Queda livre a 36 KM de altitude
Em tempos de esportes radicais e fartura de patrocínio para aventureiros, está difícil uma proeza realmente inédita. A exceção é o projeto de Felix Baumgartner. Em dia ainda indefinido, entre junho e julho, ele saltará de um balão de hélio na estratosfera, a 36 quilômetros de altitude, e, se der tudo certo, se tornará o primeiro homem a quebrar a barreira do som em queda livre. O mais famoso dos paraquedistas, esse austríaco de 40 anos tem um currículo de realizações espetaculares. Ele já saltou de paraquedas dos dois edifícios mais altos do mundo e de um braço do Cristo Redentor, o que lhe valeu o recorde de salto de baixa altitude. Baumgartner também cruzou os 30 quilômetros do Canal da Mancha em queda livre, com a ajuda de duas asas de planador, em 2003. Toda essa experiência não é suficiente como preparativo para o salto numa altura além do alcance de qualquer avião. O projeto Stratos – alusão à estratosfera, de onde Felix Sem Medo, como é chamado por seus fãs, vai saltar – está sendo preparado há três anos por quase 100 profissionais. Na equipe estão engenheiros, médicos, físicos, paraquedistas e astrônomos, alguns deles veteranos da Nasa, a agência espacial americana. O maior esforço é prever o que acontece com o corpo de um homem quando submetido a tal altitude e velocidade. Ninguém sabe. "Só saberemos os efeitos da transição para a velocidade supersônica realizando o salto", disse Baumgartner. A melhor experiência é a do recordista atual, Joe Kittinger, que agora trabalha na equipe de Baumgartner. Em 1960, Kittinger, então com 32 anos e piloto da Força Aérea americana, saltou de um balão de hélio a mais de 31 quilômetros de altitude. Ele atingiu 988 quilômetros horários, velocidade insuficiente para quebrar a barreira do som. Essa medida varia conforme as condições de altitude e temperatura. Ao nível do mar, a velocidade do som é estimada em 1 220 quilômetros por hora. No ponto em que Baumgartner pretende saltar, o som viaja mais lentamente devido ao ar frio. É esperado que ele rompa a barreira do som a 1 100 quilômetros por hora, a 30 500 metros. "Na época do salto, eu era apenas um piloto. Felix, por sua vez, é um paraquedista experiente. Ele terá muito mais habilidade para se posicionar durante a queda do que eu", disse a VEJA Joe Kittinger, hoje com 81 anos. A estratégia do salto de Baumgartner é similar à de 1960, com muitos avanços tecnológicos. O primeiro é a cápsula pressurizada atrelada a um balão de hélio em que ele será levado até a estratosfera (cinquenta anos atrás, Kittinger subiu numa cestinha). Essa altura só é atingida por balões meteorológicos e foguetes espaciais. O ambiente na estratosfera já tem características próximas às condições existentes na órbita da Terra. Dessa forma, não é surpresa que o traje do voo seja similar ao dos astronautas. A roupa espacial serve de proteção tanto contra temperaturas de 70 graus negativos como contra os raios UVB, que na estratosfera são 100 000 vezes mais intensos do que aqueles que atingem a superfície do planeta. Um tecido comum pegaria fogo se fosse exposto diretamente a essa radiação. No local do salto, a pressão atmosférica é de menos de 1% da existente ao nível do mar. Um dos efeitos letais desse quase vácuo é a imediata expansão dos vasos sanguíneos até estourarem. Há razões científicas no plano de varar a atmosfera em queda livre. A equipe por trás do projeto quer saber se o homem, devidamente equipado, é capaz de suportar velocidades supersônicas sem ser esfacelado pela onda de choque decorrente do rompimento da barreira do som. "Talvez um dia seja possível trazer astronautas de volta do espaço com segurança, caso seja preciso abandonar a nave", diz Baumgartner. Isso só se saberá se ele voltar ao solo são e salvoParaquedista prepara-se para romper a barreira do som com salto da estratosfera
Alexandre SalvadorDivulgação AVENTUREIRO
Felix Baumgartner: mergulho na estratosfera• Quadro: Mais alto que qualquer outro