Tuesday, October 13, 2009

12/10/2009 - EDITORIAIS

O QUE PENSA A MÍDIA


OPÇÕES AO MST
EDITORIAL
O GLOBO
12/10/2009

Citada em incontáveis programas partidários, de viés esquerdista ou direitista, promessa de todos os governos, inclusive no regime militar de 1964, a reforma agrária talvez seja a mais mitológica das bandeiras políticas da história brasileira.

Colônia e sede do império português, o Brasil entrou na República com a herança da concentração fundiária assentada no passado dos donatários amigos do rei, brindados por imensidões de terras a serem exploradas em sociedade com a Coroa e na base de mão de obra escrava.

A luta pela reforma agrária ganhou fôlego com a ociosidade de terras mantidas como reserva de valor pelas últimas gerações de uma aristocracia rural decadente. Isso serviu de combustível para as ligas camponesas de Julião no Nordeste dos anos 60, perpassou os 21 anos da ditadura militar, e emergiu, na redemocratização, na forma do MST, em que se aliaram frações da esquerda radical e seguidores da Teologia da Libertação.

Foi um longo ciclo em que o discurso da reforma agrária se descolou da realidade: modernizada e convertida em um setor dinâmico de uma economia que jamais esteve tão aberta ao exterior, a agricultura capitalista absorveu o "latifúndio improdutivo" e, impulsionada por uma competente estrutura de pesquisa científica, empurrou a fronteira de produção até a Amazônia. A outrora lavoura arcaica passou a responder por um terço das trocas mundiais de alimentos. Rivaliza ombro a ombro com os EUA no mercado de grãos e passou a líder nas exportações de carnes.

A rigor, o homem expulso do campo para quem a reforma agrária seria feita hoje não existe mais. Muitas famílias foram assentadas em todos estes anos. Sem assistência rural, várias passam à frente o lote, se transformam em assalariados da grande empresa agrícola e/ou, a depender da região em que se encontram, buscam renda no desmatamento. Devastada a área, migram. Restou ao MST ser a ponta de lança de um projeto radical e sem futuro, em que se autocriminaliza: dividir terras produtivas, investindo contra o estado de direito.

Sequer há hoje no campo gente para servir de massa de manobra, apenas o lumpesinato da periferia de cidades do interior. A organização deveria se transformar em partido político legalizado. Pois o caminho alternativo é sem saída - haja vista o destino das Farc colombianas.

ATRAVESSA A RUA E TE DIREI QUEM ÉS
EDITORIAL
JORNAL DO BRASIL
12/10/2009

RIO - Poucas relações sociais revelam tão bem o espírito de uma sociedade quanto as que se dão no trânsito. Quer saber o nível de educação e de civilidade de um determinado povo? Veja como motoristas, passageiros e pedestres se comportam pelas ruas. As leis de trânsito parecem dar a medida exata de quanto uma certa comunidade se distancia ou se aproxima de um estado de natureza hobbesiano. De quanto a lei do mais forte se sobrepõe às normas pactuadas e para a boa convivência. Em Frankfurt, é possível atravessar uma faixa de pedestre, no meio de uma avenida sem semáforos, sem olhar para os lados, tamanha a sensação de segurança proporcionada pelos veículos. No caótico trânsito de Roma, vespas e automóveis enfurecidos não inspiram a menor confiança, mas freiam e param a centímetros de qualquer cidadão que ponha os pés na faixa de segurança. É uma civilidade, digamos, latina, com mais emoção.
No Brasil, ainda não chegamos a esse estágio, e a orientação tatibitati do verde-vermelho-amarelo ainda se faz necessária em praticamente 100% das situações. Afinal, embora a legislação do trânsito estabeleça que os veículos maiores devam zelar pela segurança dos menores, a prática mostra que, mesmo com a presença ostensiva de sinais, o desrespeito às leis é endêmico. Há poucos dias, neste mesmo espaço, se disse que, no Brasil, há leis que pegam e as que não pegam, e tomou-se a legislação de trânsito como uma das áreas mais ilustrativas do fenômeno. O uso obrigatório do cinto de segurança, nos anos 90, pegou. A proibição do uso do celular ao volante, não. A errática lei seca quase pegou.
Agora, o que faz uma determinada lei receber ou não a adesão do cidadão? Um tratado sociológico poderia dar conta do assunto. Mas entre os principais fatores está a possibilidade de punição rigorosa. É nesse sentido que será muito bem-vinda a revisão do Código de Trânsito Brasileiro, a ser votada em breve no Congresso, conforme destacou ontem o Jornal do Brasil. Regras mais rígidas e penas severas estão sendo previstas, entre elas a redução dos limites de velocidade, a proibição de motos circularem entre os carros e o enquadramento no Código Penal dos motoristas que se recusarem a fazer o teste do bafômetro.
Mais rigor da lei, fiscalização, punição, todo o aperfeiçoamento do arcabouço jurídico e administrativo é válido. Mas nada como introjetar o conteúdo das leis e ressaltar seus benefícios ao bom funcionamento da sociedade por meio da educação.
Por que, ao longo do currículo educacional de um estudante, não se oferece uma única disciplina a respeito das principais regras de trânsito? Por que confiar tal tarefa apenas às autoescolas se milhões de pessoas jamais tirarão uma carteira de motorista? Esse é um dos exemplos mais claros de como a escola é muito mais voltada para a formação de profissionais para o mercado do que para a de cidadãos de uma comunidade política. Aprende-se matemática, mas não como controlar um orçamento ou se evitar o consumismo. Aprende-se biologia, mas não a se evitar a gravidez precoce. Aprende-se a lei da gravidade, mas não a proibição de se arremessar lixo pelo espaço público.
Ao aluno não é oferecida uma única e genérica matéria a respeito de direitos e deveres básicos do cidadão. Talvez isso fizesse muita diferença. Até no prosaico mas revelador ato de quando atravessamos a rua.

CONSERVAÇÃO E CRESCIMENTO
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
12/10/2009

Não é preciso escolher entre crescimento econômico e preservação do ambiente. Ao contrário: uma bem orientada política ambiental pode ser um instrumento de criação de empregos e de riquezas. Ao definir a questão nesses termos, o Banco Mundial (Bird) abre espaço para um debate mais produtivo e racional e menos viciado pela paixão e pelo messianismo ecológico. Este é um dos aspectos mais interessantes do novo Relatório de Desenvolvimento Mundial, dedicado especialmente à questão da mudança climática. O texto foi divulgado por ocasião da assembleia anual do banco e do Fundo Monetário Internacional, em Istambul, encerrada na última terça-feira.

Ao apresentar o relatório, o economista-chefe e vice-presidente da instituição, Justin Lin, conclamou os governos a não usar a crise como justificativa para abandonar as ações de proteção do ambiente. O apelo é reforçado pelo exemplo de algumas iniciativas antirrecessão. Alguns governos incluíram nos pacotes de recuperação econômica investimentos de US$ 430 bilhões em políticas "verdes". Metade do dinheiro, US$ 215 bilhões, deve ir para programas de eficiência energética.

Investimentos como esses podem ser muito úteis no fim de uma recessão, porque o emprego tende a crescer, nessas fases, mais lentamente que outros indicadores. As empresas demoram para reabrir as contratações e aproveitam, nas primeiras etapas, o pessoal já disponível. Mas investimentos em eficiência energética podem produzir um triplo dividendo, segundo o relatório: economia de energia, menos emissões e mais empregos, porque tecnologias de baixo carbono são menos intensivas em capital e mais propícias à criação de empregos.

Segundo os economistas do Bird, investe-se muito menos em tecnologia verde do que noutros programas e projetos oficiais. O mundo gasta US$ 150 bilhões anuais em subsídios ao uso de derivados de petróleo e só US$ 10 bilhões de verbas públicas em pesquisa e desenvolvimento de energia alternativa.

Também o setor privado investe pouco em pesquisa e desenvolvimento na área de energia - algo entre US$ 40 bilhões e US$ 60 bilhões anuais, raramente superando 0,5% da receita empresarial. As indústrias de telecomunicações aplicam em pesquisa e desenvolvimento 8% de seus ganhos e as farmacêuticas, 15%.

Mas também é possível obter resultados importantes sem grandes investimentos. O uso ineficiente de recursos é uma causa importante de poluição. Segundo os economistas do Bird, o consumo de energia na indústria e no setor elétrico poderia ser 20% a 30% menor, com melhores práticas e com tecnologias já disponíveis. Isso permitiria reduzir as emissões de carbono sem sacrificar o crescimento econômico. Além disso, haveria mais incentivo à produção de novas tecnologias se os países ricos se comprometessem claramente com uma redução drástica da emissão de carbono.

As projeções do Banco Mundial combinam dois desafios. Será preciso articular políticas para combater o aquecimento global e para aumentar, ao mesmo tempo, a produção de alimentos. Dentro de 40 anos será preciso alimentar mais 3 bilhões de pessoas. Sem mudança climática, seria possível usar mais terras e a produtividade agrícola teria de crescer 1% ao ano. Com menor expansão de área - para preservação de florestas, por exemplo -, a produtividade terá de crescer 1,8% ao ano, quase o dobro, portanto. A maior parte do aumento terá de ocorrer nas economias menos desenvolvidas, porque a margem para ganho de eficiência é menor nas mais desenvolvidas.

Os países em desenvolvimento arcarão, de acordo com o relatório, com entre 75% e 80% dos custos produzidos pelos danos ambientais nas próximas décadas. Entre 2008 e 2010, os financiamentos para programas de adaptação à mudança e mitigação de efeitos do aquecimento devem ficar em média em US$ 10 bilhões anuais. O banco estima necessidades de cerca de US$ 75 bilhões ao ano para políticas de adaptação. A meta é conter o aquecimento, ao longo do século, em 2 graus centígrados. Sem ação eficiente, o aquecimento poderá chegar a 5 graus, segundo o relatório.

A boa notícia, dizem os economistas do banco, é o compromisso anunciado pelo Grupo dos 20 de reduzir os subsídios ao consumo de petróleo e tomar outras medidas para cuidar do problema ambiental.

RENOVAÇÃO DO PORTO DE SANTOS
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
12/10/2009

Não faltam projetos e o setor privado está disposto a investir para dar uma nova cara ao Porto de Santos, de modo a apagar sua imagem caótica e eliminar o risco de um colapso no comércio exterior brasileiro nos próximos anos. Um plano de crescimento da demanda dos serviços portuários, que está sendo elaborado pelo Banco Mundial e deve ser concluído até o fim do ano, prevê o aumento de quase 160%, entre 2009 e 2024, na movimentação do Porto de Santos, que passaria de 89 milhões para 230 milhões de toneladas. Essa projeção justifica os investimentos programados.

Em algumas áreas, o porto já se transformou num grande canteiro de obras. Dúvidas, no entanto, ainda podem retardar boa parte dos investimentos privados, que correspondem a mais de 70% do total programado (o restante é de responsabilidade do governo), de R$ 5,2 bilhões. As dúvidas são alimentadas pela lentidão com que o governo vem fazendo sua parte. Sem acessos adequados por terra e por via marítima, os terminais em construção ou programados pelas empresas particulares não terão a utilização adequada.

As obras de infraestrutura necessárias para assegurar o aumento da movimentação de carga em Santos são de responsabilidade do governo federal. Entre elas está a construção da Avenida Perimetral da margem direita, de 6 quilômetros de extensão, com um pontilhão e duas alças de viaduto e custo previsto de R$ 107 milhões. Na margem esquerda haverá uma nova Avenida Perimetral, com 5 quilômetros, ao custo de R$ 70 milhões.

As obras de alargamento - de 150 metros para 220 metros nos pontos mais estreitos - e o aprofundamento de 12 metros para um mínimo de 15 metros, e depois para 17 metros, do canal do Porto de Santos deverão ser iniciadas ainda este ano, de acordo com informação do presidente da Companhia Docas do Estado de São Paulo, José Roberto Correia Serra. Essas obras são indispensáveis para a navegação simultânea nos dois sentidos de navios de grande porte e fazem parte de antigos projetos de melhoria e modernização do Porto de Santos.

A dezenas de quilômetros de distância do porto, porém, ainda não foi iniciada uma obra considerada prioritária pelos governos federal e estadual e também pela iniciativa privada. Trata-se do Ferroanel, cuja execução está emperrada porque ainda não há acordo sobre o trecho que será construído em primeiro lugar. Como o Rodoanel, o Ferroanel circundará a capital para retirar o fluxo de cargas por trilho das áreas centrais, onde o transporte de passageiros tem preferência. Como a ferrovia é compartilhada por trens de passageiros e composições de carga que se dirigem a Santos, estas só podem utilizá-la de madrugada. A Companhia Paulista de Transportes Metropolitanos, que opera os trens de passageiros, pretende ampliar seus serviços, para atender à demanda, o que deve limitar ainda mais o transporte de cargas. Por isso, é preciso que as autoridades federais e estaduais cheguem rapidamente a um acordo sobre o trecho que será construído em primeiro lugar, se a alça norte ou a sul do Ferroanel.

Da parte do setor privado, os projetos ferroviários já estão sendo executados. A Rumo Logística, do Grupo Cosan, por exemplo, está investindo R$ 1,2 bilhão em infraestrutura ferroviária para transportar açúcar do interior de São Paulo para o porto. Com isso, pretende elevar de 17% para 70% a participação da ferrovia no transporte de sua produção destinada à exportação.

Na área portuária, a obra mais avançada é a da ampliação do Tecondi, para a movimentação de contêineres na margem direita, cuja capacidade passará de 318 mil TEUs (medida que equivale a um contêiner de 20 pés) para 700 mil TEUs. Os guindastes antigos serão substituídos por equipamentos modernos conhecidos por portêineres e transtêineres. O terminal ganhará também um berço de atracação com 320 metros de comprimento e profundidade de 14,5 metros. Outros grupos privados que operam no Porto de Santos também estão investindo para atender ao aumento da movimentação de cargas em contêineres e a granel líquido, especialmente o etanol.

SINAIS POSITIVOS DE TEERÃ
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
12/10/2009

No próximo dia 25, um mês depois que o presidente Barack Obama e os líderes da França e da Grã-Bretanha denunciaram na abertura do encontro do G-20 a existência de uma instalação nuclear iraniana secreta nas montanhas próximas da cidade sagrada de Qom, o local será inspecionado pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). A inspeção, exigida pelos Estados Unidos e seus aliados, foi acertada em Teerã no domingo, dia 4, pelo presidente da entidade, Mohamed El Baradei. Ele assinalou, numa entrevista, que "estamos em um momento crítico, indo de uma posição de confronto para uma de cooperação e transparência".

El Baradei se referia aos resultados aparentemente promissores da reunião do dia 1º, em Genebra, entre representantes do governo do Irã e os do sexteto - os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU mais a Alemanha - para discutir o programa nuclear iraniano. Durante o encontro houve o primeiro diálogo face a face entre autoridades americanas e iranianas em 30 anos. O dirigente da AIEA, no entanto, não deixou de mencionar que a agência continua preocupada com "as futuras intenções" de Teerã - numa óbvia alusão à convicção amplamente disseminada de que o objetivo do Irã é ter a bomba atômica.

As palavras de El Baradei resumem o misto de esperança e desconfiança do Ocidente diante dos projetos iranianos de capacitação nuclear - alegadamente para fins pacíficos. Depois que o presidente Obama deixou claro que a sua mão estendida ao Irã estava pronta a se crispar sob a forma de uma proposta de endurecimento das sanções econômicas já adotadas pelo Conselho de Segurança contra Teerã, caso os iranianos se valham da oferta de diálogo para continuar ludibriando a comunidade internacional, a mensagem parece ter ecoado entre os aiatolás. O Irã, que insistia na tese de que o seu programa nuclear era inegociável, aceitou incluí-lo na agenda de conversações.

Embora reiterando que, como signatário do Tratado de Não-Proliferação e membro da AIEA, o país tem o direito de dominar o ciclo do combustível nuclear para usos civis, em Genebra a delegação iraniana não só concordou em abrir a instalação de Qom destinada à produção de urânio enriquecido, como ainda aceitou, em princípio, enviar uma parte dos seus estoques declarados do mineral para enriquecimento na Rússia e na França. O urânio beneficiado a 20% alimentaria depois um pequeno reator para a fabricação de isótopos utilizados em medicina. (Para gerar eletricidade, basta um enriquecimento entre 3% e 5%. Para a bomba, deve ser superior a 90%.)

Obama considerou "construtivo" o resultado da reunião, mas tornou a observar que os EUA não continuarão a negociar "indefinidamente". Washington pressiona para que até dezembro o Irã dê passos concretos para submeter todas as suas atividades nucleares a rigorosa fiscalização internacional. É muito provável que o país tenha não só outras instalações clandestinas como a de Qom, mas também acumule estoques não declarados de urânio enriquecido, além de equipamentos e sistemas de tecnologia militar atômica.

A questão que divide os especialistas não é se os iranianos buscam a bomba, mas quando estariam em condições de produzir um artefato nuclear efetivo. No domingo, dia 4, o New York Times divulgou uma versão não definitiva de um relatório confidencial da AIEA, segundo o qual o Irã já adquiriu "informação suficiente para ser capaz de desenhar e produzir" uma bomba "viável". O diagnóstico é contestado. O assessor de segurança nacional da Casa Branca, general James Jones, disse que os EUA continuam acreditando que o país ainda está "a anos" disso. Segundo uma avaliação americana de 2007, o desenvolvimento da bomba iraniana está suspenso desde 2003.

A meta final do Ocidente é que o Irã, além de autorizar inspeções irrestritas e cumprir a determinação do Conselho de Segurança para cessar os trabalhos de enriquecimento na usina de Natanz (mantida em segredo até 2002), terceirize todo o seu programa de urânio enriquecido, como estaria propenso a fazer no caso específico anunciado em Genebra, recorrendo à Rússia e à França. Para os aiatolás, mesmo os reformistas, seria uma capitulação inconcebível.

GARGALOS JUDICIAIS
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
12/10/2009

Embora meta de julgar processos protocolados até 2005 pareça distante, iniciativa já melhorou condutas no Judiciário

O INÍCIO da modernização administrativa por que passa o Poder Judiciário brasileiro repete roteiro característico desse tipo de processo. A entrada de ferramentas novas de gestão, como a fixação de metas e de avaliações estatísticas de eficiência, sempre desperta resistências corporativas e expõe gargalos desconhecidos no próprio órgão.
O 2º Encontro Nacional do Judiciário, que reuniu ministros, desembargadores e juízes em Belo Horizonte, em fevereiro deste ano, foi um dos marcos da mudança. Lançou-se ali, entre outras diretrizes, a chamada Meta 2, segundo a qual todas as ações distribuídas até o final de 2005 deveriam ser julgadas até dezembro deste ano.
De acordo com o Conselho Nacional de Justiça, que coordena a iniciativa, estão englobados na Meta 2 cerca de 5,1 milhões de processos. Atingir o objetivo, como mostra a Folha na edição de hoje, será impossível. Até a semana passada, era de 31% a média nacional de cumprimento da meta -consideradas as Justiças do Trabalho, Federal, Militar e Eleitoral, bem como os tribunais superiores.
Tal índice de evolução no julgamento dos processos antigos, faltando menos de três meses para terminar o ano, é sem dúvida acanhado. Daí não se conclui, entretanto, que a iniciativa de fixar metas de desempenho tenha fracassado.
A mobilização que o programa desencadeou, em escala nacional, ampliou o nível de conhecimento de dados e problemas básicos do Judiciário. Não havia ideia, por exemplo, nem mesmo do número de processos por julgar. Começou-se com uma estimativa de 40 milhões, que depois baixou para 23 milhões e chegou aos 5,1 milhões.
Sabe-se agora, além disso, de carências técnicas importantes. Uma grande quantidade de ações que exigem perícia, caso dos processos de investigação de paternidade, está parada porque seus autores não têm condições financeiras de bancar os exames. Será preciso ampliar o atendimento gratuito dessa demanda.
Outros entraves são os inventários parados por descaso de inventariantes, as ações com grande número de autores e réus e a falta de sistema informatizado que integre varas e tribunais na maioria das localidades. Merece menção ainda a baixa qualificação de boa parte do corpo de funcionários da Justiça.
Alguns grupos de juízes resistem à modernização. Afirmam que um magistrado, com total independência para julgar, não pode ficar sujeito a controles de eficiência. A meta, contudo, não estimula o juiz a decidir desta ou daquela maneira -mas a decidir em tempo hábil, sob o risco de pôr-se a perder, devido à morosidade, a própria ideia de justiça.

BRECHA PARA A GASTANÇA
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
12/10/2009

A INSISTÊNCIA dos parlamentares brasileiros em criar novidades bancadas com dinheiro alheio não dá mostras de esgotamento. Recentemente, surgiu no Senado um projeto de lei que pretende flexibilizar o cumprimento das obrigações estabelecidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) no exercício de 2009.
A proposta tem como justificativa o abalo de arrecadação sofrido pelos municípios em decorrência da crise econômica. Se aprovada, a flexibilização do cumprimento da LRF poderá ser estendida para 2010, caso a arrecadação não se recupere.
É fato que a arrecadação dos municípios mais pobres, cuja receita é muito dependente de repasses de tributos federais e estaduais, sofreu com a política de isenções fiscais adotada para combater a crise e o fraco desempenho da economia no primeiro semestre do ano.
Contudo, o governo federal já repassou cerca de R$ 1 bilhão em recursos adicionais para as prefeituras, com o fito de atenuar a perda de receitas. Pretende fazer uma transferência adicional, de montante equivalente, ainda neste ano de 2009.
O problema é que, mesmo quando respeitam as regras fiscais, os governantes brasileiros costumam trabalhar no limite do que é permitido. Assim, num quadro de frustração de receitas, o ajuste de despesas, especialmente gastos com o funcionalismo, pode se tornar uma tarefa extremamente custosa. Nessas circunstâncias, entretanto, flexibilizar o cumprimento da norma que limita os gastos equivaleria a premiar justamente a prática que se pretende evitar.
Desde que foi aprovada, em 2000, a LRF sobreviveu a diversas tentativas de desfiguração, e várias ainda tramitam no Congresso. São iniciativas que evidenciam a fragilidade da noção de equilíbrio fiscal no país.
Modificar a lei que compeliu a uma importante melhora na forma de gestão dos recursos públicos, sem dúvida, seria um grave retrocesso. O Brasil precisa fechar as brechas para a gastança da máquina pública -e não abrir mais uma.

RECEITA E DESPESA
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
12/10/2009

A notícia do atraso da restituição do Imposto de Renda das pessoa físicas para reforçar o caixa do governo dá amplitude popular a um assunto que não é necessariamente acadêmico. Tratam-se das contas da União. Notoriamente, elas não passam por bom momento.

Pressionado pelo ônus político, o governo anunciou ter desistido da manobra fiscal com o dinheiro do contribuinte. Então, é provável que as restituições referentes ao exercício de 2009 sejam pagas até dezembro, mas ficou clara a pouca disponibilidade de recursos no Tesouro Nacional. Isso é compreensível, pois a receita de impostos e contribuições cai há dez meses seguidos.

Em 2009, até agosto, o recuo foi de 7,4% em comparação a igual período de 2008. Se a receita se mantivesse estável frente ao mesmos meses do ano passado, teriam sido arrecadados mais R$ 34,9 bilhões.

O esvaziamento da receita reflete principalmente a retração das atividades produtivas. Mas, também foi influenciado pela política fiscal anticíclica. Dos R$ 34,9 milhões de queda, R$ 17,3 bilhões foram consequência da redução do IPI para a construção civil, para o setor automotivo e para os eletrodomésticos da linha branca - o que efetivamente estimulou a economia. O governo haveria de arcar com esse preço para ajudar o país a sair com rapidez do quadro recessivo.

Outro indicativo de que as contas federais não passam por boa fase é o minguado superávit primário (poupança que o Executivo faz para pagar juros da dívida interna). Em agosto/2009 resumiu-se a R$ 5,04 bilhões, o pior resultado desde agosto de 2003 (R$ 4,17 bilhões).

Em oito meses de 2009, o superávit primário somou apenas R$ 43,47 bilhões, valor mais baixo desde o mesmo período de 2002. Em 2009, até agosto, não deu para pagar nem a metade dos juros de R$ 108,3 bilhões da dívida governamental. Assim, o déficit nominal é de R$ 64,8 bilhões.

O endividamento do Executivo aumentou R$ 136,2 bilhões em oito meses de 2009, mas há que ter um freio, pois não existe espaço para ampliar a carga tributária. A manobra em andamento é a diminuição do superávit primário, o que ensejará maior volume de dinheiro para gastar. Originalmente, a meta desse superávit para 2009 era equivalente a 3,8% do PIB (Produto Interno Bruto). Depois caiu para 2,5%, percentual aprovado pelo Congresso.

Esse quadro sugere contenção das despesas de má qualidade do Executivo federal - aquelas destinadas à manutenção da máquina pública. Estas, evidentemente, não tem conotação anticíclica. Ao contrário, são recursos que fazem falta em obras que ajudariam a movimentar a economia.

Mas o governo não demonstra vontade política de cortar expressivamente o seu custeio. Principalmente no que se refere a contratações. Estão no Congresso, desde setembro para não perder o prazo da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), 14 projetos de criação de cargos e funções comissionadas, somando 23.515 vagas. Se aprovados, causarão impacto financeiro anual de R$ 1,4 bilhão. Além disso, outras 33 mil vagas deverão ser instituídas nos escalões do governo federal por meio de diferentes projetos que já tramitam na Câmara e no Senado. Portanto, são ao todo 56.515 novos cargos.

Pela proposta orçamentária que se encontra no Congresso, em 2010 as despesas da União com pessoal (R$ 168 bilhões) serão muito maiores do que todo o seu investimento, orçado em R$ 46 bilhões, dos quais R$ 23,4 bilhões para o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). Resta esperar que o reaquecimento da economia amplie a arrecadação tributária e melhore as contas do governo.

MST VAI CONTINUAR
EDITORIAL
ESTADO DE MINAS
12/10/2009

Reação de Lula não garante que vandalismo será punido

Vandalismo. Foi assim que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou a ação de integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) que, na semana passada, não se contentaram em invadir uma fazenda ocupada por laranjais do grupo empresarial Cutrale, em Borebi (SP). Os invasores foram flagrados por uma filmadora instalada em helicóptero da Polícia Militar de São Paulo, quando usavam tratores para destruir mais de 7 mil pés de laranja. A reação do presidente quebrou uma rotina de atos de igual nível de barbárie cometidos pelo movimento, dito social, sem que Lula manifestasse qualquer crítica. Era como se nada mais importante do que uma partida de futebol de seu time preferido tivesse acontecido, a ponto de merecer comentário do presidente. Tem sido assim desde a famosa foto de Lula usando o boné do MST. Foi assim na recente invasão da sede do Ministério da Fazenda, a poucos metros do Palácio do Planalto. E tudo se confirmou na desproporcional pressão para forçar, semana passada, a retirada de assinaturas de deputados que dariam vida a uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) destinada a apurar irregularidades no repasse e no emprego de verbas federais pelo MST.

Em todas essas oportunidades, a linha mais radical do movimento que diz defender a reforma agrária não recebeu outro sinal da autoridade maior do país senão o de que, embora o presidente Lula não tenha o menor interesse em se desgastar enfrentando esse tema, o governo não se empenhará em punir seus atos de indiscutível ilegalidade. A Constituição e as leis devem ser cumpridas, lembrou o presidente. Mas o passado recente não anima expectativas de que esse discurso não passe de uma preocupação momentânea, motivada pela ampla repercussão negativa que as imagens do vandalismo explícito provocaram ao ser veiculadas pela TV e pelos jornais de todo o país. É só esperar mais alguns dias para ver o que o governo fará contra a tentativa de reabrir aquela CPI, ou mesmo durante os trabalhos da comissão, caso ela venha a ser reaberta. Por seu lado, o MST emitiu nota oficial em que candidamente pede que não seja julgado pelo que é veiculado pela mídia. É a velha saída fácil de culpar a imprensa pelos fatos que ela apenas noticia.

Não menos equivocado é quem tenta justificar a ação criminosa dos tratores do MST com a alegação de que a fazenda invadida seria terreno da União. Se a informação for procedente, esse é apenas mais um crime a ser punido, não pelo MST, mas pela Justiça. Não se trata de ser contra ou a favor da reforma agrária, mas de dar ao tema a importância que ele tem. Como em todas as reformas fundamentais que o país precisa enfrentar, na questão agrária o governo tem procurado apenas não perder votos de lado algum. Mas, no caso do vandalismo, o problema é outro. A sociedade não pode deixar de cobrar o cumprimento da lei e isso implica punição exemplar a quem deixou de cumpri-la. Até agora, contudo, os vândalos não têm qualquer motivo para perder o sono. Os agropecuaristas, sim.

RETENÇÃO DO IR É INCOMPETÊNCIA
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
12/10/2009

Mais uma vez a ineficiência do Estado é cobrada do contribuinte. O país que detém uma das mais elevadas cargas tributárias do mundo, 35,8% do PIB em 2008, contra 34,6% na Alemanha, 25,6% nos Estados Unidos e 25,30% no Japão, não consegue pagar suas contas. Para não deixar a descoberto a gastança desenfreada, o governo agiu na surdina. Sem aviso prévio, desde junho vem retardando a devolução do Imposto de Renda cobrado a mais no ano passado. Só depois de denunciada pela imprensa, a estratégia de retenção foi admitida oficialmente, uma covardia com o cidadão que contava com o dinheiro para fazer frente a despesas urgentes, prejuízo maior para aqueles que recorreram a empréstimos bancários para antecipar receita.

Não faltaram avisos de que era preciso conciliar os gastos com a capacidade de pagamento. Primeiro, a arrecadação entrou em declínio com a crise mundial. Depois, as próprias políticas anticíclicas, com a desoneração de setores importantes para a manutenção da atividade econômica e a necessidade de ampliação da oferta de crédito e injeção de dinheiro no mercado, continham riscos iminentes de problemas de caixa para o governo. Mas, na antevéspera da sucessão presidencial, os cuidados necessários foram desdenhados. Enquanto o fluxo de entrada caía 0,8%, o de saída crescia 19%. Pior: aumentaram-se despesas permanentes. O empreguismo elevou em 15,1% o custo da folha de pagamento. As despesas da Previdência subiram 12,8%.

Tivesse o crescimento dos desembolsos resultado em significativa melhora dos serviços públicos, o contribuinte poderia se dar por satisfeito. Mas saúde, ensino e segurança andam de mal a pior. Tampouco o país deixou a rabeira do ranking de emergentes, com menor nível de investimentos públicos. Em 2007, excluídas as estatais, o Estado só investiu 1,69% do PIB, o que colocou o Brasil na última colocação quando confrontado com outras 135 nações. Resultado: a competitividade nacional também frequenta o fim da fila, cabendo ao país a vergonhosa 40ª posição entre 57 pesquisados. Triste é que, em vez de enfrentar e resolver problemas essenciais, como promover reformas fiscal e previdenciária de profundidade e melhorar a qualidade dos gastos, se mantenha a tática de soltar o Leão para cima do contribuinte.

Artifícios contábeis não são solução. Asfixiado, o governo não pode tomar o ar dos cidadãos. Deve produzir o próprio oxigênio. E só tem um jeito: inverter a curva ascendente dos dispêndios públicos. Reiteradas vezes o presidente Lula cita o exemplo da dona de casa que sabe equilibrar o orçamento doméstico. A retórica, contudo, não bate com a prática. Em seus seis primeiros anos de mandato, a carga tributária — que já havia aumentado 6,5% nos oito anos de Fernando Henrique Cardoso — cresceu 4,2%. É um garrote apertado em particular sobre a classe média, agora novamente subjugada, ao ter retido valores que já havia pagado um ano antes. Trata-se de sacrifício desnecessário, criado pela incompetência governamental.

A CONTA DO DESEQUILÍBRIO
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
12/10/2009

A anunciada intenção do governo federal de desacelerar as restituições do Imposto de Renda das pessoas físicas pago a mais na fonte, confirmada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, e rechaçada posteriormente pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, diante da repercussão negativa da notícia, chama a atenção para uma rotina do setor público. O problema de caixa do governo tem razões múltiplas, mas só alcançou dimensões de impasse por uma razão muito simples: é mais fácil tentar transferir automaticamente a conta para uma classe média sem poder político do que enfrentar as pressões por reajustes salariais de categorias funcionais organizadas. Obviamente, essa prática não tem como ser tolerada.

Descontinuada ao longo do ano, a devolução do Imposto de Renda pago a mais não chega a configurar atraso, pois a Receita Federal não tem qualquer compromisso de seguir à risca prazos assumidos mais no plano político. Ainda assim, fica difícil para o contribuinte aceitar o fato de o mesmo país que se mostrou capaz de passar da condição de devedor à de credor do Fundo Monetário Internacional (FMI) estar sem recursos suficientes em caixa, a ponto de precisar punir ainda mais o contribuinte pessoa física. Por isso, independentemente da forma como as divergências internas serão enfrentadas, é inaceitável que o contribuinte, já às voltas com uma carga tributária a cada ano mais excessiva, possa ser ainda mais prejudicado.

Em parte, uma das razões do desequilíbrio financeiro enfrentado hoje é o fato de o Planalto ter decidido atacar a desaceleração imposta ao setor produtivo pela crise econômica global com a desoneração de bens de consumo cujas vendas dependem em geral de financiamento de longo prazo. A providência assegurou os resultados pretendidos, fazendo com que a arrecadação menor pudesse ser compensada pela continuidade nas vendas e permitindo ao país se antecipar na saída da crise. A normalização da arrecadação de impostos, porém, não ocorreu na mesma velocidade da retomada da produção e a estimativa é de que isso só vá ocorrer em novembro. Nada disso, porém, justifica a opção por soluções simplesmente por serem mais práticas.

O contribuinte não tem por que arcar com o custo de um descompasso entre receita e despesa para o qual não contribuiu, como ocorreria numa eventual desaceleração das restituições do Imposto de Renda. O que o governo federal precisa fazer é enfrentar o problema pelo lado das despesas, reduzindo os gastos de custeio e os determinados por reajustes salariais de categorias mais influentes de servidores. Não há outra forma de garantir o equilíbrio das contas públicas sem prejudicar quem já se encontra há algum tempo sufocado por tanto imposto.

O MELHOR REMÉDIO HÁ 18 ANOS
EDITORIAL
JORNAL DO COMMERCIO (PE)
12/10/2009

Crianças riem de tudo. Porque não desconfiam dos dissabores, nem compartilham ainda a frenética desordem do mundo, riem da vida. Porque para elas é uma ideia vaga, motivo de brincadeira feita de olhos fechados, as crianças riem da morte.
E ainda tem quem ajude a provocar um sorriso, na hora mais difícil. Um palhaço no hospital é a expressão improvável de raro equilíbrio: no ambiente habitual de dor e angústia, onde pesadas emoções se revezam, a figura mascarada, colorida e falante destoa da tristeza reinante. A passagem dos 18 anos da organização Doutores da Alegria, celebrada no último dia 28, é uma prova de que este equilíbrio é uma dádiva para os pacientes.
Conhecido pelo trabalho voluntário junto a crianças que padecem de doenças graves, o grupo tem sua história ligada à iniciativa de um palhaço em Nova Iorque, em 1986. Michael Christensen participava de um show em um hospital, e resolveu visitar as crianças internadas, impedidas de assistir ao espetáculo. Entre 1988 e 1991, o brasileiro Wellington Nogueira fez parte do Clown Care Unit, como foi batizado o grupo surgido dessa iniciativa, atuante na cidade americana. De volta ao Brasil, fundou o Doutores da Alegria em São Paulo. A organização realiza por mês cerca de 75 mil visitas a crianças hospitalizadas em São Paulo, Belo Horizonte e no Rio de Janeiro, além do Recife, onde está há seis anos.
Em quase duas décadas de existência, os resultados gratificantes estimularam até a melhoria das relações entre médicos e pacientes, e entre médicos e familiares. Relações marcadas muitas vezes pela tensão, na corda esticada entre a capacidade da ciência e a expectativa de restabelecimento imediato da saúde. É fato digno de se comemorar o êxito obtido na aposta no “poder humanizador das relações a partir da presença inusitada do palhaço em meio à adversidade”. Graças a esses resultados, foi fundada no ano passado a Escola dos Doutores da Alegria, em São Paulo, com o objetivo de formar novos colaboradores, aprofundar as técnicas da arte do divertimento e disseminar o trabalho desenvolvido.
Autodenominados “besteirologistas”, os atores especialistas na arte circense são responsáveis por um trabalho sério, de grande alcance. “A besteirologia deve ser aplicada diariamente até que o paciente não saiba mais como ficar triste. É remédio para a vida toda”, brinca a organização em seu site na internet. Traduzem desta forma a aplicação de um conhecimento prático, aparentemente bobo, que seria o “saber rir” diante do próprio infortúnio. As visitas acontecem aos pares, que passam pelos ambulatórios, quartos e unidades de terapia intensiva duas vezes por semana, seis horas por dia. Durante um ano, são sempre as mesmas duplas, o que favorece a criação de laços estreitos entre os profissionais de saúde, os pacientes e os profissionais da alegria.
Eles sabem o quanto vale o sorriso: muitas vezes é o retorno do calor e da cor que se ausentavam das faces, do brilho nos olhos que parecia esquecido ao refletir apenas a dor e o medo. Esta é a ética da alegria, segundo a coordenadora dos Doutores da Alegria no Recife, Enne Marx. “Nosso trabalho não tem nenhuma pretensão. Não queremos resolver tudo”, afirmou ao Jornal do Commercio. É claro que a alegria não cura, uma gargalhada não basta. Mas a força da alegria é assim, despretensiosa como a ação persistente de palhaços circulando pelos corredores frios do ambiente hospitalar.
A experiência pode ser replicada no futuro em outros ambientes, a princípio, refratários a qualquer espécie de diversão. “No hospital, o palhaço é um pouco de cada uma de suas milenares manifestações. Ele não é uma coisa só”, escreve Wellington Nogueira no livro O lado invisível da vida, que conta a história do grupo. Para ele, não é estranho imaginar que “o palhaço vai entrar em outros locais como escolas, prisões, empresas, todos os lugares onde seja necessário rever nossa relação com o mundo, com a vida. Onde for preciso transformação, o palhaço vai estar lá!”, prevê, em tom que recorda alguma rebeldia. A rebeldia do riso? Pelo menos contra a doença, os Doutores da Alegria demonstram que é uma rebeldia necessária, bem-vinda como a saúde fustigada pelo bom humor.

DINÂMICA DA POPULAÇÃO
EDITORIAL
DIÁRIO DO NORDESTE (CE)
12/10/2009

A última radiografia do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta haver a população brasileira aumentado, no último ano, em dois milhões de habitantes. As estimativas indicam o contingente populacional alcançando 191.480.630 pessoas, dois terços dos quais residindo nas áreas urbanas. Em 60 anos, o País saiu da condição agrícola, para essencialmente urbano, sem recursos, contudo, para financiar os problemas estruturais daí decorrentes.

A cada ano, o IBGE atualiza a projeção das estimativas de população, considerando, para tanto, três pré-requisitos básicos: as taxas de natalidade, mortalidade e migração. São computadas as informações monitoradas nos 26 Estados e no Distrito Federal.

As estimativas sistemáticas alcançam as populações residentes nos 5.565 municípios brasileiros. Essa atualização, com periodicidade anual, foi determinada pela lei complementar nº 59, de 1988.

As estatísticas nacionais refletem, também, as disparidades encontradas nas cinco regiões geoeconômicas, como a concentração de 40,4% do contingente populacional em apenas três Estados da Federação. São Paulo detém a liderança nacional, com 41,4 milhões de habitantes. Vem, em seguida, Minas Gerais, com 20 milhões, e o Rio de Janeiro, com 16 milhões de habitantes.

As cidades se desenvolveram seguindo o ritmo da dinâmica populacional. Há nos grandes Estados cidades interioranas com populações superiores aos contingentes concentrados em algumas Capitais. São Paulo - a maior do País - reúne 11 milhões de habitantes, projetando, ainda, Guarulhos, com 1,3 milhão de pessoas, e Campinas, com 1,1 milhão de habitantes.

No Rio de Janeiro ocorre o mesmo fenômeno. Enquanto a antiga Capital da República detém 6,2 milhões de moradores, São Gonçalo, na Baixada Fluminense, exibe o troféu de segunda maior cidade fluminense. A terceira maior concentração urbana é Salvador, na Bahia, superando, em população, Belo Horizonte, com 3 milhões de habitantes nas previsões estimadas.

Foi-se o tempo em que o fator populacional representava motivo de euforia. Hoje, quanto maior a cidade, maiores serão seus problemas estruturais, agravados pela falta de receitas fiscais e de linhas de financiamento para a solução dos problemas essenciais como o saneamento básico, a oferta de transportes públicos, de moradias salubres, de redes de serviços médicos e de educação básica.

Essas três maiores concentrações urbanas lideram, também, as estatísticas da violência e dos delitos resultantes de crimes contra as pessoas e o patrimônio. O desemprego na cidade grande, os conflitos culturais resultantes dos choques de ambientes vividos especialmente pelos migrantes e a inadaptação ao mercado de trabalho formal são fatores agravantes da convivência nas metrópoles.

Daí o número acentuado de trabalhadores carreados para o comércio ambulante, em que o capital exigido não é tão elevado, nem há necessidade de maior qualificação na arte de comprar e vender nos espaços públicos. O mercado informal é uma característica das metrópoles. Necessita ser bem dimensionado e equacionado sem conflito.

CIDADANIA CAPENGA
EDITORIAL
A CRÍTICA (AM)
12/10/2009

O Amazonas é detentor de um dos piores indicadores de notificação de registro de nascimento no País. Estimativas do Unicef apontam que a média de subnotificação no Estado é de 17,4%, acima da média nacional. Matéria publicada na edição de hoje deste jornal, na Editoria de Cidades, mostra os dados que compõem uma realidade perversa. Mostra igualmente que, embora as ações para mudar esse cenário já apresentem bons resultados como o fato de o Amazonas ter reduzido em 37%, nos últimos sete anos, o sub-registro de nascimento, o quadro denuncia o tamanho da exclusão.

Nesse aspecto, tanto os indicadores do Unicef quanto a Síntese de Indicadores Sociais IBGE, divulgada na última sexta-feira (9), possibilitam perceber o fosso que separa a base de uma cidadania desse contingente invisível. Um dos primeiros direitos da pessoa é o de juridicamente existir, possuir um registro de nascimento que assegure legalmente o nome dela e as primeiras referências de vida, tendo como norteador a família, a mãe, o pai ou os pais que lhe dão nome e sobrenome, dia, horário e ano em que nasceu. Um documento para carregar por toda a vida e, quando esse acesso é negado, não há de fato uma existência jurídica. Algumas dezenas de amazonenses permanecem nessa condição e, com ela, compromete-se uma série de outros indicadores importantes para compor o índice de desenvolvimento humano do Estado, tais como a taxa de mortalidade materna, infantil, de escolaridade, de cobertura vacinal, entre outros.

A reportagem de A CRÍTICA traz a oportunidade de, primeiro, conhecer a realidade que nos cerca, depois, em conhecendo, proporcionar o debate aberto e amplo, nos mais diferentes setores e insistir na responsabilidade governamental de reforçar os instrumentos para mudar tal situação. O que está sendo exposto, inicialmente, nas pesquisas de organismos oficiais e pela mídia, contraria frontalmente o discurso maior ora feito em nível nacional e internacional sobre o orgulho em ser amazonense. Ao contrário, provoca constrangimentos e envergonha. A complexidade que marca o Estado não pode mais ser a justificativa para o não fazer. Ela ajuda no fazer, com os avanços da ciência, da tecnologia, da inovação tecnológica e com o papel estratégico das parcerias, só falta a vontade política de colocar o tema na pauta de prioridade e estabelecer metas públicas locais que realizem a mudança necessária e urgente.

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