Saturday, April 10, 2010

As mulheres mais odiadas do planeta


O esporte mundial de falar mal das modelos não leva em conta
que a maioria não precisa fazer sacrifício algum para ser magérrima


Juliana Linhares

Jason Kempin/Gwtty Images
ESTÁ NA DESCRIÇÃO
Izabel, 1,78 metro, 55 quilos de
perfeição: "Cada profissão tem suas
exigências. A da minha é pesar pouco"


Elas são magras, lindas, ricas, falam várias línguas e têm namorados famosos. Quem quer ser como elas? Todas. Quem fala bem delas? Ninguém. Ao contrário: retratos contemporâneos da beleza e do glamour, as modelos estão entre as mulheres – meninas, em muitos casos – mais tripudiadas do planeta. A bailarina é tão peso-pluma que flutua no ar? Admirável. A ginasta de 18 anos tem corpo de 12? Exemplar disciplina. A celebridade voltou ao corpo pré-gravidez um mês depois do parto? Palmas para ela. A estrela no tapete vermelho comporta no máximo 2 palmos de cintura? Nunca esteve tão bem. Mas bastou a gaúcha Alessandra Ambrosio, 29 anos, ser vista numa sessão de fotos com os ossinhos em evidência para o mundo cair sobre sua cabeça. Foi parar até no programa de Bill O’Reilly, popular comentarista da rede americana Fox, que abriu uma pausa na habitual e divertida sessão de flagelação do governo Obama para mostrar uma foto "chocante" da "desnutrida" Alessandra. A comentarista Megyn Kelly, uma das muitas loiras e lindas da Fox, afirmou com a cara mais séria que a Victoria’s Secret, a empresa de lingerie que tem Alessandra como uma das modelos contratadas, não deveria "usá-la" em anúncios. Nem um único jornalista no mundo ousaria chamar uma famosa acima do peso de "gorda", "baleia" ou "monte de banha", mas o jornal inglês Daily Mail, o primeiro a divulgar as fotos de Alessandra, classificou-a de puro osso e praticamente desfechou uma campanha mundial de desqualificação da modelo. "Para ser muito sincera, não estou nem aí para essa polêmica", desdenha Alessandra, que mede 1,78 metro e pesa 52 quilos "desde sempre". Com o tipo físico excepcional requerido pela profissão – naturalmente muito alta e muito esguia –, a modelo passou por todos os tormentos reservados às meninas magrinhas. "Quando eu estava na escola, meu apelido era Somália. Os meninos me arranjavam os nomes mais horrorosos. O sofrimento só acabou quando me tornei modelo. Aí a magreza se tornou algo útil e bacana", conta.

The Grosby Group
POLÊMICA? TÔ NEM AÍ
Alessandra, 1,78 metro, 52 quilos, numa das fotos tripudiadas: "O sofrimento por ser magrinha só acabou quando me tornei modelo"

"Isso acontece porque é muito mais fácil apontar defeitos nas meninas do que aturar a beleza e o sucesso delas", fulmina Liliana Gomes, diretora da agência Joy Models. "As pessoas não entendem que a gente não precisa fazer esforço para ser assim. Eu, como todo mundo, às vezes tenho uma semana de trabalho corrido, em que fico sem almoçar direito. A diferença é que perco, fácil, fácil, 3 quilos", diz, com toda a sua insustentável leveza, a piauiense Laís Ribeiro, 19 anos, 1,83 metro e 50 quilos exibidos, ossinho por ossinho, num macacão de Lycra na última semana de moda de São Paulo. "Toda profissão tem suas exigências. A da minha é pesar pouco", resume Izabel Goulart, 25 anos, 1,78 metro, 55 quilos, colega de Alessandra na Victoria’s Secret e considerada um dos corpos mais perfeitos da categoria peso-leve. Tantas críticas sobre as modelos, não só por serem magras, mas por fumar, não estudar, viver em festas, abusar de substâncias várias e, em certos casos, tropeçar no léxico em vários idiomas, podem ter efeitos devastadores. "Tenho estudos que mostram que, por volta dos 18 anos, elas apresentam níveis de ansiedade e stress maiores do que os notados em vestibulandas", diz o psicólogo Marco Antonio De Tommaso, especializado em atender modelos.

Vista nos bastidores, a profissão revela, sim, exageros e abusos na obrigatória manutenção da magreza. Há quase quinze anos na passarela, a paranaense Isabeli Fontana, 1,77 metro, 55 quilos, diz que a fama de pouco juízo das modelos "não é à toa", apesar do sempre presente perigo de generalização. "Muitas fazem, sim, regime de fome, gostam da noite e tomam um monte de remédios. Mas isso não quer dizer que todas sejam assim", garante. "As que vomitam e tomam remédio para emagrecer duram uma ou duas temporadas e somem, porque perdem a aparência saudável, ficam com cabelo ruim, rosto cheio de olheiras", ensina Isabel Hickmann, 1,78 metro, 53 quilos, a irmã caçula de Ana, que estudava publicidade, há um ano resolveu ser modelo e agora, aos 20, faz tantos desfiles que trancou a faculdade. A maior acusação contra as modelos é que disseminam um tipo físico totalmente fora dos padrões que, perseguido por adolescentes na difícil fase da afirmação social, leva a sofrimento emocional e, em casos extremos, a doenças. Segundo dados do Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares (Ambulim) do Hospital das Clínicas, em São Paulo, ao longo da vida, entre 0,5% e 4% das mulheres terão anorexia nervosa, e de 1% a 4,2%, bulimia, ambos distúrbios contemporâneos cuja complexidade ainda é estudada. Culpar as modelos pela propagação desses transtornos é tão injusto quanto atribuir a epidemia mundial de obesidade a... aquela, a famosa, bem, não vamos falar o nome dela. Todo mundo sabe quem é.

Fotos Marcelo Soubhia/Ag.Fotosite e Bruno Stuckert/Caraas
A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO DESFILAR
Laís (à esq.) e a irmã de Ana, Isabel: criticadas
por serem como tantas gostariam de ser

Personagens no olho da rua


Nicollette Sheridan, ex-atriz de Desperate Housewives,
está processando o produtor da série por "demissão injusta".
Guilhotinar um ator é sempre uma decisão complicada

Randee St.Nicholasabc/Retna
ELETROCUTADA
Nicollette: ela diz que levou até sopapos

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Edie Britt, a corretora imobiliária espevitada deDesperate Housewives, foi o melhor papel da carreira no geral medíocre de Nicollette Sheridan. A atriz deixou a série em 2009. Sabia-se que ela não saíra em bons termos. Agora, revelou-se a dimensão do barraco: na semana passada, ela abriu um processo em uma corte de Los Angeles, por agressão e demissão injusta, contra o criador e produtor da série, Marc Cherry. Nicollette alega que Cherry lhe deu uns sopapos quando ela reclamou do roteiro de um episódio. Até a semana passada, Cherry não se manifestara a respeito. Mas as demissões televisivas sempre envolvem um problema criativo – como eliminar o personagem do ator cortado? E a morte escabrosa de Edie, eletrocutada depois de bater com o carro em um poste, tem certo cheiro de vingança autoral contra a atriz que cria caso.

Entre os atores encrenqueiros, poucos superam o potencial demonstrado por Vera Fischer e Felipe Camargo na novela Pátria Minha, de 1994. Os barracos do casal culminaram com um braço quebrado da atriz. A Globo demitiu os dois – e seus personagens foram mortos em um providencial incêndio. A baixaria também determinou a demissão de Isaiah Washington, o doutor Burke do melodrama hospitalar Grey’s Anatomy, depois de três temporadas da série. Grosseiro no set, Washington fazia piadas agressivas contra um colega gay, T.R. Knight – que, ironicamente, também acabou guilhotinado. No ano passado, Knight declarou à revistaEntertainment Weekly que Shonda Rhimes, criadora da série, o demitiu depois que ele saiu do armário, alegando que os fãs reagiriam mal a essa revelação.

A rejeição do público pode fazer com que um ator acabe na rua. A eterna durona Michelle Rodriguez participou de duas temporadas de Lost, no papel da policial Ana Lucia. Os fãs da série odiaram a personagem, que teve de ser assassinada. Em casos mais graves, o problema não é um personagem em particular, mas a trama toda. Tempos Modernos, a atual novela das 7, vem patinando em índices de audiência abaixo dos 25 pontos (o esperado era 35). O autor Bosco Brasil matou o vilão Albano (Guilherme Weber) para sacudir a história. Weber, porém, segue na folha de pagamento da Globo – e vai voltar no papel do gêmeo bonzinho de Albano. Não estaria na hora de arranjar um incêndio?


Chutados do ar

Algumas demissões escandalosas da televisão

Gabriel de Paiva/Ag. O Globo
Vera Fischer
Os barracos da atriz com seu colega (e então marido) Felipe Camargo atrapalharam a novelaPátria Minha, de 1994. A Globo decidiu demitir os dois. Um incêndio tirou seus personagens da trama


Divulgação
Michelle Rodriguez
Enquanto vivia a policial Ana Lucia no seriado Lost, a atriz foi presa por dirigir alcoolizada. Mas a razão de sua saída foi outra: o público detestava a personagem – que acabou assassinada


Everett Collection/Gupo Keystone
Isaiah Washington
O ator criou um clima beligerante nos bastidores da série Grey’s Anatomy – costumava fazer piadas agressivas e preconceituosas contra um colega gay. Foi afastado no fim da terceira temporada

Caiu na rede, é pop


Justin Bieber, de 16 anos, lançou sua carreira na internet antes
de chegar ao topo das paradas de discos. É o ídolo de uma
geração que já cresceu on-line


Bruno Meier

Montagem com fotos de Dave Hogan/Getty Images, Istockphoto/RF e Divulgação
A FRANJINHA DO TWITTER
Na montagem, o cantor canadense Justin Bieber
em um computador: milhões de fãs viram seus vídeos,
cuidadosamente produzidos para parecer amadores

Com sua cara lisa e seu cabelo escovadinho, Justin Bieber é o ídolo da hora entre as meninas, que se desmancham com canções açucaradas como One Time. Seu álbum de estreia, My World,emplacou quatro singles nas paradas de sucessos em 2009. No mês passado, My World 2.0, que acaba de chegar às lojas brasileiras, vendeu 283 000 cópias só na primeira semana no mercado americano. Aos 16 anos, Bieber tornou-se o segundo artista-solo mais jovem a alcançar o topo da parada americana com um disco. (Stevie Wonder ainda detém o recorde, com o álbum The 12 Year Old Genius, que ele lançou em 1963, aos 13 anos.) Mais prodigiosos ainda são os números de Bieber na internet. O cantor da franjinha tem mais de 64 milhões de acessos no MySpace; seus vídeos no YouTube passaram a marca de 160 milhões de espectadores; e seu perfil no Twitter conta com 1,8 milhão de seguidores. Esse sucesso nas redes sociais foi consolidado antes do lançamento dos discos. Justin Bieber é o exemplo mais consumado das mudanças substanciais que a internet está impondo ao mercado musical – e, sobretudo, ao modo como um artista se relaciona com seus fãs.

A carreira de Bieber começou há três anos, quando ele tirou o segundo lugar em um concurso de calouros na sua cidade natal – Stratford, de 30.000 habitantes, na província canadense de Ontário. Bieber postou a apresentação no YouTube, juntamente com suas gravações de sucessos de artistas como Aretha Franklin e Usher. Pretendia apenas mostrar suas performances a parentes e amigos. Em alguns meses, porém, os vídeos foram vistos mais de 10 milhões de vezes e despertaram a atenção do empresário americano Scooter Braun, que contratou o menino-prodígio e o carregou – com a mãe, claro – para Atlanta, no estado da Geórgia, onde o jovem talento se aprimorou com aulas de canto e dança. O empresário arrumou até um "instrutor de ginga", para que Bieber aprendesse a andar e dançar com o molejo de um verdadeiro astro pop. Clipes do cantor continuaram sendo postados no YouTube. Embora já contassem com produção profissional, conservaram um certo jeitão de vídeo caseiro, pois era importante que os fãs vissem o garoto como um talento espontâneo revelado pela internet. Bieber, enfim, foi fabricado para não parecer fabricado.

Lenta e conservadora, a indústria fonográfica patinou muito tempo para acertar o passo com a internet. Mas está recuperando o atraso. Em 2009, as vendas digitais movimentaram 4,2 bilhões de dólares no mundo inteiro. Mesmo no Brasil, que engatinha no comércio de música on-line – a loja virtual iTunes, por exemplo, ainda não chegou aqui –, a aceitação dessa tecnologia cresce. Segundo dados da Associação Brasileira dos Produtores de Discos, as vendas digitais em 2009 tiveram um aumento de 159% em relação ao ano anterior. A venda de CDs, em compensação, caiu 80% nos últimos seis anos. O caso de Bieber demonstra que, para além de um mero canal de comércio, a internet é uma ferramenta poderosa para lançar artistas. O site MySpace, por exemplo, revelou o grupo inglês Arctic Monkeys, a cantora inglesa Lily Allen e a brasileira Mallu Magalhães. Rádio e televisão ainda são as maiores plataformas para a fama, mas a internet é o palco primeiro das bandas da novíssima geração. Formado em 2003 em Juiz de Fora, o grupo Strike começou atacando o Orkut, o Twitter e o MySpace. "Só depois de divulgar nosso trabalho na internet emplacamos uma música na novela Malhação", diz o vocalista Marcelo Mancini. Bandas que já tinham renome antes da popularização da internet têm de se atualizar. "Somos de outra geração, mas também precisamos conversar com nosso público sem interferência das rádios ou da gravadora", diz Samuel Rosa, vocalista da banda mineira Skank, surgida em 1991. Equipados com a câmera do celular, os músicos do grupo estão sempre produzindo vídeos curtos – trechos de shows e ensaios – para postar no Twitter e no seu site.

O tamanho das comunidades dedicadas a cada artista nas redes sociais passou a ser um índice de prestígio – e produtores de shows e festivais estão sempre de olho nesse indicador. "Uma banda tem de ter pelo menos 15 000 pessoas em sua comunidade no Orkut para chamar a nossa atenção", diz a produtora Tati Rangel, que organiza shows em São Paulo e Minas Gerais. A Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos, o maior evento nacional da música sertaneja, promove enquetes on-line para descobrir as duplas que estão para estourar. "É o melhor instrumento para buscar novos nomes em um ambiente que troca tão rapidamente de ídolos’’, diz Cássio Leite, diretor artístico do Independentes, grupo organizador da festa.

Descoberto no YouTube, assíduo no Twitter, Justin Bieber é o ídolo da geração que cresceu on-line. Mas o que ele oferece às suas enlouquecidas fãs adolescentes não constitui novidade: romantismo comportadinho, temperado por uma ou outra insinuação de sexo ("se você me der a primeira dança, prometo que serei gentil", sugere o cantor em First Dance). É uma espécie deboy band de um garoto só. A internet abriu novos caminhos para a música – mas isso, por si só, está longe de garantir a inovação.


Saque consentido

Sérgio Martins

Para astros como Justin Bieber, a internet virou a solução para o problema que ela mesma criou – a crise na venda de discos "físicos". Em certos mercados regionais do Brasil, os músicos buscam a saída pela informalidade (ou pela ilegalidade): associam-se à pirataria. Ao lançar seu segundo disco, no ano passado, o sambista pernambucano João do Morro decidiu não distribuí-lo nas lojas. Autorizou um vendedor de carrocinhas – carrinho que vende CDs piratas – a copiar e vender quantas unidades quisesse. Espalhadas pelos pontos turísticos do Recife, as carrocinhas encarregaram-se de divulgar a música do cantor e compositor. João não ganhou um tostão com o disco (que também é distribuído de graça na internet). Mas o sucesso da tática o tornou muito popular: ele hoje faz cerca de vinte apresentações mensais, a um cachê médio de 12 000 reais. "Graças à pirataria, minhas músicas ficaram conhecidas e meus shows lotam", diz.

Essa estratégia semissuicida não é invenção do pernambucano. Em Belém, vigora uma combinação entre os artistas do tecnobrega, espécie de funk paraense, e os vendedores de CDs piratas. As canções que fazem sucesso nas aparelhagens, equipes de som que tocam tecnobrega, são entregues diretamente ao camelô. Ao artista, resta partir para o mercado de shows. "Ele pode ganhar até 1 600 reais por apresentação", diz o pesquisador Ronaldo Lemos, autor de Tecnobrega – O Pará Reinventando o Negócio da Música. João do Morro, que compõe sua própria música, tem direito de distribuí-la de graça. Na maioria dos casos, porém, esses esquemas informais são francamente ilegais. "Os artistas distribuem predatoriamente a propriedade intelectual de terceiros. Os compositores são lesados", afirma João Augusto, presidente da gravadora Deck-disc.

Titular Agência Fotográfica
CHAMEM A CARROCINHA
O sambista João do Morro (à esq.): ele dá o CD aos piratas e fatura nos shows

Uma luz na evolução


Dois fósseis descobertos na África do Sul, dotados de inusitada combinação de características arcaicas e modernas, podem ser ancestrais diretos do homem


Alexandre Salvador

Os últimos quinze dias foram excepcionais para o estudo das origens do homem. No fim de março, uma falange fossilizada, encontrada na Sibéria, revelou uma espécie inteiramente nova de hominídeo que ainda existia há 50 000 anos. Na semana passada, cientistas da Universidade de Witwatersrand, na África do Sul, anunciaram uma descoberta similar. São duas ossadas bastante completas – um menino de 12 anos e uma mulher de 30 – encontradas na caverna Malapa, a 40 quilômetros de Johannesburgo. Devido à abundância de fósseis, a região é conhecida como Berço da Humanidade. Nenhum achado até hoje, porém, apresentou as características do menino e da mulher. As longas pernas, a pélvis bem desenvolvida, o rosto achatado e os dentes pequenos são similares aos das espécies mais antigas do gênero Homo, ao qual pertencemos. Já os braços longos e o formato das mãos sugerem que, apesar da marcha bípede, ainda estavam à vontade nos galhos das árvores. O formato do crânio lembra o do Homo sapiens, a nossa espécie, mas a baixa estatura (1,3 metro) e o cérebro diminuto (420 centímetros cúbicos, um pouco maior que o do chimpanzé) remetem aos australopitecos, os primatas mais antigos na evolução dos hominídeos.

A nova espécie foi batizada de Australopithecus sediba. Sediba significa fonte em sesoto, uma das onze línguas oficiais da África da Sul. As análises mostraram que o menino e a mulher viveram há 1,95 milhão de anos. Até agora, a tese mais aceita entre os estudiosos aponta oAustralopithecus africanus, que viveu na África do Sul entre 3 milhões e 2,4 milhões de anos atrás, como o ancestral imediato do gênero Homo. A intrigante mistura de características arcaicas e modernas levou os pesquisadores sul-africanos a apresentar a nova espécie como o melhor candidato a antecessor direto do nosso gênero. A comprovação dessa hipótese ainda depende de estudos posteriores – mas, seja como for, está claro que os fósseis sul-africanos oferecem pistas espetaculares sobre um período especialmente obscuro da evolução humana. "A transição para o Homo continua a ser totalmente confusa", disse à Science o paleontólogo americano Donald Johanson, da Universidade Estadual do Arizona. Johanson é o descobridor da famosa Lucy, na Etiópia, em 1974. Esse esqueleto quase completo de uma fêmea de australopiteco, de 3,2 milhões de anos, está hoje firmemente fixado na árvore genealógica do homem.

O bom estado de preservação dos ossos descobertos na caverna ajudou bastante a apressar o estudo publicado. "Os esqueletos encontrados em Malapa são muito mais completos que os da vasta maioria dos fósseis conhecidos pela paleontologia. Podem-se contar nos dedos das mãos os exemplares semelhantes a esses", diz o paleontólogo americano Lee Berger, o principal autor do estudo. O par, talvez mãe e filho, parece ter caído por uma fenda no teto da caverna. Outros animais, entre eles um felino de dentes de sabre, cujos fósseis também foram achados na caverna, parecem ter sido presas da mesma armadilha natural. A aposta dos cientistas é que tanto os hominídeos quanto os animais estavam em busca de água em meio a uma seca. Agora, os Australopithecus sediba se tornam personagens-chave da paleontologia


Excesso de proteção faz mal ao seu filho


Boa parte das crianças e adolescentes brasileiros vive como dentro
de uma bolha, protegida dos aspectos mais triviais da realidade.
É preciso dar-lhes autonomia, porque o maior risco é criar
uma geração despreparada para a existência


Daniela Macedo e Gabriella Sandoval

Montagem sobre fotos Istockphoto e Pedro Rubens

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A preocupação com a segurança da prole é de ordem biológica: sem ela, nenhuma espécie animal conseguiria reproduzir-se e perpetuar-se. No âmbito humano, durante milhares de anos, os cuidados com as crias seguiram o padrão dos mamíferos em geral: eram interrompidos quando elas começavam a tornar-se capazes de alguma autodefesa e de ajudar seus pais na obtenção de comida. A preocupação atual com os filhos – e sua exacerbação, a superproteção, assunto desta reportagem – tem origem histórica bem definida. No Ocidente, a infância e a adolescência, tais como as conhecemos, são uma criação econômica e cultural do fim do século XVIII, período imediatamente posterior à Primeira Revolução Industrial na Europa. Até então, crianças e adolescentes, assim considerados em suas limitações e peculiaridades, existiam apenas nas classes mais abastadas, nas quais eram educados com esmero por serem herdeiros da fortuna da família e para que pudessem representá-la apropriadamente na idade adulta. Meninos e meninas até 14, 15 anos, oriundos dos extratos sociais mais baixos, eram tidos só como "gente pequena" – e, portanto, sujeita a trabalhos tão pesados quanto o permitisse a sua força física. Com o avanço tecnológico, que resultou em máquinas que substituíram as atividades braçais e na necessidade de formar artesãos e operários qualificados para manusear equipamentos complexos e atender aos padrões de qualidade cada vez mais altos da indústria, o exército de crianças e jovens pobres passou a ser alvo de uma preocupação inédita: a de que crescessem saudáveis e pudessem, desse modo, ser adestrados para servir como a mão de obra requerida pelos novos tempos. Foi da vertente econômica que nasceram os conceitos de infância e adolescência – os quais, mais tarde, ganharam contornos mais delicados, complexos, graças às descobertas da pediatria, da psicologia e da pedagogia.

Com as crianças e os adolescentes, surgiu ainda uma rede de proteção tanto no plano jurídico como no familiar. Leis foram feitas para preservar o direito à integridade física e mental dos menores de idade (aliás, uma concepção originada daquelas de infância e adolescência), e pais e mães passaram a ser mais ciosos da saúde e da educação de seus filhos. Não seria inapropriado dizer que o amor maternal e paternal, no plano mais geral, é fruto das mudanças provocadas pela Revolução Industrial. Ultrapassadas as portas do século XXI, o que aterroriza muitos pais é ver suas crianças e jovens atingidos por violências que, até os estertores do século XVIII, não fariam seus congêneres perder o sono – e que não assombram, para além da medida, a maior parte das famílias atuais. Ou seja, com a infância e a adolescência, não nasceram somente os pais responsáveis, mas também os pais assustados e, por consequência, superprotetores. "Eles podem ser tão prejudiciais para a formação emocional de seus filhos quanto pais negligentes", diz a psicóloga Ceres Alves de Araujo.

No Brasil, os superprotetores temem, sobretudo, o risco de sequestros, assaltos e acidentes e a oferta abundante e livre de álcool e drogas. Há, no entanto, um limite entre a preocupação aceitável e a excessiva, que pode fazer mais mal do que bem a uma criança ou adolescente. Quando a criança é pequena, é razoável ter medo de que ela se machuque no parquinho, mas é inaceitável um pai ou mãe que não a deixe brincar na casa de um amigo de escola, longe de sua vista. É compreensível ficar com o coração aflito nas primeiras vezes que o filho de 18 anos sai de carro sozinho – no entanto, trata-se de um exagero evidente negar a ele esse tipo de liberdade. Hoje, uma família de classe média pode erguer um muro em torno de seus filhos – incluído o não metafórico. Para tanto, os pais superprotetores valem-se de recursos tecnológicos, como o celular que permite monitorar as andanças da moçada, e da nova dinâmica familiar, mais aberta e propensa ao diálogo. Íntimos como nunca de seus filhos, eles se utilizam dessa proximidade de amigo justamente para controlá-los. E abandonam a parte mais difícil da paternidade, que é deixá-los seguir em frente. Tais pais "amigos" conhecem ou já identificaram no Orkut ou no Facebook cada um dos colegas do filho, e não veem problema nessa invasão de privacidade.

Aparentemente, um filho sob a vigilância irrestrita dos pais está mais seguro. Mas há um risco na vida sem riscos, o que inclui atender a todos os pedidos da criança ou do jovem. Pais que adotam para si e para seus filhos esse tipo de estratégia ignoram uma peça-chave do desenvolvimento humano: a autonomia. É aquela capacidade – e sensação poderosa – de fazer escolhas. E também de aceitar seus próprios limites e reconhecer que, não raro, as escolhas podem estar erradas. Num artigo recente, o psiquiatra americano Michael Jellinek, professor de Harvard e chefe da psiquiatria infantil do Hospital Geral de Massachusetts, escreveu que, do momento em que um bebê nasce até a hora em que ele entra na faculdade ou sai de casa, a questão central de sua existência é conquistar independência. Tirar isso de um filho pode ser uma viagem sem volta. "Vemos o tempo todo exemplos de crianças que finalmente quebram a bolha em que vivem e se transformam em adolescentes rebeldes além do aceitável, um atalho para que se tornem adultos frustrados", disse ele a VEJA.

Em geral, os pais superprotetores são inseguros e ansiosos. Temem que seus filhos deixem de amá-los, esforçam-se para não fracassar em sua educação e têm pavor de ser julgados por parentes e amigos. Tudo somado, excedem-se na ânsia de acertar sempre. "O exercício da paternidade passou a ser visto sob a ótica de um julgamento social, dos mais rígidos e seletivos", diz o psicólogo Luis Russo. "Assim como hoje se exige que as pessoas sejam bem-sucedidas, saudáveis e magras, é preciso ser um pai exemplar de um filho idem", afirma. Trata-se de um fenômeno bastante atual. Nos Estados Unidos, pais com esse perfil ganharam o nome dehelicopter parents, ou "pais helicópteros". Eles pairam sobre a vida das suas crianças com enorme estardalhaço. O assunto foi tema de capa da revista americana Time em novembro passado. "Se o filho tira uma nota que os desaponta, vão direto à escola e exigem que ela seja mudada. Quando ele esquece um livro ou uma apostila em casa, correm para levá-lo à escola. Dessa forma, não permitem que ele sinta o constrangimento que serviria de alerta para que se lembrasse de tomar conta de sua vida", disse a VEJA a americana Hara Estroff Marano, editora da revista Psychology Today.

Atualmente, a escola é o único espaço em que boa parte das crianças e adolescentes tem, de fato, de assumir responsabilidades. Ao passarem pelos portões escolares, deixam o posto de príncipe ou princesinha da família para se tornar um entre tantos outros alunos. É um dos grandes pesadelos dos pais superprotetores: a exemplo do que ocorre na vida doméstica, eles exigem tratamento individualizado na escola. Sua interferência na rotina pedagógica é uma realidade que irrita professores e diretores. "Já recebemos ligações de pais indignados com uma discussão no pátio antes mesmo de os inspetores nos avisarem da briga", conta Vera Malato, coordenadora do departamento de orientação educacional do Colégio Bandeirantes, em São Paulo. Sim, em certos momentos de dificuldade, os filhos recorrem ao celular em que estão gravados os números de papai e mamãe.

Como efeito colateral da superproteção, os especialistas em educação infantil começam a notar um aumento no número de crianças ansiosas e inseguras. Não é difícil identificar uma delas em sala de aula: é a que pede atenção e aprovação para cada tarefa que realiza. Consulta os professores com frequência quase insuportável. Fora da sala, tem medo de se machucar no parquinho (mesmo essa excrescência americana que é o playground de chão emborrachado), evita ir sozinha ao banheiro, pede ajuda a todo momento. Tamanha dependência está na raiz da baixa autoestima. O problema é tão presente nas escolas que, em algumas delas, como a paulistana Emilie de Villeneuve, são feitas atividades para estimular a autonomia dos pequenos. Há, por exemplo, um "acampadentro", em que alunos de 5 e 6 anos passam uma noite na escola e são incentivados a tomar decisões simples como o que trazer, em que cama dormir e o que comer no café da manhã. Parece incrível, mas, para muitos, o ato da decisão é um tormento. Em outra iniciativa da escola, o aluno adolescente que falta à aula por motivo de doença é convidado a explicar, ele mesmo, a ausência. "Nossa ideia é que crianças e adolescentes tomem a iniciativa antes de levar as questões para o pai ou a mãe", diz Luiza Cesca, diretora do colégio.

Pergunte a um pai superprotetor por que ele age assim e a resposta será: "Só quero o melhor para o meu filho". O perfil desses pais, segundo os psicólogos consultados por VEJA, é o seguinte: nascidos na década de 60 – em geral, a partir de 1964 –, têm filho único ou filhos com grande diferença de idade. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, as famílias brasileiras têm, em média, 1,8 filho. Nos anos 70, eram 6,2 filhos. Um quarto das mães tem filho único. Elas demoraram a ter o primeiro herdeiro, que foi ansiosamente desejado e aguardado: 26% das crianças nascidas em 2008 eram filhos de pais com mais de 30 anos. Ou seja, as crianças – mais escassas – se tornaram mais "preciosas". Na casa da família paulista Toscano, cada passo de Matheus, de 13 anos, é dado sob o olhar atento dos pais. Fazer trabalho na casa dos amigos, nem pensar. "Não vejo necessidade. A maioria das mães trabalha fora e sei que a empregada não vai tomar conta", diz sua mãe, a representante comercial Dalva, de 48 anos. Só há pouco tempo o garoto recebeu autorização para esquentar a própria comida no micro-ondas. A mãe sugeriu que ele lavasse o prato depois do almoço, mas o pai vetou: "Ele tem medo que o Matheus se corte. Até hoje meu marido amarra o tênis do filho antes do jogo de futebol", afirma Dalva.

Histórias assim são comuns nos consultórios de psicólogos e pediatras. "A maioria desconhece – ou prefere ignorar – as aptidões do filho. Acredita que ele não tem idade para executar tarefas para as quais já está capacitado", diz o pediatra Ricardo Halpern, da Sociedade Brasileira de Pediatria. Certa vez, ele atendeu um menino de 10 anos que enfrentou uma situação constrangedora quando, durante uma excursão, pediu à professora que cortasse o seu bife. "A criança corre o risco de ser excluída do grupo por ser diferente das outras", afirma. Quando, durante uma partida de futebol, os pais tiram satisfação com o técnico por deixar o filho no banco de reservas ou com um colega por não passar a bola, estão tentando, erroneamente, poupá-lo de frustrações. "As crianças superprotegidas acham que os outros resolverão todos os seus problemas. Por isso, o risco de se tornarem compulsivas ou entrarem no universo das drogas é maior. Com elas, conseguem a sensação de mundo cor-de-rosa que os pais proporcionavam enquanto as mantinham dentro de uma bolha", explica a psicóloga Mara Pusch, da Universidade Federal de São Paulo.

A ciência começa a voltar sua atenção para os efeitos da superproteção no cérebro e no comportamento de crianças e adolescentes. Parece exagero? Não é. Há casos como o do menino Ivan (nome fictício), de 9 anos, que foi alimentado à base de papinha até os 3 anos. De tanto ouvir seus pais dizerem que ele poderia engasgar com comidas sólidas, o garoto passou a recusar tudo o que não fosse apresentado a ele na forma de sopa ou mingau. Ivan pode ter superado completamente essa deficiência. Mas algo em sua habilidade motora e em sua confiança pode ter sido afetado. Até bem pouco tempo atrás não se sabia disso, mas a falta
de brincadeiras livres, sem a interferência de adultos, pode prejudicar o bom desenvolvimento das faculdades cognitivas. Há riscos também no excesso de preparação estudantil dos filhos. Um pai pode e deve estimular seu filho a ter atividades extracurriculares. Mas o excesso não deixa de ser um ato de superproteção e, como tal, não faz bem. Uma pesquisa da Universidade de Montreal, no Canadá, publicada no início deste ano, mostra que o nível de controle dos pais pode determinar se a criança terá uma relação harmoniosa ou obsessiva com um determinado hobby ou atividade esportiva. "Descobrimos que adultos controladores podem estimular comportamentos obsessivos em seus filhos ao ensinar-lhes que a aprovação social só se consegue por meio de excelência", escreveu uma das autoras do estudo, a psicóloga Geneviève Mageau.

Outro estudo mostra que a falta de obrigações dentro de casa tem criado uma geração pouco preocupada com o próximo. E o pior: os pais estão relutantes como nunca em pedir ajuda doméstica aos filhos. De acordo com os psicólogos ouvidos por VEJA, não há nada de errado em distribuir tarefas: é bom para a autodisciplina e para ajudar a construir a autoconfiança. Pedir a um menino que lave um tênis sujo de barro ou que arrume a cama não deveria ser visto como punição. É simplesmente algo que ele deve fazer por ser parte de seu cotidiano.

"Uma criança não é um projeto, um troféu ou um pedaço de argila que se pode moldar como uma obra de arte. Só vai prosperar como pessoa se tiver permissão para ser o protagonista de sua própria vida", disse a VEJA o escocês Carl Honoré, autor do livro Sob Pressão – Criança Nenhuma Merece Superpais, publicado no Brasil pela editora Record. Eliminar do desenvolvimento infantil todo desconforto, as decepções e até mesmo a brincadeira espontânea – e ainda por cima pressionar as crianças com a exigência de sucesso total – é um erro de rumo gravíssimo. Sem enfrentarem desafios próprios nem se confrontarem com limites, as crianças tornam-se adultos incapazes de superar as vicissitudes (veja o quadro abaixo). As consequências da infância e adolescência superprotegidas já são mensuráveis: os jovens atualmente levam mais tempo para sair de casa, começar a trabalhar e formar uma família. Quando chegam ao mercado profissional, não conseguem lidar com as exigências reais. Frequentemente se sentem injustiçados e incompreendidos. E frustram-se com facilidade.

Em resumo, se você quiser ter um filho com possibilidade de ser feliz e realizado (nunca há garantias), proporcione a ele a liberdade possível em cada etapa de sua vida. E lembre-se do que disse o escritor francês Honoré de Balzac (1799-1850): "Chega um momento na vida íntima das famílias no qual os filhos se tornam, voluntária ou involuntariamente, juízes de seus pais". Para ter um julgamento razoavelmente justo, não seja negligente – mas também não seja superprotetor.

Laílson Santos

Controle férreo
"Eu faço questão de controlar as amizades da Giuliana. Quando ela está brincando no playground do condomínio, dou uma espiada pela janela a cada quinze minutos. Se escuto algum coleguinha falando palavrão ou sendo mal-educado, chamo minha filha e a proíbo de brincar com ele de novo. Gosto de conhecer também os pais dos amigos dela. Se eles são mal-educados, os filhos não serão diferentes. Sobre os amigos virtuais, eu só a deixei fazer um perfil no Orkut para que não fosse ‘digitalmente excluída’. Mas ela só entra na rede social quando a mãe está do lado. Como não sei o que posso e o que não posso permitir, controlo tudo de perto. Dentro de casa, não deixo que as meninas entrem sozinhas na cozinha por causa do risco de acidentes. Até proíbo que abram a geladeira. Sei que tenho essas atitudes por insegurança minha, mas alguns descuidos são apostas que não posso pagar. Se acontecer alguma coisa, o preço vai ser muito alto e eu prefiro não arriscar."
Marcelo Panzutti, paulistano de 36 anos, analista de sistemas, com a mulher, Luciana, de 37, e as filhas Giuliana, de 10, e as gêmeas Renata e Rafaela, de 4

Laílson Santos

Medo, muito medo
"Tenho um medo enorme de que meus filhos se percam de mim. Quando estamos na rua, não solto a mão deles por nada. Já pensei até em comprar uma daquelas coleiras de criança para o menor. Algumas mães acham isso absurdo. Eu não. Ninguém cuida melhor deles do que eu. Quando eles saem com o meu marido, por exemplo, fico apreensiva. Se vão almoçar na casa da mãe dele, ligo no mínimo quatro vezes para saber se estão bem, o que estão fazendo e o que comeram. Se a minha filha está brincando no playground e uma amiga sobe para pegar um brinquedo, ela sabe que deve esperar no térreo. Temo que o elevador quebre ou a porta se abra e ela caia no fosso. Quando a Stephanie começou a ir à escola de perua, passei uma semana seguindo o veículo para observar. Se alguma outra criança discute ou bate nos meus filhos, vou lá e brigo com ela. Não admito que ninguém chame a atenção deles."
Adriana Gil Viaro, paulistana de 30 anos, mãe de Stephanie, de 8, e Alessandre, de 3



Ernani D'Almeida

Sozinha, nem pensar
"Sou vítima de uma mãe superprotetora. Quando eu era criança, ela não me deixava participar de nenhum passeio organizado pela escola. Tinha medo de que algo me acontecesse fora do colégio. Nos dias em que não havia aula por causa de um passeio, ela passava a tarde comigo no shopping para me recompensar. Durante toda a minha adolescência, nós brigávamos muito. Ela nunca me deixava sair sozinha. Aos 15 anos, eu só podia ir ao cinema com meu namorado se ela me levasse. No fim da sessão, ela me trazia de volta para casa. Eu sentia tanta raiva que vivia dizendo que, assim que pudesse, iria embora de casa. Até hoje ela fica emburrada quando aviso que vou sair sozinha."
Alessandra Vale, carioca de 22 anos, estudante, e a mãe, Dalva Alberto, aposentada de 58



Laílson Santos

Autonomia desde cedo
"Meus filhos aprenderam a ser independentes e responsáveis desde cedo. É trabalho deles, por exemplo, alimentar e passear com o cachorro da família. Eles se revezam para isso. Cada um arruma seu quarto e cuida das próprias coisas. Eles aprenderam a guardar os brinquedos ainda bem pequenos. Eu dizia que, se algum objeto estivesse espalhado pelo chão, eles poderiam pisá-lo e quebrá-lo. Quando estão sozinhas em casa, as crianças se viram na cozinha. Elas aprenderam com o pai, que adora cozinhar, a preparar lanches e saladas. Acredito que elas devam ser fortes para superar os obstáculos e desafios que a vida apresenta. E ser independente é meio caminho andado para sobreviver neste mundo. A autonomia dos meus filhos me dá segurança e tranquilidade."
Viviani Zumpano, paulistana de 38 anos, coordenadora pedagógica, com o marido, Valter, de 50, gerente de tecnologia da informação, e os filhos Valter Zumpano Filho, de 11, e Stephanie, de 13



Humberto Michalchuk

Quem ama cuida
"Reconheço que sou uma mãe muito protetora. Quero estar sempre próxima das minhas filhas para protegê-las. Sou da opinião de que quem ama cuida. Meu marido e eu levamos e buscamos a Sthephany na faculdade todos os dias. Ela estuda longe de casa, a mais de 20 quilômetros, e é perigoso fazer esse trajeto de ônibus. Uma vez, ela foi sozinha e se perdeu. Precisei explicar, pelo celular, o caminho que ela deveria fazer até a faculdade. Minhas filhas se sentem inseguras quando estão sozinhas. Em geral, se perdem. Até hoje, nunca viajaram sem os pais. Não sei se essa insegurança se deve ao fato de que meu marido e eu nunca as soltamos. Quando a mais velha sai à noite, vou buscá-la entre meia-noite e meia e 1 hora. A Melanye ainda não sai à noite. É muito nova. Se ela vai com os amigos ao cinema à tarde, peço que volte antes de anoitecer. As meninas respeitam as regras de nossa família. Nunca brigam nem reclamam. Acho que elas se sentem mais seguras assim."
Raquel Franco Sprenger, curitibana de 38 anos, pedagoga, com as filhas Sthephany, de 18, e Melanye, de 16


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