EDITORIAIS12/8/2009
12/8/2009 - EDITORIAIS
EDITORIAL
O GLOBO
12/8/2009
A aceitação pela Justiça de denúncia do Ministério Público de São Paulo contra Edir Macedo e mais nove integrantes da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), acusados de crimes financeiros, precisa ser colocada dentro da dimensão correta, para impedir qualquer contaminação de um caso policial por questões religiosas.
O trabalho do MP de averiguar se os copiosos fluxos financeiros entre a Universal e empresas criadas por Macedo e auxiliares transitavam dentro da legalidade foi iniciado em 2007 — o Coaf estima em R$ 3,9 bilhões, entre março de 2003 e março de 2008. Nas investigações, quebraram-se sigilos bancários e fiscais, até o MP chegar à conclusão que os dez administradores da Universal poderiam ser denunciados por formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.
Com os promotores concordou o juiz Glaucio Roberto Brittes, da 9aVara Criminal de São Paulo.
Não se questiona a cobrança do dízimo — perfeitamente legal —, tampouco a crença dos fiéis da Universal.
Igreja neopentecostal, ela congrega evangélicos, ramo religioso que mais cresce no país, e em que se destaca a Assembleia de Deus. Como todo seguidor de uma religião, o evangélico tem de ser respeitado — bem como o católico, umbandista, espírita, e assim por diante. O assunto da denúncia do MP é outro. Trata-se da forma como Edir Macedo e grupo manipularam bilhões recolhidos nos templos, remetendoos de forma ilegal para empresas constituídas nos paraísos fiscais das Ilhas Cayman (Investholding Limited) e do Canal (Cableinvest Limited). Essas firmas, por sua vez, mandavam o dinheiro de volta ao Brasil, disfarçado de empréstimos, para pessoas ligadas à Iurd. E assim passou a ser justificada uma série de investimentos: na compra da Record do Rio, em outras emissoras de TV, rádios, imóveis e em vários negócios diversificados.
O MP fez um inventário do patrimônio construído por Macedo em 32 anos de existência da Universal.
Foram encontradas 23 estações de televisão, 42 rádios, firmas de participações, agência de turismo, gráficas, gravadoras, duas financeiras e até uma fábrica de móveis.
Foi por causa de uma reportagem sobre os negócios de Edir Macedo que a “Folha de S.Paulo” enfrentou um ataque por meio de inúmeros processos instaurados no interior do país como se fossem de pessoas físicas. Ficou configurada a “litigância de má-fé”, e eles terminaram arquivados.
Na prática, acusa o MP, Edir Macedo se aproveitou da isenção tributária concedida pela Constituição ao dinheiro coletado em qualquer templo, de qualquer culto, e desviou recursos para investimentos particulares. Para ficar dentro da lei, Macedo e auxiliares deveriam ter destinado o dízimo recolhido para ações estritamente ligadas à fé. Não foi o que aconteceu, como é facilmente constatado. Há, portanto, duas grandes vítimas neste caso de estelionato: além do Erário, os próprios fiéis da Iurd.
PAPEL DO BRASIL
EDITORIAL
O GLOBO
12/8/2009
Agiram bem os presidentes Lula, do Brasil, e Cristina Kirchner, da Argentina, quando mantiveram a reunião da União nas Nações SulAmericanas (Unasul) no limite do razoável. Tratava-se de encontro para dar posse a seu segundo presidente, o equatoriano Rafael Correa, que por sua vez assumia o segundo mandato presidencial em meio às festas do bicentenário da independência do Equador.
Não era essa a direção pretendida pelos bolivarianos. Basta lembrar a frase de efeito lançada por Hugo Chávez, da Venezuela, em Quito: “Ventos de guerra sopram sobre a região.” Referia-se às desavenças entre a Venezuela e o Equador, de um lado, e a Colômbia, de outro, depois da revelação de que os EUA acertaram com o governo de Bogotá o uso de sete bases colombianas.
Chávez reagira dizendo que compraria tanques russos para reforçar a defesa do país. Correa saiu-se com a bravata de que sua próxima reação seria armada.
Cortinas de fumaça para disfarçar fatos até agora não respondidos, ou respondidos apenas com palavras indignadas, sem provas: os de que armas suecas vendidas à Venezuela apareceram nas mãos das Farc; e declarações gravadas de um comandante narcoguerrilheiro de que a organização armada deu dinheiro para a campanha que elegeu Correa. Na reunião de Quito, à qual não compareceu o presidente da Colômbia, Alvaro Uribe, Chávez vociferou contra os EUA e contra a Colômbia, esta por “entregar” bases aos americanos. Correa fez um lamentável ataque à imprensa independente, exortando outros chefes de Estado a agirem como os bolivarianos: mídia boa é mídia silenciada.
Cumpriam o ritual de pôr a boca no trombone para minimizar graves problemas internos decorrentes, principalmente, da queda do preço do petróleo, do qual ambos são exportadores.
Lula insistiu não ter sentido investir no confronto quando há tanto a ser feito pelos países da Unasul para melhorar a vida de seus cidadãos.
E, com a ajuda de Cristina, conseguiu adiar para um próximo encontro a discussão sobre as bases americanas na Colômbia. Esse é o papel do Brasil, e é ótimo quando o país pode ter a Argentina a seu lado.
Fica a esperança de que a reunião de Quito marque o fim, ou a atenuação, da ambiguidade diplomática brasileira, provocada por simpatias ideológicas.
QUANDO UMA CRISE LEVA AO ERRO
EDITORIAL
JORNAL DO BRASIL
12/8/2009
RIO - Os sucessivos escândalos que sistematicamente corroem a imagem do Senado há pelo menos dois anos provocam indignação em qualquer cidadão razoavelmente bem informado. As opiniões mais exaltadas já chegaram a sugerir soluções mais radicais, como a ideia de extinguir a Câmara Alta – denominação que se tornou um oxímoro diante das cenas de baixaria protagonizadas na Casa nos últimos dias. Trata-se de uma típica reação enviesada pelo tom emocional, próprio aos tempos de crise aguda. É um dever cívico pensar em mudanças para um combalido Congresso. Mas não a tanto. Apesar dos incontáveis problemas do Senado, sua extinção é um disparate.
Convém admitir, no entanto, que são compreensíveis os sinais de inconformismo com os rumos tomados pelo Senado. Como se não bastassem os próprios fatos políticos gerados pelas acusações correntes, a irracionalidade e o infantilismo – características geralmente atribuídas à massa ignara por teóricos da democracia para justificar as vantagens do governo representativo e a existência do Parlamento – tomaram conta até do espírito de alguns dos principais senadores da República.
Tudo bem que a política, como observou Carl Schmitt, é feita sob a dicotomia amigo versus inimigo, do mesmo modo que a economia oscila entre o lucro e o prejuízo, e o reino da estética entre o belo e o feio. Mas as excelências estão descendo ao nível das paixões mais rasas e dos instintos primitivos, os quais a arquitetura institucional e os ritos legislativos procuram aplacar.
Esse cenário lamentável fornece motivos de sobra para aqueles que querem abolir o Senado. A instituição tem obviamente graves problemas de representação, a começar pela figura extemporânea do suplente. Em torno de 20% dos representantes da casa não são os titulares eleitos para o cargo. Foram indicados para substituí-los e, em certos casos, jamais receberam um único voto, sequer para vereador. É uma situação que, evidentemente, põe em xeque sua legitimidade.
Outras características deletérias são o tempo de duração dos longos mandatos, de oito anos, que leva a um distanciamento em relação às demandas do eleitor, e a renovação parcial de seus membros a cada pleito, baseada num conservadorismo inócuo.
As funções exercidas pelo Senado também são alvo de críticas. Em tese, sua existência é justificada pelo federalismo. Enquanto a Câmara dos Deputados representa o povo, o Senado é a casa dos estados, tendo uma representação igualitária, de três senadores para cada membro da federação, independentemente do tamanho de sua população. Esse princípio busca a coesão nacional. Mas é pervertido quando o Senado deixa de se ater às questões federativas e legisla sobre uma agenda ampla, funcionando quase como uma segunda Câmara dos Deputados. Desse modo, o problema da distorção da proporcionalidade da representação dos estados, que ocorre na Câmara Baixa, é ainda mais ressaltado, por vias tortas, pelo papel exercido pelo Senado na vida nacional.
Há quem veja o Senado como uma instituição elitista criada para acomodar os interesses das oligarquias regionais. Países como Portugal, Israel, Suécia e Dinamarca prescindem desta casa e são unicamerais. Mas as propostas radicais de extingui-lo no Brasil – levadas, insista-se, pelo clima emocional típico das grandes crises – se esquecem das nossas características nacionais, de um país com grande diversidade e disparidades regionais. A abolição do Senado não elimina as mazelas que permeiam a cultura política nas diversas instituições brasileiras. E ainda teria como efeito perverso o rebaixamento dos estados menos populosos e mais pobres no processo decisório do país.
O PAPEL MODERADOR DE LULA
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
12/8/2009
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva está preocupado com o futuro da União de Nações Sul-Americanas (Unasul). Ao final da reunião de Quito - convocada para coincidir com a posse do reeleito presidente Rafael Correa -, Lula observou que os 12 países-membros precisam chegar a um acordo sobre o que pretendem do grupo - "senão deixaremos de ser um processo de integração para sermos só um grupo de amigos".
Nem tanto. A reunião mostrou que o grupo é tudo, menos unido, e que o relacionamento entre alguns de seus membros é perigosamente conflituoso. O campo foi dividido em torno do uso de bases colombianas por militares norte-americanos, pondo, de um lado, a Venezuela, o Equador e a Bolívia - os bolivarianos que não admitem a presença de umas centenas de ianques na região - e, de outro, a Colômbia, o Peru, o Chile, o Paraguai e o Uruguai - que entendem ser o caso das bases um problema soberano da Colômbia e dos Estados Unidos. O Brasil e a Argentina reconhecem que se trata de assunto interno, mas querem garantias de que os militares americanos não agirão fora do território colombiano.
Divididos assim, os países-membros da Unasul resolveram fazer aquilo que os manuais de diplomacia recomendam: ignorar o tema até mesmo na declaração final do encontro. O problema é que o presidente Hugo Chávez não respeita protocolos. Ao final da reunião, tomou inesperadamente a palavra e fez um discurso ridiculamente radical contra o acordo entre Colômbia e Estados Unidos. "A Venezuela se sente ameaçada", disse ele. "Isso pode causar uma guerra" - para a qual ele disse que já está se preparando. O despautério de Chávez contagiou os seus epígonos bolivarianos e Rafael Correa acrescentou que o acordo das bases trará "um grande perigo para a região", enquanto Evo Morales requeria que a Unasul se declarasse em "estado de emergência" - o que quer que seja que isso signifique.
Quem pôs água na fervura foi o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Desde que, há dias, o caudilho Hugo Chávez se disse ameaçado pela presença de militares americanos na Colômbia - numa bem-sucedida manobra para desviar a atenção da opinião pública internacional dos lançadores de foguetes venezuelanos encontrados em poder das Farc e do fechamento das primeiras 34 rádios independentes, de um total de 240 -, o presidente Lula colocou a diplomacia brasileira a seu serviço. Foi só depois que o assessor de segurança nacional do presidente Barack Obama visitou Brasília, que o governo brasileiro reconheceu, publicamente, que o acordo era um assunto que só dizia respeito a Bogotá e Washington, mas, mesmo assim, exigia garantias de que as forças americanas não agiriam fora do território colombiano.
Em Quito, de certo alarmado com os tambores de guerra do bolivarianismo, Lula fez-se ouvir pelo bom senso de suas considerações e propostas. Em primeiro lugar, tratou de apagar o incêndio: "Não consigo ver a possibilidade de aumentar os conflitos na nossa região, num momento em que tudo indica que, quanto mais paz nós tivermos, mais chances teremos de recuperar o tempo perdido e dar aos nossos povos a melhoria de vida de que eles precisam." Depois, sugeriu que o caso das bases seja discutido em foro próprio, com a presença imprescindível do presidente da Colômbia, ressaltando que "o presidente Uribe não poderá se sentar na reunião como se fosse réu". Para terminar, sugeriu que os presidentes da Unasul aproveitem a abertura da Assembleia-Geral da ONU, em setembro, para marcar um encontro com o presidente Barack Obama, com quem discutiriam a política americana para a América Latina.
Na próxima semana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve telefonar para Obama para conversar sobre o assunto. É muito pouco provável que o presidente dos Estados Unidos, dado o clima hostil que Chávez e seus compañeros criaram, aceite um encontro dessa natureza. O presidente Álvaro Uribe, por sua vez, já avisou que não considera oportuno que a Colômbia participe de uma reunião de ministros da Defesa e das Relações Exteriores da Unasul, por causa do tom agressivo usado por Rafael Correa.
O fato é que, em Quito, Lula obteve uma trégua. Muito mais difícil será convencer Chávez de que ele manda na Venezuela, mas ainda não dita as ordens na Colômbia e, muito menos, nos Estados Unidos.
INVESTIMENTOS EM PCHS
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
12/8/2009
Mais de mil projetos de investimento em Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) estão sendo analisados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), mostrou reportagem de Andréa Vialli, publicada segunda-feira pelo Estado. Os investidores são empresas que veem nas PCHs a possibilidade de suprir suas necessidades de energia nos próximos anos, com mais presteza.
As PCHs são usinas com capacidade de geração de 1 MW a 30 MW. Há, hoje, em operação 346 usinas desse tipo, com potência outorgada de 2,857 mil MW, ou seja, 2,68% da capacidade total do sistema elétrico brasileiro, de 104,858 mil MW. Outras 70 PCHs estão sendo construídas, com potência de 1,047 mil MW. Há mais 159 outorgadas entre 1998 e este ano, mas que não começaram a ser construídas, conforme os dados da Aneel.
Se forem liberadas e construídas todas as PCHs pleiteadas, o potencial de geração dessas usinas chegará a 7,5 mil MW. E, nas próximas quatro décadas, esse potencial poderá ser multiplicado por três, estima o secretário executivo do Centro Nacional de Referência em PCHs (Cerpch) da Universidade Federal de Itajubá, Geraldo Lúcio Tiago Filho. "O potencial conhecido hoje das PCHs chega a 25 gigawatts (GW) e corresponde a duas vezes a potência de Itaipu", afirma o especialista.
Não faltam exemplos de interesse nas pequenas usinas, tanto de grupos nacionais como estrangeiros. Na sexta-feira, o conselho de administração da Light aprovou a contratação de um consórcio das construtoras Orteng e Quebec para a realização das obras da PCH Paracambi, com investimentos de R$ 185 milhões.
O Grupo Ersa, formado pelo Pátria Investimentos, a norte-americana Eton Park, o fundo BBI FIP, a GMR Empreendimentos Energéticos e o banco de desenvolvimento alemão DEG (que faz parte do Grupo KfW), controla três PCHs em operação, tem mais nove em construção em Minas Gerais e Santa Catarina, com potência de 300 MW, e já elabora o inventário de rios para acrescentar 1.000 MW à capacidade atual. A canadense Brookfield Energia Renovável (antiga Brascan) gera 536 MW em 36 PCHs, construirá mais uma neste ano e quatro no ano que vem em Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Passado o momento mais difícil da crise financeira, "demos continuidade a dois projetos que já estavam iniciados e vamos retornar os investimentos em 2010", declarou o presidente da empresa, Luiz Ricardo Renha.
Entre os maiores grupos geradores do País, a Cemig lançou, em 2004, o programa Minas PCH, que estimula o aproveitamento dos rios do Estado e prevê investimentos de R$ 1 bilhão em PCHs com capacidade de 400 MW.
Os investimentos em PCHs são estimulados pelo custo de geração, inferior ao dos projetos de grande porte. Outro estímulo é a maior rapidez na obtenção de licenças ambientais.
Para o País, a vantagem é que a oferta de eletricidade fica menos dependente de grandes projetos, como Belo Monte. Com capacidade de geração de 11 mil MW, o processo de licenciamento ambiental de Belo Monte foi encaminhado pela Eletrobrás ao Ibama em março. O governo federal ainda pretende lançar o edital neste semestre, depois de 20 anos de estudos e da oposição de grupos ambientalistas, indígenas e religiosos, além do Ministério Público.
Um consórcio formado pela Eletrobrás, Andrade Gutierrez, OAS, Odebrecht e Engevix faz os estudos iniciais de viabilidade econômica de cinco usinas hidrelétricas no Peru, com potência instalada de 6 mil MW, para produzir a partir de 2015. Calcula-se que o Peru consumirá apenas 20% da energia gerada pelas usinas.
Outro benefício que decorre da expansão das PCHs é a diversificação geográfica dos investimentos. "Os bons potenciais no Sul e Sudeste do Brasil já são aproveitados", afirma Tiago Filho. "A expansão se dará rumo aos Estados de Goiás, Mato Grosso e sul do Amazonas."
Mesmo não afastando os riscos de falta de energia quando o crescimento econômico se acelerar, as PCHs aumentam a segurança energética.
NOVA AMEAÇA À PRODUÇÃO
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
12/8/2009
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu entrar em guerra com a agricultura brasileira - a agricultura de verdade, produtora dos alimentos consumidos pelas famílias e responsável pelo superávit comercial mantido pelo País apesar da crise. Curvando-se mais uma vez ao MST, o presidente se dispõe a combater um dos projetos mais sensatos da bancada ruralista, já aprovado no Senado e em tramitação na Câmara dos Deputados. O projeto estipula novos critérios de avaliação da produtividade rural, para reduzir o risco de arbítrio nas desapropriações para reforma agrária. Se aprovado o projeto, o governo terá de submeter ao Congresso quaisquer mudanças nos índices de produtividade, os produtores terão prazo para se ajustar aos limites legais, em caso de desvio, e, além disso, o grau de utilização da terra deixará de valer como referência para desapropriação. É um projeto de blindagem perfeitamente justificável no caso brasileiro.
O presidente mandou resolver o assunto já, informou o ministro do Desenvolvimento Agrário, Gustavo Cassel, citado pelo jornal Valor. "Esses senhores feudais não podem dispor da terra como quiserem, sem levar em conta a questão da produção de alimentos", disse o ministro. Também segundo ele, a Confederação Nacional da Agricultura, presidida pela senadora Kátia Abreu (DEM-TO), deveria estimular a produtividade, em vez de se postar do "lado errado". Todos esses comentários compõem um quadro absolutamente distorcido da agropecuária brasileira. Para começar, não há no Brasil um problema de oferta de alimentos. A produção é mais que suficiente para abastecer o mercado interno e para atender muitos clientes no exterior. Se ainda há algum problema de subnutrição no Brasil, é por falta de empregos produtivos e de renda, e não por escassez de comida. Até o presidente Lula já reconheceu esse fato publicamente, abandonando as tolices ainda repetidas por assessores.
Segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário, 70% dos alimentos produzidos no Brasil provêm de propriedades familiares. Isso é provavelmente verdadeiro - mas essas propriedades familiares são aquelas exploradas de forma competente e moderna, fora dos padrões defendidos pelo MST e seus porta-vozes no governo. Muitos produtores pequenos e competentes trabalham para indústrias processadoras de alimentos. Seu êxito está associado a uma das atividades mais combatidas pelos piores conselheiros do presidente Lula - o agronegócio.
Quanto à produtividade agropecuária, não é a especialidade dos servidores federais do MST. Os produtores mais eficientes são justamente aqueles - grandes, médios e pequenos - envolvidos de forma direta ou indireta na produção competitiva para os mercados internos e externos. De janeiro a junho, a receita geral das exportações brasileiras, US$ 69,95 bilhões, foi 22,2% inferior à de um ano antes. No mesmo período, o agronegócio faturou no mercado externo US$ 31,44 bilhões, valor 6,9% menor que o do primeiro semestre de 2008. O superávit comercial do setor, US$ 26,36 bilhões, garantiu o resultado geral positivo (US$ 13,98 bilhões), mais que compensando o déficit de outros segmentos. Esse resultado foi essencial para o Brasil atravessar sem maiores danos a crise internacional. Mas o presidente Lula prefere apoiar a política do MST, representada pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, e manter em constante insegurança um dos setores mais dinâmicos e estratégicos para a segurança externa e a estabilidade de preços.
O dinamismo do agronegócio revela-se mais uma vez na evolução recente das vendas de máquinas agrícolas. Em junho, a indústria vendeu no mercado interno 5,6% mais do que em maio. De junho para julho, o aumento foi de 13%. No acumulado do ano, o resultado ainda é inferior ao de 2008, mas a reação das vendas é um sinal promissor. Quem compra equipamentos num cenário econômico ainda pouco favorável não é certamente um bando de senhores feudais improdutivos. Mas os conselheiros de Lula com certeza se entusiasmam bem menos com esses números do que com os bonés e camisas vermelhas dos bandos arregimentados pelo MST. Esses bandos, mais uma vez, ocuparam ontem, em Brasília, o Ministério da Fazenda. Para isso são muito eficientes. Produção é outra coisa.
OS LIMITES DA RECUPERAÇÃO ECONÔMICA
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
12/8/2009
Existe certo consenso sobre o início de uma reativação da economia, com base em diversos fatores. Mas não se deve apostar em prosperidade explosiva, pois há limites que podem freá-la.
Entre os fatores de otimismo está a generalizada melhora no plano internacional, embora o desemprego nas economias de maior porte não permita um efeito positivo imediato no crescimento da demanda.
No caso brasileiro, o fato de a economia ter sido atingida só marginalmente pela crise permite sair dela mais rapidamente. Foi muito positivo o papel das autoridades monetárias brasileiras nessa recuperação ao reduzirem, no momento oportuno, a taxa de juros básica, com a inflação controlada e com as reservas internacionais, colocando o Brasil ao abrigo de crise do balanço de pagamentos.
A atuação do governo foi também decisiva, embora suas intervenções não mostrem o mesmo valor positivo. Foi criado aumento de renda, mas nem sempre adequado no longo prazo. O melhor instrumento, representado pelos investimentos na infraestrutura, ficou mais nas intenções do que nas realizações, pela incapacidade do governo em administrar seu Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Houve um aumento das transferências governamentais - que deve continuar -, pelo aumento dos salários do funcionalismo, pela melhora do salário mínimo, dos benefícios do INSS e pela elevação dos gastos assistenciais, cujo inconveniente é que não se pode corrigir quando for necessário adotar uma política pós-crise. Os incentivos fiscais para o setor automobilístico, para produtos da linha branca e material de construção foram eficientes, mas poderão ter efeito negativo quando forem eliminados.Teria sido mais eficiente um alívio generalizado do ônus fiscal.
Nos próximos meses, a demanda doméstica será sustentada pela conclusão de novos acordos salariais e pelas festas do fim do ano. Existe, no entanto, um limite para o crescimento da indústria. As exportações de produtos manufaturados, num clima de recuperação lenta da atividade, acompanhada por um crescimento do protecionismo e uma taxa cambial que se valoriza, continuarão difíceis. A melhora das exportações só se verificará para as commodities.
A queda dos preços, na medida em que não toma a forma de deflação, ajuda também no revigoramento da demanda - com a esperança de que seja acompanhada de uma retomada dos investimentos privados.
BASES DA DISCÓRDIA
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
12/8/2009
Ao "convocar" Obama por conta de ampliação do acordo EUA-Colômbia, Lula reforça pantomima bolivariana na Unasul
COMO PREVISTO , a reunião da Unasul (União de Nações Sul-Americanas) em Quito foi dominada pelo tema da ampliação do uso de bases militares colombianas pelos Estados Unidos. A claque bolivariana impôs à retórica do encontro um ultrapassado tom de antiamericanismo.
A armadilha de Hugo Chávez (Venezuela), Rafael Correa (Equador) e Evo Morales (Bolívia) voltou a enredar o presidente do Brasil. Lula "convocou" Barack Obama para uma reunião da Unasul -algo que teria tanta chance de resultar em diálogo produtivo quanto um ultimato da troica a Álvaro Uribe, caso o presidente da Colômbia tivesse comparecido à cúpula. Com sua manifestação, o brasileiro só fez legitimar a pauta extemporânea.
Não se trata de dizer que o Brasil e outros países sul-americanos extrapolam ao ocupar-se da presença militar da maior potência mundial em sua vizinhança. A ampliação do acordo EUA-Colômbia traz um elemento de desequilíbrio que merece cuidado, em particular à luz da recente reativação da Quarta Frota americana para este subcontinente. Nada que se equipare, porém, a "ventos de guerra" sobre a região, como se expressou Chávez com a desmesura habitual.
Basta ouvir especialistas a respeito, como fez esta Folha. Militares brasileiros entrevistados descartam qualquer ameaça estratégica no uso das sete bases pelos EUA. Enxergam no acordo uma extensão da colaboração antiga para combate ao tráfico de drogas e à guerrilha, cada vez mais indistinguíveis.
Com efeito, Uribe não pode contar com seus vizinhos bolivarianos na solução desse conflito interno. Há indícios de tolerância e até de colaboração com as Farc (a narcoguerrilha colombiana) da parte de Venezuela e Equador. Foi com o apoio dos EUA que Bogotá colheu duas vitórias significativas em 2008: um ponto final aos sequestros promovidos pelas Farc e a redução de 18% na área plantada de coca, acompanhada da queda de 28% no volume de produção de cocaína, segundo dados da ONU.
O erro de Uribe e Obama foi o de não terem preparado nações-chave da região, como o Brasil, para a ampliação do acordo. Um esforço de transparência teria evitado a propagação da versão de que os EUA operariam diretamente novas bases na Colômbia, quando isso não está previsto.
O próximo teste da Unasul será em Buenos Aires, em nova reunião presidencial a realizar-se ainda neste mês, possivelmente com a presença de Uribe. Aí ficará mais claro se o bloco está destinado a tornar-se só mais um palanque para o chavismo ou uma aliança regional forte o bastante para desfechar um combate coordenado e eficaz ao narcotráfico no subcontinente.
CENSURA JUDICIAL
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
12/8/2009
A CENSURA imposta por um desembargador ao jornal "O Estado de S. Paulo" não é um ato isolado. Decisões desse tipo, que introduzem um dispositivo expressamente vedado pela Constituição, banalizam-se de modo preocupante no país.
No dia 30 de julho, o magistrado Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, proibiu o jornal paulista de publicar fatos relacionados à chamada Operação Faktor, da Polícia Federal. O desembargador atendeu a um recurso da defesa de Fernando Sarney, investigado pela PF -o pedido de censura havia sido exemplarmente rechaçado na primeira instância.
A reportagem do jornal revelou o teor de diálogos envolvendo Fernando, sua filha e seu pai, José Sarney. Negociavam um cargo de confiança no Senado para o namorado da neta de José Sarney -nomeação mais tarde efetivada por um ato secreto.
A justificativa para a decretação da censura foi a de que a investigação da PF transcorria sob sigilo. Trata-se de um bom argumento para punir a autoridade ou a parte eventualmente responsável pelo vazamento da informação. Jamais poderia servir como pretexto, entretanto, para impedir jornalistas de veicularem informação de notório interesse público, como é o caso.
Esse último aspecto foi enfatizado pela Associação Mundial de Jornais e pelo Fórum Mundial de Editores anteontem, em carta enviada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao presidente do Supremo, Gilmar Mendes, condenando a tutela sobre o diário paulista. A nota conjunta tampouco deixa de salientar a série de convenções internacionais afrontadas pela decisão do desembargador brasileiro, a começar da Declaração dos Direitos Humanos.
Primeira a ser atropelada no episódio, a Carta brasileira bane a censura prévia, e o faz imbuída de uma decantada sabedoria acerca da propensão, natural nos poderosos, para calar qualquer crítica. É em nome do direito da sociedade de ser informada que a Constituição finca um marco definitivo contra a censura.
É estranho que comecem a surgir do próprio Judiciário decisões que negam esse princípio.
CENÁRIO ELEITORAL APONTA PARA MAIS DOIS CANDIDATOS
EDITORIAL
VALOR ECONÔMICO
12/8/2009
É cedo demais para avaliar se uma eventual candidatura de Marina Silva à Presidência pelo Partido Verde (PV) tem o potencial para implodir a candidatura de Dilma Rousseff (PT), como afirma o deputado Ciro Gomes (PSB-CE). Mas essa possibilidade teve o poder de colocar a discussão sobre o processo sucessório do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em outros termos que não a polarização entre o PT e o PSDB de José Serra. Foi assim que Ciro saiu da posição de relativa discrição para se assumir como candidato à sucessão de Lula, também pela base do governo.
O ponto de inflexão do parlamentar do PSB foi uma entrevista concedida ao Valor, na edição de segunda-feira, onde ele desestimula as articulações feitas pela direção do PT e pelo próprio presidente Lula para torná-lo candidato a governador de São Paulo pelo "bloquinho de esquerda" com apoio petista, explicita a sua opção pela candidatura à Presidência e faz uma análise pessimista das chances de Dilma, na hipótese de ser a única candidata do governo.
Na avaliação de Ciro, uma única postulação governista garantirá a vitória de um tucano, em especial se o candidato for o governador de Minas, Aécio Neves. "Não é profecia. O Serra apoiar o Aécio significa que recuou voluntariamente. Dá vitória para Aécio em São Paulo. O Aécio sai com 80% em Minas (...) e entra mais fácil no Rio de Janeiro, no Norte e no Nordeste. E no Sul os níveis de aprovação do governo Lula estão bem mais baixos." A variável Marina Silva seria um agravante. "Se ela aceitar a convocação do PV, implode a candidatura Dilma" (Valor, 10/8).
Ao botar a cara para fora como candidato a presidente, Ciro retomou o discurso agressivo. O alvo agora são as "alianças de governabilidade" com "hegemonia moral frouxa" - e, ao formular raciocínios sobre um período pós-Lula, que parte de uma realidade de "ninhos" onde a moralidade é relativa, traça uma era Lula nada lisonjeira. A relação com aliados pouco éticos seria contingência da popularidade de Lula que um sucessor, qualquer que seja, não poderá manter. "O Lula (...) defende o Sarney e aguenta. Ele defende o Renan e aguenta. Quero ver se eu aguento, se o Serra aguenta, se a Dilma aguenta", disse. A fórmula de governabilidade sustentada no PMDB pode estar com os dias contados, segundo o raciocínio, porque uma aliança dessa não consegue se firmar a não ser na hipótese de um presidente popular, capaz de passar ao largo da péssima imagem de seus aliados.
Ao que tudo indica, a intenção de Ciro não é a de colocar o governo Lula na cova rasa das alianças espúrias, mas aproveitar o fato novo Marina Silva, afirmar a sua própria candidatura e deslocar o PMDB do centro das articulações da campanha de 2010. Primeiro, porque como ele ressalta, o preço para a candidatura Dilma de um acordo eleitoral em que ela tenha que apoiar pemedebistas que estão no centro de escândalos é muito alto. "Marina tem ainda o discurso da intransigência. Dilma foi obrigada a defender o presidente José Sarney", observou. Segundo, porque assim como uma candidatura do PV pode subtrair votos da ministra, a dele, Ciro, pode captar votos de Serra. E terceiro, porque se livrar do aliado incômodo é a forma de trazer de novo para o centro os aliados de sempre do PT, o "bloquinho de esquerda", que perdeu a centralidade com a opção de Lula por aliar-se a um PMDB teoricamente capaz de dar ao governo maioria no Congresso, mas que, na prática, tem condenado o Legislativo à imobilidade.
Se Ciro tem a sua parte de razão quando coloca o PMDB como um problema, mais do que uma solução eleitoral ou para a governabilidade, existe um outro elemento que seu raciocínio não resolve. O chamado "bloquinho de esquerda" não conseguiu se viabilizar como uma alternativa de aliança, pois não consegue resolver o problema da governabilidade. Nem Ciro, nem o PV, que quer Marina Silva como candidata, conseguem dar um passo adiante sem, no mínimo, uma coalizão parecida com a que dá hoje suporte a Lula. Mesmo se o Brasil pós-2010 tiver superado a dicotomia PT-PSDB com os novos fatos que se colocam na arena eleitoral, será muito difícil vencer essa limitação do sistema político. Coloca-se como pressuposto para a "limpa" sugerida pelo parlamentar cearense uma reforma política que reduza a dispersão partidária e tire os governos futuros da órbita de chantagem do PMDB.
EXPECTATIVA DOS APOSENTADOS
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
12/8/2009
Reajuste real (acima da inflação) é uma antiga reivindicação dos aposentados e pensionistas do INSS que recebem valor mensal maior do que um salário mínimo. Mas não vai sair este ano. Ficou para 2010, quando haverá eleições no país.
Será de 7%, a partir de janeiro conforme a proposta do governo a ser apresentada às centrais sindicais. Caso seja confirmada a previsão de inflação em 2009, de aproximadamente 3,6%, conforme o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), o ganho real vai superar 3%. É alto – considerando-se que o país ainda deverá estar vivendo ressaca recessiva no início do próximo ano – no entanto está longe do aumento histórico esperado para começar a repor anos de achatamento salarial.
O buraco a ser coberto é muito grande. Compare: nos últimos 15 anos, o ganho real dos aposentados e pensionistas que recebem o piso nacional (salário mínimo) foi cinco vezes maior do que aqueles cujo valor do benefício supera o mínimo, segundo dados da Previdência Social. Os números são estes: entre 1995 e 2009, ou seja, da era FHC à era Lula, as aposentadorias com valor de um salário mínimo (R$ 465) tiveram elevação real de quase 110%, enquanto a alta real das demais faixas de benefícios ficou em 22% no período. Doloroso.
É justa a política de elevação do piso salarial. Trata-se de melhorar a distribuição da renda. O que soa como injustiça é a não aplicação desse critério para todos os níveis de remuneração de aposentados e de pensionistas.
Esse desequilíbrio poderia ter sido reduzido a partir de 2006, não fosse o veto presidencial a uma emenda, de autoria do senador Paulo Paim, que estendia a todas as pensões e aposentadorias o reajuste de 16,67% concedido naquele ano ao salário mínimo.
Há muito mais a negociar do que um esporádico reajuste em termos reais. Dois projetos estão em tramitação na Câmara dos Deputados: o PL 3299/08 extingue o fator previdenciário; já o PL 01/07 concede aos aposentados e pensionistas o mesmo sistema de reajuste para o salário mínimo. O governo emite sinais de poder negociá-los – o que é animador.
Como se sabe, o fator previdenciário é uma forma draconiana criada para poupar recursos do INSS. Quanto menor a idade do trabalhador ao se aposentar, maior é o redutor e, conseqüentemente, menor o valor do benefício recebido. O relator do PL 3299/08, Pepe Vargas (PT-RS), propõe um tempo mínimo de idade e de contribuição para homens e mulheres, em troca da extinção do tal fator – sem implodir o caixa da Previdência.
De 2006 a 2008, a economia teve a fase de maior crescimento da era Lula, gerando recordes na arrecadação tributária. Portanto foi desperdiçada a oportunidade para implementar uma política de recuperação dos valores de aposentadoria. Agora as dificuldades são maiores, pois o valor dos benefícios está mais defasado, e o déficit previdenciário só cresce. O Ministério da Previdência calcula que os desembolsos aumentarão R$ 1,6 bilhão a cada 12 meses para cada ponto percentual de reajuste a quem recebe mais de um salário mínimo.
Mas é de justiça repor as perdas salariais dos segurados do INSS, ainda que gradualmente. O ideal é que o ritmo acompanhe a política de valorização do salário mínimo. Isso deve se tornar factível à medida que o governo enfrentar o déficit financeiro do INSS com medidas eficazes, o que requer mudanças estruturais nos fluxos de receita e de despesas. Pelo visto, isso deverá ficar para a era pós-Lula.
Por enquanto surge a esperança de que o reajuste de 7% dê partida a um processo de recuperação do poder de compra dos aposentados e pensionistas.
ÁGUA FRIA OPORTUNA
EDITORIAL
ESTADO DE MINAS
12/8/2009
Lula acerta ao esvaziar fala de Chávez e ao deixar Unasul antes da hora
A pobreza ainda é predominante na América do Sul, subcontinente em que os países estão longe de transformar suas potencialidades em prosperidade econômica, segurança e bem-estar social da população. Portanto, todas as iniciativas que tenham em vista promover a integração para acelerar o desenvolvimento da região deveriam ser aproveitadas com racionalidade e cooperação. Mas não é o que ocorre, em boa parte, devido ao excesso de protagonismo de certos líderes que, movidos por anacrônico espírito caudilhesco, pretendem impor seus projetos pessoais de poder. E, para tanto, não se acanham em lançar mão do velho truque da fantasia de estar enfrentando um poderoso inimigo externo. Por isso mesmo, fez bem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em esvaziar o palco que tinha sido armado para proporcionar mais um espetáculo midiático do inconveniente coronel Hugo Chávez, presidente da Venezuela, na terceira reunião de cúpula da União das Nações Sul-Americanas (Unasul), segunda-feira, em Quito, capital do Equador.
Foram dois golpes certeiros, disparados tão logo o ambiente da posse de Rafael Correa, que assumia o segundo mandato como presidente do Equador e o primeiro à frente da Unasul, foi contaminado por mais uma quebra de protocolo de Chávez. Ele repetiu o comportamento inadequado que, na Cúpula Ibero-Americana, em 2007, no Chile, levou o rei Juan Carlos, da Espanha, a dar o famoso puxão de orelhas: “Por qué no te callas?”. Desta vez, sem estar escalado para falar, Chávez tomou a palavra para impor o assunto que melhor serve a seus planos de liderança belicosa: o polêmico apoio dos Estados Unidos a bases militares da Colômbia, conforme projeto do país vizinho de combate ao narcotráfico e seu envolvimento com a guerrilha que já teve inspiração política. O caudilho não economizou adjetivos em sua técnica de inflar a importância do problema e valorizar seu papel de eventual vítima de uma imaginária sanha imperialista e falou claramente em guerra.
Chávez não seria mais que uma piada se não contaminasse vizinhos menos estruturados, como Evo Morales, da Bolívia, e o próprio equatoriano Correa. Ambos obedeceram ao comando do venezuelano e também se afastaram do protocolo para discursar contra o suposto avanço militar norte-americano sobre a região. Acertou Lula ao lembrá-los de que era inócua a discussão sem a presença de Álvaro Uribe, da Colômbia, e, mais ainda, ao jogar água fria na fervura ao sugerir que se convidasse o presidente Barack Obama, dos EUA, para uma conversa franca sobre o assunto. O segundo golpe de Lula foi a decisão de antecipar a volta ao Brasil, a pretexto de um não confirmado agravamento do estado de saúde do vice-presidente José Alencar. Depois de tantos pecados de Lula, por excesso de bondade e complacência com os colegas da vizinhança, de quem pensa contar com o voto para conquistar uma cadeira no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), a postura adotada em Quito surpreende. A expectativa é de que essa nova orientação prevaleça sobre o equivocado viés da identificação ideológica, que, até gora, ajudou muito pouco os vizinhos e absolutamente nada o Brasil.
A MÁFIA DOS REMÉDIOS
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
12/8/2009
Pelas fronteiras com Paraguai, Bolívia e Uruguai sempre houve invasão de mercadorias contrabandeadas, atividade criminosa combatida com certa apatia pelas autoridades brasileiras. Mas a situação evoluiu para estágio que convoca imediata e enérgica repressão, sobretudo para proteger de grave ameaça a saúde da população. A série de reportagens sob o título “Cura falsificada”, em publicação no Correio Braziliense e Estado de Minas, mostra a entrada em território nacional, via contrabando, de quantidades alarmantes de remédios falsificados e equipamentos médicos de origem suspeita.
O Paraguai figura como principal fonte para abastecimento do comércio ilícito. Ciudad del Leste (município fronteiriço ao Brasil) é a terceira maior zona franca do mundo. Perde apenas para Miami e Hong Kong. É ali que contrabandistas brasileiros adquirem medicamentos fajutos fabricados em fundos de quintal e produtos hospitalares sem autenticidade. Em Foz do Iguaçu, no lado brasileiro, só nos primeiros sete meses deste ano a Polícia Federal apreendeu 551.400 itens farmacêuticos made in Paraguai. Já operação da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) interceptou 21 mil comprimidos com diversas indicações terapêuticas.
Entre os específicos mais procurados despontam o Tamiflu — empregado no tratamento contra o vírus H1M1, indutor da gripe suína —, o Pramil (o Viagra paraguaio), o Reumazim e o Citotec. A ingestão de semelhantes fármacos falsificados carrega efeitos catastróficos à saúde, a morte inclusive. Mais grave: não apenas pela Ponte da Amizade, que liga Ciudad del Leste a Foz do Iguaçu, ocorre a contravenção. O negócio transita por mil quilômetros de fronteiras secas e de portos clandestinos no Lago Itaipu e Rio Paraná.
Também nos limites com a Bolívia sucede a mesma atividade ilegal. Em San Mathias, cidade boliviana a 80 quilômetros de Cáceres (Mato Grosso), brasileiros se abastecem dos mesmos produtos vendidos em Ciudad del Leste. Ali, o comércio incide, em particular, sobre agentes medicamentosos proibidos no Brasil, mas vendidos a brasileiros lesados pela pregação criminosa dos delinquentes.
Entre Santana do Livramento, no Rio Grande do Sul, e Rivera, no Uruguai, as transações também abarcam produtos farmacêuticos inautênticos, embora em quantidades menores, conforme registros da Policia Federal. O problema mais sério é que, na cidade uruguaia, é livre a compra de remédios sujeitos, no Brasil, a apresentação de receitas médicas.
Preocupação especial predomina no cenário em que se desenvolve a violação das fronteiras. Os amplos espaços a serem objeto de fiscalização e repressão dificultam a execução de medidas eficazes. Todavia, diante das consequências trágicas já anotadas e tendentes a assumir proporções incontroláveis, é imperiosa a mobilização de todos os meios disponíveis da União e dos estados para superar a situação anormal.
PASSEIOS DE ARCANJO
EDITORIAL
DIÁRIO DE CUIABÁ (MT)
12/8/2009
Não se pode dizer que tenha se transformado numa rotina, mas as idas e vindas do “comendador” João Arcanjo Ribeiro, entre Cuiabá e Campo Grande (MS), nos últimos anos, já chamam a atenção da opinião pública, que, obviamente, questiona até onde são necessários sucessivos deslocamentos, se praticamente eles não acrescentam nada ao processo que corre na Justiça contra o mafioso mato-grossense. Por que não o uso das videoconferências?
Há pouco mais de um mês, Arcanjo esteve na capital mato-grossense para uma audiência judicial, na qual ele figura apenas como testemunha. Como das vezes anteriores, o bandido, como se diz na gíria, chegou mudo e voltou calado para a penitenciária de segurança máxima de Mato Grosso do Sul.
Como noticiado pelo Diário, ontem, o ex-bicheiro virá a Cuiabá dentro de duas semanas para participar de duas audiências judiciais de processos distintos, aos quais ele responde na 15ª Vara Criminal, onde tramitam ações que envolvem casos de crime organizado. No dia 26 de agosto, quarta-feira, o réu acompanhará, no Fórum da Capital, o depoimento de testemunhas de defesa intimadas nas ações.
Com relação à primeira audiência, num processo que tramita desde 2005, Arcanjo é acusado de envolvimento em um esquema de suposta corrupção na Assembléia Legislativa de Mato Grosso, fato, que, por sinal, marcou o meio político, no que se convencionou classificar de um dos maiores escândalos no setor, em todos os tempos. No dia 17 de junho passado, com efeito, ele esteve em Cuiabá para presenciar os depoimentos de 10 testemunhas arroladas, porém, como algumas não foram localizadas, a audiência teve de ser redesignada.
Na tentativa de racionalizar o tempo, o juiz da 15ª Vara, José Arimatéia Neves, pretende realizar, no mesmo dia, outra audiência em que Arcanjo também figura na lista dos réus. Duas testemunhas de defesa serão ouvidas na sessão, que diz respeito ao processo da “Operação Arrego”, deflagrada em outubro de 2007. Na época da ação, 17 pessoas foram acusadas de envolvimento com um esquema de jogo do bicho, que continuava sendo comandado por Arcanjo de dentro do Presídio Pascoal Ramos. Com a ação do Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco), foi preso um genro do comendador, e Arcanjo foi transferido para Campo Grande.
Esse caso, por sinal, marcou época – a exemplo de todas as maléficas ações de João Arcanjo, quando ele comandava o crime organizado em Mato Grosso -, na medida em que, na ocasião, foram denunciados e presos por prática de corrupção ativa e formação de quadrilha dois delegados da Polícia Civil que atuavam no Interior do Estado. Ambos dariam proteção ao esquema do bicho, supostamente controlado por Arcanjo, de dentro do Presídio de Pascoal Ramos.
Tudo o que se falou do antes poderoso “comendador do jogo do bicho” talvez não seja suficiente para explicar os mistérios insondáveis que rondam os processos relacionados ao citado elemento. Interessante, no entanto, é registrar que cada vinda de Arcanjo de Mato Grosso do Sul, segundo levantamentos do próprio Governo, custa quase R$ 50 mil aos órgãos de Segurança Pública.
Noutras palavras, o “tour” do famoso bandido custa muito caro aos cofres públicos. O contribuinte, infelizmente, banca as despesas.
“O passeio do famoso bandido custa muito caro aos cofres públicos”
SAÚDE FRÁGIL
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
12/8/2009
Os postos de saúde – tanto quanto as escolas públicas – já foram símbolo de uma sociedade democrática, laica, na qual as mesmas oportunidades são oferecidas a todos, por intermédio de um estado provedor. Funcionou em uma parte do mundo, a exemplo das gélidas, distantes e civilizadas Suécia e Noruega. Mas como é sabido, nos países pobres e em desenvolvimento nem as praças deram conta do recado, confirmando nesses rincões a profecia de George Orwell: todos são iguais, mas uns são mais iguais que outros.
O preço pago pelo fracasso do projeto moderno é que o “público” se tornou sinônimo de serviços ruins, destinado à população de baixa renda. E o privado uma panacéia de competência e qualidade. Não é uma equação perfeita, é claro: a oposição entre esses dois mundos criou um vácuo social, distanciando os mais abonados e esclarecidos dos espaços comuns e condenando os demais às sobras de um sistema patrimonialista, acrítico e estagnado.
Em plena temporada de gripe H1N1, os efeitos dessa crise brotam dos ralos. A desconfiança diante do que tradicionalmente se chamou “saúde pública” e a impossibilidade do setor privado em atender a um fato de tamanha proporção trouxe o pânico, a boataria e até a insanidade.
Nem a confusão de espaços e de papéis, nem a urbanidade perversa do Brasil, contudo, resumem a ópera. Deve se considerar que ao longo do século 20 o termo saúde pública acabou se tornando algo tão complexo quanto o índice Nasdaq ou a receita dos pastéis de Santa Clara. É tudo e é nada ao mesmo tempo. Aos poucos, o termo sanitarista – usado para designar profissionais do ramo – foi sendo substituído por versões mais atualizadas, próprias da medicina social e comunitária, ou diluído em um sem número de especialidades.
Ocorre hoje que toda e qualquer área, da cirurgia plástica à oncologia podem reivindicar para si a alcunha de saúde pública, fazendo da expressão original algo relativo e impotente, uma definição a ser discutida, o que não ajuda muito na hora em que a epidemia descansa na sala de jantar. As próprias faculdades de Medicina contribuíram para o estrago na medida em que passaram a atender mais às demandas de mercado do que à modesta cesta básica da saúde. O saldo é o esvaziamento de um conceito construído, por certo, desde as pestes negras. Mas chega de mágoa: o palpite mais aceito é que a ideia de saúde pública vai ser restaurada na marra, pela experiência.
O primeiro indício de que isso está acontecendo pode ser visto nas empresas, casas e demais espaços de aglomeração: é gente lavando e desinfetando a mão, como há 40 anos ainda se aprendia na escola, em família ou na unidade sanitária mais próxima. A saúde, escorada no tratamento da doença, na compra de remédios, na pesquisa de enfermidades cada vez mais raras e no uso de equipamentos de última geração, quem diria, redescobre a água e o sabão.
Não é tudo. O renascimento da medicina como promoção da saúde deve redimir outros prejuízos, feito a perda da cultura alimentar e a necessidade de cuidados com o espírito. As cartilhas de antanho relacionavam saúde ao combate da fadiga, ao convívio feliz. Pareciam conselhos cândidos do catecismo, mas que encontram similares hoje em dia.
Sabe-se que drogadição, alcoolismo e depressão formam o terceiro conjunto de males nacionais, atrás da hipertensão e da diabete. Ainda assim, na nova ordem da saúde há pouco espaço para psicólogos e psiquiatras aptos a atender a população apavorada pelo medo, pela violência e pela solidão. Nesses dias em que o H1N1 virou o prenúncio do Juízo Final, aliás, faltaram profissionais aptos a confortar e trazer à razão. Não é sem tempo.
LIÇÕES DO H1N1
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
12/8/2009
O procurador de Saúde Pública do Ministério Público do Paraná, Marco Antonio Teixeira, 57 anos, lembra que a própria Constituição não define o que seja saúde pública. Resta recorrer à Organização Mundial de Saúde, que entende a atividade como garantia de bem-estar físico, psíquico e social. Embora simpática, para muitos críticos a definição confunde saúde com felicidade. A falta de consenso, contudo, não seria a responsável direta pelo pânico em torno do H1N1. Em tese, a população duvida do atendimento dos órgãos oficiais e das notícias veiculadas pela imprensa. Para Teixeira, pela primeira vez uma epidemia está sendo acompanhada em tempo real pelos meios de comunicação, com o agravante de que as informações são frágeis. “A doença está sendo entendida nos moldes da gripe aviária, que é muito mais severa.” Segundo o procurador, apenas em 2010 será possível fazer afirmações mais seguras sobre essa variação do Influenza, o que será de grande valia para enfrentar o que vem por aí: um segundo ciclo da doença, com uma leva de dengue no meio e provavelmente novas notícias sobre a gripe aviária. “Vamos ter de nos educar na adversidade”, diz. O procurador aposta, contudo, que a crise mundial de saúde vai fortalecer as relações sociais e chamar atenção para a prevenção. “O plano de saúde privado não resolve tudo”, observa, colocando o dedo na ferida. O apartheid entre o setor privado e o público tende a diminuir. Nesse dia, o termo saúde pública deve deixar de ser um retrato amarelado do passado.
DIÁLOGOS INDECENTES
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
12/8/2009
Com a divulgação de diálogos constantes na ação de improbidade administrativa proposta pelo Ministério Público Federal contra a governadora e oito agentes públicos do Estado, o Rio Grande passa do constrangimento à perplexidade. Se já era doloroso para os gaúchos constatar que autoridades e representantes do povo estão apontados pela investigação como suspeitos de fraudes, pior é o conteúdo das escutas telefônicas, que revela a pequenez moral e falta de compostura de alguns dos interlocutores. Ainda que o julgamento da Justiça possa vir a absolver ou atenuar a responsabilidade dos demandados, ainda que o julgamento político da CPI possa considerá-los inocentes, a opinião pública rio-grandense já tem elementos suficientes para concluir que aquelas pessoas que tramam a subtração de dinheiro público, em linguagem chula e debochada, merecem o total repúdio dos cidadãos.
É inevitável que os fatos passem por um julgamento triplo. Um deles será feito pelo tribunal político, que tem como palco a Assembleia Legislativa e que detém instrumentos específicos para tanto, a começar pelas comissões de inquérito. Outro, mais formal, é o julgamento em seu sentido estrito, exercido pelas autoridades do Poder Judiciário, com seu ritual definido e suas normas e prazos. Mas o mais abrangente e de maior celeridade já começou a ser feito por cada cidadão com base nas informações disponíveis sobre o caso.
A grave situação que os fatos retratam exige que as instituições gaúchas se comportem de maneira responsável, sem preconceitos ou prejulgamentos e também sem compadrios ou corporativismos. Neste sentido, cada um dos três julgamentos – o da opinião pública, o político e o judicial – tem seu papel e sua importância. Infelizmente, o tribunal da opinião pública não aplica sentenças definitivas, como os brasileiros têm constatado nas altas instâncias da República, notadamente no parlamento, onde alguns deputados e senadores envolvidos em escândalos e falcatruas continuam exercendo mandatos chancelados pelo voto popular. Mas suas penas de descrédito servem para aplacar a indignação dos cidadãos.
Quanto ao incipiente julgamento político, que se processa ao sabor de conveniências partidárias e de disputa de poder, é fundamental que prevaleça o interesse público e a busca do melhor para o destino do Estado. Instalado sob as luzes da imprensa e sob um clima de comoção pré-eleitoral, o julgamento político ganhará no caso gaúcho a forma de uma CPI que, se espera, cumpra com a sua responsabilidade. Há, por último, o julgamento propriamente dito da ação de improbidade, proposta pelos procuradores da força-tarefa do Ministério Público Federal, que caberá ao Judiciário. Este também será minuciosamente acompanhado pela sociedade.
Esse triplo julgamento, com instâncias próprias, tem momentos de interação recíproca. O papel de cada uma dessas instâncias exigirá dos protagonistas doses de responsabilidade pública, num desafio que demandará competência, coragem e independência. Mas o cidadão tem o direito de se sentir ferido e traído ao conhecer diálogos tão indecentes.
A opinião pública rio-grandense já tem elementos suficientes para concluir que aquelas pessoas que tramam a subtração de dinheiro público, em linguagem chula e debochada, merecem o total repúdio dos cidadãos.
A ESTRATÉGIA CONTRA A GRIPE
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
12/8/2009
Diante da brusca e acentuada elevação do número de mortes no Brasil em consequência da gripe A, é natural que a população comece a pôr em xeque a eficácia da estratégia oficial de combate ao vírus H1N1, o que aumenta a necessidade de posicionamentos firmes do poder público. Daí a importância de manifestações como as do ministro da Saúde, José Gomes Temporão, que ontem esteve no plenário da Câmara para prestar esclarecimentos sobre a doença no país. A sociedade precisa ter razões para confiar na capacidade de os órgãos oficiais enfrentarem o desafio com um mínimo de danos, evitando qualquer margem para pânico, que, neste momento, poderia conferir dimensões trágicas a um drama já suficientemente inquietante.
Na manifestação à Câmara, o ministro da Saúde esforçou-se em desfazer preocupações exageradas. As estatísticas governamentais revelam que, entre pacientes nos quais a doença evoluiu de forma grave, 43% apresentam pelo menos um fator de risco – o que inclui portadores de problemas respiratórios, gestantes, crianças menores de cinco anos, pacientes imunodeprimidos e cardiopatas. Mesmo diante do clamor popular pela liberação do acesso ao Tamiflu nas farmácias, com apresentação de receita médica, o ministro reafirmou a intenção de manter o produto sob controle do governo. As justificativas fazem algum sentido, mas a polêmica em torno de algumas questões não pode ser desconsiderada.
A melhor forma de o poder público desfazer desconfianças em relação a sua capacidade de enfrentar a gripe A com eficiência é atacar de imediato qualquer falha que possa dar margem a casos fatais. Entre os desafios mais urgentes, estão, por exemplo, a necessidade de reduzir entraves burocráticos que dificultem o acesso ao Tamiflu nas primeiras 48 horas posteriores aos primeiros sintomas e a de ampliar os horários de atendimento de postos de saúde, principalmente em fins de semana.
A sociedade precisa fazer sua parte, o que pode ser facilitado com a ênfase em informações adequadas sobre providências individuais e coletivas para o enfrentamento do problema. O poder público, por sua vez, tem o dever de transmitir segurança, demonstrando estar atento à evolução da doença e à necessidade de combatê-la com eficiência.
BUSCANDO BOM SENSO
EDITORIAL
GAZETA DE ALAGOAS
12/8/2009
Amplia-se a cada dia a perspectiva de mais prejuízos irreparáveis para a população alagoana em decorrência das paralisações dos serviços públicos.
Não há nenhuma categoria assalariada, hoje, no mundo, que esteja satisfeita com seus salários e com suas condições de trabalho. Mas a consciência frente à crise e às consequências decorrentes de ações mais radicalizadas, tem forçado soluções baseadas no bom senso e na negociação.
Em Alagoas, porém, nos últimos anos, todos os anos, a população é impreterivelmente castigada por interrupções nos serviços públicos. E, no frigir dos ovos, pazes feitas entre governo e grevistas, o povo consagra-se como único sacrificado.
De que adianta a Justiça definir a legalidade ou ilegalidade de uma greve se essa decisão não produzir consequências?
Há pouco, em decorrência de uma greve decretada ilegal, depois de findo o movimento, buscou-se, entre as partes, um acordo para o cumprimento das decisões judiciais. Magnanimamente, a própria Justiça decidiu anistiar 90% (noventa por cento) da multa aplicada e, com a concordância do governo, ainda parcelou a parte devida de 10% (dez por cento) em 60 prestações! O decidido pela justiça não se discute, cumpre-se. Mas parece que em Alagoas não é bem assim, e uma força maior se alevanta, pois a direção da entidade sindical, além de se rebelar contra o veredicto, já convoca nova mobilização (contra a decisão de Justiça). Desta forma, a liderança trabalhista “legitima” ações em sentido contrário, ou seja, acende o sinal verde para o governo ignorar decisões pela legalidade de outras greves.
Se isso for adiante sofreremos uma grave deformação do Estado de Direito, e as vozes roucas das ruas, ou dos gabinetes, mesmo que sussurradas, darão o tom, contrapondo e desmoralizando as decisões judiciais.
A IMPORTÂNCIA DO CINTO
EDITORIAL
JORNAL DO COMMERCIO (PE)
12/8/2009
Recentes turbulências aéreas que aconteceram em várias partes do mundo deixaram lições definitivas quanto à importância do uso do cinto de segurança, que lamentavelmente ainda é visto por muita gente como um acessório desconfortável. Pois em nome do conforto passageiros que não usavam cintos de segurança, quando aviões oscilaram violentamente, foram jogados no teto e todos saíram com algum tipo de ferimento, até com gravidade. A lição - que foi aplicada pela primeira vez na história exatamente na aviação, durante a Segunda Guerra Mundial - vale inteiramente para o transporte terrestre, seja individual, seja coletivo.
Outro não é o sentido da lei e esse tema foi mostrado recentemente por este jornal em face da constatação de que 70% dos passageiros que viajam no banco traseiro de automóveis não usam o cinto e por conta disso muitos são vítimas de acidentes fatais. Quando começou no Brasil a obrigatoriedade do cinto para motorista e passageiro do banco da frente, houve críticas e resistência e foi preciso mexer rigorosamente no bolso dos que se recusavam a usá-lo - com multas - para que a lei se tornasse efetiva. O que era visto como desconfortável entrou em uso habitual para grande parte dos condutores e passageiros, mas ainda há um caminho a percorrer para que se afirme que o Brasil venceu essa guerra. O custo em vidas perdidas e em traumas graves e gravíssimos pode ser estimado a partir das análises de instituições como a Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia. Suas conclusões são sombrias.
Hoje, quando já está amplamente entendido que o cinto não é um acessório dispensável, com repercussão quase que inteiramente para os que ocupam os bancos dianteiros, é preciso despertar a mesma consciência para uma outra exigência que é deixada de lado, inclusive com argumentos igualmente sem sustentação: o uso do cinto pelos que viajam no banco traseiro. As estatísticas são definitivas e não se trata, sequer, de distinguir entre passageiro adulto ou criança. Os riscos são os mesmos para todos. Os estudos mostram que ao corpo dos ocupantes do banco traseiro sem cinto se aplica o mesmo impacto que sofrem os corpos dos ocupantes da frente: em uma colisão a 50 quilômetros por hora, o movimento do veículo é reduzido a zero instantaneamente, enquanto os corpos continuam no impulso, sendo contidos pelas partes contundentes do veículo.
Quando estamos nos referindo a criança, o caso é mais grave ainda porque ela não tem consciência da necessidade do cinto de segurança. Dados do Departamento Nacional de Trânsito mostram que duas mil crianças e adolescentes morrem por ano no Brasil em acidentes de trânsito, enquanto cerca de 40 mil ficam com lesões permanentes ou leves. As mesmas pesquisas indicam que 86% das crianças com até cinco anos andam nos carros sem cinto ou cadeira para bebês. Em contraponto, os estudos técnicos comprovam que os assentos apropriados para crianças reduzem em até 70% esses números assustadores do Denatran. Só basta uma reação do poder público para instalar mais segurança nas ruas e nas rodovias: fazer valer a lei.
O Código Nacional de Trânsito diz que as crianças devem sentar no banco traseiro até os 10 anos de idade e usar os dispositivos apropriados de segurança. Além disso, é preciso uma cultura permanente do bem dirigir, que instale de vez a pacificação no trânsito, o que implica em ações pedagógicas, desde as escolas aos meios de comunicação, com recursos de simples orientação a métodos de impacto - como se faz, por exemplo, para o combate ao fumo -, expondo insistentemente a tragédia dos acidentes e suas causas. E isso não se aplica apenas aos veículos privados, pois as estatísticas aí estão para mostrar que a segurança é igualmente importante nos ônibus e microônibus, responsáveis por algo em torno de 17 mil acidentes anuais nas estradas brasileiras.
VALIDADE DOS CONCURSOS
EDITORIAL
DIÁRIO DO NORDESTE (CE)
12/8/2009
Decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar recurso oriundo do Amazonas, abriu precedente favorável aos candidatos aprovados em concursos públicos e não convocados. No entendimento do STJ, todos os candidatos aprovados dentro do número de vagas têm o direito de ser nomeados. Mesmo expirado o prazo de validade da seleção.
A deliberação surgiu da apreciação, em grau de recurso, de demanda encabeçada por dez candidatos aprovados em concurso promovido pela Secretaria Estadual da Saúde. Foram aprovados 112 candidatos, mas aproveitados, apenas, 59. O concurso, realizado em 2005, chegou a ter seus efeitos prorrogados até junho passado.
Inicialmente, os postulantes não aproveitados apelaram para o Tribunal de Justiça. A ação foi rejeitada, sob o argumento de que a aprovação em concurso gera apenas expectativa de direito à nomeação. A administração pública -entendeu o Tribunal do Amazonas - tem o direito de aprovar e aproveitar candidatos, de acordo com a sua conveniência e oportunidade. Diante disso, só restou aos interessados recorrer ao STJ.
Na instância superior, porém, esse não foi o entendimento. Para o ministro-relator Jorge Mussi, a administração é obrigada a nomear os aprovados em concurso dentro do número de vagas, quer contrate ou não servidores temporários durante o período de validade da seleção. Em face da decisão, a Secretaria de Saúde do Amazonas deve providenciar a nomeação dos candidatos remanescentes.
Durante a última década do século passado e os primeiros anos do atual, o serviço público sofreu impacto acentuado com a redução do tamanho da máquina estatal. O fundamento estava correto ao transferir à iniciativa privada a gestão de serviços até então conduzidos pelo governo. O modo de fazer, entretanto, não foi dos mais adequados. A eliminação desordenada de empresas públicas, empresas de economia mista, autarquias e unidades da administração centralizada resultou em retrocesso.
Do ponto de vista macroeconômico, foi desmantelada a sua estrutura brasileira de estradas de ferro, quando o mundo inteiro priorizava o transporte ferroviário.
Num País com as dimensões continentais, o transporte rodoviário de cargas encarece demais o preço das mercadorias. Depois de um século de construção de ferrovias, de repente, esse modal de transportes foi substituído pelo rodoviarismo, de maior custo e risco. Também a cabotagem sofreu abandono, quando o País dispõe de excepcional costa atlântica.
Hoje, há no serviço público uma decisão política para restabelecer as funções de Estado, preenchendo os claros resultantes de aposentadorias, afastamentos e ampliação de serviços mediante o recrutamento, por concurso, de novos servidores.
Como essa é uma exigência constitucional, surgiu nos governos subnacionais uma verdadeira indústria de concursos, bancada pelos candidatos, superdimensionando vagas e iludindo os incautos.
O STJ parece haver colocado um fim nessa questão.
POLÍTICA, CAUSAS E A SENADORA MARINA
EDITORIAL
A CRÍTICA (AM)
12/8/2009
O Partido Verde fez, semana passada, o lance mais ousado de sua história política recente ao convidar a senadora Marina Silva (PT) para ingressar em seus quadros e sair candidata à Presidência da República em 2010. Desde Fernando Gabeira, na eleição de 1989, o partido que supostamente se ocupa com as causas ambientais não tinha um nome de fôlego e com biografia irretorquível para oferecer ao eleitorado brasileiro.
Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente do governo Lula e com 30 anos de militância ecológica ao lado do presidente, diz que decidirá nessa semana se aceita ou não a contradança oferecida pelos verdes. Acrescenta, em suas reflexões públicas, que não é ela que tem uma causa, no caso a ambiental, mas sim a causa que a tem. Afora o efeito da frase, é de se perguntar qual ambientalismo proporá Marina Silva numa eventual presidência verde? Que tipo de desenvolvimento sustentável proporá essa brasileira do Acre que se alfabetizou aos 16 anos e antes dos 30 já era uma das mais importantes senadoras do País? Qual visão da Amazônia, a região que mais desperta atenção de ecologistas, tem a professora de História amiga do inefável líder Chico Mendes? Marina Silva tem idéias sobre esses temas que em muitos casos se chocam com a realidade e, principalmente, com interesses dominantes da região, como a posição contrária a abertura de estradas.
No campo político, uma possível troca de partido com posterior candidatura à presidência abre também um leque de oportunidades para reflexão. A primeira é sobre a condenação que todos fazem das trocas partidárias, que supostamente enfraquecem os partidos, base da nossa democracia. Como reagirá, por exemplo, a sociedade quando o PT for pedir de volta o mandato que Marina obteve pela legenda? Uma segunda reflexão é sobre os meandros do partido que hoje ocupa a presidência, pois, teoricamente, se Marina quer ser candidata, empunhada pela causa, por que não o faz dentro do próprio PT? Por que Marina não se opõe a Dilma Roussef dentro do próprio PT? Situação semelhante vive o PSDB, mas até onde se sabe não está ameaçado de perder os governadores José Serra e Aécio Neves, também pré-candidatos à presidência.
Enfim, uma troca de partido desse tipo em nada contribui para o fortalecimento da política, pelo contrário iguala todos por baixo e justifica transferências nada abonadoras para partidos de aluguel ocorridas no passado.