Prateleira eleitoral
Além de reforçar a imagem da agora ex-ministra como tocadora de obras, boa administradora e encarregada de dar sequência ao governo Lula, o PAC garante o entusiasmo dos empresários, principalmente os empreiteiros, sempre generosos financiadores das campanhas. Cumprida essa missão, o presidente Lula partiu para uma segunda etapa para manter empinada a candidatura petista – esta já bem menos visível: contornar os problemas políticos com potencial de criar turbulências à sua candidatura. A escolha do vice-presidente é uma ameaça real e imediata. O posto foi prometido ao PMDB como forma de viabilizar a aliança entre os dois partidos, mas era cobiçado por duas figuras exponenciais: o deputado Michel Temer, presidente da Câmara, e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Lula, o senhor de todas as decisões, incentivou Meirelles a se filiar ao PMDB e a pleitear o cargo. Achava que um crescimento me-teórico de Dilma empurraria para suas mãos também a escolha do vice que melhor lhe conviesse – e que nunca foi Michel Temer. As pesquisas, porém, não deram sustentação ao plano. Depois de conversar com Lula, Meirelles anunciou na semana passada que permanecerá no BC e, portanto, não disputará as próximas eleições. Deve continuar à frente do Banco Central num eventual governo Dilma. O PMDB, que emitia sinais de irritação, respirou aliviado. Se o contencioso com o PMDB aparentemente está equacionado, a candidata petista vai precisar de muita habilidade para convencer que é real uma decisão que já teria sido tomada por seus assessores – tirar da linha de frente da campanha dois pesos-pesados do petismo: o conselheiro político e ministro de Comunicação Social, Franklin Martins, e o deputado cassado e lobista José Dirceu, ex-chefe da Casa Civil. A ideia partiu dos ex-ministros Antonio Palocci e Márcio Thomaz Bastos e conta com a simpatia do ex-prefeito Fernando Pimentel, coordenador da campanha de Dilma. Para eles, Franklin é um foco permanente de tensão e Dirceu uma fonte inesgotável de problemas. Para mostrar que o afastamento é real, no início de março, todos os principais dirigentes petistas foram convidados para o jantar de aniversário do ex-ministro José Dirceu, em Brasília. Dilma não apareceu. Estava ocupada, participando de uma importante reunião com a bancada do PTB do ex-presidente Fernando Collor e do ex-deputado Roberto Jefferson – ao menos foi essa a versão oficial. Escapou assim das fotos, das entrevistas e do constrangimento de aparecer ao lado do companheiro apontado como o chefe da quadrilha do mensalão. O ex-prefeito Fernando Pimentel, que também estava na reunião do PTB, fez uma visita discreta à festa e cumprimentou o aniversariante em nome da ministra. É mais ou menos um retrato do que será durante a campanha. Dirceu e Franklin continuarão na trincheira, articulando e cumprindo variadas tarefas. Para o grande público, ficarão na prateleira.Dilma Rousseff deixa o governo para ser a candidata petista à Presidência e passa, a partir de agora, a enfrentar os problemas reais de uma campanha – inclusive afastando-se de companheiros indesejáveis
Daniel PereiraFotos Wilson Pedrosa/AE, Cristina Gallo/BG Press e J. F. Diorio/AE PARA ELEITOR VER
O comitê de campanha decidiu manter a distância o ex-ministro José Dirceu, o chefe da quadrilha
do mensalão, e o ministro Franklin Martins
A última etapa do processo de metamorfose da ministra Dilma Rousseff foi planejada para terminar de forma apoteótica. Depois de dois anos em campanha, a burocrata, que nunca disputou uma eleição, deixaria o governo como franca favorita à Presidência da República, catapultada pelo compromisso de continuidade da gestão petista e impulsionada pela ampla popularidade de seu mentor – o presidente Lula. Era esse o script. A mais recente pesquisa de intenção de votos, porém, mostrou uma ligeira ampliação da liderança do tucano José Serra, que agora é de 9 pontos. Os números resfriaram o entusiasmo de alguns, que já previam uma vitória inexorável em primeiro turno, mas também serviram de motivação para ações eleitoralmente mais agressivas. A mais visível foi o lançamento da nova edição do Programa de Aceleração do Crescimento. O PAC 2, como definiu o presidente da República, não passa de uma "prateleira de projetos" de realização incerta. Diante de trinta ministros, dezoito governadores e centenas de prefeitos, a petista anunciou investimentos de 1 trilhão de reais em obras – um superplano que, de concreto, tem muito pouca coisa.