Mais um escorregão de Dilma
EDITORIAL DO ESTADO DE S PAULO
Lina Maria, demitida no mês passado do cargo que exercia há 11 meses, depois de considerar irregular uma operação contábil da Petrobrás endossada pelo governo, disse à Folha de S.Paulo que, numa conversa rápida para a qual tinha sido chamada pela chefe do gabinete da ministra, Erenice Guerra, Dilma lhe perguntou "se podia agilizar a fiscalização do filho de Sarney". A secretária, que teria se limitado a responder que ignorava a auditoria e iria verificar, entendeu que Dilma lhe pedira para "encerrar" a devassa. A ministra nega não apenas ter feito a solicitação, mas que o próprio encontro tivesse ocorrido. O duplo desmentido parece tão crível como a sua alegação de que não tinha conhecimento da inclusão de um fictício doutorado em economia pela Unicamp no seu currículo oficial. Ou a sua versão, contra todas as evidências, de que a Casa Civil não vinha preparando um dossiê sobre os gastos com cartão corporativo da Presidência da República, no período Fernando Henrique, depois da divulgação do formidável crescimento dessas despesas no governo Lula.
A negativa não se sustenta por uma série de razões. Em primeiro lugar, conforme o noticiário, não foi a ex-secretária da Receita quem tomou a iniciativa de relatar a ingerência; apenas a confirmou. Segundo, ela se recorda de que a ministra estava apressada e de como estava vestida. Terceiro, nenhum dos políticos governistas que saíram em defesa de Dilma repetiu a história da inexistência do encontro. Preferiram dizer que ela não havia feito nada de errado porque o verbo "agilizar" não poderia ser interpretado como sinônimo de encerrar. Na realidade, é a única interpretação possível. Não se tratava, com efeito, de uma fiscalização que se arrastasse por uma eternidade. Além disso, o pedido se seguiu a um ofício encaminhado à Receita por um juiz federal do Maranhão, determinando o aprofundamento da auditoria, sob pena de prisão da cúpula da Receita, o que levara o órgão a montar uma equipe especial de fiscais. Por fim, a demanda da ministra praticamente coincide com a entrada de Sarney na disputa pelo comando do Senado, na contramão do que dissera várias vezes a Lula.
Nesse ponto, as peças se encaixam. Já à época era voz corrente que o que mais pesou na decisão de Sarney foi o intento de proteger o filho Fernando dos desdobramentos da Operação Boi Barrica da Polícia Federal - um dos quais, precisamente, foi a ordem judicial dada à Receita. Com a sua característica visão do que pode o poder, imaginou que a sua volta à presidência do Senado inibiria a ação de ambos os organismos, quando não do próprio Judiciário. E com toda a probabilidade ele deve ter mencionado a Lula as suas inquietações com a devassa do Fisco nas empresas da família.
O prestimoso presidente, de seu lado, há de ter feito saber à ministra, a quem ungiu como sucessora em potencial, até que ponto estava solidário com as aflições do cacique político de cujo partido espera o apoio uníssono à sua candidatura. Ágil, ela captou a mensagem. O fato de não ter sido bem-sucedida ajuda a entender o que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse à secretária da Receita ao demiti-la: a ordem "veio de cima". E o que ela quis dizer quando, já demitida, falou contra a "ingerência política na administração tributária". Mais um escândalo, enfim, que o lulismo tentará abafar.Confusão na área do pré-sal (O Estado de S. Paulo) Mais um escorregão de Dilma (O Estado de S. Paulo) Poupança pode provocar alta de juros (O Estado de S. Paulo) Transação perigosa (O Estado de S. Paulo)