Saturday, March 13, 2010

O tropeço do PIB


Pela primeira vez em dezessete anos, a economia brasileira
encolheu – mas isso não significa que o país vai mal


Benedito Sverberi

Sérgio Lima/Folha Imagem
Otimismo
O ministro Guido Mantega: ele prevê crescimento de 5,7% em 2010



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A economia brasileira apresentou em 2009 um desempenho negativo – algo que não se via desde 1992. Anunciado na semana passada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, o produto interno bruto (PIB), soma de toda a riqueza produzida pelo país, teve retração de 0,2% em relação a 2008. Uma primeira interpretação possível é que a economia doméstica se saiu muito mal. Em termos comparativos, no entanto, o Brasil não fez feio. Nas nações desenvolvidas, a crise financeira global bateu com muito mais força. A queda do PIB foi de 5% no Japão; de 4,1% na zona do euro (grupo de países da União Europeia que adotam essa moeda); e de 2,4% nos Estados Unidos. Outra boa notícia é que o PIB do ano passado retrata algo já superado. Se setores como indústria e agropecuária sofreram com a turbulência internacional, a retomada do crescimento começou cedo, logo no segundo trimestre, e não parou de ganhar força graças ao consumo das famílias (e aos gastos do governo). A recuperação só não foi suficiente para fazer com que a estatística fechasse o ano no positivo.

Caso não haja outra crise internacional, a economia brasileira deve continuar em expansão em 2010. "O ritmo do fim do ano passado estava bem acelerado, o que já sinaliza que a perspectiva de crescimento é maravilhosa", diz a economista-chefe do Banco Fibra, Maristella Ansanelli. Se o ritmo observado no último trimestre de 2009, quando o PIB registrou uma alta de 2%, se repetisse por mais três trimestres, o PIB anualizado atingiria a impressionante taxa de 8,2% (veja o quadro). Seria um crescimento digno da China ou da Índia – que, aliás, foram as únicas nações a nadar de braçada no ano passado, com PIBs de 8,7% e 5,6%, respectivamente. O mais provável é que a taxa não seja tão alta. Nos próximos trimestres, o crescimento deverá ficar em torno de 1%, o que aponta para um PIB anual da ordem de 5,5% na visão dos economistas (o governo, mais otimista, espera uma taxa de 5,7%, conforme as palavras do ministro Mantega). Isso, em boa parte, porque os juros devem subir neste ano, para manter sob controle a inflação. Bancos e consultorias aumentaram na semana passada, pela sétima vez consecutiva, sua projeção para o IPCA, o índice oficial de variação dos preços. Ele poderá chegar a 4,99% neste ano, estourando a meta estipulada pelo governo, de 4,50%. A inflação está ligada a um consumo aquecido – e um dos meios de esfriar o consumo é subir os juros. Assim, a taxa básica (a Selic), caso se confirme a expectativa do mercado, deve encerrar 2010 em 11,25% ao ano, 2,5 pontos porcentuais acima da vigente.

Independentemente de qual seja o número efetivo de crescimento do PIB, 2010 dará continuidade ao ciclo de prosperidade instaurado há dezesseis anos no país, desde que o Plano Real conseguiu estabilizar a economia. "O desafio do presidente Fernando Henrique Cardoso foi consertar o caminhão enquanto ele estava andando. Sua equipe teve de perseguir o crescimento e, ao mesmo tempo, fazer reformas institucionais para assegurar que ele fosse sustentável ao longo do tempo", explicou o economista da Tendências Consultoria Bernardo Wjuniski. O governo Lula pegou um país em condições melhores, não mexeu nos fundamentos da economia e tomou medidas que ajudaram a dar forma a uma nova classe média, como, por exemplo, a realização de aperfeiçoamentos no sistema financeiro que ajudaram a expandir fortemente o crédito.

O principal desafio para os próximos anos será elevar a taxa nacional de investimento. Essa é medida pela chamada formação bruta de capital fixo (FBCF), que, grosso modo, revela quanto as empresas aumentaram seus bens de capital, ou seja, as máquinas e os equipamentos que servem para produzir. São eles que asseguram, a longo prazo, a expansão da economia. Essa taxa caiu 9,9% no ano passado em relação a 2008, atingindo o patamar de 16,7% do PIB (o menor desde 2006). O setor privado realiza a maior parte do esforço em investir para garantir o crescimento do Brasil. O estado, às voltas com a necessidade de custear a mastodôntica máquina pública, pouco contribui nessa tarefa. Um governo que assumisse o compromisso de reduzir seus gastos teria recursos para investir em infraestrutura e financiar o setor produtivo (inclusive nos momentos em que o dinheiro escasseasse em razão de qualquer choque externo), o que ampliaria ainda mais o potencial de crescimento do país nos próximos anos.


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