Miriam Leitão -Trilha errada
Trilha errada
O Brasil pode mais do que triplicar a capacidade de geração de energia a carvão mineral até 2017 e multiplicar por quatro as emissões de CO2 dessa fonte de energia. O governo incentiva o negócio com crédito do BNDES, redução de Imposto de Renda, PIS/Cofins e ICMS de importação de carvão. O presidente da EPE, Maurício Tolmasquim, admite apenas que a geração a carvão vai dobrar.
Segundo Tolmasquim, o Brasil tinha, em 2007, 1.415 MW de potência instalada a carvão e chegará a 2017 com 3.175 MW:
— Vai dobrar mas continuará sendo pequena na nossa matriz. É hoje 1,4% da energia e será 2,1%.
O Brasil possui nove termelétricas a carvão mineral em funcionamento, com capacidade de geração de 1.530 MW, segundo a Aneel. Quatro estão em construção e vão dobrar a capacidade até 2013. Sozinhas, elas poderão gerar mais 1.790 MW de energia. Três delas estão sendo construídas pela MPX, no Nordeste, e outra pela Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica, no Sul do país. Outros oito projetos já receberam licença para a construção. Serão mais 4.117 MW. Tudo somado pode levar a 7.437 MW de energia movida a carvão. Aumento de 386%.
Tolmasquim diz que os números da EPE são outros, e vão ser revistos no novo Plano Decenal.
— Uma coisa é ver todas as possibilidades possíveis, outra é planejar. Estamos planejando menos.
O Plano Decenal de Expansão de Energia registra que as emissões de CO2 dessas térmicas poderão saltar de cerca de 5 milhões de toneladas para 22 milhões em 2017 (veja o gráfico abaixo tirado do estudo).
O leilão de dezembro, como já registrado aqui na coluna, deve ser vencido pelas térmicas a carvão.
— Isso não é razoável, mas há mais facilidade de concessão de licença para térmicas do que para hidrelétricas — diz ele.
O que leva uma empresa a investir em energia com alto teor de emissão que será cada vez mais taxada no futuro? O presidente da MPX, Eduardo Karrer, diz que o carvão é inevitável:
—- Não podemos descartar o carvão, mas podemos torná-lo menos poluente. Vamos investir R$ 1,2 bilhão em pesquisa de ponta para reduzir as emissões de carvão — afirmou Karrer.
Pode ser. No mundo inteiro há pesquisas para tentar limpar o carvão, mas os especialistas admitem que não há qualquer garantia de que isso será possível. Karrer diz que sua linha de estudo é usar microalgas que reduziriam entre 10% e 15% o volume de emissões de CO2. A Tractebel, que sozinha responde por quase 1.000 MW da produção atual a carvão, foi procurada insistentemente pela coluna mas não se pronunciou.
Na verdade, as empresas são incentivadas pelo governo a entrar no negócio. Somente para a construção da termelétrica de Pecém I, da MPX, houve financiamento de cerca de R$ 1,4 bilhão do BNDES. Já as usinas de Pecém II e Itaqui, que integram o PAC, ganharam desconto de 75% em Imposto de Renda, isenção de PIS/Cofins, abatimento de 59% de ICMS na importação do carvão que virá da Colômbia. Além disso, se as três usinas que estão sendo construídas pela MPX no Nordeste não precisarem entrar em operação, elas terão uma rentabilidade assegurada de R$ 715 milhões anuais de subsídio tarifário. Elas recebem mesmo quando não produzem. Fazem parte do sistema de complementação de energia. Por isso, Tolmasquim disse que não se pode calcular o volume de emissões, a partir do aumento da capacidade instalada das térmicas fósseis. Porque elas só funcionarão quando faltar água nos reservatórios.
O Ibama não explica por que concede licença com mais facilidade para térmica do que para hidrelétrica. Diz que não é o órgão que define a política energética do país e não pode negar licenças se elas atenderem ao Termo de Referência. Como a legislação permite o uso de térmicas a carvão, considera que há pouco que possa fazer.
Para mitigar a emissão, o Ibama exigiu a compensação através do plantio de árvores, mas as empresas foram à Justiça e a exigência foi derrubada. É assim, com incentivos e falhas regulatórias, que o Brasil vai sujando sua matriz.