EDITORIAIS 30/9/2009
EDITORIAL
O GLOBO
30/9/2009
Com exceção do próprio futebol, as Olimpíadas equivalem a uma Copa do Mundo para todos os demais esportes. É um momento mágico, para o qual se voltam as atenções de bilhões de pessoas em todo o planeta. Tal congraçamento das diferentes modalidades de competições estimula os atletas de alto desempenho, revigora os programas de treinamento, atrai patrocinadores e ainda viabiliza investimentos importantes nas cidades sedes dos Jogos.
No caso do Rio, esse impacto não ficaria circunscrito ao município.
Estudo encomendado pelo Ministério dos Esportes à Fundação Getulio Vargas conclui, com base em metodologia internacional, que seriam gerados, por conta do evento, 120 mil empregos em todo o Brasil até 2016, e depois das Olimpíadas, até 2020, mais 130 mil postos de trabalho. Isso porque um evento dessa magnitude envolve planejamento, projetos e obras de engenharia, melhoria em transportes, e, principalmente, preparação e qualificação profissionais.
Caso a escolha do Rio se confirme, serão os primeiros Jogos Olímpicos na América do Sul. Os holofotes da mídia internacional não estarão focados apenas no esporte em si, mas também no jeito de ser dos brasileiros e na nossa diversidade.
Isso despertará naturalmente a curiosidade de milhões de visitantes em potencial. E pode ser até que o destino turístico não seja o Rio, mas outras regiões do país, de Norte a Sul.
Até 2016 espera-se que o Rio e o Brasil acumulem avanços sociais, econômicos, ambientais e urbanos relevantes.
O Rio sediou, com sucesso, o Pan-Americano de 2007. Em breve será também sede dos Jogos Militares. E para a Copa do Mundo já foi escolhido pela Fifa para abrigar o centro de mídia e organização do campeonato.
Assim, parte expressiva das instalações que podem ser usadas nas Olimpíadas já está com meio caminho andado. Das quatro cidades concorrentes, o Rio é a que oferece as melhores condições para receber o evento em 2016, pois todas as modalidades de esportes seriam disputadas em um raio de menos de 40 quilômetros. E com um visual de dar inveja.
ALMOÇO GRÁTIS
EDITORIAL
O GLOBO
30/9/2009
Como já era do estilo do governo Lula àquela altura do segundo mandato, o resultado do leilão de concessões de sete trechos de rodovias federais, realizado em outubro de 2007, foi bastante politizado.
Decidido a jogar para baixo o preço dos pedágios, o Palácio não resistiu à tentação de mudar o critério usual dos leilões, em que se concedia maior peso ao pagamento da outorga pelos interessados, e, num lance populista, passou a decidir as disputas pela oferta de maior desconto sobre a tarifa a ser cobrada aos usuários.
O aparente sucesso da rodada de concessões foi saudado como um Ovo de Colombo. No leilão de trechos de estradas no Rio de Janeiro, São Paulo, Minas, Paraná e Santa Catarina os deságios oferecidos pelas empresas privadas chegaram a 65%. O pedágio inicial do trecho leiloado na Fernão Dias (São Paulo-Belo Horizonte) foi de R$ 0,99. Eufórico, Lula — que já havia montado o palanque de Dilma Rousseff, relacionada diretamente ao aparente êxito do novo modelo de leilão — aproveitou um “Café com o presidente” para autolouvações e criticar o governo tucano de Fernando Henrique Cardoso, o qual teria privatizado estradas sem se preocupar com o usuário —, tanto que a Dutra (Rio-São Paulo), exemplo citado por Lula, cobrava R$ 7 por trecho.
O uso político-eleitoral do leilão — retardado em cinco anos por objeções ideológicas dentro do governo — foi tão intenso que o governador tucano de São Paulo, José Serra, preferiu incluir num edital de licitação de estradas estaduais o conceito misto de outorga e deságio nas tarifas.
Mas como, na vida real, não há almoço grátis, as concessionárias que protagonizaram aquele leilão de 2007 começam a reivindicar revisões adicionais nos pedágios — como chegou a ser previsto à época. Os baixos valores oferecidos nos leilões se tornaram bastante gravosos à medida que o governo federal começou a não cumprir prazos com os quais se comprometera, para permitir às concessionárias colocar postos de pedágio em funcionamento.
Desapropriações atrasaram, licenças para postos não foram liberadas como previsto, e, com isso, o fluxo de caixa das empresas concessionárias ficou no vermelho, pois elas foram contratualmente obrigadas a realizar investimentos nas rodovias. Desembolso de um lado, nenhuma receita de outro, e por mais tempo que o previsto: estava completa a receita do problema.
Mais uma vez, Brasília demonstra pouca afeição com a competência gerencial. Que não se vá agora culpar a privatização. A falha é de quem escolheu um modelo preocupado prioritariamente com aplauso fácil.
ENFIM, O DEVIDO PROCESSO DE LIMPEZA
EDITORIAL
JORNAL DO BRASIL
30/9/2009
RIO - Os políticos ou, mais precisamente, os parlamentares do Congresso Nacional, evitaram o assunto. Fugiram dele como o diabo da cruz, durante as discussões recentes que aprovaram a mal-ajambrada “minirreforma eleitoral”, feita às pressas para já vigorar nas eleições de 2010. Mas a proibição dos candidatos com ficha suja, depois de evitada ao máximo, finalmente entra na pauta do Parlamento. Não por arrependimento, boa vontade ou lampejo de responsabilidade de algum legislador mais progressista. Como era de se esperar, não seriam os próprios políticos os autores espontâneos das restrições ao clima de quase vale-tudo que permite a condução a importantes cargos públicos de pessoas cuja reputação dificilmente seria desconsiderada numa simples eleição de síndico.
O movimento veio da sociedade civil, que conseguiu, felizmente, canalizar sua indignação. Graças a um mecanismo de democracia participativa previsto na Constituição, os projetos de iniciativa popular – por sinal, pouco utilizados desde 1988 –, uma proposta de lei complementar tentará barrar a presença de candidatos inidôneos nas eleições.
Depois de colhidas mais de 1,3 milhão de assinaturas, em todos os estados do país, o projeto de iniciativa popular contra os chamados fichas-sujas foi levado ontem à Câmara pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), que reúne 43 entidades. À frente das pilhas de papéis do abaixo-assinado, o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Dimas Lara, entregou a proposta ao presidente da Casa, Michel Temer.
O projeto de lei enfrenta o desafio de estipular que tipos de crimes e em que situação um pretenso candidato será impedido de concorrer a um cargo eletivo. A proposta prevê a proibição àqueles que foram condenados em primeira instância, ou com denúncia recebida por um tribunal, por crimes de racismo, homicídio, estupro, tráfico de drogas e desvio de verbas públicas. Também ficariam fora do páreo, de acordo com o projeto, condenados por compra de votos ou uso da máquina pública para fins eleitorais, e políticos que renunciam para evitar o processo de cassação por quebra de decoro parlamentar.
A proposta mexe em temas controversos, como considerar suficiente a condenação em primeira instância. Há a possibilidade, claro, de que o candidato, inicialmente impedido, seja absolvido em outras instâncias posteriormente. Mas isso faz parte do jogo. Algum critério há de se criar. Que seja, então, um meio-termo entre o, digamos, simples fato de estar sendo processado – afinal, na luta política, um político pode litigar na Justiça apenas com o intuito de prejudicar o adversário – e o longo processo de se chegar ao transitado em julgado, que serve mais às chicanas e protelações jurídicas, que protegem os corruptos, do que a correções de equívocos de instâncias inferiores.
De resto, é preciso fazer a distinção entre o devido processo legal – garantido pelo Estado democrático de direito e que não está em discussão – e a impossibilidade de se participar da competição política devido a regras eleitorais. Esta seria mais uma, aliás, das mais importantes, e que viria a preencher a grande lacuna da Lei de Inelegibilidades de 1990, que silenciou – por que será? – sobre o assunto.
A ÚNICA SAÍDA PARA O BRASIL
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
30/9/2009
Desde que o presidente deposto Manuel Zelaya entrou no recinto ocupado pela embaixada brasileira durante seu governo, como hóspede e não como asilado político, ninguém consegue impedir que ele faça das antigas instalações diplomáticas uma "plataforma política da insurreição". Ao receber Zelaya, naquelas condições, o governo brasileiro, que não mantém relações com o atual governo, já cometeu um grave erro diplomático, pois não se tratava de um político proscrito que buscava refúgio para escapar da perseguição de seus adversários, mas de um presidente deposto e expatriado que voltava a seu país clandestinamente. Só com isso, passou a militar ativamente a favor de uma das duas facções em que se divide Honduras - aquela protegida pelas imunidades mantidas pelo atual governo à embaixada que deixara de ter esse status desde que o embaixador brasileiro dali se retirou. Esse erro foi agravado desde o momento em que ficou comprovado que o controle interno do antigo recinto da embaixada havia escapado dos funcionários brasileiros encarregados de zelar pela antiga sede da missão diplomática e era exercido plenamente por Zelaya e seus seguidores.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o chanceler Celso Amorim, mais de uma vez, pediram a Zelaya que se abstivesse de fazer a propaganda da insurreição enquanto estivesse no recinto da antiga embaixada. Não foram atendidos. No sábado, obedecendo a instruções estritas, o diplomata Lineu Pupo de Paula voltou a transmitir a Zelaya o pedido do governo brasileiro para não fazer da antiga embaixada uma central de agitação política. Mais uma vez não houve resposta.
Manuel Zelaya é o hóspede inconveniente que se comporta como dono da casa. Ali ele dispõe de tamanha liberdade de ação que lhe permite fomentar uma insurreição política de dentro dela, já que o governo que o depôs ainda respeita o recinto como sede de uma missão diplomática.
Mas é cada vez maior o risco de esse respeito ser substituído por ações violentas, uma vez que o governo de facto de Honduras, obviamente, não assiste a tudo isso de braços cruzados. No domingo, decretou estado de sítio por 45 dias, estabelecendo restrições, principalmente, aos direitos de ir e vir e de livre manifestação. E ordenou às forças de segurança que reprimam com energia qualquer manifestação popular não autorizada.
"Nenhum país pode tolerar que uma embaixada estrangeira seja utilizada como base de comando para gerar violência e romper a tranquilidade, como o senhor Zelaya está fazendo desde sua chegada ao território nacional", afirmou nota oficial do governo de facto. Em vista disso, foi dado ao governo brasileiro um ultimato para que defina dentro de dez dias o status do presidente deposto. Se de asilado, receberá salvo-conduto para ser transportado para o Brasil. Se de abrigado, o governo de facto retirará os privilégios diplomáticos da embaixada brasileira, que passará a ser considerada um simples escritório privado.
O presidente Lula, que estava na Venezuela, repeliu o ultimato. Apresentando-se como o paladino de um país da América Central que nunca fez parte das prioridades da política externa brasileira, o presidente fez exatamente aquilo que o ex-chanceler do México Jorge Castañeda recomendava em entrevista no Estado de domingo que o governo brasileiro não fizesse: um país que tem aspirações a ser um líder mundial "não pode aparentar cumplicidade com radicais". O conselho chegou tarde. O presidente Lula não apenas caiu na armadilha armada por Hugo Chávez em Honduras, como foi procurar apoio para sua luta pela democracia na América Central, numa reunião de cúpula de países sul-americanos e africanos realizada na Venezuela na qual pontificavam lutadores da democracia do estofo de Robert Mugabe, presidente há 30 anos do Zimbábue, e de Muamar Kadafi, ditador há 40 anos da Líbia. Obteve-o por unanimidade.
Em compensação, mereceu crítica do representante dos Estados Unidos no Conselho Permanente da OEA, pelo apoio de seu governo ao comportamento "irresponsável e tolo" do presidente deposto Manuel Zelaya.
A única saída digna para o governo brasileiro da armadilha em que se meteu parece ser a concessão de asilo a Zelaya em território nacional.
O problema é convencê-lo aceitar essa solução.
A FAXINA FISCAL DO PÓS-CRISE
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
30/9/2009
O fim de semana foi animado nos feirões de automóveis, montados pelas fábricas para atrair os consumidores enquanto dura a isenção do IPI. O esforço parece ter dado bons resultados. Há filas de espera para o recebimento dos carros, depois da corrida dos compradores. Os incentivos fiscais ajudaram a mover a economia durante a crise, mas o governo tem de recalibrar as suas contas. Não só no Brasil, mas em muitos países, será preciso desmontar os estímulos criados para enfrentar a recessão. Na Turquia, onde se reúne o FMI, a redução do imposto permitiu ao setor automobilístico vender, de janeiro a agosto, 5,9% a mais do que em igual período de 2008. O benefício acaba hoje e as montadoras pedem um programa para substituição de carros velhos. Mas o espaço para uma política fiscal frouxa é reduzido.
Em alguns países, a mudança da política será penosa e politicamente complicada. Na Espanha, o governo pediu a compreensão do povo para um esforço de recuperação das finanças públicas. O plano é obter 11 bilhões, com o fim de uma isenção fiscal adotada nos últimos dois anos e com a elevação do imposto sobre o valor adicionado. O déficit público deve chegar neste ano a 8,1% do PIB, pouco abaixo dos 8,4% projetados anteriormente. A economia deve encolher 3,6% neste ano e 0,6% no próximo, com o desemprego avizinhando-se dos 19%. A arrumação fiscal, se o Parlamento aprovar a proposta orçamentária, deverá começar com a economia ainda em mau estado.
Na Alemanha, a chanceler Angela Merkel, vitoriosa na eleição de domingo, deverá governar com uma nova aliança com os Democratas Livres, ideologicamente comprometida com mais mercado e menos Estado. Agora ela terá maior apoio para agir segundo suas "verdadeiras convicções", segundo alguns analistas. A nova composição do governo talvez facilite a desmontagem do aparato anticrise, mas a tarefa será especialmente complicada, porque o setor público se envolveu amplamente no socorro a bancos e a indústrias.
Nos EUA, o tema foi incluído há meses na retórica oficial, mas com uma ressalva: ainda é cedo para desmontar o esquema criado para atenuar os efeitos da recessão. Mas o presidente Obama já encaminhou o planejamento orçamentário para a redução, nos próximos dez anos, das consequências fiscais do combate à crise. O estrago das contas públicas tem proporções extraordinárias.
O déficit orçamentário deste exercício fiscal está estimado em US$ 1,6 trilhão ou 11,2% do PIB, a maior proporção desde a 2ª Guerra Mundial. Segundo o cenário básico divulgado pelo Congresso, em 2010 o déficit poderá diminuir para US$ 1,4 trilhão, ou 9,6% do PIB. Se tudo correr muito bem, a proporção poderá chegar a 4% em 2019, ainda acima da registrada em 2008, de 3,2%. A comparação entre essas porcentagens dá uma ideia dos danos fiscais causados pela crise e pelas políticas compensatórias.
Na reunião de cúpula do Grupo dos 20, na semana passada, os chefes de governo prometeram manter os incentivos até haver sinais de uma firme recuperação da economia. Dedicaram poucas linhas, no final de um parágrafo, ao problema de como desmontar os incentivos: "Evitaremos qualquer retirada prematura de estímulos. Ao mesmo tempo, prepararemos nossas estratégias de saída e, no momento certo, eliminaremos as políticas extraordinárias de apoio, de forma cooperativa e coordenada, mantendo nosso compromisso com a responsabilidade fiscal."
O assunto é desagradável e impopular, mas os governos não poderão contorná-lo por muito tempo, em vista da situação desastrosa das contas públicas. Se a arrumação fiscal for deficiente, os bancos centrais elevarão os juros e o ajuste será mais penoso. A proposta orçamentária do governo espanhol indica a disposição de enfrentar logo o problema, embora sua popularidade tenha diminuído muito.
No Brasil, o estrago fiscal tem sido causado muito mais pelas preocupações eleitorais do governo do que pelas ações anticrise. A motivação do dano, mais política do que econômica, torna difícil confiar numa séria política de ajuste.
A SABATINA DE TOFFOLI
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
30/9/2009
Se tiverem algum compromisso com o interesse público, como a Constituição exige de quem exerce um mandato parlamentar, os integrantes da Comissão de Constituição e Justiça do Senado terão, ao sabatinar na sessão de hoje o nome indicado pelo presidente da República para o Supremo Tribunal Federal, o advogado José Antônio Dias Toffoli, de levantar duas questões de fundamental importância para o futuro do Judiciário.
Já mencionada por nós quando da indicação do atual chefe da Advocacia-Geral da União, a primeira questão é de natureza técnica. Trata-se de saber se ele atende ao requisito constitucional de notório saber jurídico. Como em quase 20 anos de carreira jamais produziu um único artigo doutrinário digno de nota, não fez pós-graduação e sempre atuou a serviço de uma agremiação política, tendo sido o principal advogado do PT nas campanhas presidenciais de 1998, 2002 e 2006, Toffoli é, sem dúvida alguma, dos sete ministros já indicados por Lula, desde 2003, o que tem o currículo mais exíguo, em termos acadêmicos, e menos adequado para o cargo, em termos profissionais. Além disso, já foi duas vezes condenado pelo Tribunal de Justiça do Amapá.
No caso, esta questão da reputação ilibada nos parece de menor importância. A questão do notório saber jurídico é também de natureza ética, pois envolve a autoridade moral do próprio Supremo, que tem a palavra final sobre qualquer aspecto da vida dos cidadãos brasileiros. Trata-se de saber se é possível chegar ao ápice da carreira, na magistratura, quem nela não conseguiu ingressar pelo princípio do mérito, por meio de um concurso público. Se Toffoli foi duas vezes reprovado quando disputou uma vaga de juiz de primeira instância, entre 1994 e 1995, como poderá ser respeitado como ministro por advogados, procuradores e, principalmente, pelos próprios colegas de tribunal? Em outras palavras, como pode chegar ao topo quem não teve competência suficiente para subir os degraus da hierarquia judicial?
O mais grave é que os escalões do Poder Judiciário, inclusive o Supremo, já deixaram clara sua posição com relação a esse fato quando, há alguns anos, por duas vezes, a seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) tentou indicar como desembargador para o Tribunal de Justiça de São Paulo, pelo chamado "quinto constitucional", um bacharel que havia sido reprovado em concursos para a magistratura estadual. Alegando que as reprovações caracterizavam ausência de notório saber jurídico, o órgão especial do TJSP devolveu a lista sêxtupla à OAB/SP, que imediatamente entrou com um mandado de segurança no Supremo.
Ao julgar o caso, em abril de 2008, o Supremo endossou a iniciativa dos desembargadores paulistas e rejeitou o recurso impetrado pela OAB/SP. Por ironia, o relator do mandado de segurança foi o ministro Carlos Alberto Menezes Direito, recentemente falecido, e para cuja vaga o presidente Lula indicou o chefe da AGU.
Em seu voto, Menezes Direito afirmou expressamente que o órgão especial do TJSP, ao exigir saber jurídico de candidatos à cadeira de magistrado de instância superior, apenas cumpriu o que a Constituição expressamente determina em seu artigo 101. Na ocasião, entidades de advogados ainda alegaram que o conceito de notório saber jurídico é um critério subjetivo, dependendo de quem o avalia. No Supremo, contudo, prevaleceu a tese de que esse critério é objetivo e de que reprovação em concurso para juiz de primeira instância configura, sim, ausência de devida qualificação técnico-jurídica para ascensão aos escalões superiores da carreira.
Temendo que suas escassas credenciais técnicas inviabilizassem sua ascensão ao STF, Toffoli, desde que foi indicado por Lula, procurou compensar a falta de saber jurídico recorrendo à mobilização política. Nunca antes na história do Judiciário brasileiro se viu um candidato à mais alta Corte fazendo campanha em centros acadêmicos, órgãos corporativos e entidades de classe para ascender a um órgão cuja autoridade repousa, basicamente, na qualificação, na experiência profissional e na isenção de seus integrantes. E, graças ao avassalador poder político do seu patrocinador, com amplo sucesso, ao que parece.
Infelizmente, é pouco provável que o Senado cumpra o seu dever.
AGORA, OS CARTÓRIOS
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
30/9/2009
Congresso se inclina a abonar notários sem concurso, e STF se torna a única instância capaz de barrar mais essa farra
A PROPOSTA de emenda à Constituição que efetiva titulares de cartórios não concursados tende a ser derrubada pelo Supremo Tribunal Federal caso seja aprovada pela Câmara, afirma o presidente da corte, Gilmar Mendes. Ainda que Mendes detenha apenas um voto em 11 no Supremo, a impugnação judicial, a esta altura, parece a última barreira contra mais uma afronta à sociedade que, tudo indica, será consumada no Congresso.
O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) estima que existam 5.000 cartórios "biônicos" no país, cerca de um quarto do total. Em junho passado, o conselho, órgão de controle administrativo do Judiciário, determinou que todos os cargos assumidos nessas condições deveriam ser desocupados, de acordo com a regra prevista na Carta de 1988.
A partir de então, coube aos Tribunais de Justiça dos Estados realizar uma apuração exata da quantidade desses postos -processo ainda em andamento. Em um passo seguinte, estão previstos os primeiros concursos para preenchimento dessas vagas. Contra o que parece ser o desejo do Congresso Nacional, a Justiça precisa manter essa sequência de procedimentos rumo à modernização dos cartórios.
Concursos são necessários para assegurar um mínimo de legitimidade no preenchimento dos postos notariais. Por conta de exigências burocráticas extemporâneas, os brasileiros são obrigados a recorrer, numa frequência injustificável, aos tabeliães. Estes, por sua vez, desfrutam de uma clientela cativa, pois a regulamentação limita muito a concorrência numa mesma região.
Nesse ambiente cercado de privilégios, uma relíquia do patrimonialismo, há pouco estímulo para que os titulares dos cartórios aperfeiçoem os serviços que oferecem. O ganho é certo e raramente é pequeno: balanço do CNJ, referente ao ano de 2006, revelou que o setor faturou mais de R$ 4 bilhões -o suficiente para construir 20 quilômetros de metrô em São Paulo.
A exigência do concurso é um veto, tardio, ao apadrinhamento que sempre vigorou na concessão dos serviços notariais. Mas o país não deveria se contentar com uma resposta modesta ao atraso representado pelos cartórios. Em primeiro lugar, é preciso que o poder público reduza substancialmente a exigência de carimbos notariais dos cidadãos.
Além disso, registros de caráter privado, como os contratos, não precisam estar submetidos a um regime monopolista de concessões. Com regulação mínima, é possível, e desejável, abrir esse mercado à concorrência.
SOMBRAS NA DINAMARCA
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
30/9/2009
INICIOU-SE em Bangkok, Tailândia, a penúltima rodada da negociação pelo novo tratado sobre a mudança do clima. Certa exasperação com a ausência de progresso, patente após o resultado pífio da cúpula da semana passada na ONU, se infiltra nas declarações diplomáticas.
O ceticismo cerca o objetivo de chegar a um tratado sobre clima em Copenhague, na Dinamarca, em dezembro. É o prazo-limite para adotar novas metas de redução de emissões de gases agravadores do efeito estufa, como o CO2, que a ciência aponta como fator do aquecimento global. O documento viria para substituir o fracassado Protocolo de Kyoto, que expira em 2012.
Frustra-se, a cada dia, a expectativa de que os Estados Unidos de Barack Obama -ainda o maior emissor do mundo, ao lado da China, e maior responsável pela inoperância do tratado anterior- abandonem o imobilismo da administração Bush.
O Congresso americano se engalfinha na reforma do sistema de saúde e deixa de lado o plano Obama de cortar emissões domésticas, criando um teto para elas, associado à concessão de permissões comercializáveis para emitir. A lógica é que empresas lucrem com a venda de permissões não utilizadas, caso consigam poluir menos, para outras que não atingiram suas metas.
Não surpreende que os Estados Unidos tenham ido de mãos vazias à ONU. Deixaram aberto espaço político que vem sendo ocupado pela China. A delegação chinesa admite buscar reduções, mas só em termos de eficiência (quantidade de CO2 emitida por unidade de produção). A China é o país onde mais cresce o uso do ultrapoluidor carvão para produzir eletricidade.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mais uma vez, vangloriou-se do fato de 45% da energia brasileira provir de fontes renováveis. Propôs reduzir o desmatamento -nossa maior fonte de emissões- em 80%, até 2020, e falou em levar "compromissos precisos" a Copenhague, sem adiantar quais serão.
Está tudo pronto, ao que parece, para reeditar-se o velho impasse entre ricos e pobres que paralisou Kyoto. Talvez o roteiro seja inevitável, nas tratativas em que duas centenas de nações precisam decidir por consenso.
ELEIÇÃO MENOS ÓBVIA DO QUE GOVERNO VERSUS OPOSIÇÃO
EDITORIAL
VALOR ECONÔMICO
30/9/2009
A decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2007, de que o mandato não pertence ao eleito, mas ao partido, coibiu enormes movimentações de candidatos entre legendas em vésperas de eleição, mas o prazo de filiação partidária de um ano - a partir de 2 de outubro, sexta-feira - parece ainda ter sido determinante na definição final do quadro eleitoral do próximo ano.
As mudanças não foram numerosas na política nacional, mas suficientes para definir o perfil da disputa presidencial de 2010. A candidata do PT e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva é a ministra Dilma Rousseff - esse é o dado mais antigo. O principal adversário oposicionista será um tucano e ele será escolhido entre os governadores dos Estados de São Paulo, José Serra, e de Minas, Aécio Neves. Esse também é um elemento antigo dessas eleições, mas a definição do PSDB deve ocorrer só no início do ano que vem. O elemento surpresa foi a mudança da senadora Marina Silva, do PT para o PV do Acre, e sua candidatura à sucessão de Lula. Não é tão surpreendente a candidatura do deputado Ciro Gomes pelo PSB - embora o PT e Lula tentassem convencê-lo a mudar o domicílio eleitoral para São Paulo e ser candidato ao governo do mais rico Estado da Federação, o deputado tem azeitado o seu discurso não apenas para disputar a Presidência, mas para ser aquele que polarizará a disputa com Serra, se o governador for candidato.
A um ano das eleições, portanto, uma disputa que se configurava de antemão polarizada entre Dilma e Serra produziu mais dois postulantes à Presidência. Além disso, a conjuntura parece ter aberto espaço para Aécio Neves concorrer de fato com Serra pela legenda do PSDB - o governador mineiro deixa, assim, de ser apenas um potencial candidato a vice, ou candidato a eleições futuras. E Ciro Gomes passou a ser um elemento na disputa que não pode ser desprezado, pois não apenas exibe boa performance nas pesquisas de opinião como pode ser um elemento importante nas definições do próprio PSDB.
Ciro aparece empatado com Dilma nas últimas pesquisas, ainda "recall" das eleições de 2002, quando disputou a Presidência e chegou em terceiro lugar no primeiro turno - em alguns momentos do processo eleitoral, esteve no segundo lugar, atrás apenas de Lula. O deputado tem alto grau de agressividade, que dedica especialmente a Serra, e admite deixar de se candidatar só na hipótese de Aécio vir a ser o candidato do PSDB. Aliados do governador mineiro apontam como o melhor dos mundos uma chapa com Aécio na cabeça (que traria uma grande votação de Minas) e Ciro na vice, com poder de agregação no Nordeste, onde o PSDB e o DEM perderam votos aos baldes em 2006.
Ciro deu uma grande tacada eleitoral ao trazer para o PSB o vereador do PSDB Gabriel Chalita - o mais votado pela legenda e o mais próximo ao ex-governador Geraldo Alckmin, hoje secretário de Serra, que disputa com o grupo serrista a legenda para voltar ao governo do Estado. Não consta que Chalita e Alckmin tenham brigado - aliás, ao que parece, ambos ainda integram o mesmo grupo político. Chalita ingressou no PSB com um discurso tão agressivo contra Serra como o de Ciro. Quando anunciou sua saída do PSDB, chamou o governador de "ególatra". Ontem, na filiação oficial ao PSB, acusou Serra de fazer uma "política de subsolo". Atraído para o partido socialista com a promessa de disputar o Senado, o vereador foi convidado ontem por Ciro Gomes para ser o candidato ao governo. Isso evidentemente só acontecerá se Alckmin não for o candidato tucano. E se Serra for o candidato a presidente. Nesse caso, no Estado com mais eleitores do país seriam dois os candidatos - um ao governo, outro a presidente - que não têm nada a perder se atacarem Serra no horário de propaganda eleitoral.
O prazo de filiação foi menos importante na definição do quadro eleitoral, mas as mudanças que produziu foram suficientes para agregar elementos que tornarão as eleições presidenciais menos óbvias e previsíveis do que uma simples disputa entre governo e oposição. Ciro pode figurar na lista de candidatos governistas ou pode fazer uma aliança com o tucano Aécio Neves, a depender da conjuntura. Marina é ainda uma incógnita eleitoral: pode tirar votos de um lado ou de outro, ou pode não ter efeito nenhum na disputa. Resta torcer que a disputa de votos entre eles não seja um simples bate-boca, mas um debate de programas.
O DRAMA DAS OBRAS PARADAS
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
30/9/2009
As instituições da República funcionam, mas nem sempre o entendimento é perfeito entre elas. Demonstração disso está na recomendação do Tribunal de Contas da União para que sejam paralisadas nada menos de 41 obras do governo federal. Entre elas, 6 no Espírito Santo.
Isso reflete incapacidade de reunir sinergia entre as esferas contratante e fiscalizatória do poder público. Em consequência, verificam-se prejuízos aos cofres públicos e desconforto à população pelo adiamento de obras cruciais e urgentes. Entende-se, no entanto, que a proposta de suspensão baseia-se em motivo que não pode ser desconsiderado: falcatrua.
A população capixaba conhece muito bem o drama da obras paralisadas. O Aeroporto de Vitória opera em condições precárias porque a União não consegue tocar as obras que prometera concluir em fevereiro de 2007. A reforma começou em 2004, com festa política, foi totalmente paralisada em 18 de julho de 2008 sob suspeita de superfaturamento.
Agora, as pequenas melhorias previstas para 2009, para evitar o agravamento dos transtornos funcionais do Eurico Salles, também deverão ser interrompidas. É a recomendação do TCU, por rejeição ao pagamento de serviços não previstos. Esse é um dos 13 empreendimentos integrantes do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) que deverão ser paralisados no país.
A duplicação de um trecho da BR 262 no Espírito Santo, que tem o carimbo do PAC, figura entre os alvos do TCU. O relatório da Corte de Contas recomenda a suspensão das obras nos acessos a Vitória por Cariacica, no trecho entre o km 10 e o km 19,1. Denuncia sobrepreço e superfaturamento.
O Tribunal de Contas da União também aponta irregularidades em contratos na restauração da BR 101, entre o km 0,0 e o km 149 no Espírito Santo. O mesmo é mencionado pelo TCU em relação à construção de dois outros trechos rodoviários no Estado: um no Corredor Leste/BR 342 até o entroncamento com a BR 101, na região dos municípios de Ecoporanga e Vila Pavão até a divisa com Minas Gerais; o outro na BR 393, entre Bom Jesus do Norte e Cachoeiro de Itapemirim.
O modal de transporte marítimo não escaparia às restrições do TCU. Está sendo denunciada gestão temerária da construção do terminal de granéis líquidos no Porto de Barra do Riacho, em Aracruz, projeto para o qual estão previstos R$ 347 milhões na lei orçamentária de 2009.
Em 2008, o Tribunal de Contas da União analisou 153 obras, das quais 48 tiveram a paralisação recomendada por problemas graves. Em 2009, o TCU fiscalizou no local de execução 219 obras, que totalizam R$ 35,4 bilhões, e encontrou aspectos irregulares em 41 delas. Então, a pergunta que não quer calar é óbvia: até quando a falta de sintonia entre as instituições da República continuará afetando a sociedade?
Caberá ao Congresso decidir se haverá bloqueio de recursos no Orçamento de 2010 para as obras ditas irregulares. Mas, independentemente do que for decidido pelos parlamentares, o imbróglio não estará resolvido. O indispensável é que sejam extintas as razões que levam o TCU a recomendar a paralisação de obras.
As maiores irregularidades identificadas têm sido sobrepreço, superfaturamento, licitação irregular, falta de projeto executivo e problemas ambientais. Todas são questões inadmissíveis, como também seriam quaisquer tentativas de afrouxamento da fiscalização. Trata-se de dinheiro público, portanto não pode haver minimização do controle do Estado.
PRÊMIO A TOFFOLI
EDITORIAL
ESTADO DE MINAS
30/9/2009
Nomeação estenderia ao ápice da Justiça o aparelhamento partidário do poder público
É da competência privativa do presidente da República, após aprovação do Senado Federal, nomear os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) – artigo 84, inciso XIV, da Constituição. A prerrogativa deferida à Câmara Alta no processo para provimento dos cargos judicantes da Suprema Corte exprime materialização do sistema de freios e contrapesos (checks and balances). Por semelhante mecanismo admitido no constitucionalismo brasileiro, certos atos de um dos órgãos da República devem ser apreciados por outro. Assim se assegura a independência e a harmonia dos poderes, dois fundamentos do regime democrático vigente no Brasil.
Embora lhe caiba a indicação de quem deve, na condição de ministro, ultrapassar os cancelos do STF, cumpre ao presidente da República fazê-la recair sobre pessoa com verbete intelectual há muito sob intensa visibilidade no universo jurídico. Não basta, pois, estribar-se em vontade particular ou ceder a inspiração de fundo apenas político. Tais considerações vêm a propósito da escolha do advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli, para ocupar vaga aberta na mais alta corte de Justiça com a morte recente do ministro Carlos Alberto Menezes Direito.
Toffoli por certo exibe virtudes, mas é um quadro em processo de maturação profissional. Não é uma referência da cultura jurídica, exigível aos que se inserem como aptos a exercer a judicatura no STF. Sua atuação como militante da advocacia se resume a um currículo exíguo, insatisfatório. Além da graduação pela Universidade de São Paulo (USP), nenhum título de mestrado e, menos ainda, de doutorado acrescentou à formação acadêmica. Todavia, como tem apenas 41 anos, com potencial para surpreender, no futuro, como revelação auspiciosa. Por enquanto, faltam-lhe a experiência e as habilidades singulares que credenciam o jurista a judiciar no colegiado mais alto do Poder Judiciário.
Como é notório escassearem em Toffoli os apontados requisitos básicos, significa que não supre o pressuposto de "notável saber jurídico" colocado como exigência preliminar e incontornável ao ingresso no quadro de juízes da Suprema Corte. É o que ordena o artigo 101 da Constituição. À semelhante barreira, bastante para tornar insustentável a indicação, antecedeu avaliação apoiada em utilitarismo político condenável.
Aos olhos do presidente da República, por ter Tofolli funcionado como advogado nas campanhas presidenciais do PT em 1998, 2002 e 2006, merecia ele o prêmio da ascensão ao STF. A nomeação estenderia ao ápice da Justiça o aparelhamento partidário do poder público, anomalia que, desde a posse do petista, acomete a administração governamental. Aí estão razões mais que suficientes para que o Senado corrija a impertinência presidencial e evite a insólita interferência de interesses partidários no funcionamento do STF. Basta rejeitar a indicação do presidente.
O STF E O PRÊMIO A TOFFOLI
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
30/9/2009
É da competência privativa do presidente da República, após aprovação do Senado, nomear os ministros do Supremo Tribunal Federal (artigo 84, inciso XIV, da Constituição). A prerrogativa deferida à Câmara Alta no processo para provimento dos cargos judicantes da Suprema Corte exprime materialização do sistema de freios e contrapesos (checks and balances). Por semelhante mecanismo admitido no constitucionalismo brasileiro, certos atos de um dos órgãos da República devem ser apreciados por outro. Assim se assegura a independência e a harmonia dos poderes, dois fundamentos do regime democrático vigente no Brasil.
Embora lhe caiba a indicação de quem deve, na condição de ministro, ultrapassar os cancelos do STF, cumpre ao presidente da República fazê-la recair sobre pessoa com verbete intelectual há muito sob intensa visibilidade no universo jurídico. Não basta, pois, estribar-se em vontade particular ou ceder a inspiração de fundo apenas político. Tais considerações vêm a propósito da escolha do advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli, para ocupar vaga aberta na mais alta Corte de Justiça com a morte recente do ministro Carlos Alberto Menezes Direito.
Toffoli por certo exibe virtudes, mas é um quadro em processo de maturação profissional. Não é uma referência da cultura jurídica, exigível aos que se inserem como aptos a exercer a judicatura no STF. Sua atuação como militante da advocacia se resume a um currículo exíguo, insatisfatório. Além da graduação pela Universidade de São Paulo (USP), nenhum título de mestrado e, menos ainda, de doutorado, acrescentou à formação acadêmica. Todavia, como tem apenas 41 anos, possui potencial para surpreender, no futuro, como revelação auspiciosa. Por enquanto, faltam-lhe a experiência e as habilidades singulares que credenciam o jurista a judiciar no colegiado mais alto do Poder Judiciário.
Como é notório escassearem em Toffoli os apontados requisitos básicos, significa que não supre o pressuposto de “notável saber jurídico” colocado como exigência preliminar e incontornável ao ingresso no quadro de juízes da Suprema Corte. É o que ordena o artigo 101 da Constituição. À semelhante barreira, bastante para tornar insustentável a indicação, antecedeu avaliação apoiada em utilitarismo político condenável.
Aos olhos do presidente da República, por ter Toffoli funcionado como advogado nas campanhas presidenciais do PT em 1998, 2002 e 2006, merecia ele o prêmio da ascensão ao Supremo Tribunal Federal. A nomeação estenderia ao ápice da Justiça o aparelhamento partidário do poder público, anomalia que, desde a posse do petista, acomete a administração governamental. Aí estão razões mais que suficientes para que o Senado corrija a impertinência presidencial e evite a insólita interferência de interesses partidários no funcionamento do STF. Basta rejeitar a indicação do presidente.
FOCOS DE CALOR
EDITORIAL
DIÁRIO DE CUIABÁ (MT)
30/9/2009
Proibida ou não a queimada está incorporada à tradição agrícola mato-grossense, como revelam os números do Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais (INPE) relativos ao período de 15 de julho a 28 deste mês – com a norma proibitiva do uso do fogo em vigor, medida essa que se aplica até hoje.
Ao longo do período acima citado, os cinco satélites e serviço do INPE detectaram 17.049 focos de calor em Mato Grosso, quando não deveria ocorrer esse tipo de registro, em tal intensidade, pois a legislação ambiental proíbe o uso do fogo para a chamada “limpa” de roça ou pastagem entre 15 de julho e 15 de setembro, sendo que neste ano, excepcionalmente, a proibição estende-se até hoje, por razões climáticas.
A média diária de focos de calor nos 76 dias do período proibitivo do uso do fogo foi além de 224, quando deveria ser baixa, restrita aos acidentes naturais que provocam incêndios; à queima dos canaviais das usinas, autorizadas em razão de sua função social na geração de empregos sazonais; e ao fogo em reservas indígenas para facilitar a captura da caça, conforme a tradição da etnia Xavante.
Tantos focos de calor revelam a existência de uma prática arraigada que exige campanhas de conscientização do produtor rural e parceleiros da reforma agrária, por parte da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema) e Ibama. Até então, o principal enfoque para a contenção das queimadas é a autuação do dono do imóvel, com pesadas multas cujos valores aumentam de acordo com a área queimada.
A multa nem sempre tem caráter educativo, ao contrário da conscientização, porém, é possível autuar e ao mesmo tempo conscientizar, para que gradativamente o uso do fogo seja substituído pelas modernas práticas de conservação do solo e preservação ambiental.
Muitos foram os avanços ambientais nos meios rurais nos últimos anos. A consciência ecológica é visível entre os jovens que vivem nas fazendas e sítios, e o que falta é sua capilarização entre os produtores que aprenderam de berço que o fogo limpa pasto e que o desmatamento ciliar elimina o mosquito vetor da malária.
A área territorial mato-grossense é vasta, mas setorizadamente e por meio de parcerias com os sindicatos rurais e sindicatos de trabalhadores rurais, Sema e Ibama podem alcançar o objetivo da conscientização, desde que adotem uma metodologia de trabalho ininterrupto.
As autoridades ambientais precisam levar ao campo menos talões de multas e mais mensagens técnicas mostrando que o fogo é inimigo e não aliado da agropecuária. Para tanto é imprescindível que Sema e Ibama estendam as mãos ao produtor. Quando fiscais e fiscalizados estabelecerem relações de confiança mútua, calcada na lógica do interesse comum, certamente Mato Grosso virará a triste página das queimadas.
“Multa nem sempre tem caráter educativo, ao contrário da conscientização”
O IMPASSE DE HONDURAS
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
30/9/2009
Os níveis de tensão registrados nos últimos quatro dias, em Honduras, com a imposição do estado de sítio e a ameaça da explosão de violência, indicam que a crise vai deixar marcas mais profundas do que se imaginava em um primeiro momento. As lições da história recente da América Latina não parecem ter sido assimiladas pelos pretensos novos líderes políticos do país, que, no afã de exibirem suas razões, legítimas ou ilegítimas, tomaram um caminho repleto de erros.
Como um erro não justifica outro, o Brasil não deveria tentar corrigir o impasse hondurenho com uma intromissão sem propósito. Entre acolher Manuel Zelaya na embaixada para poupá-lo do risco, gesto comum na diplomacia, e deixar que o hondurenho fizesse do lugar um palanque político e um trampolim para sua volta ao poder, há uma enorme distância. Eliminá-la significou, nesse caso concreto, contribuir para conflitos políticos cujo preço é o mais alto a ser pago por um povo: a restrição das liberdades civis.
No direito internacional, a embaixada fica sob a soberania do país que representa, mas não é o que se vê no prédio que abriga Zelaya em Tegucigalpa. Os brasileiros não exigiram de¬¬le algo que é praxe em situações do gênero: que não se aproveite das salvaguardas para incitar a população local à violência. Não se teve notícia de que Zelaya tenha sido instado a abandonar, durante sua “hospedagem” na embaixada brasileira, o mote de “pátria, restituição ou morte”, adotado ainda no tempo de exí¬¬lio na Nicarágua. O aval para incitação à violência não é o único erro no espisódio. Também estranha aos trâmites diplomáticos é a proteção de um grupo tão grande – cerca de 50 pessoas.
Ao mesmo tempo em que cede a todos os caprichos de Zelaya, o governo brasileiro se recusa a adotar o gesto que é a marca maior da nossa diplomacia: o diálogo. Ontem, o chanceler brasileiro, Celso Amorim, afirmou que a instituição a mediar a crise deve ser a Orga¬¬nização dos Estados Americanos (OEA) – e não o Brasil. Amorim parece ter compreendido, tardiamente, o peso da intromissão brasileira em um assunto doméstico.
Mas, para o Brasil, é tarde para cruzar os braços. A recusa brasileira em promover a negociação com o governo de Roberto Mi¬¬cheletti contribui largamente para que a de¬¬sestabilização prossiga. E as implicações são variadas: o governo de fato ganha a oportunidade de dizer que, dispondo-se ao diálogo, foi rechaçado pelo interlocutor. Zelaya fica autorizado a pensar que pode seguir dando as cartas no forte que o abriga. A OEA perde força, o que só satisfaz os que relativizam o valor da estabilidade democrática. Quanto mais durar a crise, mais Chávez a usará como evidência de que Zelaya foi vítima do governo de Micheletti.
O Brasil precisa defender um caminho que leve os hondurenhos às urnas no fim de no¬¬vembro e que, sobretudo, possa devolver aos cidadãos os direitos ora suspensos. Este sim é um papel digno da nação que apregoa ser líder regional da América Latina.
FICHAS-SUJAS
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
30/9/2009
Apesar da clara resistência de muitos parlamentares em votar medidas para impedir candidaturas de políticos com ficha suja na justiça, entidades da sociedade civil ainda apostam na aprovação, pelo Congresso, em tempo recorde, de regras restritivas nesse sentido, para valer já nas eleições de 2010. Com esse objetivo, o Mo¬¬vimento de Combate à Corrupção Eleito¬¬ral, patrocinado por elas, entregou ontem ao presidente da Câmara, Michel Temer, um abaixo-assinado contendo 1,3 milhão de assinaturas em apoio ao projeto que barra a candidatura dos chamados candidatos fichas-sujas, aqueles que já tiveram uma primeira condenação judicial. Sem dúvida, um passo importante para a moralização da política. Pa¬¬ra que essas regras passem a valer a partir do próximo pleito, seria necessária a aprovação do projeto até sexta-feira. A proposta de iniciativa popular pede ainda que o político ameaçado de cassação que renuncie ao mandato fique inelegível por oito anos. Temer prometeu colocar em votação. É ver para crer.
LIÇÕES DO IPI REDUZIDO
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
30/9/2009
As autoridades federais começam hoje o processo de desativação dos incentivos dados para enfrentar a crise financeira num dos setores decisivos da economia, o da produção e consumo de automóveis. A medida e seus reflexos deixam lições importantes. Para impedir a propagação dos efeitos sociais e econômicos da crise sobre o país, o governo da União determinou a redução da alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para automóveis novos, mantendo a venda e a produção em alta e impedindo que o desemprego se ampliasse, como tendia a ocorrer nos primeiros meses da crise global. Posteriormente, medida idêntica foi adotada para a produção de bens da linha branca.
O êxito conseguido pelas medidas merece reflexões que vão além da simples constatação de que foram eficazes e mantiveram aquecido o mercado de automóveis e de eletrodomésticos. A adoção de impostos mais baixos como política destinada a estimular o consumo – e não de restringi-lo – é, por si só, a confirmação de que está nas mãos dos governos a possibilidade de incentivar a cadeia produtiva e o comércio. Ao fazê-lo, os governos não estarão praticando uma política de renúncia fiscal, mas agindo exatamente no sentido contrário. Impostos menores levarão a um consumo maior e, portanto, na prática, a uma ampliação da própria arrecadação. De quebra, com a produção em crescimento, abre-se na economia a possibilidade de mais empregos. Não é outra a opção majoritária dos países desenvolvidos: ao deixarem baixos os impostos sobre o consumo, estimulam o comércio e a produção, mantêm a arrecadação e fazem girar a roda do crescimento.
A lógica de uma política fiscal inteligente e estimuladora aponta, por isso, para alíquotas baixas na área do consumo. Entre os efeitos do imposto baixo, nenhum é negativo. A experiência brasileira de enfrentamento da crise precisa ser discutida com o objetivo amplo de entender que baixar impostos não significa necessariamente uma perda de arrecadação. Ao contrário, ela pode ser usada, em crises e especialmente fora delas, como uma ferramenta de política econômica. Se, para o consumo, a produção e o emprego se manterem num momento de crise, foi necessário apelar para o mecanismo da redução da alíquota do IPI, por que tal medida não pode ser usada com mais eficácia em perío- dos de normalidade econômica?
Os governos são, na maioria das vezes, vorazes no sentido de criar novos impostos e de reduzir alíquotas, vendo nessa reivindicação da sociedade uma perda de receita e de poder. A realidade mundial e a experiência com o IPI reduzido no Brasil mostram o contrário. No momento em que o país discute a adoção de uma reforma tributária e em que não surgem avanços significativos, a questão da carga de impostos, especialmente sobre o consumo, merece um capítulo especial. Há espaço para que governos, parlamento e empresários apliquem as lições aprendidas no combate aos efeitos da crise financeira.
AS OBRAS INDISPENSÁVEIS
EDITORIAL
JORNAL DO COMMERCIO (PE)
30/9/2009
O anúncio de construção do sistema Via Mangue permite-nos pensar que, enfim, o Recife verá o andamento de um projeto indispensável para um espaço urbano cada vez mais complexo e carente de obras estruturadoras. Mostramos, em reportagem recente, o inferno em que se transformou o tráfego de veículos em nossa capital e na Região Metropolitana, com engarrafamentos que paralisam ou retardam as atividades cotidianas, fazendo-nos reproduzir cenários de falência de uma grande cidade, pela falta de uma cultura urbanística.
Uma olhada para o Recife no último século deixa a sensação de que apenas fomos invadindo as águas, os mangues, os canais e cada centímetro da área municipal, para atender ao crescimento vertiginoso da população – de 200 mil para um milhão e meio de habitantes – e, naturalmente, criando as condições para a passagem do bonde para o imperador da vida moderna, o automóvel, com mais de um milhão de veículos pedindo passagem, espalhados pelas nossas avenidas e exigindo mais e mais a cada dia.
Para atender à voracidade do trânsito e ao crescimento da população, uma nova cidade teria que ser antecipada a cada meio século – como já está sendo feito por alguns grandes centros urbanos de países desenvolvidos. Planeja-se, por exemplo, como deve ser a cidade em 2050, de forma a começar a se construir o futuro, de olho na melhor qualidade de vida para as pessoas. A ideia não é apenas abrir espaço para os carros passarem, mas pensar a cidade para ser vivida em todas as suas necessidades, sem a paranóia e a correria que se tem hoje.
Dos nossos grandes centros urbanos não se pode dizer o mesmo. Se alguém sugerir que seja pensado o Recife ou idealizada a Região Metropolitana no ano 2050, será visto como uma figura pouco ajustada à realidade. Se não temos sido capazes de construir as condições ideais para os dias correntes, se apenas tentamos, a cada década, corrigir o que deixou de ser feito na que passou, como projetar a cidade do futuro? Entretanto, o início de algumas obras - como a Via Mangue - traz esperança de que viver em um espaço urbano em processo de degradação e de paralisação exige mais do administrador que trabalhar pensando na folha de pagamento ou na reposição de pessoal para melhorar a qualidade do serviço público, sempre uma expectativa para o futuro.
A Via Mangue tem maior importância quando se informa que não se trata apenas de um projeto viário, mas - como disse o secretário de Planejamento do Recife -, de uma proposta que passa pela mobilidade urbana e pela habitação social, com a retirada de quase mil famílias que vivem em palafitas, além de saneamento de grande área de Boa Viagem, do Pina e da Imbiribeira. Aí, sim, estamos entrando no território da obra estruturadora e não apenas retoque superficial para assegurar passagem aos novos veículos que chegam e ocupam os raros espaços disponíveis diariamente.
Além dessa grande obra, espera-se que a Prefeitura do Recife dê andamento a alguns outros projetos anunciados e que, se não vão resolver o problema do trânsito, pelo menos podem servir de paliativos antes de outras intervenções mais ousadas. Essas obras compreendem o Binário da Zona Norte, que alivia a Avenida 17 de Agosto, uma ponte entre os bairros de Iputinga e Monteiro, com reflexos sobre a Rodovia de Contorno, uma ponte entre os bairros da Torre e de Santana, que dá continuidade à terceira perimetral. São intervenções urbanas tão necessárias quanto urgentes, mas ficará faltando o algo mais, que sintonize nossa capital com a cultura que faz do espaço urbano uma extensão das mais legítimas aspirações de uma melhor qualidade de vida para todos. Isso só será possível quando uma outra cultura prevalecer na formatação da administração pública: a de que os governantes devem trabalhar de olho nas próximas gerações e não apenas nas próximas eleições.
PEC DOS CONFLITOS
EDITORIAL
A CRÍTICA (AM)
30/9/2009
A ´PEC dos Vereadores´ que acaba de ser promulgada pelo Congresso Nacional vai continuar a promover conflitos. Não há indicações, até hoje, que justifiquem como necessário o aumento das bancadas municipais. Logo os conflitos, nessa realidade, não estão investidos de uma grande causa, apenas satisfazem interesses de uns poucos. Por conta da medida, estão criadas 7.343 vagas nas Câmaras Municipais, em Manaus, a bancada de vereadores passará de 38 para 39 membros.
Uma outra ponta da confusão criada está no entendimento da Justiça Eleitoral sobre o início de vigência da alteração proposta. Na última segunda-feira (28), a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) encaminhou ofício aos presidentes dos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) informando que no entendimento daquela Corte a posse dos suplentes só deve ser feita a partir da próxima eleição municipal.
Embora não tenha orientado às instâncias regionais que neguem a posse, o TSE sinaliza com uma firme disposição de fazer valer as regras atuais até o final dos atuais mandatos. Ao mesmo tempo, os suplentes estão em ritmo intenso se preparando para ocupar os postos.
Na perspectiva dos interesses da população, a ´PEC dos Vereadores´ perde-se completamente. Não nasceu do anseio dos brasileiros, sequer de uma parte deles, os eleitores. Não houve preocupação e zelo para fazer do tema uma discussão envolvendo os diferentes setores da sociedade, transitou somente entre aqueles diretamente interessados na emenda constitucional.
O debate poderia contribuir, em muito, para a construção de uma concepção mais moderna da atuação parlamentar no município - espaço privilegiado para os políticos detentores de mandatos. Infelizmente, as discussões feitas não foram muito além de dois aspectos: garantir as vagas e não aumentar o repasse financeiro para as Câmaras Municipais.
Medidas dessa ordem exigem maior debate, mais análise e vinculação direta com um plano de restauração da credibilidade do Legislativo. Serão 59 mil vereadores em todo o Brasil e eles deverão ter a responsabilidade de demonstrar para que vieram. Que seja para cumprir com a tarefa fundamental de um parlamentar municipal que é zelar pelo bem estar dos habitantes da cidade.