EDITORIAIS 29/9/2009
EDITORIAL
O GLOBO
29/9/2009
A volta de Manuel Zelaya a Honduras foi classificada pelo representante dos EUA na OEA de “irresponsável e tola”, e com razão. O ex-presidente saiu da Nicarágua num avião venezuelano, que pousou em El Salvador, onde carros do partido no governo neste país o esperavam para transportá-lo à fronteira com Honduras. Ainda se levarmos em conta a improvável versão brasileira de que Zelaya “materializou-se” na Embaixada do Brasil, é lamentável que Brasília se deixe enredar em armadilhas chavistas.
Embarca o Brasil na tese bolivariana de que golpista é o governo interino de Honduras, chefiado por Roberto Micheletti, quando não há mocinhos nessa história. Zelaya, presidente eleito, tratava de organizar um referendo para permitir-lhe a reeleição, algo expressamente proibido pela Constituição de Honduras, mas que figura no receituário chavista como fórmula para acabar com a alternância democrática no poder. As instâncias legislativas e jurídicas hondurenhas reagiram adequadamente, culminando com uma decisão da Suprema Corte, que decretou a prisão do presidente e expediu ordem de captura.
Na execução da ordem, contudo, os militares também violaram a Constituição ao enviar Zelaya para a Costa Rica, quando a Carta determina que “nenhum hondurenho poderá ser expatriado nem entregue pelas autoridades a um Estado estrangeiro”.
A situação criada em Tegucigalpa certamente entrará para os manuais de Direito Internacional, pois nunca se vira um foragido político receber “abrigo” estrangeiro ao voltar para seu próprio país e transformar a embaixada que o acolhe em palanque para atacar inimigos políticos. Nos últimos dias, as posições se acirraram perigosamente.
O único caminho legítimo é o do respeito à legalidade. O governo interino de Honduras deve respeitar a integridade da Embaixada do Brasil, ao contrário do que vem ameaçando fazer, e Zelaya tratar de se aquietar, abandonando qualquer proselitismo político contra o governo em exercício. Parta a iniciativa do Brasil ou do próprio Zelaya, a mudança de seu status de “abrigado” para asilado político facilitaria a resolução do impasse que prejudica enormemente o povo hondurenho, pois o país está paralisado à espera de uma decisão.
É preciso que tanto o governo interino quanto Zelaya flexibilizem posições e aceitem negociar via OEA. De uma fórmula para descongelar a situação depende a realização das eleições presidenciais de 29 de novembro, em que Zelaya está impedido de concorrer. Diante do atual impasse, a ONU concluiu que Honduras não está em condições de realizá-las. Mas elas são o melhor instrumento para permitir o retorno do país à normalidade.
JUROS E 2010
EDITORIAL
O GLOBO
29/9/2009
Um dos subprodutos nocivos do longo ciclo de superinflação pelo qual o país passou foi tirar qualquer credibilidade das contas públicas.
Expresso em uma moeda que se desvalorizava diariamente, o Orçamento virou obra de ficção.
Mas o controle da inflação não garantiu a fidedignidade orçamentária.
Em vez da alta descontrolada dos preços, entrou em cena o arsenal de manobras contábeis usadas pelo Executivo e o Legislativo para gerar receitas fictícias que justifiquem gastos reais ou produzir economias virtuais — ou o que for do interesse de políticos e autoridades palacianas.
A proposta orçamentária de 2010 encaminhada pelo governo ao Congresso não escapa à regra. Análise da Consultoria de Orçamento da Câmara, revelada domingo pelo GLOBO, detecta uma conjunção de receitas superestimadas e despesas subestimadas, ou não previstas, das quais restaria um rombo nada desprezível de R$ 35,6 bilhões. Um dos pontos frágeis do Orçamento, critica o estudo, é o fato de ele considerar um aumento de receitas líquidas — após as transferências para estados e municípios — acima da arrecadação de 2008, ano em que a coleta de impostos superou as expectativas. Os problemas identificados justificam ainda mais os temores de que o governo não conseguirá atingir no ano que vem a meta do superávit primário de 3,3% do PIB. O ministro Guido Mantega considera “conversa fiada” as previsões pessimistas. O governo aposta que a recuperação da economia, além do fim de isenções, gerará os recursos suficientes para garantir o cumprimento da meta. O assunto, porém, será acompanhado com atenção. Afinal, ano de eleições leva governos a apertar no acelerador das despesas — mais ainda este, notabilizado pela gastança que patrocina com a máquina burocrática. Aliás, segundo o Orçamento, as despesas primárias — excluindo, pois, as financeiras — aumentarão, ano que vem, em R$ 68 bilhões, dos quais apenas R$ 13,8 bilhões serão investimentos. E como muitos bilhões foram destinados a despesas permanentes — salários do funcionalismo, por exemplo —, há uma perspectiva concreta de estreitamento da margem de manobra das autoridades.
Seja como for, o mercado já sinaliza juros em alta em 2010. Teme-se que o dinheiro injetado na economia — necessário por causa da recessão — tenha sido em dosagem muito elevada, e, por isso, vá provocar alguma pressão inflacionária, obrigando o BC a apertar a política monetária. Preocupações com o superávit primário são um fator a mais a impulsionar os juros de mercado.
ENTRE A CRUZ E OS LOBOS DO HOMEM
EDITORIAL
JORNAL DO BRASIL
29/9/2009
RIO - A situação prisional no país atingiu ponto tão calamitoso que até um organismo internacional do porte da Cruz Vermelha se levantou para interceder em favor da saúde e dos direitos dos detentos que vivem em condições sub-humanas nos presídios brasileiros. Como noticiou ontem o Jornal do Brasil, a entidade solicitou oficialmente ao governo federal acesso aos centros de detenção do Rio de Janeiro.
Tal pedido, de visita a presídios pela Cruz Vermelha, só é previsto em situações de guerra. É discutível se este é o caso, por mais que analogias e expressões como “guerra ao tráfico” sejam largamente utilizadas. Entre janeiro e abril, houve 811 homicídios na Região Metropolitana do Rio. No mesmo período, segundo o instituto americano Brookings, morreram 1.100 civis na guerra no Iraque. As baixas são semelhantes, bem como o clima de horror para populações expostas à violência diária. Mas é preciso cautela para não se associar contextos diferentes sob o pretexto de se justificar a presença e a colaboração da Cruz Vermelha. Como argumentou em artigo o cientista político João Trajano Sento-Sé, há um risco enorme em se identificar a conjuntura atual como uma guerra. Equivaleria a aceitar ações típicas de um suposto estado de exceção, com mão pesada das forças militares. Pioraria o conflito e deixaria de lado a ação firme, mas inteligente e cirúrgica, que o problema do crime organizado exige.
Feita essa ressalva, é bem-vinda a iniciativa da Cruz Vermelha, diante da leniência com que as autoridades historicamente tratam a situação carcerária no Brasil. O caos nos presídios já virou um perigoso clichê, posto que é um tema sem apelo. Não incendeia a opinião pública. Por que investir recursos do Erário para humanizar as condições de vida de pessoas que cometeram crimes, se há tantas outras prioridades como saúde, educação, habitação? Imagens de celas superlotadas, em péssimas condições de higiene, não sensibilizam o cidadão comum. Pelo contrário, parecem satisfazer instintos primitivos do “olho por olho, dente por dente” dos tempos do estado da natureza hobbesiano. É esse o conteúdo civilizatório sobre o qual repousa a sociedade e o estado de direito?
Responder negativamente a essa pergunta é o primeiro passo para se avançar no debate e entender o que está em jogo. Há razões humanitárias, claro. A incidência da tuberculose entre presidiários, por exemplo, é 40 vezes maior do que na população em geral e, no Rio, cerca de 8% dos presos estão infectados. Um quadro que se agrava devido à superlotação. No início deste ano, um levantamento determinado pelo Conselho Nacional de Justiça apontou um déficit de 156 mil vagas nos presídios brasileiros.
Mas há também razões processuais e sociais. Nessa mesma pesquisa, constatou-se que, na população carcerária formada por 446.687 homens e mulheres, 43% são presos provisórios, que já cumpriram pena ou estão à espera de julgamento. É um enorme contingente que não tem como contratar advogados particulares ou está à margem da sobrecarregada defensoria pública. Ou seja, pobres essencialmente.
Por fim, é um erro imaginar o cárcere como o inferno final dos que o merecem. Ao não se priorizar o assunto, os ex-detentos não se recuperam, os presídios se transformam em uma escola do crime e os homens continuam sendo os lobos do homem.
´´VAZAMENTOS SELETIVOS´´ DE DADOS
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
29/9/2009
Em ofício enviado ao ministro da Justiça, Tarso Genro, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, voltou a pedir ao Executivo que forneça os resultados do inquérito aberto pela Polícia Federal (PF), no ano passado, para apurar o vazamento de informações obtidas pela corporação em investigações protegidas por segredo de Justiça. O problema começou quando a PF passou a fazer operações espetaculosas, expondo a imagem pública de políticos e empresários presos em flagrante. Assim que os tribunais superiores tentaram coibir abusos, os órgãos de imprensa passaram a receber fitas, fotografias e degravações de conversas consideradas suspeitas entre as pessoas detidas pela corporação. Até magistrados tiveram conversas vazadas.
A ideia era intimidar desembargadores federais e ministros do Superior Tribunal de Justiça e do STF. Todas as vezes em que um deles concedia habeas corpus a pessoas presas pelas operações espalhafatosas da PF, seu nome aparecia em alguma informação vazada pela corporação. Entre os nomes "vazados", entre 2005 e 2007, por exemplo, estavam o da desembargadora Cecília Mello, do TRF da 3ª Região, e dos ministros Sepúlveda Pertence e Carlos Velloso. O próprio Gilmar Mendes foi objeto dessa estratégia de constrangimento.
Durante a Operação Navalha, realizada em maio de 2007, o nome do presidente do STF e do CNJ foi divulgado pela PF como beneficiário de um esquema de aliciamento da Construtora Gautama. Na realidade, o investigado era Gilmar Mendes ex-secretário da Fazenda de Sergipe. Policiais sabiam disso e se valeram da homonímia para criar confusão.
"Mais uma vez fica nítido o modus operandi da PF. Por meio de sórdidas acusações nos meios de comunicação com a finalidade de submeter magistrados aos propósitos de policiais federais (...), desacredita-se o juiz que não se revele disposto a abrir mão de sua independência ao decidir", diz Mendes, depois de acusar a PF de desrespeitar sistematicamente garantias fundamentais asseguradas pela Constituição e de tentar desmoralizar o Poder Judiciário, abrindo caminho para a substituição do Estado de Direito por um Estado Policial.
"O padrão de atuação de certos agentes públicos resume-se ao vazamento distorcido à imprensa de conversas descontextualizadas, sem a devida investigação e sem corroboração dos fatos nelas supostamente narrados. O resultado é a comprovação da falsidade das conclusões que tais agentes fizeram apressadamente chegar aos meios de comunicação", afirma o presidente do STF.
Em seu ofício, Mendes enumera nove casos de tentativa de constrangimento de desembargadores e ministros. Segundo ele, os magistrados que não se curvassem às pretensões dos delegados federais passavam à condição de corruptos e, na sequência, tinham seus nomes vinculados a fatos inverídicos. "Não é de se estranhar que tal estado de coisas produziria, com o passar do tempo, anomalias sistêmicas", conclui.
Pressionado pela mais alta Corte do País após os abusos cometidos pela PF em julho de 2009, durante a Operação Satiagraha, o ministro Tarso Genro ordenou à direção da PF a abertura de inquérito para apurar o vazamento de informações protegidas por segredo de Justiça. Na ocasião, o presidente do STF chegou a procurar pessoalmente o próprio presidente Lula, que prometeu cobrar agilidade e eficiência de seu ministro da Justiça, a quem a PF está subordinada. Um ano e dois meses depois, porém, as investigações continuam inconclusas e a cúpula da PF se limita a dar declarações vagas e imprecisas sobre o que foi efetivamente apurado até agora.
Foi por isso que Mendes optou por enviar suas reclamações ao ministro da Justiça por meio de ofício, com cópia para o procurador-geral da República. Diante da solicitação formal de informações feita pelo chefe de um dos Três Poderes, cabe agora ao ministro Tarso Genro responder se a direção da PF foi inepta ou omissa. Se foi incompetente, o ministro poderá ser indagado dos motivos pelos quais mantém pessoas despreparadas para chefiá-la. E, se foi omissa, o STF poderá exigir de Genro que aplique as sanções administrativas previstas por lei e pedir ao Ministério Público que avalie a possibilidade de medidas judiciais por crime de responsabilidade.
O PODER CORRUPTOR DO JOGO
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
29/9/2009
Dois fatos recentes dão a medida do equívoco que a Câmara poderá cometer se aprovar o substitutivo do deputado Régis de Oliveira (PSC-SP) que, sob a justificativa de "regularizar" o funcionamento das casas de bingo e das máquinas caça-níqueis, abre a brecha para a legalização de todos os jogos de azar no País. Quando o substitutivo foi aprovado há uma semana pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, os poucos parlamentares que resistiram ao poderoso lobby dos "empresários" da jogatina advertiram que a liberação dos bingos levará à proliferação do crime organizado e ao embate entre quadrilhas que disputam o controle de determinadas áreas.
Os dois fatos acima referidos dizem respeito, justamente, a esse problema. O primeiro deles foi o acolhimento, pela 1ª Vara Criminal de São Paulo, da denúncia feita pelo Ministério Público Federal contra 12 pessoas presas pela Operação Têmis, da Polícia Federal. Realizada há dois anos no Rio de Janeiro e Mato Grosso do Sul, a operação desbaratou uma quadrilha que, entre outros crimes, negociava decisões da primeira e da segunda instâncias da própria Justiça Federal para favorecer proprietários de casas de bingo e de máquinas caça-níqueis.
Depois de cumprir mais de 80 mandados de busca e apreensão, a PF descobriu que o esquema, apesar de ter sido montado no âmbito do Judiciário, também tinha ramificações em importantes órgãos do Executivo. Além de envolver um juiz e três desembargadores, a quadrilha contava com a participação de quatro advogados, de um membro da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e de uma servidora da Receita Federal. Ao denunciar o esquema por corrupção ativa e por crime de formação de quadrilha, o Ministério Público Federal alertou para o poder corruptor dos "empresários" da jogatina.
O segundo fato ocorrido recentemente foi o desmonte, por meio da Operação Novelo, realizada por 750 agentes da Polícia Civil de São Paulo, de uma organização criminosa que explorava jogos de azar pela internet. Ao todo, foram vasculhadas 358 lan houses de fachada, apreendidos 3 mil computadores e cumpridos 25 dos 39 mandados de prisão expedidos pela 1ª Vara Criminal da capital. Também foram bloqueados imóveis, carros de luxo, barcos e contas bancárias da quadrilha, que agia em 12 Estados, movimentava cerca de R$ 60 milhões por ano e era liderada por donos de casas de bingo e máquinas caça-níqueis. O esquema era tão organizado que chegava ao requinte de "franquear" lojas nas quais os apostadores só entravam se tivessem uma senha ou se fossem conhecidos pelos "franqueados". As apostas eram feitas em dinheiro e, para participar desse cassino virtual, os apostadores escolhiam os valores a serem creditados, imprimiam um boleto e faziam o depósito.
Além de promover a jogatina, a quadrilha manipulava os resultados. Quando o valor dos prêmios pagos aos jogadores ultrapassava a margem de lucro estabelecida pela quadrilha, os administradores do site "derrubavam" imediatamente a conexão. Os jogos eram programados para reter cerca de 80% dos valores apostados. Em troca de 20% do lucro de cada "franquia", a organização criminosa providenciava desde o aluguel de imóveis e a aquisição de equipamentos até o fornecimento do software e do sinal para jogos online. E, para dificultar eventuais investigações da Polícia, os sites eram hospedados em servidores nos EUA. Segundo o delegado Weldon Carlos Costa, interceptações telefônicas também revelaram disputas por pontos de exploração de jogo, corrupção de servidores públicos, cobranças com uso de violência e até "indícios de ligações com homicídios".
Ao comentar o sucesso da Operação Novelo, o governador José Serra classificou o jogo como uma forma de roubo e criticou o substitutivo aprovado pela CCJ da Câmara. O deputado Régis de Oliveira ainda tentou justificá-lo, afirmando que, com a legalização do bingo, os estabelecimentos terão "destinação exclusiva e não poderão explorar outros serviços". Pelo que foi apurado pela Operações Têmis e Novelo, não é difícil ver quem está com a razão.
O BNDES E A CRIAÇÃO DE MONOPÓLIOS
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
29/9/2009
O objetivo do BNDES de favorecer a criação de "campeões nacionais" - empresas brasileiras com caráter de multinacionais - é louvável, embora enfrente diversas dificuldades, entre elas o atraso tecnológico de nossas empresas e a concorrência das multinacionais que procuram se instalar no País.
É claro que, no contexto da economia mundial atual, grandes empresas levam grande vantagem. No entanto, sua expansão se baseia, em primeiro lugar, na superioridade tecnológica e na capacidade de inovação. Nesse campo, o Brasil sofre um grande atraso, que tem suas raízes num sistema educacional muito deficiente. Seguramente, o grande sucesso das empresas da Califórnia, do Japão e dos países asiáticos em geral repousa na inovação tecnológica.
No Brasil, as vantagens comparativas se baseiam na disponibilidade de riquezas naturais: minérios, produtos agropecuários, madeira. São commodities cujos preços são formados fora do País. Seria necessário industrializar essas matérias-primas com tecnologias inovadoras, que impusessem ao mercado externo os produtos resultantes. Nesse sentido, a melhor contribuição do BNDES seria estimular as pesquisas tecnológicas.
As descobertas de grandes reservas de petróleo deveriam estimular-nos a que nos tornássemos um país inovador na área da petroquímica, setor em que colhemos o nosso maior malogro até agora. Embora sejamos um dos maiores produtores mundiais de minério de ferro, a existência de outros grandes produtores nos impede de pensar em exercer um monopólio no setor siderúrgico. A situação é muito mais cômoda no caso da produção de carne ou de celulose.
A vantagem de termos um grande mercado doméstico é, seguramente, importante, porém precisamos ter o cuidado de não criar monopólios que possam prejudicar os consumidores nacionais. Nesse sentido, caberia mais ao governo facilitar a criação de empresas multinacionais brasileiras mediante reformas tributárias e administrativas que as favorecessem.
Devemos atentar para o movimento atual de transferência de fábricas de multinacionais para nosso país, que procuram implantar-se aqui para fornecer ao mercado doméstico com equipamentos já amortizados. De certo modo, isso dificulta a pretensão do BNDES de criar grandes empresas nacionais, pois elas teriam de enfrentar uma competição estrangeira mesmo dentro do Brasil.
UM PASSO ATRÁS
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
29/9/2009
Brasil se intromete mais do que deve em Honduras e toma atitude estranha de negar-se ao diálogo com governo de fato
O ENVOLVIMENTO do Brasil na crise hondurenha foi além do razoável, e provavelmente o Itamaraty já perdeu a capacidade de mediar o impasse. É preciso dar um passo atrás e recuperar a equidistância em relação seja à intransigência de um governo ilegítimo, seja a uma plataforma, dita bolivariana, descompromissada com a democracia.
O Brasil perdeu o mando sobre sua embaixada em Tegucigalpa. A casa está ocupada por cerca de 60 militantes, que acompanham o presidente deposto, Manuel Zelaya. Devido à omissão do governo brasileiro, Zelaya e seu séquito transformaram uma representação diplomática estrangeira numa tribuna e num escritório político privilegiados.
O salvo-conduto para o proselitismo chegou ao ápice no sábado. De dentro da embaixada brasileira, Zelaya conclamou a população do país à revolta. Se o Brasil considera o presidente deposto seu "hóspede", deve impor-lhe a regra fundamental da hospitalidade diplomática: calar-se sobre temas políticos internos. Do contrário, caracteriza-se intromissão de um país estrangeiro em assuntos domésticos hondurenhos.
A propósito, terá o Itamaraty controle sobre todos os cidadãos alojados em sua representação? Sabe, de cada um, a nacionalidade e o motivo de estar ali? O abrigo deveria restringir-se a Zelaya e seus familiares próximos; todos os demais precisam ser retirados da embaixada. Não cabe ao Brasil hospedar a guarda pretoriana do presidente deposto.
Outra posição cada vez mais estranha do Brasil é a recusa absoluta de negociar com o governo interino de Roberto Micheletti. Tal intransigência contraria a tradição diplomática do Itamaraty, não contribui para a dissolução do impasse e cai como uma luva para o objetivo do chavismo -interessado em prolongar a desestabilização política em Honduras.
O presidente Lula negocia com a ditadura cubana e a favor dela interveio na Assembleia Geral da ONU. Em Nova York, afagou o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, que acabava de reiterar a negação do Holocausto e ser flagrado em nova trapaça nuclear. Logo depois, na Venezuela, Lula se reuniu com golpistas africanos e ditadores homicidas do continente, como Robert Mugabe (Zimbábue) e Muammar Gaddafi (Líbia) -o líder sanguinário do Sudão não pôde comparecer porque poderia ser preso numa conexão aérea.
O regime chefiado por Roberto Micheletti em Honduras ocupa categoria bem mais tênue de ilegitimidade democrática. Violou a Constituição ao expulsar do país um presidente eleito, quando a ordem da Corte Suprema era de prender Zelaya, por afronta a essa mesma Carta. O governo interino, contudo, respeitou a linha sucessória constitucional, assegurou o poder em mãos civis e manteve o calendário das eleições presidenciais, marcadas para 29 de novembro.
O Brasil precisa recobrar a lucidez diplomática -e, com ela, a sua capacidade de mediação. Ajudar a dissolver o impasse é a melhor contribuição que o Itamaraty tem a oferecer no caso de Honduras.
MAIS CONSERVADORA
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
29/9/2009
APESAR de ter perdido mais de um ponto percentual dos votos desde a última eleição parlamentar alemã, em 2005, a frente conservadora da premiê democrata-cristã Angela Merkel, a aliança CDU/CSU, venceu o pleito de domingo.
O fiel da balança foi a derrocada dos social-democratas do SPD, rivais históricos e até agora sócios difíceis na chamada "grande coalizão". Perderam 12 pontos e livraram Merkel de sua principal amarra política.
O resultado deve conduzir à formação de um governo mais conservador, com retorno à coalizão com os liberais do FDP que tanta estabilidade conferiu ao governo de Helmut Kohl no período 1982-1998. Liderado por Guido Westerwelle, o FDP empalmou quase 15% dos votos, marca inédita. Para alguns analistas, menos por seus méritos do que por cálculo utilitarista do eleitorado, interessado em repudiar a grande coalizão.
As complicações da aliança forçada entre CDU/CSU e SPD custaram mais caro, do ponto de vista eleitoral, aos social-democratas. Participando do governo, soavam falsas tanto a crítica quanto a reivindicação de autoria da política relativamente bem-sucedida de combate à crise econômica. Os alemães, a julgar pelos votos, atribuíram-na à premiê e a seu partido.
A campanha eleitoral, no entanto, foi feita mais de silêncio que de propostas. Pouco se debateu a divisão -decerto menor que na Reunificação, em 1990, mas ainda marcante- entre o ocidente e o oriente do país.
Mesmo sobre a crise, a aliança de Merkel só promete um vago corte de impostos. Para a economia global, é a medida certa: estimula-se o mercado interno alemão, e o gigante passa a importar mais. Mas não se sabe ao certo como os conservadores lograrão tal feito, com deficit público de 6% do PIB estimado para 2010.
CENTRO-DIREITA CAPTURA O GOVERNO NA ALEMANHA
EDITORIAL
VALOR ECONÔMICO
29/9/2009
Os partidos tradicionais alemães levaram uma surra nas eleições de domingo. Apesar da forte perda de votos do bloco democrata cristão da primeira ministra Angela Merkel, ela conseguiu manter-se no poder e obter junto a seus aliados liberais do FDP uma maioria, embora pequena, de cadeiras no Parlamento. Com isso, poderá se livrar da "grande coalizão" com os rivais social-democratas, formada para resolver um impasse eleitoral há 4 anos. Ainda que a margem de vantagem parlamentar seja estreita, há muito mais margem para entendimentos com os liberais do FDP, que garantiram maioria à centro-direita, do que com os social-democratas.
A primazia da centro-direita no poder, porém, forçará a novas definições que não garantem um segundo termo tranquilo a Merkel. Os liberais fizeram campanha com base no corte de impostos, com o qual concordou a CDU-CSU de Merkel, e na necessidade de levar avante as reformas da saúde e do auxílio ao desemprego. A vitória de Merkel foi recebida pelas principais associações empresariais com alívio e com a esperança de que as reformas, empacadas durante o período da "grande coalizão", possam enfim deslanchar. Esta perspectiva é rósea demais para um país que amargará uma queda de 5% no seu Produto Interno Bruto no ano e que verá a fila dos desempregados crescer até 2010.
A Alemanha, que sempre seguiu a linha dura fiscalista na zona do euro, terá um déficit público de cerca de 6% do PIB em 2010, fruto da recessão e do aumento dos gastos sociais para enfrentá-la. Maior exportador do mundo, a Alemanha foi um dos países mais atingidos pela crise e, em tese, teria de estimular seu consumo doméstico e diminuir seus superávits comerciais, conforme os EUA receitaram, sem sucesso, na reunião do G-20. Com os "estabilizadores automáticos" (seguro desemprego e outros programas de auxílio à renda) drenando mais recursos públicos, é difícil saber como Merkel e seus aliados agora vão atacar o déficit público e, ainda por cima, cortar impostos. Alguns economistas alemães acreditam que liberais e democratas-cristãos farão simplesmente o contrário do que pregaram em campanha: elevar tributos.
Por outro lado, partir para reformas após quatro anos de paralisia pode agora não ser uma tarefa mais fácil do que antes. A uma configuração política de centro-direita corresponderá uma reação contrária de uma oposição mais à esquerda que seduz parte dos social-democratas. O SPD, com cerca de 23% dos votos, teve sua pior performance desde 1953 (28,8%). Já os votos de A Esquerda, uma fração que rompeu com a moderação do SPD, crescem constantemente e chegam agora a pouco mais de 12%. Os verdes avançaram para 10%. A dura derrota dos social-democratas deixou aberta a possibilidade de que o partido se mova mais para a esquerda no seu congresso de novembro. A oposição à centro-direita reforçada crescerá e terá apoio dos sindicatos.
Angela Merkel terá de exercer seus dons de equilibrista por mais tempo. Seu discurso após as eleições, no qual prometeu ser a chanceler de "todos os alemães", é um primeiro sinal de que não pretende levar à frente programas impopulares, como são os de sua agremiação e os dos liberais. Boa parte da prática do bloco governista dependerá do comportamento da economia, que começou a se recuperar no segundo trimestre.
Crises profundas tendem a deslocar o pêndulo político fortemente para a esquerda, mas isso agora não ocorreu. Merkel arquivou princípios liberais, comportou-se como uma keynesiana e injetou bilhões de euros na economia. A virada se deu por forças das circunstância, de seu instinto político e da camisa de força do governo de coalizão. Há poucas dúvidas de que foram as ações para mitigar os efeitos da crise financeira um dos fatores decisivos para a vitória eleitoral. Se a economia global se recuperar logo, os aliados da centro-direita poderão tentar iniciar nova onda de reformas. Este não é o cenário mais provável, e então Merkel terá que governar com os liberais usando a mesma cautela que usou nos últimos anos e que muitos alemães chamam de paralisia. As baixas eleitorais de social-democratas e democratas cristãos indicam que a política alemã não encontrou um novo centro de gravidade. A margem de manobra de Merkel continuará pequena.
POSSE QUESTIONADA
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
29/9/2009
Para a maioria da população, a decepção está consumada. É o aumento do número de vereadores em todo o país. Resta apenas tentar adiar a data a partir da qual valerá a infeliz iniciativa do Congresso.
Nesta luta estão à frente, ainda bem, as instituições com as quais a população conta para o caso: o Ministério Público Eleitoral e a Justiça eleitoral, cujo entendimento é o mesmo: a ampliação do quadro de vereadores, conforme a PEC (Proposta de Emenda Consticional) nº 58, só pode ser posta em prática em 2012.
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Carlos Ayres Britto, enviou ofício ontem aos presidentes dos tribunais regionais eleitorais (TREs) informando a visão da Corte sobre a PEC dos Vereadores: as novas vagas nas câmaras municipais só poderão ser preenchidas a partir da próxima eleição.
No ofício, Britto deixa claro que não tem "a pretensão de interferir na esfera da autonomia" dos TREs, mas informa o resultado de uma consulta feita em 2007 ao TSE. A resposta da Corte é que a aplicação da emenda está condicionada a sua aprovação antes do processo eleitoral.
O mesmo assunto foi tema de entrevista à imprensa concedida pelo ministro Ayres Britto. "Ficou dito pelo TSE de forma unânime que a emenda constitucional não retroage. O novo número de cadeiras parlamentares fixadas por ela tem de ser submetido a uma convenção partidária, o que se dá entre 10 e 30 de junho do ano da eleição. Vale dizer, nos termos dessa consulta, que a emenda atual chegou tarde para entrar em vigor na corrente legislatura", declarou o presidente do TSE.
No último dia 10, após a PEC dos vereadores ser aprovada em primeiro turno pela Câmara, Ayres Britto também havia se manifestado. Afirmou que "a jurisprudência do TSE entende que se pode sim aumentar o número de vereadores (por PEC), mas só vale para a legislatura subsequente, porque uma emenda não pode substituir a voz das urnas". Sem dúvida, esta é a lógica que respeita o sentido das eleições.
Já a Procuradoria Regional Eleitoral no Espírito Santo se posiciona na mesma linha de entendimento. Recomendou aos 55 promotores eleitorais do Estado que ajuízem recursos contra a expedição do diploma para suplentes de vereadores que tentarem tomar posse.
No caso de diplomas que já tenham sido expedidos, a Procuradoria Regional Eleitoral orienta aos promotores eleitorais que ingressem com mandados de segurança na Justiça Eleitoral para suspender os efeitos da diplomação e impedir a posse dos suplentes. Sim, porque eles foram rejeitados de acordo com as regras do pleito de 2008.
A iniciativa da Procuradoria Regional Eleitoral do Espírito Santo é semelhante à adotada pela Procuradoria Regional Eleitoral de São Paulo em relação aos promotores eleitorais daquele estado. O conceito é o mesmo: a ocupação imediata das vagas é inconstitucional. Burla as regras do pleito.
No Espírito Santo, serão 153 novas cadeiras. Em valores de hoje, haverá acréscimo de R$ 8,6 milhões em pagamentos de salários nos 42 municípios capixabas que terão a representação parlamentar ampliada.
As prefeituras não terão de aumentar os repasses às câmaras. Ao contrário, diminuirão os percentuais de receita a serem transferidos, segundo a PEC dos vereadores. Amanhã, porém, não faltarão pretextos para aumentar o montante de dinheiro para as câmaras. Esse é o receio que se espalha, acompanhado da sensação de que as cidades nada ganharão com o inchado do Legislativo
GREVES E BOM SENSO
EDITORIAL
ESTADO DE MINAS
29/9/2009
Direito constitucional carece de lei complementar
A Constituição Federal, em seu artigo 9º, e a Lei 7.783/89 asseguram o direito de greve a todo trabalhador, competindo-lhe a oportunidade de exercê-lo sobre os interesses que devam por meio dele defender. Contudo – é bom que se deixe bem claro isso –, esse direito, assegurado constitucionalmente, ainda não foi regulamentado, como tantos outros introduzidos na Carta Magna em 1988 e que viraram letra morta ou objeto de diferentes interpretações, a favor ou contra – especialmente da Justiça do Trabalho –, justamente por não haver legislação complementar. O governo Lula cogita manter o direito à greve dos servidores, proibindo-a, entretanto, nos setores chamados essenciais, como os da saúde e segurança pública, e, em alguns, estabelecendo limites. As greves poderão eclodir como meio de defesa de pautas reivindicatórias, desde que dentro de determinadas condições, a principal delas a manutenção em atividade de uma quantidade determinada e necessária de servidores.
As centrais que congregam sindicatos de trabalhadores Brasil afora e lideranças próprias dos servidores consideram que as categorias não podem ficar desarmadas na hora de reivindicar, principalmente se o que se pede são aumentos ou reajustes salariais. E o governo aproveita para remeter esse assunto ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que, via projeto de lei, prevê que o reajuste total da folha de salários no serviço público, já descontada a inflação, só pode ter aumento de 1,5%. Para os dirigentes sindicais, algumas categorias podem ter um aumento maior e outras menor, ou nada.
Considera-se legítimo o exercício de greve, com a suspensão coletiva temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação de serviços, quando o empregador ou a entidade patronal correspondentes tiverem sido avisadas 72 horas antes, nas atividades essenciais, e 48 horas, nas demais. A greve também é lícita quando não for contra decisão judicial. São assegurados aos grevistas o emprego de meios pacíficos tendentes a persuadir ou aliciar os trabalhadores a aderir à greve; a arrecadação de fundos; e a livre divulgação do movimento. Quanto às proibições, os meios adotados por empregados e empregadores em nenhuma hipótese poderão violar ou constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem. Por sua vez, à empresa é vedada a adoção de medidas para constranger o empregado ao comparecimento ao trabalho, bem como capazes de frustrar a divulgação do movimento. Cabe frisar que a manifestação e atos de persuasão utilizados pelos grevistas não poderão impedir o acesso ao trabalho nem causar ameaça ou dano à propriedade ou pessoa.
Há dias o país vem convivendo com greves de diferentes categorias (carteiros, bancários e médicos do sistema público, entre outras), ocasionando muitos transtornos à população. Por isso, é preciso que essa regulamentação seja feita logo pelo Congresso Nacional. O direito a reivindicar dos trabalhadores é constitucional, mas à maioria deles, ao governo e ao povo não interessam as paralisações totais nos serviços essenciais. Elas provocam desordem, desassistência em setores capitais e danos no bem-estar coletivo.
VEXAME NA DOAÇÃO DE ÓRGÃOS NO DF
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
29/9/2009
O histórico de resistência à doação de órgãos no Distrito Federal registrava 2003 como o ano mais crítico da série do levantamento: 23% das famílias se recusaram a praticar o gesto humanitário. A taxa mais alta a partir de então se verificou em 2005: 18,5%. Este ano, de janeiro a 18 de setembro, o ato nobre foi recusado por inéditos 31,8%, mais do que o dobro de 2008. No país, a média no primeiro semestre foi de 20,2%. Sinal de que o espírito de solidariedade do brasiliense precisa ser incentivado.
A cada potencial doador cuja retirada de órgão é negada pela família esvai-se parte da esperança de 11 pacientes da fila nacional de transplantes. Na melhor das hipóteses, a delonga agrava a angústia e a qualidade de vida. Na pior, a morte chega antes do socorro. Em 2000, 56 pacientes não resistiram à espera por um rim no DF. Em 2008, 167. A dor certamente é mais difícil de ser assimilada quando várias barreiras foram vencidas, as condições se revelaram propícias e a salvação não chegou apenas porque alguém disse não, e o sim significava a redenção.
Este ano, quase metade dos possíveis doadores do DF (48,9%) foi rejeitada no primeiro semestre devido a contraindicações médicas. Portadores de HIV e de doenças infecciosas não podem doar. Pulmão de fumante quase sempre é rejeitado. Depois vêm as circunstâncias da captação, conservação e transporte do órgão, a compatibilidade etc. etc. etc. É inadmissível que, superadas todas as dificuldades, surja trincheira intransponível formada pela indiferença, o egoísmo ou a ignorância.
No plano nacional, houve crescimento de 24,3% no número de transplantes no primeiro semestre do ano, em relação ao mesmo período de 2008. Na contramão, a capital federal, que deveria estar na vanguarda, realizou um procedimento a menos: de 19 para 18, comparando-se as ocorrências de janeiro a julho do ano passado com as dos meses correspondentes de 2009. E não foi por falta de investimento em políticas de saúde pública voltadas para o setor. Por exemplo, a equipe da Central de Captação, composta por apenas três profissionais, ganhou mais cinco no fim de 2008.
Aumentar o número de doadores é o desafio maior no setor de transplantes em todo o país, mas a situação consegue ser mais vexatória no DF. Na outra ponta, a boa lição vem de Santa Catarina. Enquanto a média nacional de doadores efetivos é de sete por 1 milhão de habitantes, o estado atingiu em 2008 a razão de 16,7 por 1 milhão. É o caso de aprender com os catarinenses. Eles reduziram em 53% a resistência familiar. Entre as medidas para o sucesso, adotaram forma mais humana de abordar as famílias. Além disso, cabe reforçar a campanha de conscientização lançada no fim de semana pelo Ministério da Saúde.
PONTO CEGO
EDITORIAL
DIÁRIO DE CUIABÁ (MT)
29/9/2009
Dois jatos de última geração, novos, pilotados por experientes comandantes, se chocaram no ar. Um deles, da companhia aérea Gol, despedaçou-se caindo no município de Peixoto de Azevedo, sobre a mata na calha do rio Xingu, região norte de Mato Grosso, matando os seis tripulantes e os 148 passageiros.
Esse acidente, no Brasil o segundo em número de vítimas, aconteceu na tarde de 29 de setembro de 2006, portanto há três anos. A Força Aérea Brasileira (FAB) instaurou inquérito policial militar para apurar as causas, e em outras esferas da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) e o Ministério Público Federal em Mato Grosso também aprofundaram investigações.
Imediatamente após o acidente, a associação dos pilotos fez uma denúncia muito grave: revelou que na aerovia Brasília-Manaus há o chamado “ponto cego” num trecho da rota que se estende entre o norte e o nordeste de Mato Grosso, na área onde as duas aeronaves se chocaram.
A denúncia mereceu cautelosa resposta da ANAC e da FAB. Ambas admitiram o tal ponto cego, que resumidamente significa uma área onde as torres de controle em Brasília e Manaus perdem a comunicação por rádio com o avião que a sobrevoa.
Nenhuma autoridade detalhou se além do corte da comunicação o avião também desaparece dos radares do Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam). Porém, independentemente de permanecer ou não na telas, está claro que a aviação civil no ponto cego em Mato Grosso é atividade de alto risco.
Transcorridos exatos três anos do trágico acidente aéreo o Ministério da Defesa não se pronunciou sobre o problema do ponto cego, nem anunciou nenhum investimento para ampliar a capacidade de vigilância do Sivam, e assim eliminar essa falha estrutural.
Diante da omissão das autoridades do setor sobre a falha na segurança da aviação civil em parte do território de Mato Grosso, cabe aos senadores e deputados federais da bancada mato-grossense uma enérgica ação cobrando informações e exigindo que a comunicação das torres com as aeronaves seja estabelecida. O que não pode persistir é a aventura de agora, com uma aerovia utilizada inclusive por rotas internacionais, onde o “visual” é a grande ferramenta dos comandantes.
O Ministério da Defesa tem que agir antes que ocorra novo acidente na rota Brasília-Manaus e também para dotar as regiões norte (Xingu) e nordeste (Araguaia), de moderno sistema de comunicação entre torres e aeronaves, fato esse que contribuirá para reprimir os vôos clandestinos de aviões de pequeno porte utilizados por narcotraficantes. A prática nos ensina que para fazer o poder público funcionar é preciso cobrá-lo insistentemente. Que a bancada federal o faça, a partir de agora.
“O Ministério da Defesa tem que agir antes que ocorra novo acidente”
INFLAÇÃO É IMPOSTO
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
29/9/2009
A discussão que se seguiu ao anúncio de que o governo irá tributar os ren¬¬dimentos das cadernetas de poupança com saldo superior a R$ 50 mil levantou uma questão pouco entendida pelos brasileiros: o fato de que, ao tributar rendimentos financeiros, o governo lucra com a inflação. Quando alguém compra um título público e recebe 8,75% de ju¬¬ros ao ano, o governo cobra até 20% de Im¬¬posto de Renda sobre o ganho total do aplicador, apesar de o equivalente a 4,5% referir-se apenas à correção monetária, considerando uma taxa de inflação anual neste porcentual. No exemplo citado, descontada a inflação, o ganho real do aplicador é de 4,25% no ano. Como o imposto é sobre o total, o governo come 1,75% (20% sobre 8,75%), deixando um ganho em forma de juro real de apenas 2,5% ao ano.
Essa é apenas mais uma das formas que o governo tem para se defender do processo inflacionário, deixando o ônus do problema para a população. Tanto os que recebem renda do trabalho quanto os que ganham renda do capital sofrem perdas com a inflação. Num primeiro momento, os rendimentos financeiros nominais são corroídos, situação que até mesmo políticos, alguns por ignorância e outros por má fé, não compreendem bem, o que os motiva a criticar a taxa de juros, sem mencionar que parte dela é apenas o reflexo da inflação. Segundo, a inflação tem o efeito de reduzir o valor dos ativos, sejam eles financeiros ou reais, tais como imóveis, ações ou aplicações de renda fixa.
Quando se compara a taxa de juros básica no Brasil com a taxa básica de outros países sem considerar a inflação e os impostos so¬¬bre os juros, a conclusão é defeituosa e equivocada. Uma análise honesta e tecnicamente correta, comparando a Selic, que é a taxa básica brasileira, com a Prime Rate, que é a taxa básica nos Estados Unidos, exige expurgar os tributos e a inflação sobre os juros, lá e aqui. Somente assim é possível tirar conclusões sobre a realidade dos fatos e os efeitos sobre a economia em ambos os países. Para as autoridades governamentais ou essa discussão não é muito interessante ou eles, não todos, realmente não conseguem ver o problema em toda a sua complexidade.
É por essas e outras que a melhoria do de¬¬bate econômico e o desenvolvimento do país dependem de que tanto os políticos quanto os governantes tenham um mínimo de educação financeira e conhecimentos, ainda que rudimentares, de teoria econômica. Porém, a falta de instrução financeira e o desconhecimento do funcionamento da economia são deficiências que não se resolvem em curto prazo. É um processo longo e demorado, mesmo assim, desde que os currículos escolares comecem a ensinar os conteúdos pertinentes.
PERIGOS DA GASTANÇA
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
29/9/2009
Os organismos internacionais que teceram elogios por ter o Brasil se saído bastante bem da crise internacional, são unânimes em dizer que o país poderá ter seu crescimento futuro prejudicado pela gastança do setor público. Segundo os analistas, o aumento dos gastos públicos correntes (que excluem investimentos) poderá obrigar o governo a aumentar sua dívida, o que elevaria a taxa básica de juros, ou fazer um duro ajuste fiscal no futuro, o que reduziria sua capacidade de investir na infraestrutura e em equipamentos sociais. Além desses efeitos, a gastança pode jogar lenha na fogueira da inflação. Qualquer desses efeitos acabaria por diminuir a capacidade do país de conseguir crescimento econômico, além de levar os adversários do capitalismo a dizerem que o governo fez opção por pagar juros da dívida em detrimento de gastos sociais. A estes parece tão difícil entender que os juros são apenas a consequência da política de gastar mais do que
ANTES DA EMERGÊNCIA
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
29/9/2009
Mais uma vez, na entrada da primavera, muitas cidades da região sul do país veem-se em situação de calamidade pública devido às chuvas, aos temporais e às cheias dos rios. Centenas de famílias são dramaticamente afetadas, perdendo vidas e bens, em episódios que se repetem cada vez com maior frequência e gravidade. As tragédias climáticas ou ambientais, além de exigirem a mobilização das comunidades a partir da consciência em relação às causas desses fenômenos, exigem do poder público tanto ações de socorro imediato quanto medidas preventivas, capazes de reduzir o impacto danoso desses cataclismos. Várias cidades gaúchas e catarinenses vivem neste momento, pela segunda vez no mês, o drama das chuvas e dos temporais.
No curto século 21 que percorremos até agora, dezenas de vezes a sociedade tem sido chamada para enfrentar os desafios do clima. Inundações e secas, vendavais e incêndios, granizo, frio intenso e calor excessivo sucedem-se numa repetição que já não pode ser considerada nem surpreendente nem inusitada. Houve estiagens amplamente prejudiciais à economia agrícola e ao bem-estar dos cidadãos. Houve enchentes dramáticas, com sequelas assustadoras, como ocorreu, com mais de cem mortes, na região de Blumenau, no ano passado. E agora, com amplitude menor – mas nem por isso menos aflitiva para os que sofrem suas consequências –, muitas cidades enfrentam a tarefa de reconstruir-se depois de terem sido atingidas por enchentes ou por vendavais. É, novamente, um momento para a solidariedade e para ações emergenciais que diminuam o sofrimento das populações atingidas.
Mas pode ser também um momento para a reflexão das autoridades, que às vezes se descuidam em relação ao quesito prevenção. Quando uma prefeitura permite loteamentos clandestinos nas margens dos rios, está acendendo o estopim para a tragédia. Quando um governo não prevê recursos para a Defesa Civil, está deixando seus governados expostos aos azares das intempéries. Quando as administrações municipais se descuidam da limpeza de bueiros, do assoreamento dos rios ou não dispõem de planos diretores cuidadosos, estão criando condições para surpresas desagradáveis, quando não trágicas. De um ponto de vista mais amplo, torna-se evidente a necessidade de que União, Estados e municípios mantenham estruturas de defesa civil ágeis e eficientes. Mas não apenas isso. Cada vez mais exige-se que as estruturas existentes possam ser mobilizadas para ajuda recíproca, sempre que forem a isso desafiadas pelos fatos.
É mais eficaz e mais inteligente que governos e instituições ajam antes das emergências, não apenas em consequência delas.
AS DIÁRIAS DOS PARLAMENTARES
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
29/9/2009
A polêmica suscitada em torno da falta de rigor na concessão de diárias para parlamentares e servidores da Assembleia, fazendo com que usufruam desse benefício mesmo em viagens a suas cidades de origem, é um bom pretexto para que a questão seja discutida de forma objetiva e voltada para a busca de soluções. O desgaste provocado pelo debate do tema poderia ter sido evitado se tivessem sido adotadas alternativas para impedir a continuidade do uso desse mecanismo como complementação de renda. Mesmo quando a lei é omissa, como ocorre no caso, isso não significa que o dinheiro público possa ser usado sem necessidade claramente comprovada.
No caso específico, é importante reconhecer que a Assembleia gaúcha é pioneira na divulgação dos valores destinados a cada parlamentar, por meio do site Transparência RS. O mecanismo, porém, mesmo permitindo ao contribuinte apurar quanto cada parlamentar recebeu a título de diária, é falho ao omitir o detalhamento de quanto teria sido destinado para alimentação ou para hospedagem. E, em qualquer situação na qual esteja envolvida verba oficial, a prestação de contas precisa ser amplamente detalhada.
Felizmente, sobram propostas capazes de proporcionar um fim a qualquer suspeita de mau uso das verbas para custear viagens de deputados e funcionários do Legislativo. Entre elas, está a substituição das diárias com valor fixo por uma forma de ressarcimento dos gastos efetivamente comprovados e com um limite preestabelecido. A saída vai depender, obviamente, da disposição dos parlamentes em resolver o problema.
Num Estado em que considerável percentual da população enfrenta dificuldades para bancar o dia a dia, fica difícil entender que o dinheiro público possa ser usado sem um mínimo de rigor nos controles. Os deputados gaúchos, que ousaram instituir o Transparência RS, precisam se mostrar os principais interessados em assegurar moralização nos gastos e rigor na prestação de contas.
DESEMPENHO GERMÂNICO
EDITORIAL
DIÁRIO DE PERNAMBUCO
29/9/2009
A nação alemã ainda enfrenta problemas com referência a essa reunificação das Alemanhas de Leste e do Oeste - as partes antagônicas em que ficou desdobrado o país germânico a partir do término da Segunda Grande Guerra, que durou de 1939 a 1945 - não se completou inteiramente, não somente porque os filhos de ambas as partes se comportam de maneiras diversas, mas porque não foi possível harmonizar entre as duas a velocidade do desempenho econômico-social, isto depois de 20 anos decorridos do sinal verde para a decolagem do histórico processo, que se verificou após o fim do regime soviético.
Persiste maior o desemprego da mão de obra na parte leste do país correspondente à antiga Alemanha Oriental, que na outra parte. A parte ocidental é, de longe, mais dinâmica e influente nos grandes negócios que a outra. Visão interpretativa das recentes eleições para a renovação federal dos mandatos mostra isto. A parte economicamente mais rica e equilibrada da atual Alemanha vota como votam as grandes democracias tradicionais, o voto é mais dirigido ao incentivo do bem-estar adquirido do que ao simples protesto, o voto por assim dizer de "direita" sobrepuja em larga margem o de "esquerda". No lado oeste, as petições acompanham a ocorrência de um bem-estar disseminado, na outra parte, convoca-se o estado, em detrimento da economia privada, a fazer mais pelos que dele mais dependem.
A enviada especial do jornal Folha de São Paulo a Berlim, diz, com efeito, que a "exuberância prometida ao leste não se concretizou de todo, mas deu lugar a um desencanto que se traduz em movimentos tanto de esquerda quanto de extrema-direita de maneira mais acentuada do que na outra metade do país", a parte rica e próspera.
Até proximamente a metade do vintênio, a parte oriental cresceu mais que a outra parte, mas, depois de breve período em que os números se equivaleram, o desempenho do oeste nunca mais deixou de predominar. Lembra o jornal paulistano no mesmo trabalho que, sem crescimento sustentável, os analistas não veem como se possa reduzir oalto desempenho de hoje no antigo lado oriental, chegando ao dobro do que ocorre na outra metade do país. "Já a renda equivale a 70% daquela que beneficia os alemães do oeste", observa.
Opina-se a cada momento com maior insistência que a ex-Alemanha do leste demandará subsídios anuais da ordem de 30 bilhões de euros, durante um período de no mínimo 10 anos a contar de agora. O prognóstico oficial é otimista, dizendo por exemplo o ministro Wolfgang Tiefensee que "o leste está convergindo para o oeste".
Outro grave problema é o da migração demográfica. Entre 1989 e 2007, assinala o Instituto da População e Desenvolvimento de Berlim, mais de 1,7 milhão de indivíduos migraram do leste para o oeste, "tangidos pelos baixos salários e pouco trabalho".
Em que pesem as dificuldades de uma integração desse porte e natureza, acredita-se que a maioria do povo alemão possa achar que a reunificação acabou com uma situação que não poderia durar indefinidamente. Ali naquela oposição leste-oeste residia um dos mais escabrososfocos de conflito de toda natureza a envolver não apenas os alemães de um e outro lado, mas, igualmente, outras nações poderosas com enormes interesses fortemente arregimentados e garantidos pelas armas. Não nos faltaram vezes em que, periclitando Berlim, punha-se em perigo de morte o resto do mundo.
VIOLÊNCIA SEM LIMITE
EDITORIAL
DIÁRIO DO NORDESTE (CE)
29/9/2009
A violência urbana assomou um patamar inadmissível, tanto entre as autoridades policiais do Estado como no seio dos aplicadores do Direito, tão graves têm sido as ocorrências, observando um crescendo sem limite. No Ceará, nos primeiros nove meses deste ano, ocorreram dois mil homicídios, 813 dos quais praticados com armas de fogo. Esta é a face escancarada da falta de controle, comprovando a carnificina em tempo de paz.
Na Região Metropolitana de Fortaleza, onde se concentram os maiores recursos disponíveis para a prevenção e a reação contra os delitos, as estatísticas da criminalidade não deixam por menos. Nos nove primeiros meses deste ano foram praticados mil homicídios na Grande Fortaleza, dos quais 58% tiveram como modo operacional a execução sumária, a maioria estando relacionada a dívidas de drogas e parte expressiva das eliminações envolvendo menores de idade.
Em situações prementes como esta, a primeira cobrança procedente se volta para o aparelho policial do Estado, a braço com a circulação de armas clandestinas, muitas das quais alugadas no mercado informal para o cometimento de variados tipos de delito. A esta emergência, o poder público acena com a criação da Divisão de Homicídios, uma unidade policial da Secretaria de Segurança, especializada nessa forma de crime, com pessoal e estrutura para enfrentar o desafio.
Mas a questão, de tão complexa, não se cinge apenas à Segurança Pública. Há forte conteúdo social nessa problemática, exigindo ações sociais efetivas para reverter os riscos a que estão expostos os grupos de adolescentes sem o efetivo cuidado de suas famílias, sem atrativos na escola, sendo presa fácil, portanto, do comércio das drogas. A eliminação de menores em débito para com os fornecedores de substâncias alucinógenas tem-se tornado uma rotina chocante e desumana.
Nesse contexto de patologias sociais, deve ser encarada a experiência que começa a ser implantada no Eusébio, fundamentada em portaria baixada pelo juiz da Comarca, respaldada pelo Ministério Público e apoiada pelo Conselho Tutelar, disciplinando a circulação de menores pelos bares, casas de shows, restaurantes e logradouros públicos. Esta é uma ação preventiva em favor dos menores em situação de risco, portanto, de apoio às próprias famílias.
A verdade, pouco reconhecida e proclamada, é a desatenção das famílias, alcançando as marcas da irresponsabilidade social. Se houvesse controle dos pais sobre os filhos, não haveria necessidade de a Justiça estabelecer horários de permanência dos menores desacompanhados na via pública. Esse disciplinamento deve ser visto como uma providência educativa e preventiva. Nada mais.
Nos municípios onde esse ordenamento ocorreu, com o apoio das próprias famílias, dos empresários da noite e das autoridades, os resultados são animadores. A intervenção do magistrado deve ser recebida como uma contribuição da Justiça para evitar, em breve, a generalização da criminalidade, como já ocorre em alguns bolsões de miséria da região metropolitana. Essa intervenção emergencial não impede outras medidas sociais de proteção aos menores, nem fere seus direitos.
FICHAS-SUJA, É HORA DE MUDAR ESSE QUADRO
EDITORIAL
A CRÍTICA (AM)
29/9/2009
Uma legislação nova tem sempre por objetivo atualizar padrões, acolher novos comportamentos e projetar hábitos civilizatórios no seio de uma determinada sociedade. Nestes dias tivemos um bom exemplo dessa característica do mundo do direito positivo quando um balanço mostrou que ao menos 600 políticos perderam o mandato por compra de votos.
Estes políticos - e os mandatos que conquistaram de forma ilegítima - foram pegos por uma lei que há dez anos foi introduzida no ordenamento jurídico-eleitoral brasileiro. Foi um avanço e tanto, puniu governadores, senadores e vereadores nos mais distantes rincões do País. O mais importante, contudo, é que a lei, por rigorosa, está criando um novo hábito, que precisa ser respeitado sob pena do "trapaceiro" eleitoral perder o "investimento escuso" no plenário de um tribunal. É uma legislação consolidada, ou como diz o adágio popular é "uma lei que pegou".
Na outra ponta, naquela em que projetamos comportamentos desejáveis, há uma franca e ampla manifestação da sociedade civil com vistas a implantar no Brasil uma legislação saneadora prevendo a exclusão das eleições nacionais de candidatos com problemas judiciais, mesmo que na primeira instância da Justiça. São os chamados candidatos "fichas-suja".
Se em 1998 já tivessémos essa legislação, o ex-deputado federal Hildebrando Pascoal (AC), homem que tem diversas condenações, a última delas a 18 anos por decepar o corpo de um adversário com uma motoserra, jamais teria ascendido a um posto no Congresso Nacional. Mas Hildebrando é apenas o mais exuberante dos “fichas-suja” que conquistaram um mandato. Escondidos pelo vácuo legal, muitos candidatos com problemas na Justiça desfilam faceiros pelo processo político eleitoral sem que o eleitor, senhor de baraço e cutelo do destino público ao ter o voto na mão, tenha a devida consciência da real situação do dito candidato. Esse quadro precisa mudar!
Há quem defenda o princípio segundo o qual todos são inocentes até o trânsito em julgado de um processo. No entanto, é lícito lembrar que em termos eleitorais é imperioso que o eleitor tenha todas as informações possíveis sobre o candidato. Não pode o dono do voto usar sua prerrogativa sem saber em quantas e quais embrulhadas jurídicas está envolvido o seu preferido. É hora de mudança e 20 mil amazonenses a referendam.