriores. No lado negativo da questão, aponta-se uma tendência de espírito totalitarista no mundo virtual, que fomentaria entre seus usuários a ilusão de poderem deter todos os conhecimentos do mundo ao simples acionar de uma tecla.

A facilidade de acesso para se obter qualquer tipo de informação causaria, em paralelo, o desenvolvimento de um processo de acomodação não de todo condizente com a adequada formação de sólido, ou pelo menos razoável, acervo de conhecimentos. Torna-se indiscutível que a Internet tem seu aspecto eficaz, tanto pelo imediatismo com que as informações são obtidas quanto pela incalculável diversificação de itens e dados fornecidos ao usuário, embora, no caso, sejam também postas em discussão a credibilidade e a idoneidade dos "sites" consultados. Como argumento em contrário, aponta-se igualmente a evidência de que a leitura virtual é, na grande maioria dos casos, fragmentada e descontínua.

Psicólogos americanos chegaram à conclusão de que o texto digital exige um tipo de atenção que se contrapõe à chamada "deep atention" (atenção profunda), que somente a leitura linear sobre o papel impresso requer.

Esse importante detalhe poderia contribuir, ainda segundo os estudos realizados, para a destruição da faculdade cognitiva, substituída pela "habilidade informática".

O poder do livro impresso estaria exatamente na capacidade de materializar idéias, além de estimular o espírito crítico e o hábito da discussão argumentativa, algo que a instantaneidade do mundo virtual não tem condições de instigar e oferecer. Sem falar no incentivo à leitura, que é altamente aconselhável através da oralidade, entre pais e filhos, ou mestres e alunos. As crianças têm sua curiosidade despertada para o hábito de ler por narrativas que lhes são feitas por alguém que transmite, de viva voz, o conteúdo dos livros. Com sua linearidade e finitude, o livro de papel continua uma presença materializada indiscutivelmente forte, subsídio valioso para a formação de conceitos coerentes e articulados. Parcerias com o mundo digital provavelmente se multiplicarão e, na verdade, tornaram-se necessárias, mas não ao ponto de retirar da forma tradicional do livro seu intenso simbolismo como peça de resistência na preservação e ampliação de conhecimentos.

O EXERCÍCIO DO PERDÃO
EDITORIAL
A CRÍTICA (AM)
27/9/2009

A Igreja Católica de Manaus expõe, com o assassinato do padre Rogério Ruvoletto, há nove dias, a dor na própria carne. Um dos seus membros e uma referência nas comunidades nas quais atuou tombou diante da violência.

O exercício entre a dor e o perdão vem sendo apresentado desde o primeiro dia, quando o arcebispo de Manaus, Dom Luiz Soares Vieira, se viu diante da imprensa para falar da morte do sacerdote, pedir Justiça e, como pastor, mobilizar o seu rebanho na direção da solidariedade, da luta pela segurança da população e no aprendizado do perdão.

Matéria publicada na edição deste domingo - editoria de Cidades - relata o crescimento dos índices de violência. Por trás de cada uma das 11.294 ocorrências de maior gravidade registradas nos sete primeiros meses do ano, há pelo menos uma vítima, que precisa lidar com os sentimentos de vingança e de perdão.

A Igreja Católica e os familiares ilutados por ação da violência trazem à tona a emergência da discussão sobre a violência e da necessidade da participação popular nas decisões que estão sendo propostas nesse campo ainda demarcadas por atos isolados de governos. O assunto permanece entre os três mais citados pelas populações quando ouvidas sobre os problemas que mais as afligem. O sentimento de abandono, do fazer Justiça por conta própria e de viver em pânico cresce diante da morosidade das ações e das respostas efetivas dessas ações.

Uma população que sobrevive em uma realidade como essa adoece. Vê a vida banalizada, a impunidade reforçada e corre o sério risco de tornar natural o que é inadmissível. As manifestações ora realizadas para que a Justiça se concretize também na materialização da segurança têm um papel importante, o de dizer que a insanidade não venceu a humanidade e que os gritos, aparentemente isolados, têm o elo de resistência contra a coisificação da vida.

São vozes que, em meio a dor maior, conseguem ir em frente para dizer todos têm uma chance de participar e fazer a grande frente contra a prevalência da cultura de violência.

Nesse movimento, o perdão tem um lugar de destaque porque, exercitado, retira do plano pessoal a mágoa, o sofrimento mais isolado e mais solitário para entender a dimensão dessa luta como proposta muito maior e mais coletiva. A dor da perda é redimensionada na esperança de vidas protegidas.

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