Sunday, October 19, 2008

Reinaldo Azevedo Xiii, lá vem Chico de Oliveira descendo a ladeira

Francisco de Oliveira, que ainda será nosso último marxista — se já não é —, expõe seus equívocos ao menos uma vez por ano, o que volta a fazer neste domingo, na Folha. Seguem trechos e link de sua entrevista a Maurício Pul:
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A desindustrialização de São Paulo empurrou a esquerda para fora da cidade, sustenta o sociólogo Francisco de Oliveira, 74, professor titular aposentado do Departamento de Sociologia da USP. Segundo ele, a fuga das indústrias da capital paulista converteu a cidade num pólo de serviços com um setor informal muito extenso, cujos integrantes não se identificam com o PT: "Em geral eles votam na direita devido ao imediatismo. É gente que quer receber benefícios imediatos, sem esperar por transformações estruturais". Segundo Oliveira, o Bolsa Família é uma "política conformista" que reflete o predomínio desse "exército informal que representa mais de 50% da força de trabalho".
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Na entrevista a seguir, concedida na última terça-feira, o sociólogo sustenta ainda que, ao chegar ao poder, "o PT foi engolido pelo atraso", pois trocou uma política de classe por uma política de combate à pobreza.

FOLHA - Em novembro de 2004, o sr. publicou um artigo na Folha em que dizia que Marta Suplicy foi derrotada pelo governo Lula, pois sua política econômica era indefensável. Hoje Lula tem mais de 50% de aprovação na cidade de São Paulo. Como o sr. explica a rejeição a Marta? A criação das taxas? As políticas sociais do PT? Críticas moralistas?
FRANCISCO DE OLIVEIRA -
Um pouco de tudo isso. Em primeiro lugar, naquela época o ataque da mídia ao governo Lula era muito intenso, e Lula não transferiu votos para Marta, transferiu a carga negativa. Agora a situação é a seguinte: a administração de Kassab está muito fresca na memória, enquanto a de Marta já tem quase quatro anos de distância. Isso hoje é muito importante devido à imediaticidade da mídia. É ela que faz a nossa consciência: é uma presentificação absoluta. A distância da administração da Marta esbarra na imediaticidade das avaliações positivas de Kassab. O fato de a avaliação do governo federal ser positiva na cidade de São Paulo não dissolve essa distância da Marta. E São Paulo é uma cidade bastante conservadora. Bastante conservadora. Se você retoma a história brasileira, o populismo paulista sempre foi de direita: Adhemar de Barros, Jânio Quadros, Paulo Maluf.

FOLHA - Ignácio Rangel dizia que o latifúndio gaúcho -Getúlio Vargas, João Goulart- conseguiu representar politicamente a indústria nacional, o que deu origem a um populismo de esquerda, progressista. Mas isso não aconteceu em São Paulo. OLIVEIRA - Isso nunca aconteceu. Mas não é só isso. Na verdade o que é importante no Rio Grande do Sul é a pequena propriedade, não é o latifúndio: o latifúndio enche nossas mentes, mas não forma... As ideologias populistas nascem no Rio Grande do Sul, mas é importante não esquecer que o Estado conheceu um positivismo muito especial, que é o que influi na legislação trabalhista. Vargas era positivista, a moçada formada nas escolas militares era positivista. Não é a toa que a divisa da bandeira brasileira é "Ordem e Progresso". E São Paulo não teve essa formação.
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Comento
Como vocês vêem, descarte-se o fato de que a maioria dos eleitores pode simplesmente não ter gostado da gestão de Marta. Não, não! Para um esquerdista, isso não é possível. Ou há um fator estrutural para a derrota da esquerda — a desindustrialização — ou há um elemento, digamos, cultural-ideológico derivado daquele: o imediatismo, para o qual concorre, claro, a mídia. Não é por acaso que as esquerdas, ao longo da história, sempre silenciaram a imprensa quando chegaram ao poder. Como a gente percebe, para os valentes, ela distorce tudo e leva as pessoas a votarem contra o seu próprio interesse. Pérfida mesmo! Para conseguir falar a mais de 30 pessoas, eis Chico de Oliveira recorrendo à... pérfida!

E notem que ele tenta buscar raízes históricas profundas para o suposto conservadorismo de São Paulo — que, é bom lembrar, já elegeu Luíza Erundina e a própria Marta. Até parece que a cidade, nos últimos 50 anos, evoluiu segundo uma lógica imutável, infensa ao crescimento desordenado, à migração, à grande mistura que faz de São Paulo uma das grandes metrópoles do mundo.

É por isso que essa esquerda a que pertence Francisco de Oliveira não chegou e jamais chegará ao poder. Para ser sintético: ela não entende nada. Quem os ultrapassou foi o Apedeuta, com sua brutalidade teórica e seu impressionante senso prático. Não quer dizer grande coisa também, é certo. Mas que se convenha: nefelibata, ele não é. Francisco de Oliveira é de uma incrível ousadia e novidade teórica para os anos 1950...

Tolice-clichê
E chega desse cretinismo de ficar apontando o “conservadorismo” de São Paulo — especialmente porque se toma isso como coisa ruim. É mesmo?

- Esta cidade elegeu uma nordestina solteira e sem filhos (viu, Marta?) como prefeita: Luiza Erundina.
- Esta cidade elegeu uma socialite de esquerda, que sempre fez questão de mostrar que tem hábitos bastante, como direi?, avançados: Marta Suplicy.
- Esta cidade elegeu um filho de imigrantes libaneses — não entro no mérito da moralidade de ninguém neste post. Apenas evidenciou como são largos os critérios dos paulistas. Falo de Maluf, é claro.
- Esta cidade elegeu um negro, que nem político era: tornou-se um para se candidatar: Celso Pitta. Deu errado? Deu. Mas todos sabem por quê.
- Esta cidade vai eleger agora um prefeito vítima de uma campanha sórdida. E vai porque Sâo Paulo repudiou a baixaria dos “reacionários”.

Cidade conservadora? Talvez ela goste de lei e de ordem, como gostam todas as pessoas decentes — desde que sejam uma lei e uma ordem democráticas. O Rio paga até hoje o preço da eleição do “progressista” Brizola.

O que Francisco de Oliveira queria? Eleger Ivan Valente, do PSOL, que hoje é o seu partido — aliás, essa escolha explica boa parte de seu rigor teórico. Eu posso provar, se ele quiser, que, sob muitos aspectos, Ivan Valente é uma opção mais conservadora do que todos os citados acima.

Ah, sei... É que o Chico de Oliveira gostaria de ter na prefeitura um marxista revolucionário. Em vez do serviço de varredura de rua, nós assistiríamos ao debate dos garis. Isso parece chulo? Sofisticado é Chico de Oliveira, não é mesmo?

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