À Procura de Eric, de Ken Loach
De obras-primas como Kes, sobre um menino cercado de miséria e indiferença terríveis, a fiascos como Pão e Rosas, um panfleto sobre faxineiros que tentam se sindicalizar, em suas quatro décadas de carreira o diretor inglês Ken Loach virou o campeão de uma categoria que se poderia chamar de feelbad movie – em oposição ao americaníssimo feelgood movie, aquele tipo de filme em que tudo termina bem para que a plateia saia se sentindo leve e alegre. Nos filmes de Loach, o amor quase nunca vence, a justiça raras vezes triunfa e os fracos permanecem oprimidos; as vitórias são apenas relativas e custam muito sacrifício. O diretor não vê o mundo assim porque seja um pessimista, mas porque tem a convicção de que ele poderia ser melhor: Loach é um dos últimos socialistas românticos do planeta, e, no seu entender (nesse ponto, aliás, irrefutável), compreender como a injustiça se dá é imprescindível para repará-la. É uma surpresa, portanto, que aos 73 anos Loach tenha feito um filme do qual se pode sair completamente contente. Em À Procura de Eric (Looking for Eric, Inglaterra/França, 2009), que estreia na próxima sexta-feira, o carteiro Eric (Steve Evets) é uma amargura só. Mora numa casa feia com os dois enteados adolescentes, que a segunda ex-mulher largou com ele. Nenhum dos dois dá a mínima para o padrasto, e um deles está metido com um bandido da vizinhança. Logo no início, vê-se Eric contornando uma rotatória em alta velocidade e na contramão: ele acabou de rever, de relance, sua primeira mulher, Lily, e está atordoado. Eric deixou Lily quando a filha dos dois nasceu, e considera esse o maior de uma série de erros que cometeu. Eric tem amigos fiéis, mas não fala a eles de seu desalento por vergonha. Seu único confidente é um pôster do jogador de futebol francês Eric Cantona, estrela do Manchester United nos anos 90. E eis então que Cantona, em carne e osso, aparece para dispensar conselhos ao carteiro sofredor. A brincadeira é que Cantona – o próprio – não diz mais do que platitudes, como "sempre há outra saída", ou "veja-se pelos olhos dos que amam você". Mas elas bastam para impulsionar Eric a tirar conclusões que muito importam para Loach. Por exemplo, que a união faz a força e que o certo pode derrotar o errado. Em um desfecho cheio de graça, um pelotão de Cantonas (os amigos do carteiro, com máscaras de borracha) ajuda Eric a pôr no devido lugar o bandido que ameaça sua família e a reconquistar o amor dos filhos e de Lily. Pode-se argumentar que isso é socialismo no seu mais simplista – mas não há dúvida de que vem de um bom coração no seu mais generoso. O diretor de bom coração
Ken Loach faz filmes tristíssimos, porque ele quer que o mundo
se torne melhor. Em À Procura de Eric, o milagre acontece
Isabela BoscovDivulgação ERIC & ERIC
O astro do futebol Eric Cantona (o próprio, à esq.) e o carteiro sofredor Eric:
obviedades que levam à felicidade• Trailer Trailer