Saturday, June 12, 2010

Violoncelo étnico


Consagrado no circuito erudito, Yo-Yo Ma fez de seu instrumento
uma caixa de ressonância global, gravando a música dos mais
variados cantos do planeta e usando-a como foco de projetos sociais


Sérgio Martins

Michael O'Neill/Divulgação
O FAVORITO DOS DEMOCRATAS
Yo-Yo Ma: performances na posse de Obama e no funeral de Ted Kennedy

Em qualquer lugar do planeta em que você me jogar, minha primeira atitude será empreender uma parceria com um músico local", diz Yo-Yo Ma, 54 anos. O violoncelista sino-americano – que nesta semana faz recitais em São Paulo e no Rio de Janeiro – tem autoridade para sustentar a afirmação: em quatro décadas de carreira, com aproximadamente 100 discos lançados, fez de seu instrumento uma espécie de caixa de ressonância global. Sem negligenciar as peças obrigatórias do repertório erudito (como as Seis Suítes para Violoncelo Solo, de Bach, que gravou duas vezes), Yo-Yo Ma adicionou à sua discografia títulos dedicados ao tango, à música popular brasileira e às chamadas sonoridades étnicas. Empenhou-se ainda em projetos como o Silk Road Ensemble, conjunto formado por artistas originários da antiga "rota da seda", caminho comercial que ligava a Europa à Ásia. Embora seja a estrela do grupo, Yo-Yo Ma define sua posição com humildade: "O segredo é me portar como um hóspede na casa dessas pessoas, para que elas me apresentem à sua família – ou seja, à sua música".

Sem populismo nem proselitismo ideológico, Yo-Yo Ma dedica-se a projetos de integração social. Em janeiro deste ano, assumiu o cargo de consultor artístico da Sinfônica de Chicago e tomou como uma de suas missões apresentar a música erudita à numerosa comunidade mexicana da cidade. Quatro anos atrás, viveu seus dias de lobista no Congresso americano, no esforço de facilitar o ingresso de músicos estrangeiros nos Estados Unidos – os integrantes do Silk Road Ensemble, muitos vindos de nações muçulmanas, estavam perto de perder uma turnê por causa de atrasos na concessão de vistos. Simpático ao Partido Democrata, Yo-Yo Ma tocou, ao lado do violinista Itzhak Perlman e da pianista Gabriela Montero, na posse de Barack Obama (apresentação, na verdade, pré-gravada, pois o frio intenso dificultou a correta afinação dos instrumentos). Em agosto do mesmo ano, seu violoncelo foi ouvido no funeral do senador democrata Ted Kennedy.

Yo-Yo Ma já fez coletâneas questionáveis, como Songs of Joy & Peace (com um repertório pop cuja breguice o violoncelo acentuou) e Simply Baroque (com diluições de obras eruditas). Nas apresentações no Brasil – cujos ingressos já estão esgotados –, ele executa peças de Brahms e Rachmaninoff, além de composições do italiano Ennio Morricone e do brasileiro Cesar Camargo Mariano. Uma salada? Sem dúvida. E é isso mesmo que o violoncelista ambiciona. Na música e, mais discretamente, no empenho por suas causas sociais, Yo-Yo Ma mostra uma versatilidade admirável – e acerta bem mais do que erra em suas misturas.

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