Saturday, June 12, 2010

Quem é contra o Irã atômico levante a mão


A diplomacia brasileira jogou irresponsavelmente para
a plateia antiamericana mas perdeu feio nas Nações Unidas


Ana Claudia Fonseca

Richard Drew/AP
BIRRA
Maria Luiza Viotti, do Brasil, mantém o braço abaixado enquanto outros embaixadores
do Conselho de Segurança votam a favor das sanções

A equipe diplomática do presidente americano Barack Obama precisou de oito meses para aprovar sanções econômicas e militares contra o Irã. Esta é a quarta vez desde 2006 que a teocracia islâmica é punida pela insistência em buscar a tecnologia para construir uma bomba atômica. Ao contrário do que pretendiam os Estados Unidos, contudo, o maior perdedor da votação no Conselho de Segurança (CS) das Nações Unidas, na quarta-feira passada, não foi o presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad, mas a diplomacia brasileira. Dos quinze membros do CS, os representantes do Brasil e da Turquia foram os únicos a levantar a mão para dar um voto contrário à resolução. O Líbano se absteve, pois a coalizão que governa o país inclui o Hezbollah, organização paramilitar com influência iraniana. Até a China e a Rússia, países com poder de veto no conselho, aprovaram as sanções, apesar de terem vínculos comerciais estreitos com a república islâmica. Para agradarem a chineses e russos, as sanções ficaram muito aquém do desejado pelos Estados Unidos e dificilmente terão um impacto significativo na economia iraniana, pois não afetam os setores bancário e de energia. Ahmadinejad não tem com que se preocupar. A decisão da Turquia de apoiar os aiatolás, por sua vez, foi um risco calculado. O Irã e a Turquia são aliados na repressão aos curdos, minoria étnica que busca a independência em ambos os territórios. Para os turcos, portanto, havia uma razão estratégica para fazer um agrado aos vizinhos. Já o Brasil não tinha nenhum interesse direto em defender o Irã, a não ser a ambição fantasiosa de desempenhar o papel de pomba da paz.

A derrota diplomática começou a ganhar forma no mês passado, quando o presidente Lula foi a Teerã para fechar, com a ajuda do primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan, um acordo que deveria eliminar as preocupações das grandes potências com o programa nuclear iraniano. O texto que Lula e Erdogan conseguiram arrancar de Ahmadinejad não convenceu ninguém, porque reiterava a intenção iraniana de continuar enriquecendo urânio, o combustível para a bomba, e não previa inspeções da ONU às instalações nucleares. Considerando o histórico do Irã em desrespeitar acordos e desenvolver em segredo tecnologia nuclear, era compreensível que a comunidade internacional não considerasse o acordo suficiente para livrar o regime persa das sanções. "Até este ponto, a diplomacia brasileira ainda teria como se sair bem, porque pelo menos podia alegar que tentou incentivar o Irã a voltar à mesa de negociação", diz o cientista político Peter Hakim, do Diálogo Interamericano, um centro de estudos em Washington. O Brasil perdeu a oportunidade de vender a imagem de mediador bem-intencionado ao deixar a neutralidade de lado e assumir a defesa incondicional do Irã. Após o acordo em Teerã, o governo brasileiro agiu como se tivesse sido ofendido pela decisão dos Estados Unidos de seguir com as sanções. Diz Hakim: "A diplomacia brasileira assumiu um discurso triunfalista e esqueceu-se de que não estava negociando com o Irã, apenas tentando uma mediação entre Ahmadinejad e as grandes potências".

Ao insistirem na validade do acordo, mesmo depois de ele ter sido recusado por americanos e europeus, e ao se oporem até o fim às sanções, Lula e seus assessores passaram a ser vistos como representantes dos interesses iranianos. "Se o propósito na votação do conselho era manter a coerência com o ideal do diálogo com Teerã, uma abstenção brasileira teria sido mais do que suficiente", diz Roberto Abdenur, ex-embaixador do Brasil em Washington. "Do modo como se comportou, o Itamaraty pôs-se na contramão da história, sem ganhar nada em troca." A patacoada iraniana só serviu para consolidar a convicção do governo americano de que, por enquanto, o Brasil não é um parceiro confiável. Na semana passada, a secretária de Estado Hillary Clinton fez uma visita a quatro países da América do Sul com o objetivo de pôr nos eixos questões diplomáticas mal resolvidas, como as relações bilaterais com o Equador e a reintegração de Honduras à Organização dos Estados Americanos (o país foi expulso após a deposição do presidente Manuel Zelaya, que planejava um autogolpe). O Brasil não estava no roteiro de Hillary. "O governo americano pode estar esperando pela escolha do próximo presidente brasileiro antes de tentar uma reaproximação", diz o americano Flynt Leverett, ex-assessor externo da Casa Branca. Soa como uma derrota de fim de mandato para a diplomacia lulista.

Rodrigo Buendia/AFP
SÓ SORRISOS
Hillary em visita a Rafael Correa. Quem precisa do Brasil?

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