Começou um grande cinquentenário - ELIO GASPARI
O GLOBO - 17/10
Aquele ano glorioso para os Estados Unidos durou 401 dias e se acabou às 12h30 de 22 de novembro de 1963
COMEÇOU ONTEM o cinquentenário de um grande ano de 401 dias. Ele durou da manhã de 16 de outubro de 1962, quando o presidente John Kennedy foi informado de que havia mísseis soviéticos em Cuba, até as 12h30 de 22 de novembro de 1963, quando Lee Oswald apertou o gatilho em Dallas. Período igual a esse só se repetirá em 2039, nos cinquent"anos dos levantes do Leste Europeu.
Na encrenca dos mísseis, produziu-se a crise internacional mais bem documentada da história. Em Dallas, o assassinato mais estudado de todos os tempos. No meio, o mundo esteve a um passo da Terceira Guerra e Martin Luther King contou a uma multidão que tivera um sonho.
Kennedy gravou reuniões e telefonemas na Casa Branca e, com o tempo, recolheram-se preciosos depoimentos de soviéticos. (Os colaboradores do presidente foram instruídos a tirar suas famílias de Washington. Os russos também.)
Nesses 13 dias, Kennedy fechou o momento estelar de sua Presidência. Ele chegou a brincar com Bob: "Agora posso ir ao teatro". (Era uma agourenta referência a Abraham Lincoln, que tomou um tiro na cabeça enquanto assistia a uma comédia.)
Há poucos dias, Leslie Gelb, ex-presidente do Council of Foreign Relations, sustentou que, se Washington tivesse contado ao mundo que, secretamente, aceitara tirar os foguetes americanos da Turquia, os Estados Unidos sairiam da crise sem a auréola que estimularia o estilo Rambo de política externa.
(Em setembro de 1963, o Departamento de Estado produziu uma diretriz para o Brasil, recomendando que, se houvesse um movimento para depor o presidente João Goulart, o novo regime deveria ser reconhecido rapidamente. Dito e feito.)
Kennedy tinha alguma simpatia por Martin Luther King, mas não fez muita fé quando ele lhe disse que planejava uma manifestação aos pés do memorial de Lincoln. Temia que a choldra urinasse no obelisco de Washington. Usou o encontro com King para ameaçá-lo, insinuando que a vida sexual do reverendo estava vigiada. O reverendo fez que não ouviu, e Bob Kennedy acautelou-se, mandando instalar sanitários móveis na Esplanada da capital.
Nessa altura, Lee Harvey Oswald, um ex-fuzileiro naval de 23 anos, já comprara um rifle de mira telescópica. Tudo na sua vida dera errado. Decidira matar alguém, tentara assassinar um general direitista e errou o tiro. Às 12h30 de 22 de novembro, pela primeira vez, acertou.
Serviço:
Quem quiser saber tudo e mais alguma coisa sobre o discurso de agosto, está na rede "King"s Dream" (O Sonho de King). Custa US$ 9,99 e conta que ele tinha um texto escrito, mas achou que não animara a plateia. O fecho foi um improviso da alma.
Acaba de sair nos Estados Unidos "The Fourteenth Day" ("O 14º Dia: Kennedy e o Desfecho da Crise dos Mísseis em Cuba"), do historiador David Coleman. Está na rede por US$ 12,99. É médio.
Saiu também "Killing Kennedy" ("Matando Kennedy - O Fim de Camelot"), dos jornalistas Bill O"Reilly e Martin Dugard. É uma boa narrativa dos passos do presidente e de Oswald. Tem a virtude de tangenciar as teorias da conspiração.
Stephen King publicou "11/22/63" ("22 de Novembro de 1963"), um romance com a história de um sujeito que viaja ao passado e chega ao depósito de livros de Dallas às 12h26. Sua conclusão é fascinante. Sai por US$ 9,99.