Saturday, April 03, 2010

Genética artilheira


Para Pelé, os gols do Santos em 2010 – média de 3,3 por jogo,
em 21 partidas – podem ser explicados por um tipo diferente
de DNA, que leva os jogadores a gostar do ataque


Fábio Altman, de Santos

O ATAQUE DOS ANOS 60
Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe, quase uma rima poética


VEJA TAMBÉM

Está no DNA do Santos marcar gols", disse Pelé a VEJA. No último domingo de março, depois da vitória por 5 a 0 contra o Monte Azul, o time praiano celebrava uma estatística empolgante. Nos primeiros 21 jogos do ano, incluindo partidas pelo Campeonato Paulista, pela Copa do Brasil e um amistoso, o Santos marcou setenta vezes – média de 3,3 gols por jogo. É desempenho pouca coisa mais fraco que o das míticas equipes de 1962 (83 gols, 3,9 por jogo) e 1963 (71 gols, 3,4 por jogo). Houve, na trajetória de 2010, um 10 a 0 contra o Naviraiense, pela Copa do Brasil, e um 9 a 1 no Ituano, pelo Campeonato Paulista.

"As revelações do Santos parecem sempre olhar para o passado, tentando colar sua imagem à da turma de antigamente", diz Odir Cunha, autor de sete livros sobre o time da Vila Belmiro. Evidentemente, qualquer comparação da linha formada por Paulo Henrique Ganso, Neymar, Robinho e André com o ataque do início dos anos 60, declamado como uma quintilha poética (Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe), é exagero – mas a mágica saudosista é inevitável. Pepe, ponta-esquerda do mais forte chute que já se viu, entusiasma-se com o que acontece agora. Caseiro, recatado, nos últimos anos ele se acostumara a acompanhar futebol pela televisão, no sofá. Até que veio este Santos do treinador Dorival Junior, e Pepe saiu da sala. Na partida contra o Palmeiras, na Vila Belmiro, lá foi ele ao estádio. "Nem quis sentar na tribuna de honra", diz. "Fui para baixo, próximo ao alambrado, para ver de perto e ouvir a reação da meninada em campo." Viu três gols do Santos e quatro do Palmeiras, mas pouco importa, a derrota foi detalhe.

Fora do gramado, vive-se o renascimento da lenda santista. Guilherme Guarche, ex-doqueiro do porto, ex-presidente de torcida organizada, é quem zela pelos arquivos do Centro de Memória e Estatística do Santos. Animado com as goleadas, mexe no computador, à cata de dados, como quem garimpa tesouros. Instado a medir a distância de Ganso, Neymar, Robinho e André para a era Pelé, olha para um canto, sorri e aponta para um imenso painel com a foto do time de 1927 (sim, 1927) perfilado. "Aqueles, sim", afirma. Aqueles eram, entre outros, Araken, Feitiço, Camarão, Siriri e Evangelista – 133 gols nos primeiros vinte jogos do ano, para não perder a comparação, média de 6,3 por jogo. E dá-lhe mística.

Como sempre, tenta-se transformar o gosto pelo ataque, a alegria de meninos com aparelhos nos dentes, para quem treinos e jogos são a mesma algazarra, em explicação teórica. Bobagem. "Qual é, em números, o esquema tático do Santos? Não sei", escreveu Tostão na Folha de S.Paulo. Algumas vezes é um 4-3-3 (quatro defensores, três meio-campistas e três atacantes), outras vezes tem a cara de 4-3-2-1 (quatro defensores, três meio-campistas, dois atacantes próximos à área adversária e um outro mais enfiado). "O Santos não é um time de botões nem de prancheta", anota Tostão.

O Santos de 2010 tem dois caminhos: ganhar um título, e entrar para o rol dos grandes; ou então perder, e fazer parte de um grupo ainda mais fascinante, o das seleções magistrais que não ergueram taças. Estão nessa família a Hungria de 1954 (vice-campeã mundial), a Holanda de 1974 (também vice) e o Brasil de 1982 (eliminado pela Itália, com um mero quinto lugar). Dorival Junior, o técnico, sabe que uma eliminação na semifinal será ruim, mas, genuinamente modesto, diz aquilo que até mesmo quem não gosta de futebol tem dito nos últimos dias: "Dá prazer ver o Santos jogar". Como nos tempos de Pelé, o time faz muito e toma muito (embora menos). Dos 525 gols do Paulistão até a semana passada, 75 deles – o equivalente a 14,2% – ocorreram nas dezessete partidas do Santos, a favor e contra. São 4,4 por jogo. É diversão garantida


O TRIO DE 2010
Difícil definir o esquema tático de André (à esq.), Robinho e Neymar

Blog Archive