Saturday, October 13, 2012

Joaquim Barbosa: presidente - WALTER CENEVIVA


Joaquim Barbosa: presidente - WALTER CENEVIVA

FOLHA DE SP - 13/10


A auspiciosa nomeação de um presidente negro para o STF é ótima como simbologia das transformações sociais


O ARTIGO 5º da Constituição começa com o enunciado de uma verdade jurídica, mas uma inverdade material: "todos são iguais perante a lei". Será verdadeiro se o lermos como esperança de um vir a ser, compondo programa igualitário para todos os que aqui vivem, com "inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade". O artigo 5º é mais do que ordem jurídica -é uma "norma programática", conforme ensinam os mestres. Retrata a esperança de aprimoramento das condições sociais dos que vivem aqui, para alcançarem realização plena.

Nesse quadro a auspiciosa nomeação de um presidente negro para o STF (Supremo Tribunal Federal) é boa em si mesma, pelas qualidades que o ministro Joaquim Barbosa já demonstrou no tratamento do direito e no trabalho que tem desenvolvido. É, porém, ótima na simbologia das transformações sociais pelas quais estamos passando. Seu acesso à presidência dá o indício fundamental: a substituição dos dirigentes do STF, segundo o tempo na mesma função permite, no restrito grupo de 11 magistrados, com revezamento de estilos, convicções e mando.

É evidente, porém, que o caso do ministro Barbosa acrescenta, além do toque da novidade, o preenchimento de um lugar que, desde a criação da Constituição imperial, sob Pedro 1º, foi submetido a duas reservas específicas: só para homens e só para brancos. A lei de então incluiu na capital brasileira (o Rio de Janeiro) um "Supremo Tribunal de Justiça, composto por 11 juízes letrados...", sem fazer referência à cor.

"Letrado" caiu em desuso, mas no começo do século 19 indicava o grande conhecedor do direito. A exigência constitucional de hoje requer "notável saber jurídico e reputação ilibada", permitida a escolha pelo presidente da República, sem distinção de sexo, com aprovação do candidato pelo Senado Federal.

É confortante ver a evolução, embora lenta. Nas dezenas de tribunais brasileiros, tanto na área federal quanto na estadual, o número de presidentes negros é muito pequeno. Ainda predomina o sexo masculino, mas já se está no ritmo do equilíbrio entre homens e mulheres. As antigas resistências à presença feminina nos serviços da Justiça, que pareciam irremovíveis até a segunda metade do século 20, hoje são encaradas como passadismo pré-histórico.

Nesse perfil histórico, o ingresso de Joaquim Barbosa na Corte Suprema se fez credenciado por títulos de pós-graduação no país e no exterior, tendo feito carreira no Ministério Público Federal. É o 44º presidente do STF, depois da proclamação da República, sendo o oitavo mineiro a chegar ao cargo, conforme o decano do tribunal, ministro José Celso de Mello Filho, informou no discurso de saudação. A conduta de Barbosa no processo do "mensalão" sugere que está pronto para os embates da presidência.

A escolha simultânea do ministro Ricardo Lewandowski para vice-presidente gerou alguma preocupação, pois ele e Barbosa tiveram discordâncias ásperas no exame dos processos. A preocupação está abrandada, pois ambos receberam nove votos de dez votantes, a indicar que cada um dos eleitos escolheu o outro. Foi bom prenúncio, da parte de ambos, para os ajustes das responsabilidades recíprocas na chefia do tribunal.

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