Friday, January 01, 2010

Choque de ordem nas praias do Rio

Sol, mar e organização

A prefeitura do Rio promove um choque de ordem para acabar
com a balbúrdia em que se transformaram as praias cariocas


Carolina Vaisman

Fotos Alexandre Vieira/Ag. O dia/AE e Eduardo Martino/Documentography
IMPACTO MAIS DO QUE VISUAL
Barracas padronizadas e limpas no lugar de uma infinidade de tendas sem condições sanitárias mínimas (ao lado)

Quando Tom Jobim e Vinicius de Moraes compuseram Garota de Ipanema, em 1962, o Rio de Janeiro tinha metade do número de habitantes de hoje. Havia espaço de sobra para que a musa andasse, em doce balanço, a caminho do mar – sem tropeçar. Nos últimos anos, porém, as praias cariocas tornaram-se lugares quase intransitáveis. Não apenas porque há mais gente. O maior tumulto é provocado pela turba de barraqueiros, camelôs e flanelinhas que tomou conta do pedaço. A ideia de que a orla do Rio era um espaço de convivência extremamente democrático serviu apenas como pretexto para a falta de organização. A baderna se espalhou. Neste verão, a prefeitura do Rio resolveu pôr ordem na casa. A primeira providência foi dar um banho de loja nas barracas que funcionam como ponto de venda de bebidas e de aluguel de cadeiras e guarda-sóis. Em vez das tendas improvisadas e das caixas de isopor imundas, espalhadas pela areia, só serão permitidas barracas padronizadas e caixas térmicas de plástico. O número de barraqueiros, agora uniformizados, foi reduzido. No primeiro trecho em implantação, que compreende as praias do Arpoador, Ipanema e Leblon, baixou de 300 para 193.

Desde o início do ano, a prefeitura já vinha tentando acabar com a bagunça provocada pelos barraqueiros. Eles estacionavam Kombis velhas nos melhores pontos em frente à praia apenas para servir como depósito de seus produtos. Depois de algumas tentativas de driblar a fiscalização, as sucatas desapareceram e um esquema de abastecimento racional foi adotado. Mas persistiam as barracas, de aparência lastimável, que começam a ser removidas agora. Essa é a parte mais visível do plano, que inclui o aumento da fiscalização para fazer valer uma série de restrições que já existiam e não eram cumpridas. É o caso dos jogos de frescobol ou das onipresentes rodas de jogadores que controlam a bola de futebol sem deixá-la cair no chão (veja o quadro). Até a semana passada, a inspeção ainda deixava a desejar. Vendedores com produtos proibidos estavam em atividade, havia animais na areia e praticantes de futebol na beira d’água. Os ambulantes esperavam o momento em que os fiscais iam embora para invadir a praia. A prefeitura garante que vai resolver o problema. "Quero ver como o esquema funciona durante duas semanas de praias lotadas, antes de ampliar as ações", diz o secretário municipal de Ordem Pública, Rodrigo Bethlem. "A fiscalização será severa", afirma.

As tentativas de civilizar a orla do Rio não são recentes. Desde 1999, por exemplo, a prefeitura procura implantar um estilo de quiosque que substitua os pesadões modelos de madeira por instalações modernas, de ferro e vidro. Elas funcionam como ponto avançado de restaurantes conhecidos da cidade e contam com banheiros e cozinha no subsolo. Apenas em 2005 se começou a tirar a ideia do papel, mas a iniciativa esbarrou em uma série de pendências judiciais, promovidas pelos chatos de plantão. A consequência é que somente 28 dos 309 quiosques previstos ficaram prontos. Eles deveriam ocupar quase toda a orla balneável da cidade, desde as praias da Zona Sul até a Prainha, ponto extremo da Zona Oeste. Por causa dos tropeços nos tribunais, foram instalados apenas no Leme e em parte de Copacabana, e não há previsão para a retomada do projeto.

As próximas praias a receber o "choque de ordem" serão justamente Leme e Copacabana. A prefeitura elevou o número de fiscais. Antes eram apenas vinte para os 43 quilômetros de praia da cidade. Agora são 143, quantidade que, se não resolve o problema, aumenta a capacidade de vigiar pelo menos os pontos mais frequentados. Em um único fim de semana do alto verão circulam no trecho entre Arpoador, Ipanema e Leblon 400 000 pessoas, o equivalente à população de Porto Velho, capital de Rondônia. Em breve, haverá o reforço da tecnologia. Serão usadas miniaeronaves para monitorar as operações na areia. Importadas de Israel, elas têm câmeras acopladas que transmitem a imagem em tempo real e chegam a 4.500 metros de altura. Nada disso será suficiente, no entanto, se os próprios banhistas não fizerem sua parte. O carioca que aplaude o pôr do sol em Ipanema precisa aplaudir a organização e não burlar a lei

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