RESPEITO A LIMITES EDITORIAL O GLOBO 2/10/2009
O chanceler Celso Amorim, ligado ao PMDB na década de 80, acaba de filiar-se ao PT; já Henrique Meirelles, eleito deputado federal em 2002 por Goiás, seu estado, com a legenda do PSDB, renunciou para assumir o Banco Central de Lula, e se posiciona para retomar a carreira política, ao assinar a ficha de entrada nos quadros do PMDB goiano. A adesão a uma legenda, no passado, não impediu que qualquer dos dois deixasse de ter destaque no primeiro escalão do governo, desde o primeiro dia do primeiro mandato. Carteirinha de partido, a princípio, não impede autoridade de atuar como deve em seus cargos, mesmo os técnicos, como a presidência do BC. Problema haverá se Amorim, Meirelles e qualquer outro utilizarem a função a favor de partidos, se atuarem na campanha de 2010, já deflagrada pelo próprio presidente Lula há algum tempo. Pelo menos o presidente do BC, a depender das perspectivas eleitorais, se desincompatibilizará em março, anunciou. A preocupação mesmo é com o estilo e tom do próprio presidente, na estrada eleitoral desde que assumiu o segundo mandato com o nome de Dilma Rousseff no bolso para suceder-lhe. Na posse de Alexandre Padilha, sucessor de José Múcio no cargo de ministro de Relações Institucionais, Lula fez declarações aparentemente acacianas em defesa da partilha de cargos públicos entre as legendas da coligação vitoriosa nas eleições. Por óbvio, a não ser por motivos muito especiais, não se divide o poder com adversários políticos. Mas, diante da prática do governo, o discurso presidencial é para justificar o aparelhamento da máquina pública — às expensas do contribuinte — por falanges de sindicalistas e células de ditos movimentos sociais, como o dos sem-terra. Estes, assentados no Incra e Ministério do Desenvolvimento Agrário, em que são receptadores de milhões de reais que percorrem trajetos sinuosos para escapar dos sistemas de fiscalização. O argumento de Lula visa, ainda, a responder a críticos da relação fisiológica que aceitou manter com o PMDB. E também com o PDT, a quem entregou o Ministério do Trabalho com a respectiva chave do cofre. Adesões partidárias não assustam, contanto que limites éticos sejam respeitados, e haja uma Justiça e um Ministério Público eleitorais especialmente atentos em 2010.
PAPEL DO CAMPO EDITORIAL O GLOBO 2/10/2009
A monocultura caracterizou a economia brasileira desde os primórdios da colonização. Primeiro a cana-de-açúcar, depois o algodão e o café, principalmente, sustentaram por muitas décadas a economia do país. A geração dessa riqueza foi também a base da urbanização e do processo de industrialização que ocorreu ao longo do século XX. Em face dessa transformação, o Brasil deixou de ser rural a partir dos anos 50 e hoje tem mais da metade da sua população vivendo em cidades grandes e no seu entorno. A atividade agrícola não é mais separada das demais. O conceito de setor primário se desatualizou em face da formação de cadeias produtivas que integram a agropecuária à indústria e aos serviços. O conceito do agronegócio talvez defina melhor esse tipo de atividade econômica que une campo e cidade. Assim, além dos produtos tradicionais, como açúcar, algodão e café, o Brasil se destaca na soja, no milho, na produção de biocombustíveis (etanol e biodiesel), no processamento de carnes, no suco de laranja, na celulose, etc. Além de grãos, o agronegócio tem proporcionado aos brasileiros (e também a consumidores no exterior) uma alimentação saudável, com produtos que chegam quase sempre frescos à mesa. Nesse sentido, o agronegócio combina a exploração de grandes extensões de terras com a produção de hortigranjeiros proveniente de pequenas e médias propriedades familiares. O último censo agropecuário do IBGE, com dados de 2006, confirmou essa evolução. Há mais investimentos em mecanização e tecnologia, o que leva a produção a aumentar mais pelos ganhos de produtividade do que pela área cultivada, o que é importante para se conciliar atividade econômica com preservação ambiental. Por outro lado, é inevitável que essa estrutura de produção ocasione uma concentração de propriedades nas regiões de culturas extensivas em capital, com menos utilização de mão de obra. É, portanto, ilusória a leitura da questão agrícola por meio do coeficiente de Gini. É um fenômeno negativo para o país? A julgar pelos resultados proporcionados pelo agronegócio — tem sido o maior responsável pelo superávit comercial — e pela fartura de alimentos oferecida aos centros urbanos — fiador de inflações baixas —, a resposta é que o modelo vem dando certo. Não por acaso, a sociedade brasileira deixou de ficar cultuando ilusões em relação aos movimentos que pregam a distribuição de terras como saída para todos os nossos problemas. A reforma agrária só faz sentido se inserida nessa cadeia produtiva.
PARTICIPAÇÃO CRUCIAL NUMA ´ENRASCADA´ EDITORIAL JORNAL DO BRASIL 2/10/2009
Virou lugar-comum denominar a crise política de Honduras como uma “enrascada” na qual o Brasil se encalacrou. Ao abrigar o presidente deposto Manuel Zelaya em sua embaixada, o Brasil foi jogado para o olho do furacão de uma confusão que não lhe diria respeito. O Itamaraty teria, a rigor, se intrometido numa briga pelo poder em um inexpressivo país – curiosamente o que inspirou o termo República de Bananas – onde dois caudilhos medem força. Não há certeza, passados 11 dias, se a diplomacia brasileira teve papel atuante na volta de Zelaya para Honduras ou se foi pega de surpresa, num joguete diabólico orquestrado por Hugo Chávez. Mesmo assim, o episódio, delicado por seu ineditismo, tem oferecido fartas oportunidades a um discurso que atira críticas essencialmente de duas estirpes: ou o governo brasileiro e o Itamaraty agiram de modo ingênuo, incompetente, ou a condução da política externa do Estado foi ideologicamente capturada por um viés esquerdista da pior espécie, o bolivarianismo que estaria se espalhando da Venezuela e Bolívia para tomar todo o continente. Ora, não se trata nem de um nem de outro suposto equívoco. Há situações em que simplesmente restam poucas opções. Uma vez que Zelaya chegasse à embaixada brasileira, negar-lhe o abrigo seria contraditório, já que o Brasil (bem como toda a comunidade internacional) foi contra a sua deposição, taxando enfaticamente sua expulsão do poder como um golpe. Aliás, é curioso notar como a grita de gralhas logo após o primeiro dia se transformou no previsível barulho de cigarras tão logo a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, veio a público referendar a atitude do Brasil. É claro que o episódio requer cuidados e tomou proporções perigosas. O governo golpista de Micheletti – ou interino, “de fato”, para usar expressões mais eufemistas – fechou rádio e TV de oposição, impôs toques de recolher diários, revogou as liberdades constitucionais e mandou suas tropas para as ruas. A truculência, porém, vai surtindo efeito contrário, e Micheletti já perde apoio interno – de empresários e até dos poderes que o sustentaram: Congresso, Supremo e Forças Armadas. A saída negociada, com sua renúncia, é uma possibilidade iminente. O exato arranjo institucional que será desenhado é uma incógnita. Mas caso isso ocorra, a participação do Brasil no episódio terá sido crucial. Não por incompetência, ingenuidade ou captura ideológica que, “por sorte”, não resultaram em pior desfecho. Mas porque era, democraticamente, o correto a ser feito. Aconteça o que acontecer. Obviamente, dilemas deste tipo não podem e não são tratados com voluntarismo na política internacional. Envolvem contextos geopolíticos. A linha de atuação do Brasil, de certo, tem mudado. Mas não no sentido ideológico, como imaginam alguns, e sim no estratégico. A diplomacia está acompanhando o novo papel que o Brasil vem exercendo no mundo, com seu peso econômico e político, não mais restrito a uma função de simples apaziguador de conflitos de vizinhança. Há uma oportunidade de inserção no cenário globalizado. Vide o pleito do país, já apoiado pela França, de ter assento no Conselho de Segurança da ONU. O Brasil quer ter voz efetiva. Mas isso tem um preço. O imbróglio em Honduras é o início deste aprendizado.
A MORDAÇA SE ETERNIZA EDITORIAL O ESTADO DE S. PAULO 2/10/2009
Descartada a versão implausível de que o Judiciário conspira deliberadamente contra a liberdade de imprensa no Brasil ? apesar de já chegar a uma dúzia o número de casos de censura judicial ?, é inexplicável, ou pode se prestar a quaisquer outras interpretações, a espantosa decisão tomada pela 5ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJ-DF). O colegiado considerou o TJ-DF incompetente para julgar a ação movida pelo empresário Fernando Sarney contra o Estado, transferiu o caso para a Justiça Federal de primeira instância, no Maranhão, e, ainda assim, para perplexidade de leigos e juristas, manteve a liminar, oriunda do mesmo TJ-DF, que há mais de dois meses proíbe o jornal de publicar reportagens baseadas nas investigações da Polícia Federal sobre os negócios do filho do senador José Sarney. Ele está indiciado por lavagem de dinheiro, tráfico de influência, formação de quadrilha e falsidade ideológica.
Foi a segunda incursão do tribunal de Brasília pelo território do absurdo ? ou pelo "abuso", como prefere o veterano criminalista Antonio Claudio Mariz de Oliveira, que se diz chocado com a decisão. Da primeira vez, em 15 de setembro, o Conselho Especial do TJ-DF, embora desse ganho de causa ao Estado, que demandara que o autor da liminar impondo a censura prévia, desembargador Dácio Vieira, fosse declarado impedido de atuar no processo ? por ter atribuído ao jornal "ação orquestrada mediante acirrada campanha com o nítido propósito de intimidação" ?, convalidou o seu ato atentatório ao princípio constitucional da liberdade de imprensa. Os conselheiros ignoraram que o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (STF), aplicável por analogia a todos os tribunais brasileiros, estipula que, "afirmada a suspeição pelo arguido, ou declarada pelo tribunal, ter-se-ão por nulos os atos por ele praticados".
À época, o ministro Marco Aurélio Mello chamou a atenção para a "insubsistência dos atos praticados pelo magistrado dado por suspeito". A decisão foi recebida nos meios forenses como uma construção criativa, possivelmente para salvar a face do colega que se recusara, ele próprio, a deixar o processo, depois da revelação de suas relações de amizade com a família Sarney e de sua passagem pela consultoria jurídica do Senado. E assim, de favores em favores, de proteção em proteção, consolida-se a lassidão moral que avassala a vida pública brasileira, a ponto de se atentar contra as liberdades constitucionais com a maior sem-cerimônia.
A nova enormidade segue o mesmo padrão, aprofundando a gritante incongruência anterior. Para sair da "esteira do abuso que marca a manutenção da censura quando o juiz foi declarado suspeito", argumenta Mariz de Oliveira, "o TJ-DF, ao dar-se por incompetente, deveria ordenar imediatamente a suspensão dessa proibição". Um órgão do Judiciário que não se considera competente para dar curso a um processo, preferindo remetê-lo para outro tribunal, logicamente teria de anular as decisões que os seus membros tenham tomado a respeito.
"O que mais me deixa surpreso é quando um tribunal diz que não tem competência e mantém a decisão", comenta o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Mozart Valadares Pires. "Se é incompetente, a decisão está revogada. Não consigo entender."
"É mais uma demonstração do corporativismo que prolonga uma inconstitucionalidade absurda", explica o presidente da Associação Brasileira de Imprensa, Maurício Azêdo. Atitudes corporativas podem se destinar a proteger qualquer dos colegas da corporação ? ou o conjunto dos seus membros. Às vezes a proteção se estende, para todos os efeitos práticos, a figuras que não integram o colegiado, mas podem ter tido influência na sua composição. São laços poderosos que evidenciam a sua durabilidade em momentos críticos.
Em que medida isso alcança o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios é uma questão em aberto. O fato incontestável é que o Estado continuará amordaçado não se sabe por quanto tempo ainda. Os advogados do jornal não podem apelar de imediato da decisão. Qualquer iniciativa deve esperar a publicação do acórdão do TJ-DF, o que não costuma acontecer exatamente da noite para o dia. Tanto pior para o direito da sociedade à livre informação sobre assuntos de interesse público.
ALERTA A GOVERNOS ENDIVIDADOS EDITORIAL O ESTADO DE S. PAULO 2/10/2009
Países com dívida pública elevada poderão enfrentar problemas graves na saída da crise, adverte o Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo brasileiro deveria dar atenção ao alerta. A dívida aumentou neste ano porque a retração dos negócios derrubou a arrecadação de impostos, estímulos fiscais foram concedidos e, além disso, o governo gasta mais do que deveria. Se a economia voltar a crescer com rapidez, os juros tenderão a subir. Quanto mais endividado o setor púbico, mais vulnerável será ao encarecimento do crédito. Mas isto é apenas parte da história. Se os governos tiverem de buscar mais dinheiro no mercado, maior dificuldade terão as empresas para cobrir suas necessidades. O setor privado também sofrerá as consequências do desajuste fiscal.
A situação do Brasil é muito mais confortável que a de países, como os da Europa Oriental, forçados a refinanciar nos próximos dois anos grandes compromissos externos, públicos e privados. O País dispõe de reservas elevadas e, além disso, tanto o governo quanto as maiores empresas têm boas classificações de risco no mercado financeiro. Mas nenhuma economia ficará totalmente imune à reacomodação do sistema financeiro.
Os problemas serão em grande parte gerados nos Estados Unidos e noutros grandes mercados e transmitidos ao resto do mundo.
Nas principais economias o crédito ao setor privado continua muito limitado, como indica o relatório do FMI sobre as condições globais do mercado financeiro. Mas as necessidades totais de empréstimos não diminuem na mesma proporção, por causa do crescente déficit público em muitos países.
Como resultado, o crédito permanecerá escasso no curto prazo. No médio prazo, os problemas ficarão mais complicados, se os governos atrasarem a correção de seus déficits. Os Tesouros pressionarão os mercados em busca de financiamento e os tomadores privados serão empurrados para fora. Esse fenômeno já foi observado nos anos 80 e no começo dos 90.
Nesse período, tornou-se corrente a expressão "crowding out", usada para designar a forma como os governos ocupavam a maior parte do espaço nos mercados e jogavam para fora empresas e indivíduos necessitados de crédito. A expressão "crowding out" foi usada, agora, pelo diretor do Departamento Monetário e de Mercados de Capitais do FMI, José Viñals.
Há 20 anos, esse fenômeno teve escala internacional. Na disputa, os perdedores foram não só empresas privadas e indivíduos em busca de financiamento, mas também os governos mais endividados e mais vulneráveis ao aperto de crédito. O Relatório de Estabilidade Financeira Global, divulgado na quarta-feira pelo FMI, não detalha como poderá ser um novo episódio de "crowding out", mas é fácil imaginar os cenários prováveis. Num dos mais inquietantes, o governo americano falhará no esforço de conter seus gastos e seu endividamento e pressionará fortemente o mercado financeiro. Os bancos elevarão os juros e diminuirão a oferta de crédito para a maioria dos tomadores, prolongando os efeitos da crise iniciada em 2007 e agravada a partir de setembro de 2008.
Se algo semelhante a esse quadro se materializar, a recuperação da economia mundial será mais lenta do que poderia ser num cenário de menor desajuste das contas públicas.
O relatório financeiro do FMI está longe de ser uma peça de literatura de terror. Seus autores descrevem a melhora das condições do mercado nos últimos seis meses e mostram os avanços dos bancos e de outras instituições na captação de capital. Além disso, reduziram de US$ 4 trilhões para US$ 3,6 trilhões a estimativa de perdas totais do setor financeiro desde o agravamento da crise até o fim do próximo ano. Mas a recuperação das instituições de crédito é incompleta e o crédito continua restrito.
Enquanto os bancos e as demais instituições do mercado não voltarem à normalidade, o crescimento da economia real ? produção, investimento, consumo e emprego ? será limitado pela escassez de financiamento. Mas os governos devem cuidar não só da normalização do sistema financeiro. Devem dar atenção também às suas contas e ao seu endividamento, para não se transformar em obstáculos à recuperação do setor produtivo.
REDUÇÃO DO SUPERÁVIT PRIMÁRIO EDITORIAL O ESTADO DE S. PAULO 2/10/2009
Em agosto o superávit primário, levando em conta o fluxo de 12 meses, chegou a R$ 47,044 bilhões, equivalentes a 1,59% do PIB estimado em R$ 2,957 trilhões. Em dezembro de 2008 esse superávit somava R$ 118,037 bilhões, ou seja, 4,08% do PIB calculado em R$ 2,902 trilhões. Essa queda de 60% do superávit primário, em oito meses, levou o deputado Geraldo Magela, do PT, relator do Orçamento de 2010, a propor que se reduza o superávit primário previsto na Lei das Diretrizes Orçamentárias - já aprovada - de 3,3% do PIB para 2%.
Ao longo do ano, houve uma redução progressiva do superávit primário acumulado em 12 meses, que em janeiro atingia 3,81% do PIB. O deputado petista não esconde que sua proposta visa a dar mais espaço de manobra para o governo central, responsável por 47% do superávit primário em agosto.
Cumpre lembrar que, por decisão do governo, se pode deduzir os investimentos do superávit primário, que assim chegaria a 1,03% do PIB.
Apesar das declarações do relator, de que a proposta não tem intenções eleitoreiras e de que será mais fácil aumentar a taxa do superávit primário se a economia crescer mais do que o previsto, não se pode negar que essa modificação virá a calhar para os propósitos do governo, que procura total liberdade para aumentar gastos durante a campanha eleitoral.
No entanto, o relator parece ter-se esquecido de que a função do superávit primário é pagar parte dos juros da dívida pública, e que os juros não pagos com parte do superávit se acrescentam à dívida mobiliária e acarretam aumento da emissão de títulos. A dívida líquida do governo federal cresceu R$ 6,180 bilhões de julho a agosto, mas, quando se examinam os fatores desse crescimento, verifica-se que ele se deve apenas ao aumento dos juros nominais, num montante de R$ 13,308 bilhões, enquanto os outros fatores contribuíram para reduzir a dívida líquida.
Apesar de uma redução das taxas de juros que incidem sobre a dívida pública do governo federal, um aumento dos juros não cobertos pelo superávit primário contribuirá para ampliar o total dessa dívida. Se os deputados tivessem plena consciência desse efeito colateral, deveriam, ao contrário, defender um superávit primário maior.
Infelizmente, a palavra "superávit" é enganosa, dando a impressão de que se trata de um valor superior às despesas, como se os juros não se constituíssem numa despesa a ser paga...
RADIOGRAFIA RURAL EDITORIAL FOLHA DE S. PAULO 2/10/2009
Censo Agropecuário do IBGE expõe ganhos de eficiência da agricultura nacional, que ainda tem longo caminho à frente O 10º CENSO Agropecuário do IBGE, com dados de 2006, compõe um retrato bifronte do campo brasileiro. A face mais à vista parece apontar um retrocesso, com o aumento da concentração de terras desde 1996. Por trás dela, contudo, vislumbra-se uma agropecuária pujante, que se moderniza e compete com sucesso no mercado global, embora ainda possa tornar-se muito mais eficiente. Em 2006, havia 5,2 milhões de estabelecimentos rurais no país, responsáveis por uma produção no valor de R$ 147 bilhões e por empregar 18,9% da população ativa. Dez anos antes, eram 4,9 milhões de propriedades. A área ocupada, que corresponde a 36,8% do território nacional, recuou 6,7%. Ou seja, o equivalente a 237 mil km2 a menos -uma superfície do tamanho de Rondônia. Produz-se mais, em volume e valor, com muito menos terra. Nesse processo de ganho de produtividade, aumentou 1,9% a concentração de terras medida pelo índice de Gini. Passou-se de 0,856 para 0,872 (quanto mais perto de 1, mais área na mão de menos proprietários). Ocorre que variaram pouco tanto a parcela da área total ocupada por latifúndios, de 45,1% para 44%, quanto a de minifúndios, de 2,2% para 2,4%. A concentração atingiu propriedades médias, segundo o IBGE, sob estímulo de cultivos de commodities, como soja, milho e algodão. Todos eles observaram avanços de produtividade entre os censos, com destaque para o milho (47,7%). Com todas as incertezas e dificuldades de que os empresários do agronegócio habitualmente se lamentam, estão investindo e conquistando mercado no mundo. Só a produção de soja aumentou 88% em uma década. A modernização alcança até a pecuária, poucas décadas atrás um símbolo de atraso no campo. Embora ocupe 62% da área total, representa só 10% da renda agrícola. Mas o rebanho bovino cresceu 12,1%, para 171 milhões de cabeças, mesmo com redução de 10,7% nas pastagens. Se em 1996 havia 0,86 cabeça por hectare, em 2006 a cifra subiu para 1,08/ha. Ainda distante, decerto, das 5/ha que a Embrapa indica ser possível manter com manejo adequado de pastos. Há, portanto, ampla margem para intensificar a pecuária bovina e aumentar a participação das exportações na produção, que já progrediu de 1,2% para 17,8%. Em paralelo, libera-se terra para aumentar o plantio de outras commodities sem avançar sobre áreas de vegetação primária, como exigem mercado e opinião pública dentro e fora do país. O censo aponta ainda muitas outras mazelas agrícolas brasileiras, como a baixa utilização de crédito -menos de um quinto dos estabelecimentos recorreu a financiamentos em 2006- e a carência de assistência técnica. A agropecuária vai bem, no final das contas, mas precisa ir muito melhor para aproveitar todo o potencial presente no país.
RECADOS DO BC EDITORIAL FOLHA DE S. PAULO 2/10/2009
O BANCO Central começa a modificar as mensagens sibilinas que transmite aos atores econômicos. Uma elevação da taxa básica de juros, a Selic, poderia ocorrer muito antes do esperado, talvez ainda neste ano de 2009. Influenciar as expectativas econômicas na base de conversas e recados cifrados é uma iniciativa comum entre as autoridades monetárias, no Brasil e em outros países. A lógica do BC, no caso, é induzir as pessoas que decidem os preços de bens e serviços na economia a moderar seu apetite por remarcações. Os juros negociados no mercado futuro -que norteiam as taxas dos empréstimos na praça- começaram a aumentar. Esse movimento responde à percepção de que a economia brasileira se acelera num ritmo superior ao anteriormente previsto. É cedo para fixar tendência nesse sentido, pois a atividade econômica volta de um mergulho atípico, provocado pela crise global. Por ora, há apenas uma confluência de vetores, todos redundando em expansão. Crescem, ao mesmo tempo, as importações, o crédito e o consumo privados, bem como os gastos do governo. A poupança que a União acumula -o chamado superavit primário- não é tão exígua desde 1998. À medida que nos afastamos da fase aguda da crise, a aceleração da despesa pública deixa de ter um papel estabilizador e passa a trabalhar contra a sustentação do crescimento: fomenta desnecessariamente o nível de consumo, numa economia já reanimada, e atiça a inflação. Pisar no acelerador dos gastos públicos quando o setor privado pressiona o freio é apenas um dos lados de uma política econômica que se queira "anticíclica". Um governo responsável também precisa cortar seus dispêndios quando as famílias e as empresas voltam às compras. Do contrário, o remédio conhecido -e repleto de efeitos colaterais- da alta dos juros será inexoravelmente aplicado.
BALANÇOS FRÁGEIS DOS BANCOS AMEAÇAM RETOMADA GLOBAL EDITORIAL VALOR ECONÔMICO 2/10/2009
O pior da crise econômica mundial pode ter passado, mas os balanços dos bancos ainda estão atulhados de lixo tóxico. Números nada animadores emergiram do mais recente Relatório de Estabilidade Financeira Global, divulgado nesta semana pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Se, por um lado, o FMI, reduziu o tamanho das perdas esperadas para o sistema financeiro em função da crise internacional, por outro constatou que menos da metade dos prejuízos foram digeridos até agora. A notícia não é ruim apenas para os acionistas dos bancos. O comprometimento dos balanços ameaça a recuperação econômica mundial. O Fundo projeta retração de 1,1% para o planeta neste ano e crescimento de 3,1% em 2010. Além disso, a vulnerabilidade dos bancos mantém os governos em estado de alerta e os tubos de oxigênio ligados. Divulgado duas vezes por ano, o novo Relatório de Estabilidade Financeira Global informou que as perdas mundiais com a crise do sistema financeiro, incluindo bancos, seguradoras e demais instituições, vão acumular US$ 3,4 trilhões entre 2007 e 2010. O montante é US$ 600 milhões menor do que os US$ 4 trilhões projetados no levantamento anterior, divulgado em abril. O número diminuiu com a valorização dos títulos no primeiro semestre, o que reduziu as perdas com a marcação a mercado. Houve também uma revisão metodológica que tornou mais precisa a avaliação dos prejuízos dos bancos europeus ao tomar como base o volume de provisões feitas. Apesar disso, o FMI espera prejuízos substanciais à frente. Os bancos, que já reconheceram US$ 1,3 trilhão em perdas até agora, ainda terão que enfrentar mais US$ 1,5 trilhão em baixas. A maior parte dos prejuízos, cerca de dois terços do total, virá das carteiras de crédito, e não mais dos títulos que causaram boa parte dos problemas iniciais. As perdas não são homogêneas e nem todos os países estão no mesmo estágio de digestão. Os técnicos do FMI dizem que os bancos americanos já baixaram 60% de suas perdas totais, enquanto os da zona do euro e do Reino Unido fizeram apenas 40% da lição de casa. A defasagem é resultado de vários fatores entre eles a diferença de ciclo de crédito, de princípios contábeis e de composição dos balanços. Se os bancos americanos terão mais perdas com créditos residenciais e com títulos, os ingleses e da zona do euro perderão mais com créditos externos, feitos em geral para países do Leste Europeu. A conta também recai de modo diferenciado. As perdas em proporção ao tamanho do sistema bancário de cada região são maiores nos EUA e Reino Unido do que nas instituições da zona do euro. Os bancos americanos ficarão com a maior parte da conta. Serão US$ 1,025 trilhão em baixas - 8,2% do total de US$ 12,561 trilhões em ativos. O lado positivo é que US$ 610 bilhões já foram digeridos e uma quantia menor, de US$ 420 bilhões ainda vem pela frente. Nos bancos ingleses, as perdas totais devem atingir US$ 604 bilhões, dos quais apenas US$ 260 bilhões já foram reconhecidas. Do total de baixas, quase US$ 500 bilhões são com crédito. Já os prejuízos previstos para os bancos da zona do euro somam US$ 814 bilhões, sendo US$ 470 bilhões a serem contabilizadas. Os bancos voltaram a registrar lucro graças à injeção de dinheiro promovida pelos governos, melhoria dos mercados e o refinanciamento dos ativos imobiliários. Mas as margens estão pressionadas pela queda das taxas de juros e custos mais elevados de captação. A volta aos produtos financeiros mais simples também deverá reduzir a rentabilidade. As receitas antes das provisões só devem voltar aos padrões "normais" no fim de 2014. Essa constatação explica a mão leve do G-20 no cronograma de reformas esperadas para o setor financeiro. As reformas são necessárias para fortalecer o sistema e coibir os abusos e o renascimento das práticas perniciosas e obscuras que proliferaram no casino financeiro nos últimos anos e desencadearam a crise. Se os bancos tivessem que se enquadrar em padrões mais rigorosos de capital, as perdas seriam maiores. Assim, as novas regras de capital mínimo serão calibradas no próximo ano para entrar em vigor em etapas nos anos seguintes, à medida que a economia se recuperar, e serão postas em prática apenas no fim de 2012.
INVESTIGAÇÃO ABORTADA EDITORIAL A GAZETA (ES) 2/10/2009
A transparência de atos, que deveria ser um dogma do setor público, sofre um lamentável revés. O Congresso não mais instalará a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que analisaria o repasse de recursos públicos para o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.
Há até dois dias, quando foi lido o requerimento para a sua instalação, a CPMI do MST parecia favas contadas. Tinham sido arrecadadas 183 assinaturas de deputados e 34 de senadores. Era mais do que o necessário. A criação de uma CPI mista exige 171 adesões na Câmara e 27 no Senado. Com a leitura, os parlamentares tinham até a meia-noite de quarta-feira para retirar as assinaturas. Quinze deputados o fizeram, restando, portanto, 168 adesões.
Forças governistas se articularam intensamente para que isso acontecesse, suscitando duas interrogações. Uma sobre o que teria levado 15 deputados a mudar de posição. O que os levou a retirar as assinaturas? Seria razoável que eles próprios explicassem o recuo aos seus eleitores, aos colegas de Legislativo e ao país.
O outro questionamento é sobre o interesse do Palácio do Planalto em abortar essa CPI. Por que o repasse dos recursos – que não são do governo e sim da população – não podem ser debatidos no âmbito do Legislativo? Por que evitar a transparência?
Na operação de desarme da CPMI do MST, os parlamentares aliados ao Executivo agiram com mais eficiência do que o fizeram em relação à CPI da Petrobras. Como não conseguiram impedi-la, passaram a controlá-la. A base governista ocupa 8 das 11 cadeiras na comissão.
O argumento do Executivo de que as CPIs podem ser transformadas em palanques políticos para a oposição não parece consistente. Tal possibilidade seria anulada pela transparência, sem qualquer restrição, das contas e dos atos administrativos dos órgão investigados. Mas isso pressupõe que neles não haja manchas.
A tentativa da oposição para que fosse criada a CPMI do MST remonta a antigas e persistentes denúncias sobre o financiamento público inadequado. A suspeita de que cooperativas e ONGs legalmente constituídas, com CNPJ, seriam organizações de fachada do MST, criadas especialmente para driblar a lei e receber repasses do governo federal.
A esse propósito, vale lembrar o relatório final da extinta CPMI da Terra apresentado ao Congresso no início de março último. O documento pede a devolução aos cofres públicos de R$ 18 milhões a entidades que seriam ligadas ao MST. Poucos meses depois, em junho, a então CPI Mista das ONGs, embora tivesse governistas à frente de seus postos-chaves, acumulava relatórios sobre 19 entidades suspeitas de uso indevido de recursos obtidos em convênios com a União.
Além da controvérsia dos repasses, em relação aos destinatários, recentemente foi denunciada falha gritante na fiscalização do uso de recursos estatais – o que obviamente gerou discussões no Congresso e na sociedade.
Em junho último, uma manchete de O Globo causou perplexidade. Informava que o Tribunal de Contas da União constatou que em 2008 ficaram sem fiscalização do Executivo federal pelo menos 38 mil prestações de contas referentes a repasses de R$ 13,3 bilhões a ONGs, Estados e municípios, por meio de convênios. Portanto, nem sequer é possível saber se esse vultoso montante foi empregado conforme as finalidades previstas. É absolutamente inadmissível esse apagão fiscal.
A não instalação de nova CPI no Congresso não deve inibir denúncia, desde que fundamentada em fatos concretos, sobre mal uso de recursos públicos.
AQUECIMENTO PREOCUPANTE EDITORIAL ESTADO DE MINAS 2/10/2009
Especialistas afirmam que os custos são factíveis para os países ricos
Tomando-se como parâmetro os valores a serem desembolsados, a luta contra o aquecimento global vai exigir uma atuação obstinada dos países industrializados entre 2010 e 2050. Juntos terão que pagar entre US$ 75 bilhões e US$ 100 bilhões anuais às nações em desenvolvimento. Pelo menos é o que alerta o estudo divulgado pelo Banco Mundial, segundo o qual os maiores custos de adaptação se produzirão no Extremo Oriente e no Pacífico, na América Latina, no Caribe e na África Subsaariana. O relatório foi apresentado em Bangcoc, na Tailândia, numa reunião sobre mudança climática promovida pela Organização das Nações Unidas (ONU), ante 4 mil delegados, para discutir o documento que vai substituir o Protocolo de Kyoto, que expira em 2012. Os países industrializados se comprometeram a financiar projetos nos países menos desenvolvidos para reduzir as emissões de gases do efeito estufa, causadores do aquecimento global.
Segundo o documento da instituição multilateral, há dois possíveis cenários: um de clima mais seco, no qual o custo seria de US$ 75 bilhões; e outro mais úmido, no qual o número ascenderia aos US$ 100 bilhões. "O acesso a um financiamento necessário é crítico para que os países em desenvolvimento possam enfrentar o aumento das secas, as doenças e a redução da produtividade agrícola que a mudança climática vai gerar", assinalou a vice-presidente para Desenvolvimento Sustentável do Banco Mundial, Katherine Sierra. Ela precisou que o financiamento do próximo Protocolo de Kyoto vai se igualar ao que atualmente gasta a instituição em ajudas para o desenvolvimento. O efeito adverso da mudança climática na produção de alimentos causará a fome de 25 milhões de crianças em 2050, se não se tomar medidas para evitá-lo, adverte o Instituto Internacional de Política Alimentar. O estudo afirma que os habitantes dos países em desenvolvimento terão acesso a 2.410 calorias diárias em 2050, 286 calorias a menos que em 2000; na África será de 392 a menos; e nos países industrializados, 250 a menos. Os líderes do G20 acordaram na semana passada em Pittsburgh (EUA) doar US$ 2 bilhões para combater a fome, enquanto a ONU anunciou uma cúpula sobre o problema em novembro.
O estudo deixa claro que realizar as ações em favor da adaptação dos países em desenvolvimento economizará custos no futuro e reduzirá riscos inaceitáveis. Pelo posto, mais do que nunca, a moderação, adaptação e desenvolvimento são necessários para que os países pobres sejam menos vulneráveis à mudança climática e para não pôr em perigo os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio fixadas pela ONU. Os custos são factíveis para os países ricos, a julgar por seu Produto Interno Bruto (PIB). Só que, no papel, tudo são flores. Espera-se que, na hora do vamos ver, as chaves dos cofres desses países estejam em mãos ponderadas e comprometidas com o bem-estar do planeta. Sem isso, tudo o que se discute agora se tornará uma grande utopia.
A CONVOCAÇÃO DOS RICOS PARA O PÓS-KYOTO EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE 2/10/2009
A luta contra o aquecimento global exigirá atuação obstinada dos países industrializados entre 2010 e 2050. Juntos, terão que pagar entre US$ 75 bilhões e US$ 100 bilhões anuais às nações em desenvolvimento. É o que alerta estudo divulgado pelo Banco Mundial, segundo o qual os maiores custos de adaptação se produzirão no Extremo Oriente e no Pacífico, na América Latina, no Caribe e na África Subsaariana. O relatório foi apresentado em Bangcoc, na Tailândia, em reunião sobre mudança climática promovida pela Organização das Nações Unidas (ONU), ante 4 mil delegados, para discutir o documento que substituirá o Protocolo de Kyoto, que expira em 2012. Os países industrializados se comprometeram a financiar projetos nos países menos desenvolvidos para reduzir as emissões de gases do efeito estufa, causadoras do aquecimento global.
Segundo a ONU, há dois possíveis cenários: um para clima mais seco, ao custo de US$ 75 bilhões; outro para clima úmido, no qual o número ascenderia a US$ 100 bilhões. “O acesso a um financiamento necessário é crítico para que os países em desenvolvimento possam enfrentar o aumento das secas, as doenças e a redução da produtividade agrícola que vai gerar a mudança climática”, assinalou o vice-presidente para Desenvolvimento Sustentável do Banco Mundial, Katherine Sierra. Ele precisou que o financiamento do sucessor do Protocolo de Kyoto igualará ao que atualmente gasta a instituição em ajudas para o desenvolvimento. O efeito adverso da mudança climática na produção de alimentos causará a fome de 25 milhões de crianças em 2050, se não forem tomadas medidas para evitá-lo, advertiu entidade internacional especializada. O estudo afirma que os moradores dos países em desenvolvimento terão acesso a 2.410 calorias diárias em 2050, 286 a menos que em 2000; na África, serão 392 menos; nos países industrializados, 250 menos. Os líderes do G-20 acordaram na semana passada, em Pittsburg (EUA), a doação de US$ 2 bilhões para o combate à fome, enquanto a ONU anunciou uma cúpula sobre o tema em novembro.
O estudo deixa claro que realizar as ações em favor da adaptação dos países em desenvolvimento economizará custos no futuro e reduzirá riscos inaceitáveis. Pelo posto, mais do que nunca, a moderação, adaptação e desenvolvimento são necessários para que os países pobres sejam menos vulneráveis à mudança climática e para não pôr em perigo os objetivos de desenvolvimento do milênio fixados pela ONU. Os custos são factíveis para os países ricos, a julgar pelos respectivos Produtos Internos Brutos (PIB). Só que, no papel, tudo são flores. Espera-se que, na hora do desembolso, as chaves dos cofres desses países estejam em mãos ponderadas e comprometidas com o bem-estar do planeta. Sem isso, tudo o que se discute agora se tornará uma grande utopia.
PAPEL DO GEFRON EDITORIAL DIÁRIO DE CUIABÁ (MT) 2/10/2009
Longe de Cuiabá e distante dos olhares da imprensa, Mato Grosso enfrenta uma luta incessante contra o narcotráfico na extensa fronteira seca de 730 km com a Bolívia nos municípios de Cáceres, Porto Esperidião, Vila Bela da Santíssima Trindade e Comodoro.
A luta contra o narcotráfico e outros crimes transnacionais, a exemplo do contrabando de armas, é travada pelos policiais do Grupo Especial de Fronteira (Gefron), que faz policiamento ostensivo em pontos móveis e fixos nas rodovias que cruzam a região fronteiriça em todas as direções.
Em muitos pontos da fronteira o Gefron é a única presença do Estado brasileiro. Seus efetivos transmitem segurança e confiança aos moradores da área, que por muito tempo, antes de sua criação, viviam clima de terror pelas incursões de quadrilhas supranacionais que agiam nos dois lados da linha imaginária que une o Brasil e a Bolívia.
Constitucionalmente o papel da segurança policial nas fronteiras é de competência da União. Porém, diante da crônica ausência de policiais da esfera federal na região, Mato Grosso optou por uma parceria com o governo federal, que lhe proporciona suporte logístico e lhe cedeu viaturas e armamentos, o que resultou na criação do Gefron.
No bom sentido o Estado usurpa atribuição federal. O resultado é o melhor possível, dentro da realidade que cerca o tráfico internacional de drogas. Os narcotraficantes continuam cruzando a fronteira, como acontece no mundo inteiro. Porém, o saldo de apreensão de cocaína e de prisões é altamente positivo, e além disso, com a forte presença do Gefron, torna-se difícil a entrada da droga no Brasil, o que não acontece em outras fronteiras pela fragilidade da fiscalização.
Some-se ao resultado do combate ao narcotráfico a verdadeira blindagem do Gefron à passagem para a Bolívia de veículos roubados e furtados no Brasil, para serem trocados por droga, ou até mesmo serem vendidos sem que tais operações tenham a ver com o tráfico internacional de drogas.
A atuação do Gefron é motivo de orgulho para Mato Grosso. Tomara que esse grupo policial ganhe mais efetivos, receba novos e modernos equipamentos de comunicação, que seja reforçado com a inclusão de aeronaves pilotadas ou não, e que amplie - a boa - interatividade com os destacamentos militares do 2º Batalhão de Fronteira de Cáceres e com a Polícia Federal.
A presença do Gefron é imprescindível para o enfrentamento ao narcotráfico na fronteira com a Bolívia. Sua atuação resulta na redução dos impactos das drogas em Cuiabá, cuja face mais visível é a banalização da violência.
Com a atuação do Gefron Mato Grosso demonstra competência, mas além de policiais a região também exige presença do Estado em todas as suas esferas. Soberania implica em presença social, e essa somente se viabiliza quando a cidadania é assegurada por meios dos direitos básicos do cidadão, e isso, infelizmente ainda não existe na fronteira com a Bolívia.
“Com a atuação do Gefron Mato Grosso demonstra competência”
SABATINA À MODA DA CASA EDITORIAL GAZETA DO POVO (PR) 2/10/2009
Na última quarta-feira o Senado Federal bateu o martelo: José Antonio Dias Toffoli será o mais novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Desde que foi indicado pelo presidente Lula, o nome de Toffoli causou polêmica na imprensa, no meio político e na comunidade jurídica. E o questionamento era sempre o mesmo: preencheria Toffoli os requisitos constitucionais do notável saber jurídico e da reputação ilibada? Pois bem, quanto ao notável saber jurídico, logo se apontou, como possíveis deficiências, que ele havia sido reprovado em dois concursos para juiz e que não possuía os títulos de mestre nem de doutor – argumentos que poderiam ser considerados no debate, mas que não parecem ser determinantes para o preenchimento ou não da vaga no STF. Já no que diz respeito à reputação ilibada, veio à tona o fato de que sobre Toffoli pesava uma condenação da Justiça do Amapá. A condenação determinava o ressarcimento de valores aos cofres públicos daquele estado, em decorrência de supostas irregularidades na contratação do escritório do qual era sócio. Mas os efeitos da condenação, em razão de um recurso interposto, foram logo suspensos. Desse modo, até a última quarta-feira, a única certeza, de fato, era a de que Toffoli, com 41 anos de idade, preenchia o terceiro requisito constitucional: a idade mínima de 35 anos. Dos três, aliás, o único requisito de caráter eminentemente objetivo. Mas por qual razão, então, o presidente Lula escolheu José Antonio Dias Toffoli? Provavelmente porque, na visão dele, Lula, o advogado de suas campanhas presidenciais e advogado-geral da União por quase dois anos preencheria todas as condições estabelecidas na Constituição Federal de 1988. Não existiriam nomes de maior consenso ou de menor rejeição? Certamente sim. Muitos seriam os juristas aptos a ocupar uma vaga na corte máxima. Por isso, é também preciso reconhecer que, em qualquer hipótese, haveria sempre mais de um nome possível e, por consequência, a necessidade de uma escolha que, inevitavelmente, seria sempre do¬¬tada de um razoável grau de subjetivismo. Em um Estado Democrático de Direito, então, como seria possível minimizar esse subjetivismo? O mecanismo escolhido pelo legislador constituinte foi o de submeter a indicação do presidente da República ao crivo do Senado Fe¬¬de¬¬ral, em uma fórmula bastante similar à adotada, por exemplo, nos Estados Unidos da América. Aqui, entretanto, começam as diferenças. Nos Estados Unidos, recentemente, a juíza Sonia Sotomayor foi sabatinada no Senado durante quatro dias. A aprovação da Comissão Judiciária do Senado – que poderia ser comparada à brasileira Comissão de Constituição, Justiça e Cida¬¬dania (CCJ) – ocorreu mais de uma semana depois e a votação final em plenário, com a aprovação definitiva do seu nome, ocorreu aproximadamente 20 dias depois do término da sabatina. Um processo, que, sem dúvida, permitiu um amplo debate por parte dos senadores e da sociedade norte-americana. No Brasil, por sua vez, como foi realizado o processo? Em não mais de um dia. Toffoli foi sabatinado na CCJ por aproximadamente 8 horas. A aprovação do seu nome naquela comissão ocorreu logo em seguida (20 votos favoráveis e 3 contrários) e, ato contínuo, o nome do novo ministro foi aprovado pelo plenário do Senado (58 votos favoráveis, 9 contrários e 3 abstenções). Que seriedade se pode atribuir a um procedimento como o acima narrado? Os senadores que não participaram da sabatina tiveram acesso às manifestações de Toffoli? Tomaram conhecimento das respostas e das explicações dadas à Comissão de Constituição e Justiça? Tiveram tempo de analisar, refletir e debater minimamente sobre a pessoa e sobre as linhas de pensamento do indicado? É evidente que não. O Senado Federal, mais uma vez, falhou. E falhou não por¬¬que aprovou o nome de José Antonio Dias Toffoli, mas sim porque o fez sem a devida análise, por conveniências e circunstâncias meramente políticas. Falhou porque não cumpriu com rigor a missão que lhe foi fixada na Consti¬¬tuição Federal, qual seja a de avaliar e fazer um juízo crítico sobre o nome indicado pelo presidente da República. Falhou na incumbência de, com seriedade, avaliar se os requisitos constitucionais definidos para o cargo se encontravam plena e cabalmente atendidos, principalmente no que diz respeito ao conhecimento jurídico e à reputação ilibada. Há poucos dias, neste mesmo espaço, assim se escreveu: “Espera-se que o processo de análise e aprovação do nome do novo ministro do Supremo Tribunal Federal seja realizado de uma maneira histórica e exemplar. Tudo isso para que os brasileiros possam confiar nas suas instituições e, também, para que o futuro ocupante da cadeira possa ter a real dimensão da sua conquista e da função ímpar que passará a exercer.” Contudo, como se pode perceber, ainda não foi desta vez que o Senado da República demonstrou um mínimo de comprometimento com a sociedade brasileira, com as instituições e, principalmente, com a Constituição Federal de 1988. E para esse comprometimento – ao contrário do verificado no processo de aprovação do novo ministro – parece não haver pressa. É que a favor e ao lado dos nobres senadores segue sempre a infindável e santa paciência do povo brasileiro. E é justamente pelo bem desse povo que se deseja a Toffoli sucesso na sua nova função. Que possa ele demonstrar competência, serenidade e imparcialidade no compromisso que firmou com a Constituição.
O VAZAMENTO NO ENEM EDITORIAL ZERO HORA (RS) 2/10/2009
O ministro da Educação, Fernando Haddad, agiu com sensatez e firmeza ao adiar para novembro a prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) marcada para o próximo final de semana e para a qual estão inscritos mais de 4 milhões de candidatos em 1,8 mil cidades. Um teste desta abrangência para o país, do qual muitos estudantes dependem para ingresso na universidade e para a obtenção de bolsas de estudo do ProUni, não pode conviver com qualquer suspeita de fraude, muito menos com um crime das proporções do que foi descoberto. Mas, ainda que o Ministério da Educação (MEC) tenha se comprometido em conter ao máximo os prejuízos para o poder público e para os inscritos e que a Polícia Federal esteja no encalço dos criminosos, um ato desse tipo merece uma reflexão mais demorada, não apenas no meio educacional.
Mesmo num país historicamente leniente com pequenas fraudes e jeitinhos no cotidiano e incapaz de enfrentar com um mínimo de eficiência o mau uso de dinheiro público e a corrupção, fica difícil de entender como alguém pode se imaginar tirando vantagem prejudicando justamente quem estuda para assegurar uma forma honesta de ganhar a vida. No caso do Enem, os prejuízos seriam ainda mais graves se a fraude tivesse sido revelada só depois da realização da prova, o que exigiria sua anulação. Isso só não ocorreu porque, como lembrou ontem o ministro da Educação, o jornal O Estado de S. Paulo, ao ser procurado por pessoas interessadas em vender as provas por R$ 500 mil, denunciou o esquema. A particularidade de os criminosos não terem se contentado apenas em comercializar o que deveria estar sob rigoroso sigilo, mas também de envolver a mídia no esquema, alegando que “isto aqui é muito sério, derruba o ministério”, torna o caso ainda mais grave. Como não poderia deixar de ser, o jornal denunciou o fato às autoridades, que agora devem, além de explicações para o país, uma apuração rigorosa e conclusiva.
Ninguém desconhece a dificuldade de aplicação de uma prova cujo enfoque foi nacionalizado e com um número de inscritos que se amplia a cada ano, num país de dimensões continentais como o Brasil. Ainda que o MEC assegure ter tomado todas as precauções para evitar qualquer risco de as questões se tornarem conhecidas antes da aplicação do teste, é lamentável que tenha havido alguma margem para a atuação de inescrupulosos.
Os brasileiros não podem aceitar como inevitáveis crimes como a transformação de questões da prova prevista para o fim de semana em pretexto para ganhos financeiros ilícitos, com prejuízos de toda ordem para milhões de pessoas. Esse é o tipo de risco que precisa ser enfrentado sobretudo com rigor na prevenção e na repressão por parte do poder público, mas acima de tudo pelo rechaço permanente da sociedade a qualquer tipo de transgressão.
UM SETOR ESSENCIAL EDITORIAL ZERO HORA (RS) 2/10/2009
O Censo Agropecuário 2009 traz uma novidade: pela primeira vez, a agricultura familiar brasileira é retratada em bases científicas nas pesquisas realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O setor emprega quase 75% da mão de obra no campo e é corresponsável pela segurança alimentar dos brasileiros ao produzir 70% do feijão, 87% da mandioca, 58% do leite, 59% do plantel de suínos, 50% das aves, 30% dos bovinos e, ainda, 21% do trigo consumidos no país. Foram identificados 4,3 milhões de estabelecimentos de agricultura familiar (incorporadas aí também as pequenas propriedades), 84,4% do total, mas ocupam apenas 24,3% (ou 80,25 milhões de hectares) da área dos estabelecimentos agropecuários brasileiros. Globalmente, 38% dos produtos agrícolas e pecuários brasileiros se originam desse esforço, mas eles compõem cerca de 70% dos itens da cesta básica.
São informações preciosas não apenas para a valoração adequada de cada ramo da economia primária brasileira, mas especialmente para a elaboração de políticas públicas que contemplem efetivamente os interesses de toda a agricultura. Diante dos números e da relevância social e econômica, seja da agricultura familiar, seja da empresarial ou de grande porte, o óbvio é que a cada uma delas seja conferida a importância efetiva que tem, relegando-se a um passado irrelevante as polêmicas em relação à preponderância de uma sobre a outra. Os números do IBGE são eloquentes. Ambas são indispensáveis e se complementam. Se a agricultura familiar produz mais feijão, milho, mandioca, aves e suínos que a empresarial, esta produz mais arroz, soja, trigo e bovinos. Ambas estão na mesa de cada brasileiro e, de quebra, fornecem excedentes para o esforço de exportação do qual o país não pode abrir mão. Por isso, não há razão inteligente nem motivo prático para que esses dois braços da economia agrícola não estejam unidos pela grandeza do país, pela sustentação de seu mercado interno e externo e pela construção de um pujante mercado de trabalho, com a distribuição justa e ampla dos efeitos do progresso.
FINANCIAMENTO CONTINENTAL EDITORIAL DIÁRIO DE PERNAMBUCO 2/10/2009
Os países pobres e emergentes do continente sul-americano, reunidos na paradisíaca Isla Marguerita, possessão da Venezuela, finalmente assinaram o documento de fundação do Banco do Sul como será chamada a instituição destinada a financiar projetos de infraestrutura nesta parte do mundo, e mais projetos agrícolas e também os relacionados com a saúde da população. Firmaram o documento em questão os dirigentes da Bolívia, Evo Morales, Equador, Rafael Correa, Paraguai, Fernando Lugo, Uruguai, Tabaré Vasquez, Argentina, Cristina Kirchner, Venezuela, Hugo Chávez, e também o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Esperam-se outras adesões, pois não é imaginável que os demais países tenham, desta maneira, razões fortes que deixem de firmar o histórico documento, ficando assim de fora das futuras linhas de financiamento a juros baixos e outras condições favoráveis.
Os países da América Latina, em geral, e da América do Sul, no particular, vinham emitindo queixas periódicas, a fim de significar que as grandes organizações multilaterais de fomento não estavam fazendo e nunca fizeram o suficiente para dotar a região de infraestruturas adequadas, e isto graças à alegada escassez de dinheiro. Quando apelavam ao maior acionista do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), no caso os Estados Unidos, ou tinham por resposta que os projetos apresentados à consideração eram de má qualidade, ou que os trâmites para o aumento do capital eram pela própria natureza demorados. Houve época em que o Banco Internacional de Reconstrução e Fomento (BIRD), o chamado Banco Mundial, passava por semelhantes dificuldades, e lembrava que em algumas oportunidades nem todos os créditos em dinheiro eram cabalmente utilizados no tempo assinalado nos respectivos projetos. Na realidade, inúmeros projetos dessa instituição continham a cláusula da coparticipação nos dispêndios que nem sempre puderam ser disponíveis no caixa dos países beneficiários. Ter-se-iam seguido inúmeras paralisações e alguns cancelamentos de crédito pelo desuso em tempo hábil.De todas as circunstâncias que rodeavam de dificuldades alguns dos projetos patrocinados ou pelo BID ou pelo Banco Mundial, na região sul-americana, restou para inúmeros governos certo desencanto de tratar com as duas poderosas agências de desenvolvimento. Seguiu-se à decepção o desejo inicialmente manifestado pela Venezuela de se ter um banco próprio dos governos locais da área que trabalhasse de maneira desenvolta na tomada das decisões e que dependessem menos possível dos arautos de Washington.
O Banco do Sul iria trabalhar, de início, com a disponibilidade de US$ 7 bilhões, mas logo os fundadores chegaram à conclusão de que a quantia, de tão minguada, não seria útil a fomentar o primeiro salto. Então, os presidentes reunidos na Isla Marguerita subiram o capital original para US$ 20 bilhões, com que esperam começar os programas sul-americanos dispondo de capital próprio da região. É oportuno lembrar que o banco, uma vez credenciado nos organismos internacionais, poderá por sua vez transformar-se em agentede terceiros, ou seja, de provedores de capital poderosos que há na Europa e nos Estados Unidos, com o que se aumentariam as possibilidaedes de aplicação nesta área carente do mundo. Não é impossível ver o BID e o BIRD crescerem as respectativas disponibilidades já agora, ante o fato consumado de que terão pela frente um concorrente a mais.
VEREADORES EM EXECESSO EDITORIAL DIÁRIO DO NORDESTE (CE) 2/10/2009
A aprovação, pelo Congresso Nacional, da Emenda Constitucional 58, em desacordo com as normas fixadas pelo Tribunal Superior Eleitoral, vem provocando desdobramentos de toda natureza. Afinal, a ampliação do número de vereadores às Câmaras Municipais, de 51.988 para 59.611, só poderá ocorrer por ocasião do pleito de 2012, sendo este entendimento ponto pacífico entre os operadores do Direito.
Entretanto, contrariando o bom senso, os suplentes, candidatos em potencial às 7.623 novas vagas de vereador, estão pressionando as Câmaras Municipais, exigindo a posse imediata, apesar das disparidades de opiniões existentes em torno desse direito. O conflito envolve aspectos jurídicos e políticos e demonstra como atua o Congresso Nacional quando estão em jogo os interesses imediatos dos parlamentares. Essa Emenda foi aprovada em tempo recorde.
As consequências já se fazem sentir: a Procuradoria Geral da República ajuizou com o Supremo Tribunal Federal ação direta de inconstitucionalidade contra o dispositivo incluindo na Emenda embasando a posse agora. Para o procurador-geral, "sem qualquer justificativa, a alteração constitucional promove imensa interferência em eleições já encerradas." A Adin pediu a concessão de medida liminar.
Outro aspecto enfatizado pelo recurso diz respeito aos efeitos causados nos municípios, "onde os cálculos dos quocientes eleitoral e partidário estão sendo refeitos, com a nova distribuição de cadeiras a depender dos números obtidos, podendo trazer à concorrência partidos que não obtiveram lugares anteriormente." O resultado inevitável da intervenção casuística é a crise de legitimidade alimentada pelos parlamentares. Também a Ordem dos Advogados do Brasil contestará a chamada PEC dos Vereadores no Supremo Tribunal Federal. Como já havia deliberado sobre a matéria, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) oficiou aos Tribunais Regionais Eleitorais reiterando o seu entendimento sobre a matéria: a PEC não poderá entrar em vigor nesta legislatura. Recomenda, ademais, que os TREs não deem posse aos suplentes.
Em junho de 2007, por decisão unânime, o Tribunal Superior Eleitoral havia deliberado que a emenda constitucional não retroage. A jurisprudência se aplica a este caso.
Por todo o País, os suplentes procuraram tornar os fatos consumados. A Câmara de Bela Vista de Goiás foi a primeira a dar posse a dois suplentes. Na Câmara Municipal de Palmas - TO, a pressão é pela posse de nove suplentes. No Ceará, os juízes eleitorais começaram a apreciar as ações interpostas pelos promotores de Justiça, contra a posse dos suplentes, ávidos pelos recursos do erário.
A primeira decisão foi da juíza de Icó, Mabel Viana Maciel, deferindo pedido de liminar em ação cautelar interposta pelo Ministério Público, para que a Câmara Municipal se abstenha de dar posse aos suplentes. O descumprimento implicará em multa diária de R$ 5 mil, até que a Justiça esclareça este conflito de legislação.
Numa fase em que o Congresso Nacional tenta chancelar com tintura de legalidade nomeações feitas mediante atos secretos, torna-se salutar a manifestação do Supremo Tribunal Federal sobre esse tipo de "trem da alegria" com quase oito mil suplentes sem votos para a consagração nas urnas.
PRIMEIRO PASSO DE UMA LONGA CAMINHADA EDITORIAL A CRÍTICA (AM) 2/10/2009
O cidadão Wallace Souza deixou ontem a vida pública, ao menos por enquanto, pela porta dos fundos. Abatido por denúncias contundentes, não soube provar, de maneira igualmente contundente, a própria inocência. Terminou cassado e com os direitos políticos suspensos por oito longos anos.
O desfecho dessa carreira, que pode ser vista como coletiva dado a ligação umbilical estabelecida com o vice-prefeito de Manaus e um vereador à Câmara Municipal, foi tornando-se previsível a medida em que os fatos vieram à tona. A ligação suspeitíssima com um cidadão preso por tráfico de drogas, retratado ao lado dele num prosaico banho de piscina; as estripulias e as suspeitas que recaem sobre o filho, hoje preso num batalhão da Polícia Militar; e a própria forma de tocar o programa televisivo que lhe deu fama, foram construindo, tijolo-a-tijolo, o que ocorreu ontem. Wallace, ressalve-se novamente que por enquanto, sai de cena, mas deixa um estilo que ameaça tomar conta da vida política, deixa de herança latente uma forma equivocada de traduzir as angústias populares de maneira popularesca, escrachada e de mais baixo nível.
Ressalte-se que as cortinas da vida pública baixaram sobre a carreira de Wallace, mas nos bastidores sua força política vai continuar junto aos irmãos, hoje autoridades constituídas, e na forma do capital político amealhado com milhares de votos. Não se pode desprezar esse potencial. A respeito disso, é bom lembrar que ao longo dos anos em que esteve com sucesso na vida pública, Wallace foi cortejado, adulado e teve o nome diversas vezes cotado para realizar vôos mais altos.
Por fim, como nos alerta especialista em sociologia ouvido por A CRÍTICA, a cassação do deputado não é um fim em si mesmo. É preciso mais! Cabe agora a polícia, ao Ministério Público e a Justiça esclarecerem definitivamente qual a participação do deputado nos crimes que lhe são imputados. Qual o nível do envolvimento dele com a organização criminosa que infelicitou a vida de muitos amazonenses. Só com um trabalho completo, para além da punição política dada ontem, que desvende todos os meandros do caso, que o responsabilize ou o absolva, teremos um final aprovado pela sociedade civil. O primeiro passo foi dado, mas a caminhada em busca do esclarecimento ainda está longe de terminar. |