Saturday, February 27, 2010

Bate e arrebenta


Gordon Brown já tinha cara e fama de mau. Agora aparecem os depoimentos de assessores e funcionários sobre xingamentos e até agressões

Surpreender o público está ficando mais difícil para os políticos. Eleitores, afinal, já viram de tudo. Bill Clinton quase perdeu a Presidência por fazer sexo com uma estagiária ao lado do Gabinete Oval, na época rebatizado de Oral. O italiano Silvio Berlusconi teve suas atividades lúbricas com "modelos" gravadas e as festinhas fotografadas. Ex-mulheres que contam tudo, dinheiro enfiado em lugares estranhos, cinismo como prática de vida – precisa dizer onde isso acontece? Mas partir para a agressão física, somada a palavrões e ataques de fúria assassina, é uma nada bem-vinda inovação incluída no manual do mau comportamento político pelo primeiro-ministro britânico, Gordon Brown. Ele é o protagonista do livro O Fim da Festa, exaustivamente investigado e escrito pelo jornalista Andrew Rawnsley (veja trechos ao lado). Rawnsley entrevistou centenas de amigos, assessores e funcionários da célebre casa na Downing Street, número 10, onde reside e despacha o chefe de governo. Conhecido pelos maus bofes e pela eterna cara de quem saiu de um encontro desagradável com gatos de rua, Brown parece pior à luz de quem o conhece de perto: um homem de formidável inteligência, mas profundamente inseguro, com mania de perseguição, explosivo e raivoso a ponto de agarrar um assessor pelo paletó e empurrar uma secretária, para tomar seu lugar à frente do computador, entre outras baixarias.

Aos entrevistados por Rawnsley somou-se o depoimento de Christine Pratt, diretora de uma associação que recebe queixas por telefone de pessoas que sofrem assédio moral no trabalho. Ela afirmou que tem registros de ligações diretas de Downing Street, com denúncias de funcionários apavorados pelo clima de terror. A única coisa que, em termos de comportamento, contava pontos a favor de Brown – sua teimosa recusa em parecer bonzinho – tombou no clima de pré-campanha para as eleições de junho. Entrevistado num programa de televisão, falou, de olhos marejados, num assunto que sempre havia evitado: a morte da filhinha recém-nascida, em 2002, vítima de hemorragia cerebral. Brown, que é cego de um olho, respondeu a perguntas do tipo: "O que você tem a dizer sobre ser um escocês idiota e caolho?". O entrevistador, estranhamente, sobreviveu.


A fera de Downing Street

Alastair Grant/Reuters

Os ataques de fúria, os delírios persecutórios e a boca suja do primeiro-ministro Gordon Brown, segundo o livro O Fim da Festa, do jornalista Andrew Rawnsley

"Brown ficou uma fera com Bob Shrum. ‘Como você fez essa *** comigo, Bob?’, gritou Gordon Brown. Depois, começou a berrar com outros assessores: ‘Todo mundo para fora dessa *** de sala’."
A reação do primeiro-ministro ao saber que o consultor americano havia reaproveitado frases usadas em discursos de Bill Clinton

"Gordon Brown estava tão furioso que ele disparou pela sala. Agarrando o apavorado Kelly pela lapela do paletó, Brown grunhiu: ‘Eles querem me pegar!’"
Sobre o comportamento violento e irracional com o assessor Gavin Kelly, encarregado de comunicar o desvio de dois disquetes da Receita, com informações pessoais e bancárias de 20 milhões de contribuintes

"Ao longo dos anos, todo tipo de coisa foi jogada em mim — jornais, canetas e latas de Coca."
Relato de um assessor que trabalha há muito tempo com Brown. São constantes também os gritos e grosserias com telefonistas, secretárias e outros funcionários do quadro fixo de Downing Street, a sede do governo

"Por que você está me obrigando a ver essa *** dessa gente?
Não quero ver essa *** dessa gente!" Ao amigo de faculdade e assessor Stewart Wood, por ter marcado um almoço com os embaixadores da União Europeia

"Com cara de fúria, Brown levantou o braço e fechou o punho. O assessor se encolheu, pensando que o primeiro-ministro ia dar um soco na sua cara. Brown esmurrou as costas do assento de passageiro em frente a ele. O segurança se retraiu."
Cena no carro oficial, com um infeliz encar-regado de falar de assunto desagradável. Brown batia tanto no banco do Jaguar, com a mão ou a caneta, que o couro bege ficou todo marcado. Nenhum guarda-costas queria se sentar ali

Blog Archive