Tuesday, October 06, 2009

EDITORIAIS 6/10/2009 -

O QUE PENSA A MÍDIA


PROJETO TÓXICO
EDITORIAL
O GLOBO
6/10/2009

A aprovação do Estatuto Racial, há quase um mês, na Câmara, chegou a ser saudada como um avanço.
Errado, pois o que recebera sinal verde para voltar ao Senado fora um projeto apenas reduzido em seu grau de toxicidade racialista, mas ainda tóxico. Daí a comemoração de ONGs do ramo e do próprio senador Paulo Paim (PT-RS), autor da versão original da lei.
Tão grave quanto a própria aprovação do projeto foi o fato de ele ter sido sancionado, de forma terminativa, em uma comissão. Em boa hora, então, o deputado Arnaldo Madeira (PSDBSP) colheu assinaturas para que o assunto, devido à sua importância para a sociedade, fosse levado ao plenário. Conseguiu 91 adesões ao pedido — quando o regulamento exige 52 —, mas uma exótica aliança entre racialistas e empresários trabalha contra. Com a ajuda inclusive da liderança do partido de Madeira, o movimento tenta obter o apoio de 46 dos signatários para evitar a apreciação do projeto em plenário. Se tiver êxito, a lei voltará logo ao Senado, onde só poderá ser alterado o que foi modificado pelos deputados. Assim, há o perigo de a versão mais radical do Estatuto, a primeira, ser restabelecida. Nas negociações na Câmara, alguns dispositivos do projeto aprovado no Senado foram retirados: facilidades para o reconhecimento de terras de supostos quilombolas; cotas para negros em comerciais de TV, filmes e peças de marketing; cotas nas universidades — medida inócua, pois elas são criadas em projeto à parte, no momento no Senado —, entre outros artigos. Em troca, foi conservada a concessão de incentivos fiscais para empresas que tenham 20% de empregados negros, mantiveram-se cotas raciais para candidatos às eleições, apenas reduzidas de 30% para 10%, e o currículo escolar sofreu alterações para a doutrinação das novas gerações por meio de visões racialistas da História. Contrabandeiase, também, para a saúde pública a concepção de “doenças de negros”, sem base científica. Assim, o conceito de raça é inoculado na legislação brasileira, toda ela lastreada no princípio constitucional da igualdade entre os cidadãos.
Conceito que, na prática, será revogado, caso o Estatuto, mesmo desidratado, seja promulgado.
A melhor alternativa continua a ser levá-lo ao plenário, para que seja revogado na íntegra. O temor de empresários de que possa ser piorado é improcedente. Não só porque há a possibilidade de isso acontecer no Senado, como também a legalização da ideia de raça é, por si só, péssima, e não pode ser aceita em negociações políticas, sob qualquer hipótese. Barrar o Estatuto no Congresso evitará uma batalha jurídica, necessária em defesa da Constituição.

DESCOMPRESSÃO
EDITORIAL
O GLOBO
6/10/2009

Pouco a pouco, sinais de descompressão em Honduras abrem perspectivas a uma solução negociada para o impasse político iniciado com a destituição do presidente Manuel Zelaya, a 28 de junho, e intensificado com a sua volta ao país e acolhimento na Embaixada do Brasil, há pouco mais de duas semanas.
Sob forte pressão interna e externa, o governo interino, que assumiu após apear Zelaya do poder, voltou atrás e suspendeu o estado de sítio no qual havia mergulhado o país, restabelecendo as liberdades civis — ainda que não se saiba o destino dos veículos de comunicação próZelaya silenciados. A medida, além de extremamente benéfica para a sofrida população de Tegucigalpa, desanuvia o clima às vésperas da chegada da delegação da OEA que, mais uma vez, tentará arrancar concessões dos dois lados para abrir caminho a um acordo.
Zelaya disse ao GLOBO estar otimista sobre uma solução nos próximos dias. A OEA demonstra confiança na missão do secretário-geral, que chega amanhã ao país acompanhado dos chanceleres do México e de Costa Rica, entre outros.
O chanceler brasileiro, Celso Amorim, também afirmou acreditar que as condições para o diálogo tenham melhorado.
Em entrevista ao GLOBO, John Negroponte, o experiente ex-embaixador americano em vários países e na ONU, declarou que a política externa do presidente Obama dá destaque aos organismos multilaterais, o que vai exigir maior participação de todos os países na solução de crises internacionais — no caso hondurenho, especialmente do Brasil. Ele manifestou confiança em que os dois lados farão concessões porque “é preciso avançar, e não repetir erros do passado”.
A situação, ainda assim, é muito complicada. O presidente deposto contempla a volta ao poder num governo de unidade nacional. O presidente interino, Roberto Micheletti, admitiu pela primeira vez a restituição do cargo a Zelaya, desde que seja por decisão da Corte Suprema.
Há alguns parâmetros que precisam ser observados: respeitar a Constituição, que proíbe terminantemente a reeleição do presidente; dar curso aos processos contra Zelaya na Justiça; e realizar as eleições previstas para o fim de novembro.

RELATOS CONTRA A XENOFOBIA
EDITORIAL
JORNAL DO BRASIL
6/10/2009

Um dos principais dogmas do liberalismo econômico é a livre circulação de bens e de capitais. No entanto, curiosamente, pouca ênfase é dada à liberdade de movimento da mão de obra. Sobre a livre circulação de trabalhadores de um país para outro sempre pairou um silêncio. O mesmo ideário que sistematicamente propugnou o laissez-faire, em prol da derrubada das barreiras protecionistas (tendo em vista a troca livre de produtos e a conquista de mercados estrangeiros), jamais priorizou, na mesma medida, a defesa da livre circulação da mão de obra, considerada potencialmente perigosa.

Para os países ricos, afastar os estrangeiros, com rígidas regras de imigração, em muitos casos atende, ao mesmo tempo, aos interesses de distintas classes. Da elite, temerosa de ver uma “invasão bárbara” em seu território – cujas consequências políticas a longo prazo podem prejudicá-la na relação de força do conflito social interno –, e dos trabalhadores nativos, receosos de perderem seus empregos para a mão de obra mais barata e competitiva dos estrangeiros. Dessa aliança extrai-se a persistência das barreiras à imigração, mesmo após o fim da Guerra Fria e a hegemonia do neoliberalismo. A rejeição aos imigrantes e os movimentos xenófobos nunca saíram de moda e parecem estar cada vez mais presentes no cotidiano do Primeiro Mundo.

Uma amostra de como esse clima persecutório tomou conta da Europa é o filme Bem-vindo, lançado este ano, no qual o diretor francês Philippe Lioret denuncia o ambiente de paranoia promovido pelas leis anti-imigração em seu país, onde ajudar, transportar ou abrigar em casa um imigrante ilegal pode custar cinco anos de prisão e multa de 30 mil euros. A polêmica em torno da obra foi tanta que levou o Partido Socialista francês a propor um projeto de lei, batizado de Welcome, título original do filme, para revogar o dito “delito de solidariedade”.

As reações ao embrutecimento da sociedade, porém, não se restringem a belos apelos humanistas cinematográficos. Importante petardo contra a criminalização dos imigrantes, baseado em extensa pesquisa, o Relatório de Desenvolvimento Humano 2009 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), divulgado ontem – no qual o Brasil manteve sua posição no ranking do IDH – derruba uma série de mitos relacionados à questão.

Diferentemente do percebido pelos cidadãos nativos, o estudo mostra que, no agregado, os imigrantes aumentam a produtividade econômica dos países que os recebem com custo baixíssimo ou inexistente para os trabalhadores locais. Além disso, os imigrantes são fortes propulsores do desenvolvimento humano dos países de origem. De acordo com o relatório, as remessas de dinheiro feitas por emigrantes para seus países de origem equivalem a quatro vezes a ajuda oficial ao desenvolvimento, bancada sobretudo pelos países mais ricos.

Outro dado interessante mostra que o fluxo da migração é maior entre países emergentes (50%) do que de pessoas que vão de países em desenvolvimento para as nações mais ricas (37%).

Ao fim e ao cabo, o relatório conclui que “ao contrário do que normalmente se acredita, os migrantes estimulam a produtividade e dão mais do que aquilo que recebem”. É uma defesa da liberdade que poderia invadir a doutrina liberal.

BRASIL CREDOR, SEM MILAGRE
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
6/10/2009

Pela primeira vez o Brasil será credor do Fundo Monetário Internacional (FMI). Essa posição era ocupada, tradicionalmente, apenas por economias desenvolvidas e pelas nações exportadoras de petróleo. Desta vez, quatro países de fora do clube estão na fila para reforçar o caixa da principal instituição financeira multilateral. Os Brics - Brasil, Rússia, Índia e China - dispõem-se a contribuir com o total de US$ 80 bilhões para aumentar a capacidade de empréstimos do Fundo. A contribuição brasileira poderá chegar a US$ 10 bilhões. O dinheiro será entregue de acordo com as necessidades do FMI. O mundo mudou, novas potências ganham peso na economia global e uma nova configuração de poder se desenha. Para entender como isso foi possível, vale a pena examinar o caso brasileiro.

O Brasil não se tornou capaz de emprestar ao FMI apenas por ter acumulado mais de US$ 200 bilhões em reservas cambiais. Isso aconteceu por vários fatores. Há mais de 20 anos a economia do País começou a ser passada a limpo. A agricultura se modernizou, os preços foram liberados, o mercado se abriu a partir dos anos 90, estatais foram privatizadas, a inflação endêmica foi vencida e as contas públicas tornaram-se um pouco mais ordenadas. O setor produtivo ganhou eficiência, estimulado pela competição e pela estabilidade. O setor público mudou, mas o setor privado mudou ainda mais.

Nada disso ocorreu de um dia para o outro e os efeitos dessa transformação apareceram gradualmente na produção e no comércio exterior. A manutenção da política de metas de inflação e de certos padrões fiscais e cambiais, desde os anos 90, facilitou a difusão das mudanças pelo organismo da economia brasileira.

Para manter o compromisso com a maior parte dessas políticas o presidente Lula teve de abandonar velhas bandeiras de seu partido e de resistir a pressões de aliados. Não deixou de aparelhar a administração federal nem de politizar aspectos importantes da gestão pública, mas teve o mérito de, até agora, preservar a independência de fato do Banco Central e de evitar as intervenções mais desastradas na vida econômica.

Várias deficiências nunca foram eliminadas. O sistema tributário continua travando o investimento produtivo e reduzindo a competitividade dos produtores brasileiros. Hoje, a concorrência se dá tanto no exterior quanto no mercado interno. O aumento da competição foi bom para os consumidores. Forçou a elevação da qualidade dos produtos brasileiros e contribuiu para a contenção dos preços. Mas a concorrência em condições desiguais pode impor custos excessivos à economia nacional, enfraquecendo empresas competitivas e destruindo empregos. A solução, na maior parte dos casos, não é impor barreiras aos produtores estrangeiros, mas diminuir as ineficiências da economia nacional. Podem ser problemas simples, como eliminação de uma exigência burocrática. Podem ser questões tecnicamente mais trabalhosas, como a construção de portos ou de centrais elétricas.Talvez sejam politicamente complexas, como a reforma tributária. Mas é preciso enfrentá-las. O presidente gosta de falar em planejamento e coordenação estatais. O melhor que o governo tem a fazer é cumprir a agenda da competitividade - com as necessárias mudanças na educação, na pesquisa e na produção de ciência.

A permanência dessa enorme agenda não obscurece, no entanto, alguns dados altamente positivos. A produção brasileira é hoje muito mais eficiente, em quase todos os setores, do que era até há alguns anos. Numa economia mais aberta, os empresários foram levados - e até forçados - a buscar espaço no mercado internacional. A velha conversa a respeito da opção entre mercado externo e mercado interno revelou-se uma tolice. A alimentação no Brasil nunca foi tão abundante e tão barata quanto depois da transformação do País num dos maiores exportadores agrícolas do mundo.

O Brasil credor do FMI é simplesmente isso: um país mais produtivo, menos sujeito a grandes surtos de inflação, mais aberto e com um padrão fiscal melhor do que teve durante décadas. Muitas dessas mudanças positivas dependeram de políticas condenadas por boa parte dos companheiros do presidente Lula e por ele mesmo durante muito tempo. É preciso resistir à tentação de uma recaída - que parece estar ficando forte - nos velhos padrões.

A PEC DOS CARTÓRIOS
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
6/10/2009

Desde que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu moralizar o funcionamento dos 13,5 mil cartórios em funcionamento no País, exigindo que todos sejam dirigidos por pessoas devidamente concursadas, os tabeliães interinos, que assumiram o cargo em decorrência da aposentadoria ou morte do titular, vêm pressionando a Câmara dos Deputados a aprovar, a toque de caixa - espera-se para quarta-feira a votação em primeiro turno -, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 471/05, que os efetiva no cargo. A atividade cartorária é delegada pelo poder público a particulares e a Constituição exige que eles sejam escolhidos por concurso público.

O problema é que, embora os concursos já tenham sido realizados, muitos presidentes de Tribunais de Justiça, agindo corporativamente, negam-se a empossar os novos titulares, esperando a aprovação da emenda para favorecer os interinos. Pelas estimativas do CNJ, 8 mil pessoas que já foram aprovadas para dirigir cartórios, que estão sob responsabilidade de interinos, ainda não foram empossadas. E elas estão se mobilizando para exigir seus direitos na Justiça.

Nos cartórios mais rentáveis, situados nas capitais e em cidades de porte médio, chegando a faturar entre R$ 500 mil e R$ 2 milhões por mês, grande parte dos titulares interinos ou provisórios é formada por juízes e desembargadores aposentados. Atraídos pela alta rentabilidade do setor, eles negociaram a indicação para o cargo com a direção da Corte à qual serviam. Para o CNJ, a PEC 471/05 é imoral, na medida em que mantém os cartórios atrelados a "esquemas corporativos de transmissão de feudos". E também é inconstitucional, uma vez que a Carta de 88 determina o preenchimento dos cargos por concurso público.

Em nota técnica divulgada em novembro de 2008, o CNJ criticou duramente as pressões políticas dos titulares interinos para acelerar a tramitação da PEC 471/05, classificando-a como um "descompasso histórico" que "desmoraliza a democracia e o Estado de Direito". No mês passado, o corregedor nacional de Justiça, ministro Gilson Dip, classificou a PEC como "trem da alegria".

Há uma semana, o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, disse que a PEC dos cartórios não passa de uma imoral "gambiarra jurídica" concebida para efetivar tabeliães biônicos e institucionalizar relações promíscuas entre os cartorários indicados a título provisório e as cúpulas dos Tribunais de Justiça. "Isso não eleva nosso padrão civilizatório. Os provisórios se eternizam, gerando filhotismo, apadrinhamento e patrimonialismo. Está na hora de o Brasil acabar com isso de forma definitiva. Não faz sentido tentar burlar o sistema concursivo previsto pela Constituição." Recebeu o apoio da OAB.

Apesar de a PEC 471/05 configurar uma aberração jurídica, ela vem sendo defendida pela Associação dos Notários e Registradores do Brasil, cujos dirigentes têm participado de negociações com deputados e com o próprio presidente da Câmara, Michel Temer, para tentar colocá-la em votação o mais rapidamente possível. Ao justificar as pressões sobre o Legislativo, a entidade distribuiu nota afirmando que a iniciativa moralizadora do CNJ é injusta com os titulares interinos de cartórios, pois eles seriam afastados e perderiam os cargos "depois de trabalharem, investirem e aperfeiçoarem os serviços". A tese foi refutada pelo presidente da OAB, Cézar Brito: "Cartório não é capitania hereditária."

Como o lobby dos titulares interinos é poderoso, o próprio CNJ acha que será difícil evitar a aprovação da PEC dos Cartórios. Por isso, o presidente do órgão já deixou claro que o caso acabará sendo levado ao Supremo. "E aí a emenda será contestada, pois fere cláusula pétrea, flexibiliza os critérios dos concursos públicos, fere o princípio da igualdade e erode a autoridade do próprio CNJ", diz Mendes. Na realidade, este problema não existiria se o poder público já tivesse adotado um processo de desburocratização, reduzindo ao mínimo a exigência de carimbos notariais. Com o avanço da tecnologia, a maioria das atividades dos cartórios se tornou desnecessária.

A INFIDELIDADE CONSENTIDA
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
6/10/2009

Foi como se a Justiça Eleitoral não tivesse resolvido, em 2007, que os partidos são os donos das cadeiras ocupadas nas câmaras legislativas pelos candidatos que por eles se elegeram - e que, portanto, perderia o mandato o político que, a qualquer momento, saltasse de uma legenda para a outra, salvo em poucas circunstâncias previamente estipuladas, tendo o partido prejudicado o direito de preencher a vaga aberta com o primeiro da lista de seus suplentes. Nos últimos dias, dezenas de políticos, para ficar apenas no plano federal, correram a mudar de sigla enquanto houvesse tempo - a um ano das próximas eleições, terminou no dia 4 o prazo para a filiação a alguma legenda de quem queira disputá-las. O chamado instituto da fidelidade partidária, logo se vê, ainda não pegou.

Mais uma vez os políticos em trânsito escancararam para a opinião pública que eles só têm compromissos com as suas chances nas urnas e que, na maioria esmagadora dos casos, os partidos não passam de hospedarias em que a entrada e a saída de trânsfugas são reguladas, não pelas leis, muito menos por qualquer coisa parecida com identidade de ideias, mas pelos cálculos de conveniência de parte a parte - as afinidades eletivas, para dar à expressão de Goethe o mais raso sentido literal. Em 2005, quando nada obstava o ir e vir pelas agremiações, cerca de 60 políticos de maior projeção trocaram de alojamento - uma troca de seis por meia dúzia, diria um cínico -, quase sempre para se candidatar a prefeito no ano seguinte. Agora, embora a infidelidade esteja sujeita a punição, houve 31 transferências.

Em parte, a culpa é da própria Justiça Eleitoral. Dos 18 políticos julgados por pular a cerca desde a entrada em vigor da resolução concebida para dar consistência ao sistema de partidos, apenas um, o deputado federal Walter Brito, perdeu o mandato - e isso depois de encarniçada resistência do então presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia. Em geral, os trânsfugas conseguem se safar invocando as condições em que a transferência é permitida (perseguição política é o pretexto de praxe). Em parte, a culpa é dos partidos, quando - também por cálculos políticos - abrem mão de cobrar no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a cadeira que poderia lhes ser devida, com a remoção do ocupante que os deixou.

Em tese, por exemplo, o PT poderia reivindicar o lugar da senadora Marina Silva, que se mudou para o PV. O PSDB poderia fazer o mesmo com a cadeira do vereador paulistano Gabriel Chalita, que se bandeou para o PSB (o qual, aliás, acaba de acolher o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, de quem o baronato industrial paulista decerto não suspeitava que fosse um socialista camuflado). Mas é evidente que, naqueles casos, petistas e tucanos pagariam um elevado preço político - e eleitoral - se tentassem se vingar dos seus ex-correligionários. Às vezes, os partidos tratam de agir preventivamente para enquadrar os caídos em tentação. Na undécima hora, o DEM do Distrito Federal impediu a transferência do seu senador Adelmir Santana para o PSB. Com a mesa da festa já posta, ele sucumbiu. "Vão tomar meu mandato", avisou aos convidados. "Não dá para sair."

Em outras situações, o mesmo DEM não moveu uma palha para enquadrar os migrantes em potencial - o que levanta uma indagação que parece dividir as opiniões dos juristas: quando uma legenda desiste da reparação a que teria direito, consentindo, pelo silêncio, com a saída de um parlamentar a ela filiado, deve a Justiça Eleitoral tomar a iniciativa de desalojá-lo da cadeira por transgressão à regra da fidelidade partidária? Para o ministro Fernando Gonçalves, do TSE, citado pela Folha de S.Paulo, "não é só o partido que tem legitimidade para requerer a perda do mandato". Poderiam fazê-lo tanto o suplente que iria para a vaga como - e principalmente - o Ministério Público Eleitoral. O primeiro estaria agindo em defesa de um direito particular; o segundo, em defesa de um interesse difuso, a salvaguarda de uma norma com força de lei.

Mas o presidente do TSE, Carlos Ayres Britto, discorda. "Se o partido não se sente traído", interpreta, "tenho dificuldade de entender por que o Ministério Público sentiria ciúme por ele." Brito acredita que "com o tempo, a fidelidade partidária se tornará um verdadeiro dogma jurídico". Não, se depender só dos políticos.

EXPORTAÇÃO DE IMPOSTOS E INDÚSTRIA
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
6/10/2009

As exportações de produtos industrializados nos nove primeiros meses do ano caíram 31% em relação ao mesmo período de 2008, enquanto as exportações totais diminuíram 25,1%. Estima-se que as exportações respondem por cerca de 20% da produção industrial, e isso explica por que o setor secundário apresenta a pior performance e a maior contribuição para o aumento do desemprego.

Costuma-se responsabilizar a valorização do real pela queda das exportações. No entanto, a pobre infraestrutura do País e o excesso de carga tributária parecem ter maior responsabilidade nas dificuldades dos exportadores para enfrentar a concorrência internacional.

O vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, considera que "o Brasil é o único país cuja legislação desestimula as empresas a aumentar a parcela de produção destinada à exportação".

A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), baseada na Pesquisa Industrial Anual do IBGE, que examinou a estrutura de custo das empresas, realizou um estudo, resumido pela jornalista Raquel Landim, que mostra que 22,9% da receita dos exportadores brasileiros de produtos industrializados vai para impostos - 17,1% são teoricamente recuperados e 5,8% não são recuperados.

Convém lembrar que a Organização Mundial do Comércio (OMC) admite que os países não exportem seus impostos e não considera a sua desoneração como subsídio.

Por lei, a exportação deveria estar sujeita apenas a impostos sobre lucros: Imposto de Renda Pessoa Jurídica e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, que é questionada. No entanto, existem alguns encargos sociais para os quais não há mecanismos de recuperação, como o INSS, que em setores mão de obra intensivos, como vestuário e móveis, é muito pesado, e são os setores que mais sofrem no caso das exportações.

Mas talvez os impostos recuperáveis sejam os que apresentem mais problemas, pelo fato de que os governos (União e Estados) não os reembolsam. Calcula-se em R$ 32 bilhões a dívida desses governos. O atraso nesses pagamentos, além de obrigar as empresas a exportar esses custos, tem o inconveniente de levá-las a computar a soma não paga a título de tributos a recuperar, o que infla a margem de lucro. É preciso saber se as autoridades que lamentam a queda das exportações de produtos industrializados aceitam assumir a parte que lhes cabe.

IR, VIR, MIGRAR
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
6/10/2009

Oposição do eleitorado no mundo rico mantém barreiras à imigração e inibe um meio de reduzir desigualdades sociais

ALGUMAS armadilhas do credo ultraliberal se materializaram na crise da qual o mundo agora começa a se recuperar. Testemunhou-se o poder destrutivo da circulação sem regras dos capitais financeiros. Outras contradições, presentes não só naquele receituário, continuam entretanto a produzir estragos sociais em ritmo endêmico.
O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) acaba de lançar um alerta sobre um deles: as barreiras inamovíveis, erguidas por diversas nações, contra os imigrantes.
A globalização, que dinamizou em muitos aspectos a economia mundial, pouco se fez notar no campo da migração internacional. No planeta, a fatia de cidadãos que residem fora de seu país, mostra o Pnud, permaneceu estável, em meros 2,8%, ao longo dos últimos 50 anos.
Há, decerto, que considerar a escala: em 1960 havia 74 milhões de imigrantes, contra 188 milhões estimados para 2010. Ainda assim, não há termo de comparação com a explosão ocorrida nas transações comerciais -triplicaram, como proporção do PIB mundial, em meio século- e financeiras -os empréstimos internacionais foram multiplicados por 40 em três décadas.
O empenho de governos e grupos de pressão para a liberalização do comércio e das finanças jamais se estendeu às migrações. Aqui os ultramercadistas, e muitos liberais tradicionais, se aliaram ao conservadorismo. Perderam a oportunidade de legitimar sua agenda com algo cristalino na teoria: num mundo em que capitais e mercadorias circulam com liberdade, quanto maior a mobilidade da mão de obra, menor a concentração da renda.
Os emigrantes vão em busca, em outros países, de ocupações que lhes ofereçam melhores salários. Admitidos, reduzem a distância entre sua renda e a de trabalhadores dos países ricos; barrados na fronteira, o fosso social permanece -e tende a ampliar-se com o tempo. Além disso, imigrantes enviam parte do salário para seus países de origem e ajudam a mitigar a pobreza local.
Em 2007, relata o Pnud, as remessas de dinheiro de imigrantes equivaleram a quatro vezes a ajuda financeira dos países ricos aos mais pobres. Apesar dos benefícios de ampliar a mobilidade de trabalhadores -o que ajuda a baixar custos nos países receptores de imigrantes-, as fronteiras das nações desenvolvidas são seletivas ao extremo.
Estão em voga programas agressivos de "captura de cérebros", em que nações ricas, com fartos benefícios, sugam a já exígua elite qualificada de países menos desenvolvidos. As mesmas portas, contudo, estão fechadas aos trabalhadores menos escolarizados; quem é pego tentando burlar a barreira está sujeito a tratamento desumano.
A oposição de boa parte do eleitorado no mundo rico, que ecoa em partidos de variadas tendências ideológicas, constitui o maior obstáculo à imigração. Parece improvável que essa equação se altere no médio prazo, mas é possível, pelo exercício de pressão em fóruns globais, ao menos evitar restrições adicionais da liberdade de migrar.

CAMPEONATO DA INÉPCIA
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
6/10/2009

É COMO um clínico que não sabe o que fazer diante de um resfriado. Ou um arquiteto incapaz de projetar uma casa. Falta-lhes o conhecimento mínimo para exercer o ofício.
Muitos deputados federais ignoram noções basilares da função de legislar, para a qual foram eleitos. De fevereiro de 2007 ao mês passado, 254 propostas foram devolvidas pela Câmara a seus autores devido a erros primários. A atual legislatura tem ainda 16 meses pela frente e já conquista um desonroso recorde nesse campeonato da inépcia.
A desídia se faz evidente em casos de propostas idênticas apresentadas pelo mesmo parlamentar. Deputados também subscrevem projetos em áreas de incumbência exclusiva do presidente da República. Pululam textos que ferem a Constituição.
Num lance anedótico, tomado apenas como exemplo, um deputado propôs que o ministro da Defesa, ainda que civil, tivesse o direito de usar farda. Não bastasse a irrelevância da iniciativa, ela ainda se choca com a Carta, pois apenas o presidente da República pode tomar iniciativa de legislar sobre temas relacionados às Forças Armadas.
Se não foi capaz de informar-se, o congressista poderia recorrer a seu pelotão particular de assessores. Cada deputado pode sacar R$ 60 mil do contribuinte todo mês, verba destinada apenas a pagar funcionários, que variam de 5 a 25 em cada gabinete. Mas os cabos, eleitorais, alistados para esses postos em geral atuam em outras batalhas.
Se a inépcia e o desrespeito ao cidadão que elege e custeia seus representantes estivessem restritos a um brancaleônico exército de deputados obscuros, vá lá. Mas o Congresso acaba de aprovar, com endosso massacrante, a farra que criou 7.709 vagas de vereador no país -o texto, quando estabelece que os edis devem assumir já, afronta princípios legais e decisões do Supremo.

MAIS UMA BATALHA DE ITARARÉ EM TORNO DO JURO
EDITORIAL
VALOR ECONÔMICO
6/10/2009

A disputa que se trava à luz do dia sobre a futura elevação da taxa de juros é mais uma das batalhas de Itararé em que frequentemente se envolve a equipe da Fazenda. 0 ministro Guido Mantega e seu secretário de Política Econômica, Nelson Barbosa, saíram a campo atacando o "terrorismo fiscal" de analistas, que projetam a necessidade de aumento dos juros a curto prazo para debelar a alta de inflação, estimulada pelo excesso de gastos do governo. Além de a tese constar das previsões de mercado, ela faz parte, ainda que de forma condicional e circunstanciada, do relatório de inflação de setembro divulgado pelo BC. O que irrita a Fazenda trata-se de uma obviedade: com a economia voltando a se reaquecer, o estímulo fiscal feito para tirá-la da recessão, se não for descontinuado, provocará inflação adicional. O governo petista raramente dá demonstrações de tanta unidade quanto na questão dos juros - todos contra o BC. Apesar das demonstrações de ira e inconformismo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sempre deu carta branca ao BC para realizar os ajustes necessários. Desta vez não deve ser diferente e toda a salva de fogos disparados mais uma vez prepara a batalha que não haverá.
Como a reação parece desproporcional, é possível que haja outros motivos no ar. Um deles é previsível - os efeitos de um aumento dos juros em pleno período eleitoral. Como os sinais são de que a campanha do candidato oficial governista, a ministra Dilma Rousseff, encontra dificuldades para garantir até agora um patamar de popularidade à altura das necessidades, a alta dos juros antes das eleições poderia ao mesmo tempo dar munição eleitoral ao governador José Serra, um habitual crítico do BC, e tirar votos de Dilma. A inconveniência política, de fato existe, mas a política monetária não existe para agradar candidatos e é para essas situações que existe a autonomia operacional do BC. Pode-se criticar, com boas doses de razão, o duro conservadorismo da equipe do BC, mas ele baseou-se até agora em diagnósticos técnicos, uma base adequada em torno da qual as interpretações podem variar.
Em primeiro lugar, é preciso qualificar o risco inflacionário visto pelo BC, que foi magnificado pela polêmica. Segundo o relatório, do terceiro trimestre de 2009 ao último de 2010, a inflação acumulada em quatro trimestres fica abaixo dos 4,5%, centro da meta para 2010 e 2011. Mas fica acima dele nos dois primeiros trimestres de 2011, e no terceiro, volta a coincidir com a meta. De quanto a inflação se distancia da meta? Pouco: 4,6% nos dois primeiros trimestres de 2011. Uma das causas, e não a única, são "os impulsos fiscais esperados para o segundo semestre de 2009 e o primeiro de 2010, que vêm contribuindo para acelerar a retomada da atividade". E tudo volta ao melhor dos mundos no terceiro trimestre de 2011, porque a projeção contempla "a expectativa de que ao menos em parte esses estímulos fiscais sejam retirados a partir do segundo semestre de 2010". É muito pouco para acirrar os ânimos.
O fato é que as previsões de mercado são piores e movimentaram para cima os juros futuros. Boa parte dos analistas começa a ver uma aceleração maior que a prevista e a iminência de, no início do ano, o BC elevar a taxa de juros em pelo menos dois pontos percentuais. O BC não diz qual será sua política e, se tudo continuar de acordo com seu cenário, pode até mesmo não mexer nos juros para acomodar um desvio de 0,1 ponto percentual. Neste ponto, a visão do BC é uma aliada, e não adversária, da posição da Fazenda.
A Fazenda argumenta que os mercados estão errados, o que é bastante provável. Até há pouco, prevalecia a projeção de uma retração de até 1% e agora já se fala que a economia retoma o ponto de que foi tirada pela crise global já em março de 2010. Por outro lado, não vê nada errado na política oficial, que privilegiou gastos permanentes e não temporários, e isso, segundo o BC e a maioria dos economistas, é de "complexa reversão". Este é um fato relevante não só para a política monetária. Com a maré montante de dólares e a valorização cambial, uma das armas para manter a competitividade brasileira é a redução de impostos. O governo, porém, poderá pouco se utilizar dela devido ao forte aumento das despesas salariais.

DESENVOLVIMENTO HUMANO
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
6/10/2009

Estudo divulgado ontem pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) mostra que o Brasil perdeu cinco posições no ranking do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). Aparece em 75º lugar. Evidentemente, não é uma posição confortável, mas o desempenho brasileiro apresenta evolução em vários aspectos e desafio em outros.

Em 2008, o país estava em 70º lugar, com IDH de 0,807. Em 2009, o índice cresceu atingindo 0,813, mas não evitou que o país descesse ao 75º lugar, porque diversos outros países também apresentaram evolução.

Com a 75ª posição, o Brasil se mantém na categoria de "desenvolvimento humano elevado". Ainda assim, na América Latina, permanece atrás de Chile, Argentina, Uruguai, Cuba, México, Venezuela e Panamá – situação que certamente pode ser revertida sem muita demora.

A expectativa de vida é um indicador que puxa para baixo a posição do Brasil no ranking do IDH. Se essa condição fosse considerada isoladamente, a colocação brasileira a seria a 81ª. A coordenação do Pnud entende que a desigualdade de renda se reflete na expectativa de vida, mas que a curto prazo é possível obter melhora com ampliação de investimentos governamentais nas áreas de saúde e de educação.

Uma das variáveis de cálculo sobre a expectativa de vida é a mortalidade infantil. Em regiões mais pobres do Brasil, onde as mães têm baixo nível educacional, o índice chega a 119 crianças mortas a cada mil – taxa superior a alguns países africanos, diz o relatório, conforme a Pnud.

Valem algumas observações. A primeira delas é que o nível de pobreza diminuiu no Brasil antes e durante a recessão. Pelo menos nas regiões metropolitanas. O Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) constatou que, em janeiro deste ano, 31,2% da população dessas regiões estava na faixa de rendimento considerada pobre. Em junho, a taxa era de 31,1% – redução equivalente a 503 mil pessoas.

A desigualdade também caiu, apesar da crise internacional. Segundo apuração do Ipea, a queda foi de 4,1% de janeiro a junho, quando o índice de Gini atingiu 0,493 ponto, o menor nível desde 2002 – época em que começou a ser contabilizado no país. Esse índice varia de 0 a 1, e quanto mais perto de 1, maior a desigualdade.

Antes da crise econômica internacional, a boa novidade era mostrada pelos números do IBGE. Em 1997, 31,6% das famílias viviam com até meio salário mínimo per capita ao mês, ao passo que, em 2007, essa proporção caiu para 23,5, de acordo com dados da Pesquisa Nacional de Amostras por Domicílio (Pnad).

Quanto à mortalidade infantil, o Ministério da Saúde informa que o quadro atual já é diferente do apresentado pela ONU, e que em 2010 haverá melhora acentuada. Tomara.

Segundo levantamento do Pnud, o Brasil destinou 14,5% do PIB (Produto Interno Bruto) para o setor educacional no período de 2000 a 2007, e apenas metade disso, cerca de 7,2%, para a área de saúde. No entanto, conforme dados do Ministério da Educação, já em 2007 o nível do investimento educacional correspondeu a 4,6% do PIB, e a meta é se aproximar dos 6%.

Em relação aos serviços de saúde para a população, a grande perspectiva de aumento de investimentos está na Emenda 29, que fixa o mínimo a ser destinado pela União, Estados e municípios para essa área. A lei que regulamenta os percentuais está parada no Congresso.

A evolução do Índice de Desenvolvimento Humano é um processo continuado. O Brasil está vencendo etapas, mas os desafios são complexos.

GUERRA AO CALOTE
EDITORIAL
ESTADO DE MINAS
6/10/2009

Não é à toa que a inadimplência ficou estável em agosto

Desde 2005, quando foi implantada a atual versão do sistema Bacenjud – programa utilizado para o bloqueio on-line de contas bancárias pela Justiça, em convênio com o Banco Central (BC) –, até junho deste ano, foram realizados 6,1 milhões de bloqueios a contas bancárias, totalizando R$ 47,2 bilhões. De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), desde 2001, quando foi criado o sistema Bacenjud, que interliga o Judiciário e o Sistema Financeiro Nacional, foram registradas 11.941.068 ordens judiciais por meio da internet. Só nos primeiros oito meses deste ano foram 2.774.132 ordens emitidas. No mesmo período, o uso de papel para os ofícios judiciais somaram apenas 46.504. Os órgãos da Justiça Estadual foram os que mais utilizaram o sistema: até agosto, foram registrados 1.350.495 pedidos no Bacenjud. Na Justiça trabalhista, que reúne 24 regiões, foram 1.270.267 ordens judiciais. Já na Justiça Federal, o sistema foi utilizado 153.365 vezes nos primeiros oito meses do ano, representando 6% do total das ordens emitidas.

“O Bacenjud revolucionou o Judiciário. A lei prevê que, se o devedor não pagar espontaneamente, será executado. E a prioridade na execução é o dinheiro. Mas essa preferência não tinha efetividade, porque ninguém anda com dinheiro no bolso. Com o Bacenjud, essa preferência passou a existir de fato. Se o devedor não pagou espontaneamente, faz-se o bloqueio diretamente na sua conta”, explica o secretário-geral do CNJ, juiz Rubens Curado. Segundo ele, a possibilidade de se ter a conta bloqueada automaticamente tem levado muitos devedores a negociarem para evitar ter o dinheiro retirado de sua conta. Vale dizer que o Bacenjud pode ser utilizado por todos os juízes cadastrados no sistema. De posse de uma senha, os magistrados o acessam no site do BC e preenchem o formulário pedindo as informações necessárias ao processo. A ordem, então, é repassada eletronicamente aos bancos que têm como clientes o devedor. O sistema tem seu uso incentivado pelo CNJ para garantir o cumprimento da Meta 8 do Planejamento Estratégico do Poder Judiciário deste ano, que propõe cadastrar todos os magistrados como usuários dos sistemas eletrônicos de acesso a informações sobre pessoas e bens e de comunicação de ordens judiciais.

E não é à toa que a inadimplência ficou estável em agosto, em 5,9%, depois de oito meses consecutivos de alta, mas o nível de calotes das empresas, de 3,9%, é o maior desde maio de 2001, segundo o BC, que divulgou ainda que o estoque total das operações de crédito no país cresceu 1,5% em agosto, a R$ 1,3 trilhão, o equivalente a 45,2% do Produto Interno Bruto (PIB). No acumulado do ano, o crédito teve crescimento de 8,1% e, nos 12 meses encerrados em agosto, uma alta de 19,5%. As operações do sistema financeiro público cresceram 2,3% no mês, 20,5% de janeiro a agosto e 40,9% em 12 meses. O sistema financeiro privado nacional ampliou o crédito em 1,3% no mês. No ano, a expansão é de apenas 2,9% e, em 12 meses, de 9,3%. O sistema Bancejud deve ser ainda mais melhorado, para que a parcela da população que ainda insiste em praticar o calote, ou professar o “devo, sim, pago quando puder”, sinta que essa prática não combina com um país que se diz a caminho da condição de nação desenvolvida.

SEM PUXADINHO NA LEI DOS PUXADINHOS
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
6/10/2009

Desde o fim da década passada, entidades de defesa do patrimônio histórico e o Ministério Público lutam para pôr fim à ocupação irregular dos fundos e laterais de lojas das comerciais do Plano Piloto, problema iniciado nos primórdios de Brasília. Em 2007, o GDF começou a discutir uma solução com as partes envolvidas. O entendimento só avançou com o poder público exercendo o máximo de tolerância. Apenas as invasões avaliadas como abusivas seriam demolidas, permitindo-se a permanência das demais, embora dentro de um padrão mínimo, definido na Lei nº 766/08 e regulamentado em abril último pelo Decreto nº 30.254/09.

Numa derradeira concessão, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que já aceitava até cinco metros de invasão nos fundos dos estabelecimentos comerciais, cedeu mais um metro, tendo sido o limite fixado em seis. Não bastasse, os empresários passaram a contar com linha de crédito especial para as obras de adequação à lei. Era para não haver desculpa, pois esse custo é estimado em irrisórios R$ 2,5 mil por unidade. Mais: deu-se um ano de prazo para que as mudanças necessárias fossem realizadas e o imóvel regularizado. Surpreende, pois, que, decorrido metade do tempo, praticamente nenhuma providência tenha sido tomada pelos lojistas.

Reportagem de ontem do Correio mostrou que só foram apresentados projetos para a regularização de três das 1,2 mil lojas irregulares. Mais estarrecedor ainda, apenas um deles atendia os critérios exigidos e pôde ser aprovado pela Administração de Brasília. A quase totalidade dos comerciantes irregulares continua a apostar na impunidade, em total desrespeito à lei e à comunidade. Depõe contra a história de planejamento da cidade, como bem definiu o pesquisador do Núcleo de Estudos Urbanos Regionais da Universidade de Brasília (UnB) Sérgio Ulisses Jatobá. “Além de deixar a capital muito feia, isso agride o projeto de Lucio Costa”, reforçou o especialista.

Resta ao poder público cumprir a sua obrigação e aplicar a lei. Sem qualquer tolerância mais. Basta de aceitar ofensas de quem se recusa a respeitar as regras da boa convivência. Vencido o prazo, em abril do ano que vem, justo por ocasião dos 50 anos de Brasília, impõe-se a cobrança da multa diária prevista, de R$ 1 mil, aos que não tiverem se adequado. Também faz todo sentido a intenção do Ministério Público de determinar a remoção completa dos puxadinhos que seguirem em desacordo com a lei. Sem novas concessões. Talvez até esteja aí a chance de devolver à capital planejada o gabarito original de suas lojas. Um presente para o brasiliense no aniversário da cidade.

CÁCERES 231 ANOS
EDITORIAL
DIÁRIO DE CUIABÁ (MT)
6/10/2009

No mundo inteiro ainda hoje fronteira é região estratégica. No passado, quando o Centro-Oeste era grande vazio demográfico e a Coroa Portuguesa disputava palmo a palmo com a Espanha o domínio territorial do continente, Cáceres teve destacado papel de sentinela da nacionalidade brasileira, numa área então pendente de demarcação.

Por quase dois séculos Cáceres não teve acesso rodoviário ao Brasil, mas ao longo desse ciclo manteve-se ligada ao mundo pela sua via natural de transporte, a Hidrovia Paraná-Paraguai, que é o elo entre brasileiros, bolivianos, paraguaios, argentinos e uruguaios.

O pouco contato com Mato Grosso e o restante do Brasil nunca abalou o espírito de nacionalidade cacerense. Ao contrário, a ausência da figura jurídica do Estado motivou a cidade e a fez criativa, audaciosa, visionária de nariz arrebitado.

Quando a rodovia chegou e se espalhou pelo imenso município de 85.738 km², o que permitiu seu fracionamento para o surgimento de cidades a exemplo de Rio Branco, Curvelândia, Salto do Céu e outras, Mato Grosso deu o grande salto para a ocupação de uma vasta faixa de fronteira. Com a emancipação dos distritos a área de Cáceres caiu para 24.398,40 km² - maior que Sergipe – numa região predominantemente pantaneira.

O governo não levava faculdades à Cáceres. A cidade não se curvou e tratou de resolver o problema de sua demanda universitária criando cursos superiores que foram as bases para o surgimento da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat), hoje com campi dispersos por todas as regiões mato-grossenses.

O impulso desenvolvimentista na fronteira transformou Cáceres em cidade-pólo na prestação de serviços e suprimento dos municípios adjacentes. Essa condição alterou arraigados hábitos cacerenses, cujo povo até então formava uma sociedade fechada em razão das peculiaridades regionais. A mudança foi gradual e se processava a cada nova família que se transferia para a cidade, cada novo estabelecimento comercial que abria suas portas. Esse fato resultou no surgimento de uma metrópole regional eclética, mas sem perder suas raízes.

A bonita cidade de Cáceres localizada na margem esquerda do rio Paraguai comemora hoje, 231 anos de fundação, por ordem do quarto governador de Mato Grosso, Luís de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres, do qual herda o nome.

Nesta data o Diário reitera seu compromisso cotidiano, como o faz há mais de duas décadas, por sua Sucursal, de continuar intransigente defensor de Cáceres e de sua gente.

O Diário cumprimenta o prefeito Túlio Fontes, demais autoridades e ao povo cacerense pela data, na certeza de que Cáceres cada vez mais será estratégica ao desenvolvimento de Mato Grosso.

“Cáceres teve destacado papel de sentinela da nacionalidade”

BOLSÃO DE SONHO E DE PÓ
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
6/10/2009

A Rua Helena Carcerari Piekarski, antiga Avenida do Progres¬¬so, não é conhecida dos curitibanos. Jamais seria escolhida para uma passeata, até porque mal pode ser identificada nos sofisticados mapas virtuais. Desafia GPS de último tipo. Nem taxista escolado a localiza. Mesmo assim, tornou-se motivo de orgulho para as 2,5 mil famílias que vivem no Bolsão Audi-União, uma das mais de 258 zonas favelizadas da capital.
Há pouco, com mais razões. Beneficiada pelo Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC, com R$ 16,7 milhões, a via recebeu asfalto, amenizando um dos principais dilemas do bairro – a poeira que arruína os pulmões e suja a roupa nos varais. A visita de homens e máquinas fez um bem danado à estima dos moradores. Em enquete feita pela Gazeta do Povo ano passado com a população que circulava na Rosa Piekarski, o resultado foi unânime: ninguém sonhava morar noutro local. Quiçá mais próximo do Terminal do Capão da Imbuia, onde se dá a baldeação do ônibus que vem do Centro.
É difícil afirmar, mas a escolha da “passarela” do Bolsão Audi-União para a chacina ocorrida na noite do último sábado – com saldo macabro de oito mortes, dois feridos, e cerca de 10 mil pessoas se trancafiando dentro de casa – foi estratégica. O tráfico, além da exibição de força, como frisou o repórter Guilherme Voitch em texto publicado ontem pela Gazeta, se ocupa de ferir as esperanças. E não haveria melhor lugar para intimidar a turma do Audi-União do que ali, num território que se tornou o que havia de mais parecido com bem público num raio de pelo menos cinco quilômetros.
A matança de sábado é o que parece: um problema de segurança pública. E o que não parece também: um problema de urbanismo. Qualquer dúvida, é só se aventurar por míseras duas quadras da região e tirar as conclusões. O Bolsão Audi-União, à revelia dos que afirmam serem todas as zonas favelizadas idênticas, nasceu de uma ocupação organizada, mas não deu sorte.
Quando as famílias chegaram, as ruas estavam traçadas e os lotes divididos em partes iguais. No dia em que fosse feita a regularização fundiária, não haveria a trabalheira de ter de tirar gente de casebres e puxadinhos erguidos no meio do caminho ou na beira dos rios. Até a própria Avenida Progresso estava traçada. Não à toa, ali se estabeleceram supermercados, padarias, farmácias, lojas de roupa. Nem as ocupações mais antigas, hoje quase 100% regularizadas, como a Vila das Torres, desfrutam de tanta variedade de serviços.
O progresso da avenida, contudo, não bastou para salvar o Bolsão Audi-União da tragédia do último sábado. O que era de se esperar. Mesmo tendo nascido de forma racional – apesar de ser uma ocupação –, o bairro está espremido entre a BR-277 e a linha do trem. Entrar ali é um exercício de paciência, perícia e arte de fazer contornos, passar por baixo de viadutos e mentalizar marcos urbanos em meio à monotonia da paisagem suburbana.
Pois é. A população bem que se esforçou, mas a chegada da polícia, da ambulância, do ônibus, do taxista e de qualquer pessoa – garantia de que um lugar pode ser habitado e cuidado como qualquer outro – não é possível naquelas bandas. As obras do PAC foram bem-vindas. Estão garantindo 419 casas de alvenaria, mas ainda não mudaram o cenário, até porque o cenário, dado seu isolamento, se desmanchou naturalmente.
É o caso da Vila Icaraí – uma vizinha miserável, um bolsão de pobreza dentro do bolsão. Ali não há quadras bem-traçadas nem rua do comércio. Seitas se alternam com barracões de lixo, onde mora gente, e vendedores de churrasquinho de gato. Com o PAC, 295 famílias serão retiradas do local – as outras 392 terão de esperar novos programas. Difícil imaginar que no local – além da luta diária por um prato de comida – haja gente se ocupando do tráfico, e com os requintes verificados na chacina de sábado.
Caso a versão da Polícia Militar se confirme, a dedução é só uma: os traficantes tiraram proveito da informalidade gritante do Icaraí da mesma forma que seus rivais tiram proveito do isolamento da Vila União. Com perdão ao trocadilho, contra o tráfico uma boa saída seria o tráfego. Mesmo que aumente o poeirão que tanto incomoda as donas de casa, não há de ser nada ter de aguar a roupa tantas vezes ao longo do dia.

CHACINA JOVEM
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
6/10/2009

Chama atenção a idade das vítimas da chacina do Bolsão Audi-União. Além do pequeno Mateus, de 5 meses, os outros sete mortos oscilam dos 17 aos 29 anos. Não é difícil cruzar com jovens nos limites da ocupação, em qualquer hora do dia, confirmando o que as estatísticas nacionais apontam sobre essa faixa etária: falta-lhes emprego formal e permanência na escola, em especial no ensino médio, no qual a evasão são favas contadas para a população mais empobrecida.
Em contrapartida, ocorre ali o que ainda é de praxe em outras zonas pobres da cidade – a rotulação do jovem, como se não lhe restasse outra identidade senão a do bairro em que mora. Reportagens anteriores na região o confirmam: não raro, muitos, à procura de emprego, se apresentam como moradores de outras divisas, temendo a discriminação.
Uma boa medida – no calor da chacina – seria traçar um retrato juvenil do bolsão. Por certo, o avaliador encontraria pontos positivos, como os times de futebol que treinam numa praça do Uberaba, na altura da Escola Municipal Maria Marli Piovezan, e a ação da ONG Voice for Change, que atende majoritatiamente crianças e adolescentes. Em tempo – a fachada azul da Voice é um dos orgulhos da antiga Avenida do Progresso. Assim deve permanecer depois da tempestade.

O BRASIL E O FMI
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
6/10/2009

A confirmação de que o Brasil não está apenas saindo da crise econômica mas também passando à condição de credor do Fundo Monetário Internacional (FMI), e não de devedor, como costumava ocorrer em situações semelhantes, constitui-se numa dupla proeza a ser conduzida com o máximo cuidado. O fato de o país estar conseguindo deixar a crise para trás, mais cedo do que outras economias duramente afetadas pelas dificuldades globais, confirma o acerto das chamadas medidas anticrise postas em prática internamente. Mas o aspecto inusitado é a particularidade de esse acerto coincidir com a formalização feita ontem pelo Planalto da aquisição de US$ 10 bilhões em bônus da instituição, cumprindo decisão anunciada em junho. A mudança da condição do país de devedor para credor tem um significado importante para a autoestima dos brasileiros, mas não pode ocultar o fato de que também o FMI precisa repensar a fundo suas políticas.

As últimas crises econômicas globais deixaram evidente que o receituário aplicado pelas instituições multilaterais nos últimos anos, conhecido como Consenso de Washington, levou muitos países, incluindo o Brasil, a se preocupar mais com o rigor fiscal. Ainda assim, as providências não foram suficientes para impedir que o país fosse impactado pela turbulências e fosse levado a pagar um alto custo por isso, precisando recorrer a taxas de juros e de impostos elevados e a perder a autonomia para decidir suas políticas de desenvolvimento. Por isso, é importante que o governo brasileiro consiga ver hoje o FMI de forma menos ideológica, mas também que a instituição reveja suas políticas e possa se antecipar às crises.

Na mais recente, o Brasil demorou a admitir a possibilidade de ser afetado mas tomou afinal providências que, agora, se confirmam como acertadas. Entre elas, estão a redução de alíquotas de impostos para setores selecionados, a expansão do crédito e um impulso considerável nos investimentos das estatais. Os resultados das chamadas providências anticíclicas foram eficazes, a ponto de o país já ter começado a desativá-las. O próprio FMI recomendou pressa nessa operação, alertando para a necessidade de “gerenciar a abundância”, principalmente de ingresso de dólares – sinal de que nem tudo foi resolvido internamente.

O mesmo país que conseguiu passar da condição de devedor à de credor do FMI ainda tem desafios importantes pela frente, como é o caso da redução da taxa básica de juros. Mesmo com a política de queda gradual, descontinuada agora, o percentual segue elevado demais para quem investe e ainda expõe o país a riscos, como o advertido pela instituição, para as exportações e para seus saldos comercial e em conta corrente, na hipótese de um ingresso muito expressivo de moeda externa.

RUIM PARA TODOS
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
6/10/2009

Os resultados da pesquisa do Ibope, que confirmam uma imagem profundamente negativa da administração Yeda Crusius, são preocupantes para todos os gaúchos. Mais do que retratar os efeitos dos equívocos políticos e administrativos de que o governo é acusado, a pesquisa mostra uma perda de apoio que torna frágil a sustentação popular da governadora. Independentemente dos desdobramentos que venham a ocorrer nos processos que tramitam na Justiça Federal, na ação de impeachment que foi aberta na Assembleia ou nas investigações da CPI, existem evidências que complicam ainda mais a situação, a começar pelo peso das acusações, que sobressai em relação aos fatores positivos do governo, e pela rejeição constatada na pesquisa. Esses fatos tornam delicado o momento político e institucional do Estado e exigem ações marcadas pela responsabilidade por parte dos vários atores envolvidos, incluindo-se aí os partidos políticos que precisam ser coerentes e maduros na apreciação do presente e na formulação dos passos futuros. Mas não há dúvida de que o principal alvo da indignação manifestada pelo público é a própria governadora.

O retrato que emerge da pesquisa, ao lado das preferências eleitorais ou da avaliação de desempenho, mostra uma relação de problemas que aguarda a ação dos poderes públicos. Os gaúchos têm como suas preocupações mais urgentes temas como saúde, segurança pública, emprego, educação, estradas e corrupção, pela ordem, além de outras. Diante da gravidade dessas questões, é compreensível a preocupação que os cidadãos demonstram ao se defrontarem com uma agenda política degradada por acusações e suspeitas nas quais a ética no trato da coisa pública é a vítima mais frequente. O Rio Grande revelado na pesquisa está mostrando inequivocamente suas insatisfações com o que está acontecendo e, ao mesmo tempo, está apontando as questões que deseja que seus governantes enfrentem. Está revelando o que quer e o que não quer. O recado da sociedade é claro e a governadora precisa entendê-lo como tal, sem atribuí-lo a intrigas da oposição ou a armações políticas.

A CRISE HONDURENHA
EDITORIAL
JORNAL DO COMMERCIO (PE)
6/10/2009

Honduras é pouco maior que Pernambuco – algo em torno de 15 mil quilômetros quadrados a mais – e tem menos habitantes. É um pequeno e pobre país da América Central, com uma história centenária de golpes militares. Entre 1956 e 1978, quatro governos caíram pela força armada, passando de um grupo militar para outro. Somente em 1981 chegou um civil ao poder, pelo voto, em mais de um século. Uma história que desconheceu, por muito tempo, as mais elementares lições sobre democracia e que tiveram vida curta: 28 anos, quando o país é submetido de novo a uma ditadura. O diferencial na história dessa nação é que o golpe atual não se dissolve entre outros tantos da América Latina. Um hábito não apenas em Honduras mas em quase todos os países latino-americanos.
Muito bem, mas qual a causa aguda desse mico institucional hondurenho? A origem esteve na intenção do presidente deposto Manuel Zelaya de fazer uma consulta de opinião pública no dia 28 de junho sobre a realização de um referendo para a convocação de uma Assembleia Constituinte. E nesta Assembleia Constituinte, estavam embutidas mudanças numa cláusula pétrea da Constituição, segundo a qual está proibida, sob qualquer circunstância, a recondução do presidente da República. Exatamente como fez o presidente venezuelano Hugo Chávez, de quem Zelaya é fã e seguidor. A oposição, entretanto, resgatando do passado o histórico golpista de Honduras, afastou Zelaya do poder e o baniu do país – como se dois erros fossem igual a um acerto. Configurou-se, portanto, um golpe de Estado que, ao contrário dos anos 60 e 70 do século passado, está sendo condenado pela comunidade internacional, a começar pelas Nações Unidas, cujo secretário-geral, Ban Ki-Moon, considera inaceitável a destituição de um presidente democraticamente eleito.
Até mesmo os Estados Unidos, avalista histórico de Honduras, se pronunciou contrário ao golpe, o que torna o episódio particularmente especial para o Brasil, já que passamos a atores coadjuvantes desse episódio. O nosso presidente não hesitou em condenar o golpe e foi mais além, através da declaração forte do ministro Celso Amorim, das Relações Exteriores, pedindo o imediato e incondicional retorno do presidente deposto ao poder. Mas, esqueceu de condenar o presidente Zelaya que, abrigado na embaixada brasileira em Tegucigalpa, passou a usar aquele espaço soberano de nosso País como escritório de campanha, contrariando todos os princípios do asilo político, e dando motivos para que os golpistas hondurenhos nos acusem, não sem razão, de praticarmos uma política imperialista, que durante tanto tempo sempre condenamos. Viramos personagem de mais uma dramática conjuntura institucional de Honduras, onde envolveu-se, também, de forma não tão ostensiva, o presidente Hugo Chávez, cuja contribuição com a economia hondurenha parecia lhe dar – como no passado deu aos Estados Unidos – o direito de dispor sobre as questões internas do país.
A presença de Chávez complica um problema que o Brasil poderia solucionar sem traumas, pois até o abrigo ao presidente deposto em nossa representação diplomática é tolerado do ponto de vista da política internacional e das leis internacionais que tratam da soberania e inviolabilidade das representações estrangeiras em qualquer país. Observando-se, é claro, aquelas limitações que a condição do asilo impõe ao asilado. No bojo dessa crise, não cremos na violação da representação brasileira, pois isso seria a instalação do caos em uma nação que depende do exterior, até mesmo para o funcionamento de uma economia fundada na exportação de café, banana e camarão. Daí a fragilidade com que os opositores de Zelaya avançam e recuam em decisões que de outra forma teriam que ser definitivas e respeitadas por todas as demais nações. Essa crise, no entanto, deve deixar lições para o Itamaraty, certamente evitando no futuro um engajamento tão direto em assuntos internos de outros países, entregando-os, se for o caso, à apreciação de organismos internacionais, particularmente a Organização dos Estados Americanos (OEA).

REINSERÇÃO DO NORDESTE
EDITORIAL
DIÁRIO DO NORDESTE (CE)
6/10/2009

Fato inusitado está sendo comprovado nas avaliações da crise financeira internacional na economia brasileira: ao contrário do que era de se esperar, como o agravamento do ambiente de pobreza - característica secular da região - o semiárido nordestino vem passando por nova fase de crescimento regional, reinserindo-se no esforço pelo desenvolvimento nacional. É o resultado dos programas de transferências de renda e dos investimentos públicos na região.

As atenções do poder público para com o Nordeste induziram os investimentos privados, nacionais e estrangeiros, por conta do surgimento de uma nova categoria de consumidores, a classe C, migrada de camadas mais sacrificadas economicamente. A ascensão dessa nova camada social, decorrente da elevação de sua renda, tem repercutido na cadeia produtiva, no consumo, na geração de empregos, e, consequentemente, em novos negócios.

Nos últimos tempos, houve uma reviravolta nas sondagens prospectivas do potencial do consumo interno. No ranking nacional, o Nordeste passou a ocupar a segunda posição no mercado consumidor, perdendo apenas para o Sudeste. Ao superar a região Sul, vem merecendo as atenções dos investidores privados, interessados em explorar novos nichos de negócios e a demanda reprimida, aproveitando exatamente as oportunidades surgidas com essas novas fontes de negócio, renda e consumo.

A nova realidade econômica regional não deixa dúvidas sobre as transformações estruturais: o Sudeste detém, hoje, 51% do mercado consumidor nacional, estimado para 2009 em R$ 1,8 trilhão. O Nordeste conseguiu a segunda posição, com uma fatia correspondente a 18,8%. A terceira posição está ocupada pelo Sul, com 16,3% do consumo interno, vindo, em seguida, o Centro-Oeste e o Norte, com 7,8% e 5,7%, respectivamente. O crescimento do salário mínimo foi o fator responsável por essas transformações.

O Nordeste, concentrador de 28% da população brasileira, tem a singularidade de reter, também, mais da metade dos que recebem salário mínimo no País. Por consequência, o ganho real do mínimo beneficiou diretamente essa camada agora responsável pela dinamização do mercado regional de consumo. Como a classe C emergente não tem sobras suficientes para alimentar um plano de poupança, a renda auferida se orienta, toda ela, para as compras.

De 2003 a 2008, foram gerados no semiárido 1,9 milhão de postos de trabalho, com vínculo empregatício. Essa oferta, exatamente num segmento onde a região sempre acumulou déficit de empregos, representou um incremento de 39% sobre o estoque de vagas. Em termos nacionais, foram gerados, no período, 10,3 milhões de ocupações formais, com uma alta significativa de 36%.

O comércio tem sido o termômetro mais eficaz dessas mudanças pontuais. As operações de varejo, na região, cresceram 53% contra a média de incremento nacional de 40%. O crédito para pessoa física, entre 2004 e 2008, quintuplicou quando comparado com a média do País. Esses sinais de melhoramentos comprovam uma realidade inquestionável: sempre que o poder público se volta para regiões com níveis de desenvolvimento defasado, como o Nordeste, o retorno positivo ocorre de imediato, como agora.

ÁREAS DE RISCO E ATO ADMINISTRATIVO
EDITORIAL
A CRÍTICA (AM)
6/10/2009

Matérias divulgadas nas edições de domingo e segunda-feira deste jornal trazem importantes questões sobre as áreas de risco em Manaus. De um lado, identifica os pontos que são hoje uma ameaça real a dezenas de famílias e, de outro, mostra uma série de dificuldades tanto por parte das autoridades públicas quanto dos moradores em tratar do tema com a responsabilidade que merece ter.

O número de áreas de risco aumentou motivado por situações que vão desde as ocupações desordenadas, ausência de planejamento do espaço urbano e progressiva destruição dos igarapés que cortam a cidade.

Tragédias, prejuízos e muito sofrimento fazem parte dos acontecimentos anuais envolvendo comunidades que habitam essas regiões. As histórias que seguem esse roteiro se repetem ajudando a fortalecer a ideia de que é impossível impedi-las. Nesse caso, tais tragédias podem ser evitadas. Exigem medidas antecipatórias e agentes públicos atuando no sentido de promover a prevenção, o diálogo permanente a respeito das ameaças as quais estão submetidas essas famílias e as saídas apresentadas pelo Poder Público. O Estado e a cidade de Manaus possuem, na atualidade, vários instrumentos que deveriam ser usados para mudar o quadro atual.

Se no passado, a ineficiência administrativa, a escassez de recursos financeiros e a limitação no conhecimento científico eram apresentados como razões para agravar essa situação, hoje já não é possível mais aceitar tais desculpas. O que está em evidência é a inabilidade do gestor público que não consegue se antecipar e nem mostrar de forma mais transparente qual é o plano de ação para esse problema. A tecnologia aliada a um bom projeto pode significar salvar vidas, minimizar os prejuízos e ajudar na construção de uma nova mentalidade na cidade, incluindo a prevenção como um desses indicadores fundamentais à evolução.

O trabalho nessa área exige de um lado uma nova postura administrativa e, de outro, construir alianças firmes com os segmentos populacionais. Sem entender qual é o contexto e como ele afeta a dignidade dessas vidas, é muito mais difícil promover as mudanças reivindicadas e necessárias para esta cidade. Os elementos apresentados nas matérias publicadas nos dias 4 e 5 deste mês são contribuições importantes para o debate e as decisões que precisam ser tomadas.

Blog Archive