Saturday, March 27, 2010

Operação "voto no deserto"


O xiita Iyad Allawi vence as eleições no país com o apoio
dos sunitas. Agora vai tentar a adesão dos curdos. Será
que a democracia vencerá o terror?


Duda Teixeira

Nabil Al-Jurani/AP
SÓ BARULHO
Protesto em apoio ao candidato derrotado Maliki, em Basra: a ONU aceitou, mas ele pediu a recontagem dos votos


O futuro do Iraque continua tão volátil quanto seu passado, mas, com a retirada das tropas americanas em agosto e o resultado das eleições na semana passada, a palavra normalidade começa a fazer algum sentido no país. O vencedor nas urnas foi Iyad Allawi. Sua coalizão, o Movimento Nacional Iraquiano, conquistou 91 das 325 cadeiras do Parlamento. Xiita, Allawi conseguiu manter distância do fundamentalismo dos aiatolás iranianos, que há trinta anos comandam a teocracia no país vizinho e exercem influência direta sobre milhões de seguidores no Iraque. Allawi é um conciliador que defende um estado laico. Consegue ser popular tanto entre sunitas como entre xiitas. Em segundo lugar ficou o atual primeiro-ministro, Nuri al Maliki, com duas cadeiras a menos. Para obter maioria no Parlamento, os dois adversários terão de cortejar os curdos, minoria étnica que vive no norte do país. Os dois políticos também devem disputar o apoio do bloco xiita mais ferrenho, cujo chefe é o clérigo Moqtada al Sadr, que tem mantido silentes as armas de sua própria milícia. Desde agosto de 2007, depois de ser responsabilizado pela morte de cinquenta peregrinos na cidade de Karbala, al Sadr está menos belicoso. Os analistas garantem que ele tem percebido as vantagens de ser visto como um líder político.

Khalib Mohammed/AP
FELIZ DA VIDA
Allawi: ele pode ser primeiro-ministro pela segunda vez


Maliki perdeu por uma margem pequena e pediu a recontagem parcial dos votos. Isso fomentou pequenos focos de protesto nas ruas em seu apoio - mas nada que empanasse as eleições. O pleito teve alto grau de comparecimento, com maciça adesão dos sunitas, a corrente religiosa majoritária no país, que, em 2005, boicotou as eleições. Allawi foi primeiro-ministro interino do Iraque após a invasão americana, em 2003. Integrou o partido Baath, de Saddam Hussein, com quem se desentendeu. Foi para o exílio nos anos 90, de onde comandou a oposição ao regime em colaboração com a CIA. Allawi foi uma das fontes do relatório americano que afirmava haver armas de destruição em massa no Iraque - o mentiroso argumento usado para justificar a invasão. Agora, sete anos depois da derrocada de Saddam, o Iraque dá sinais de que vai tentar a sério governar-se por essa invenção ocidental chamada democracia representativa. Para funcionar, será preciso que os iraquianos aceitem que as alianças partidárias, a alternância de poder e o voto secreto se sobreponham às seculares divisões étnicas e religiosas. Não é a primeira tentativa do gênero no Oriente Médio. Se falhar, também não será a primeira vez.

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