EDITORIAIS 14/9/2009 -
14/9/2009 - EDITORIAL
EDITORIAL
O GLOBO
14/9/2009
Dos três assaltantes presos recentemente depois de terem mantido seis pessoas como reféns em Copacabana, um deles, de 19 anos, já cumprira medida socioeducativa numa instituição dedicada à recuperação de menores delinquentes.
A tentativa de assalto trouxe à lembrança outro crime, que dessa vez terminou em tragédia: o sequestro do ônibus 174, em 2000. No episódio morreu uma das vítimas. O bandido — também morto — igualmente havia passado por uma instituição de correição de menores.
São dois exemplos, entre inúmeros outros, de falhas numa política supostamente voltada para a proteção e recuperação do menor infrator. Segundo o presidente do Conselho Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente, Carlos Nicodemos, o índice de reincidência em crimes de jovens atendidos no Departamento Geral de Ações Socioeconômicas do Rio (Degase) é de 70%, percentual que se repete quando o menor chega à idade adulta e acaba entrando na rede penitenciária.
Há, evidentemente, algo errado num sistema que não resgata jovens da trilha fácil do crime — antes, parece facilitar-lhe o acesso aos descaminhos da ilegalidade. Nesse sentido, o principal arcabouço legal do país destinado a proteger o menor, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), claramente deixou de cumprir o papel para o qual foi criado, há quase duas décadas. Tratase de legislação cimentada em conceitos paternalistas, a tal ponto que, como notou há alguns anos o jurista Alyrio Cavallieri, o ECA tem um excesso de capítulos sobre os direitos do menor e quase nenhuma referência aos deveres.
Quase 20 anos de equívocos abrigados num corpo legal que, longe de proteger o menor e salvaguardar a sociedade, ajuda a acirrar os problemas decorrentes da delinquência juvenil são tempo suficiente para reclamar necessárias mudanças na lei. Entre elas, impõemse a redução, de 18 para 16 anos, do limite de inimputabilidade do jovem envolvido com o crime e o fim da borracha que se passa no prontuário do infrator quando ele alcança a maioridade.
São mudanças inescapáveis, mas que não têm o dom de, por si só, mudar o quadro. O menor inegavelmente precisa da proteção do Estado, e mantê-lo afastado do crime pressupõe, entre outras providências, reformar as instituições correcionais e oferecer ao jovem na linha de recrutamento do crime alternativas como educação eficiente e inclusão no mercado de trabalho.
BALANÇO DA RESSACA UM ANO DEPOIS
EDITORIAL
JORNAL DO BRASIL
14/9/2009
RIO - O aniversário de um ano da crise econômica mundial, cujo marco foi a queda do banco americano Lehman Brothers, é um momento de avaliação. Em cada lugar, faz-se o balanço do abalo financeiro mais devastador desde a Grande Depressão de 1929. Contam-se os mortos e feridos, expressão que, neste caso, não se restringe apenas a uma figura de linguagem. Tal como no crack do século 20, magnatas endividados chegaram à atitude extrema do suicídio, e aumentos do crime e da violência foram registrados, sobretudo nos Estados Unidos, epicentro do terremoto que chacoalhou o planeta.
Mas, conferindo às baixas um significado menos literal e mais econômico, o resultado do estrago provocado pela grande crise de 2008 tem surpreendido no caso do Brasil. A ideia de que o país seria levado de roldão para o fundo do poço não se confirmou, assim como os cenários mais catastróficos desenhados no ano passado. Não houve um tsunâmi, como o que atingiu os Estados Unidos, a Europa e o Japão. Também não houve a anunciada e otimista “marolinha”, esperada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas entre as previsões, reconheça-se, o país ficou longe dos prognósticos mais sombrios e mais perto da visão poliana – não fosse política e estrategicamente conveniente – do presidente. Entre nós, a crise estourou como uma desagradável ressaca praiana, superável nos dias seguintes.
Esse balanço positivo foi mostrado em caderno especial publicado no domingo pelo Jornal do Brasil. Para alguns especialistas, o país não só venceu a crise, como, em certos setores, a exemplo do bancário, saiu fortalecido do processo.
Um ano depois, a indústria de exportação, a mais atingida pela crise financeira mundial, subiu suas expectativas em relação a vendas, uso de capacidade instalada, produção e contratações. O índice de confiança entre as empresas exportadoras disparou de 48 pontos em janeiro para 71 pontos em agosto. Está longe da média histórica de 97,5 pontos, mas já sinaliza uma disposição para investimentos, o que deve ocorrer nos próximos meses.
Graças à força do mercado interno, com o aumento da massa salarial no período e o desemprego que não veio com a intensidade prevista, o comércio varejista pairou sobre toda a turbulência. As vendas só não foram melhores que em 2008, quando a economia crescia a galopes. Destaque para os setores de eletrodomésticos e de automóveis, favorecidos pela política anticíclica de desoneração de impostos feita pelo governo federal, que reduziu, de modo acertado, o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), estimulando o consumo e fazendo a roda da economia girar.
A taxa de desemprego, que subiu no início da crise, teve uma inflexão. Muitas empresas, depois de terem se preparado para o pior, tiveram de voltar a contratar para dar conta do consumo dos brasileiros, que, no segundo trimestre deste ano, aumentou 3,2% em relação ao mesmo período de 2008. O PIB subiu 1,9% ante o primeiro trimestre deste ano. Ou seja, a ressaca que atende pelo nome de recessão passou.
São dados que mostram um país muito diferente daquele vulnerável a qualquer bafejo vindo de algum lugar do planeta. Fruto das políticas que estabilizaram a economia, no governo FHC. Fruto das que, no atual, lhe deram vigor.
O STF E O CASO BATTISTI
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
14/9/2009
Ao classificar como "tendenciosas e ideológicas" as decisões já tomadas no julgamento do pedido de extradição do ativista italiano Cesare Battisti, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro da Justiça, Tarso Genro, foi além dos despropósitos, que têm sido uma das marcas de sua gestão, demonstrando desconhecer o funcionamento do Estado de Direito.
Dizer que a mais alta Corte do País converteu Battisti num "preso político ilegal no Brasil" e que sua extradição provocará uma "crise entre os poderes" é uma bobagem tão grande que o presidente do Supremo, Gilmar Mendes, se sentiu obrigado a refutá-la de imediato, afirmando que as posições de Tarso Genro não têm endosso nem mesmo nos diferentes escalões do próprio Ministério da Justiça.
Condenado em 1988 a pena de prisão perpétua pela Justiça italiana, por ter cometido quatro homicídios na década de 70, Battisti fugiu para a França, depois para o México e chegou ao Brasil em 2004, aqui vivendo clandestinamente até ser preso em 2007, quando então pediu o status de refugiado político. Na ocasião, o Ministério das Relações Exteriores da Itália divulgou nota afirmando que Battisti era um delinquente comum que havia invocado motivos ideológicos e distorcido a história política italiana para justificar seus crimes perante a opinião pública internacional.
Ao julgar o caso, no final de novembro do ano passado, o Comitê Nacional para Refugiados (Conare) - o órgão colegiado encarregado de tratar da matéria e que é integrado por representantes de cinco Ministérios e do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados - acatou o argumento do governo italiano, recusou refúgio a Battisti e recomendou sua extradição. Em janeiro deste ano, contudo, o ministro Tarso Genro revogou a decisão do Conare e concedeu a Battisti o status de refugiado político. Em resposta, o governo italiano arguiu a ilegalidade da decisão do ministro junto ao STF, contestou os argumentos históricos e políticos por ele invocados e entrou com pedido de extradição de Battisti. As provas anexadas ao processo não deixaram margem a dúvidas, mostrando que as liberdades públicas estavam em plenitude na Itália, quando Battisti matou um guarda, um policial, um joalheiro e um militante político.
Ao julgar o recurso, na quarta-feira, o STF o desdobrou em duas etapas. A Corte primeiro examinou a legalidade da revogação da decisão do Conare. Por 5 votos contra 4, ela entendeu que Genro exorbitou de suas funções. Além de decidir que o ministro da Justiça não podia anular a decisão de um órgão interministerial, o STF considerou arbitrária a concessão de status de refugiado a Battisti.
Com essa decisão a Corte enquadrou duplamente o ministro da Justiça. Ela apontou os limites de seu cargo, no caso, e não se deixou levar pela tentativa de Genro, com o apoio de parlamentares do PT, de deslocar a discussão do campo da legalidade para o da legitimidade. O entendimento que prevaleceu foi o de que, quando a democracia está consolidada, ninguém pode apelar para a violência e depois invocar o princípio de que a "nobreza" dos fins justifica a torpeza dos meios. Essa é uma lição ensinada no primeiro ano dos cursos jurídicos, mas, no caso de Genro, ele teve de aprendê-la com base nas decisões do Supremo.
Concluída a primeira parte do julgamento, o STF passou a julgar o mérito do pedido de extradição. Em seu parecer, o relator Cezar Peluso lembrou que o réu não comprovou as perseguições políticas que teria sofrido e que as vítimas de Battisti foram mortas com requintes de violência. E votou pela extradição. A sessão foi suspensa por causa de um pedido de vista do penúltimo ministro a votar, Marco Aurélio de Mello. A votação estava em 4 a 3 a favor da extradição e, como Mello se inclina a votar contra e Gilmar Mendes deixou claro que Battisti terá de ser extraditado, em princípio o caso já estaria decidido. Pelo regimento do STF, porém, os ministros que já votaram ainda podem mudar de posição, o que torna incerto o julgamento do pedido de extradição. De qualquer modo, qualquer que seja o resultado final da segunda parte do julgamento, a decisão já dada à primeira parte, reafirmando a independência do Judiciário e enquadrando um ministro da Justiça que pretendeu prevalecer-se do cargo para impor uma decisão baseada unicamente em afinidade ideológica, é uma vitória da razão e do bom senso.
A RECUPERAÇÃO DA CLASSE C
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
14/9/2009
A crise interrompeu um processo de crescimento das classes de renda mais alta e da consequente redução das camadas mais pobres que vinha sendo observado pelo menos desde o início da década e que marcava uma melhora constante do quadro social brasileiro. Esta é a constatação de um estudo do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), segundo o qual os efeitos mais agudos da crise foram registrados nos quatro primeiros meses de 2009. O estudo aponta também que, nos meses mais recentes, a situação mudou e é possível que esteja sendo restabelecida, paulatinamente, a tendência anterior, de melhora da renda da população.
Elaborado com base na Pesquisa Mensal de Emprego (PME), realizada pelo IBGE nas seis principais áreas metropolitanas do País, o estudo da FGV mostra que a faixa representada pelas classes A e B - formadas por famílias com renda mensal superior a R$ 4.807 - passou de 11,09% da população em julho de 2003 para 15,05% em julho do ano passado, com crescimento de 35,7%; a classe C, com renda familiar na faixa de R$ 1.115 a R$ 4.807, aumentou 23,1%. Já as classes D (renda familiar de R$ 804 a R$ 1.115) e E (renda familiar de até R$ 804) diminuíram 15,5% e 37%, respectivamente.
A crise inverteu esse padrão. Provocou o encolhimento da fatia dos brasileiros que têm renda mais alta e fez crescer a dos que ganham menos. Entre setembro do ano passado, quando a crise começou a se espalhar para o resto do mundo, e abril deste ano - pior mês para o Brasil em termos de renda da população - a faixa correspondente às classes A e B diminuiu 6,8% e a classe C encolheu 0,8%. Em compensação, a classe D aumentou 3,3% e a classe E, 5,7%. Ou seja, por causa da crise, muitos brasileiros passaram para faixas de renda inferiores.
Mais numerosa de todas, a classe C foi a que mais empurrou as pessoas para as faixas de renda mais baixa. Não apenas por abrigar a maioria dos trabalhadores qualificados, mas, sobretudo, pelo papel que desempenha na preservação do equilíbrio da sociedade, o encolhimento da classe C começava a preocupar.
Foi ela que simbolizou um dos fenômenos sociais mais notáveis dos últimos anos, caracterizado pelo aumento da renda real e pelo aumento do emprego formal. Foi também a classe C que, com a sofisticação de hábitos de consumo estimulada pela melhora de sua renda, sustentou a notável expansão do mercado interno.
Em algumas categorias de produto, como a de telefones celulares pré-pagos, essa fatia da população responde por até 70% das vendas. Em outras, como a de alimentos, bebidas e produtos de higiene e limpeza, ela responde por 50% do mercado interno. Por isso, a classe C é o principal alvo das empresas de bens de consumo.
Dados referentes aos meses mais recentes divulgados pelo coordenador do estudo da FGV, economista Marcelo Cortes Neri, indicam que, depois dos sinais preocupantes de encolhimento da camada média da população e do aumento da desigualdade de renda no começo do ano, a situação está voltando aos níveis observados antes do início da crise mundial. "Houve um empate", disse Neri ao comentar os números. Não chega a ser um resultado ruim, pois se temeu que a deterioração do quadro social em razão da crise seria mais intensa e mais longa.
Na maioria das áreas metropolitanas, depois da crise, a renda média dos moradores da capital teve desempenho pior do que a dos que moram nos demais municípios. A maior discrepância entre as rendas, na capital e em outros municípios, foi constatada na Grande São Paulo. Na capital, a renda média per capita caiu 3,2% de julho de 2008 a julho deste ano, enquanto nos demais municípios aumentou 6,7%.
Uma das hipóteses de Marcelo Neri para explicar essa discrepância é o fato de, por serem mais industrializadas e mais voltadas para o mercado externo, as capitais serem mais suscetíveis à crise. Além disso, como a crise se propagou através dos mercados financeiros e os demais municípios metropolitanos são menos conectados a esses mercados do que as capitais, seu efeito na periferia da região metropolitana foi menor.
A POLÍTICA DE METAS DO CNJ
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
14/9/2009
Desde que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) passou a estabelecer metas de produtividade para todas as instâncias e setores especializados do Judiciário, com o objetivo de agilizar a tramitação das ações e melhorar a qualidade do serviço jurisdicional prestado à população, juízes, desembargadores e até ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) vêm questionando o alcance e a legalidade dessa iniciativa. Para assegurar o cumprimento das metas, alguns membros do CNJ querem adotar medidas punitivas, como a proibição de ascensão na carreira dos magistrados considerados improdutivos.
O protesto mais recente partiu do ministro Marco Aurélio de Mello, do STF, que aproveitou a sessão de homenagem póstuma ao ministro Carlos Alberto Direito, recentemente falecido, para acusar o CNJ de "atravessar a Constituição". Segundo ele, em vez de se limitar ao controle externo do Judiciário, tarefa que lhe foi atribuída pela Emenda Constitucional nº 45, o Conselho teria se convertido num "superórgão", tentando enquadrar todos os tribunais do País. Com isso, concluiu o ministro, o CNJ estaria assumindo uma posição superior à do próprio STF na hierarquia judicial.
Convocados pelo CNJ, há sete meses os presidentes de todos os tribunais brasileiros se reuniram em Belo Horizonte e estabeleceram 10 metas de produtividade que o Judiciário deveria atingir em 2009. A meta que mais irritou as diferentes instâncias da magistratura e levou Mello a criticar publicamente o presidente do CNJ e do STF, Gilmar Mendes, é a de número 2. Imposta sob a justificativa de assegurar o "direito constitucional a uma razoável duração do processo judicial", ela visa a encerrar em caráter definitivo, até o final do ano, todas as ações protocoladas antes de dezembro de 2005 e que ainda aguardam julgamento.
Para atingir esse objetivo, desde o primeiro semestre o CNJ vem patrocinando a campanha "Meta 2 - bater recordes é garantir direitos". As magistraturas estaduais, federal e trabalhista, contudo, alegam que suas cargas de trabalho são muito grandes e que a maioria absoluta das varas judiciais não dispõe de estrutura física e de servidores em número suficiente para fazer o que está sendo exigido. Em nota, os juízes federais de São Paulo e Mato Grosso disseram que a chamada "Meta 2" foi estabelecida a partir da premissa de que todas as varas funcionariam do mesmo modo, executariam o mesmo tipo de serviço e contariam com o mesmo quadro de pessoal. No universo forense, porém, as Justiças estaduais, a Justiça Federal e a Justiça do Trabalho têm realidades distintas e cada instância tem suas especificidades.
Na Justiça Federal, por exemplo, as varas que julgam processos previdenciários estão mais abarrotadas do que as especializadas em questões penais e tributárias. Os juízes que atuam nos Juizados Especiais Federais reclamam que os órgãos governamentais na área da seguridade social são morosos no encaminhamento de documentos, sem os quais os julgamentos não podem ser realizados e as sentenças não podem ser executadas.
Por seu lado, os juízes estaduais do Paraná alegam que, se tiverem de se dedicar exclusivamente ao julgamento dos processos anteriores a 2005, para cumprir a meta do CNJ e não terem suas careiras comprometidas, serão obrigados a atrasar os despachos mais simples das ações protocoladas a partir de 2006. "A consequência é uma nova acumulação de trabalho a ser enfrentada no futuro. Os objetivos impostos pelo CNJ são impossíveis de cumprir ", diz nota divulgada pela Associação dos Magistrados do Paraná.
Em resposta a essas críticas, o ministro Gilmar Mendes alegou que a "Meta 2" foi fixada com base em dados enviados pelos próprios tribunais, mas não confirmou se os juízes que não as atingirem não poderão ser promovidos pelo critério de mérito. Na realidade, esse é um impasse que deveria ser resolvido com bom senso, sem exaltação de ânimos. Afinal, a inédita iniciativa do CNJ de impor metas de produtividade é absolutamente necessária para a administração da Justiça. Mas é preciso assegurar que tais metas sejam exequíveis, para que não funcionem como uma camisa de força que provocará tensões entre o CNJ e os tribunais, sem viabilizar o tão necessário descongestionamento do Judiciário.
O ESTATUTO DA RAÇA
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
14/9/2009
Câmara aprova lei de igualdade com vários dos defeitos eliminados, mas ameaça racialista resiste em projeto no Senado
O ESTATUTO da Igualdade Racial terminou aprovado na Câmara esvaziado do conteúdo controverso da proposta original do senador Paulo Paim (PT-RS). Caíram as reservas de um número de vagas, em programas de TV e instituições públicas de ensino superior, para pessoas que declarem ter pele preta ou parda. Sobreviveu a cota de 10% nas vagas para candidaturas legislativas.
Em vez de cotas, o estatuto prevê a possibilidade de um incentivo fiscal para empresas que contratem no mínimo 20% de pessoas que considera negras. O projeto ainda necessita da aprovação do Senado. Existe a expectativa de que o presidente Lula o sancione em 20 de novembro, Dia da Consciência Negra.
Com razão, muitos brasileiros repudiam o critério racial -que carece de fundamento científico- como base para a discriminação positiva, concebida para corrigir desigualdades flagrantes na sociedade nacional.
Cidadãos que, nas pesquisas populacionais do IBGE, declaram preta ou parda a sua pele constituem fração desproporcional do contingente de pobres. Muitos ficam sem acesso aos meios de ascensão propiciados pela educação universitária. Consagrar em lei o equívoco da divisão da sociedade em raças, contudo, nem por isso se torna solução aceitável, à luz do imperativo constitucional da igualdade entre os cidadãos.
A motivação original do estatuto se reapresenta em outro projeto de lei, oriundo da Câmara. Foi aprovado pelos deputados com uma reserva de 50% das vagas em faculdades federais e estaduais para alunos egressos das redes públicas de ensino. Com a ressalva da parcela exagerada da reserva -metade, em todo o país-, trata-se aqui de medida aceitável, pois beneficia todos, sem distinção de cor de pele, num estrato em que prevalecem jovens de menor renda.
Apesar disso, o projeto torna obrigatória também uma subcota nesse contingente, para alunos considerados negros e índios, na proporção de sua representação populacional no Estado onde funcionar a instituição. Da Câmara o projeto seguiu ao Senado. Na Comissão de Constituição e Justiça, a relatora, Serys Slhessarenko (PT-MT) já votou por manter o texto da Câmara.
O opositor Demóstenes Torres (DEM-GO), porém, apresentou substitutivo eliminando o critério racial e reduzindo a reserva para estudantes de escolas públicas de 50% a 30% das vagas -e só nas instituições federais. Sua proposta também limita as cotas ao prazo de 12 anos.
A adoção do critério social é a medida mais razoável para corrigir a distorção de classes no acesso ao ensino superior público. A USP apostou nessa via -refutando a absorção de qualquer viés racial em seu vestibular- e colhe resultados promissores. A fatia de calouros egressos de escolas públicas atingiu 30% neste ano, contra 26% em 2008. No curso de medicina, no qual a aprovação é das mais difíceis, essa proporção saltou de 10% para 38%, de um ano para o outro.
Está aí, sem dúvida, um bom exemplo a ser seguido.
A FIESP NOS COMERCIAIS
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
14/9/2009
POUCAS instituições brasileiras desfrutam de imagem tão boa, em termos de eficiência, utilidade pública e importância educacional, quanto as do chamado "sistema S", de que são exemplos o Sesi e Senai. Só por isso, já seria de estranhar que veiculem publicidade na TV, nos ônibus e no metrô enaltecendo qualidades amplamente reconhecidas pela população.
Estranha-se mais ainda -ou melhor, entende-se perfeitamente- que o material propagandístico esteja concentrado na figura de Paulo Skaf, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. É a Fiesp, órgão representativo por excelência do empresariado paulista, que controla o Sesi e o Senai.
A candidatura ao governo paulista está nas cogitações de Skaf, que há dois meses contratou o célebre publicitário Duda Mendonça como consultor da Fiesp. Eis que o rosto do presidente da entidade é lançado para o conhecimento mais amplo da população, numa campanha de R$ 8 milhões. Os recursos, é crucial lembrar, provêm de contribuição compulsória de todo empresário paulista, seja qual for sua preferência partidária.
Argumenta-se, na Fiesp, que a presença de Skaf na investida publicitária seria para mostrar que Sesi e Senai não são órgãos do governo, e sim da iniciativa privada, sendo assim legítimo associá-los ao líder empresarial.
Certamente, não veio da fértil imaginação de Duda Mendonça um argumento tão inconvincente. O velho aparelhamento das entidades sindicais, tão comum nos órgãos representativos dos trabalhadores, repete-se na Fiesp. O público e o privado, a pessoa e a instituição, misturam-se desse modo pelas artes da política e da propaganda.
E o "Sistema S" corre o risco de tornar-se, pelo menos até as próximas eleições, uma outra coisa: o Sistema Skaf.
CUIDADOS AO COMPRAR OS CAÇAS DA FRANÇA
EDITORIAL
VALOR ECONÔMICO
14/9/2009
O governo anuncia que reabriu as oportunidades para ofertas de fornecedores interessados em vender 36 caças à Força Aérea Brasileira. Mas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os ministros da Defesa, Nélson Jobim, das Relações Exteriores, Celso Amorim, e o assessor internacional da Presidência, Marco Aurélio Garcia, declaram sua preferência pelos aviões oferecidos pela Dassault francesa, os Rafale. Uma carta do presidente francês, Nicholas Sarkozy, prometendo transferência "irrestrita" de tecnologia e a compra de 10 aviões cargueiros da Embraer, ainda em projeto, teria baseado a decisão favorável aos caças franceses.
Na semana anterior à visita de Sarkozy, em entrevista à "France Presse", Lula atribuiu aos franceses "vantagem comparativa excepcional", por ser "o país mais flexível para transferência de tecnologia". Como revelou o Valor, no jantar com o presidente francês, no domingo, porém, Lula havia sido alertado de que a enorme diferença de preço e custo entre os caças franceses e os concorrentes dava aos Rafale desvantagem considerável na análise técnica e financeira que a FAB pretendia apresentar oficialmente no fim deste mês.
Numa demonstração de preferência pela oferta apoiada por Sarkozy, o Planalto montou uma reunião de emergência, de madrugada, na qual os franceses, entre eles executivos da própria Dassault, ofereceram resposta às objeções feitas pela Aeronáutica. Uma delas, o alto custo de operação e manutenção dos caças, cerca de US$ 14 mil por hora/voo, quase o triplo da dos Gripen suecos.
O avião sueco tem só uma turbina, o que distorce a comparação com os concorrentes, equipados com duas, que os faz mais seguros e potentes. Mesmo o caça americano tem operação bem mais barata, quase um terço menor que a do francês. Os negociadores de Sarkozy prometeram baixar o custo dos aviões e isso provoca comentários descrentes da concorrência. Sarkozy avalizou o trato e garantiu um souvenir para levar de volta à casa: a primeira promessa de compra, por um país estrangeiro, dos aviões franceses, até agora um fracasso de mercado, sem nenhuma concorrência vencida.
"No fundo, o Brasil quer comprar um avião com a garantia de uso e transferência total de tecnologia", disse Lula. Essa parece ser, de fato, a motivação da decisão política em favor dos franceses. É exagero ver, na decisão do governo brasileiro, sinal de hostilidade ou afastamento em relação aos EUA, o perdedor da disputa.
Já em meados de 70, o então presidente Ernesto Geisel deixou clara sua independência em matéria de estratégia militar, ao firmar o acordo nuclear com a Alemanha e pôr fim ao acordo militar mantido desde a década de 50 entre Brasil e EUA - uma resposta às pressões do governo democrata de Jimmy Carter pelo respeito aos direitos humanos no Brasil.
A Alemanha forneceu submarino ao Brasil; era a França a fornecedora dos caças, os Mirage, da Força Aérea. A decisão pelos Rafale foi política, mas se sustenta tecnicamente e não marca o afastamento - talvez só indique a falta de aproximação entre Brasil e EUA nesse campo. Desafio não para Lula, mas para o governo Obama, que conseguiu tirar do seu Congresso autorização de ofertas tecnológicas no pacote de venda dos jatos F/A-18 Super Hornet, inclusive permissão para adaptações que permitissem aos caças usar mísseis fabricados fora dos EUA.
Os EUA também prometem boa oportunidade à Embraer, já que negociam a compra de 100 aviões Super-Tucano. Uma associação com a Boeing, no caso dos caças, favoreceria a Embraer nessa concorrência, mas autoridades dos EUA garantem que um fracasso da venda dos F/A-18 não reduzirá as chances da empresa para o fornecimento aos EUA.
O governo brasileiro diz tratar a questão dos caças como um negócio, com implicações estratégicas. É de se esperar, porém, que as ponderações estratégicas não levem os cofres públicos a bancar um mau negócio. Os franceses costumam ser negociadores duros, cuidadosos com cada termo impresso em contrato. Na negociação recente para uma ponte sobre o rio Oiapoque, com custos divididos ao meio, até paralisaram a construção exigindo que impostos pagos ao governo brasileiro entrassem na conta. Se for confirmada a compra dos aviões franceses, que sejam destacados técnicos, e não políticos, na hora de botar no papel as vantagens prometidas por Sarkozy.
OPORTUNISMO CONDENÁVEL
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
14/9/2009
Os deputados federais estão em campanha salarial. Entre eles mesmos, porque têm a prerrogativa singular de decidir sobre a própria remuneração. Querem ganhar igual aos ministros do Supremo Tribunal Federal.
A Câmara aprovou na última quarta-feira o projeto que aumenta o subsídio dos ministros do STF de R$ 24.500 para R$ 25.725 a partir de 1º de setembro deste ano; e para R$ 26.723 em fevereiro de 2010. Agora, a proposta será votada no Senado.
Antevendo que dificilmente os senadores a derrubarão, um grupo de deputados oportunistas quer pegar carona e colocar em discussão um projeto que equipara os salários dos três Poderes. Articulam nos bastidores a elaboração de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para assegurar que os vencimentos dos congressistas (deputados federais e senadores) e do presidente da República sejam iguais aos dos ministros da Suprema Corte.
Os avanços salariais seriam expressivos. Hoje, o benefício de R$ 24.500 mil recebido pelos ministros do STF apresenta diferença de R$ 7.988 para a remuneração básica dos deputados, que é de R$ 16.512, e de R$ 13.080 para o vencimento do presidente da República, que é de R$ 11.420.
Na Câmara, parece muito restrita a resistência à proposta de reajuste para os parlamentares - mesmo sendo uma questão impopular. A divergência é sobre datas.
Alguns deputados acham que a equiparação só deve ser paga aos congressistas e ao presidente da República que tomarem posse em 2011. Outros defendem a idéia de que a bondade salarial entre em vigor já em 2010 - apesar de ser ano de eleição. Avaliam que nenhum dos atuais detentores de mandato será fulminado eleitoralmente por isso. Apostam em uma situação mais fácil de lidar: a diluição do ônus. Afinal, uma PEC para ser aprovada precisa receber no mínimo 308 votos favoráveis, ou seja, três quintos dos 513 deputados. É muita gente para dividir a culpa.
Vale lembrar, no entanto, que a contestação popular ao custo dos congressistas não tem como razão única o benefício básico. Os R$ 16.512 que recebem atualmente é apenas uma parcela de uma grande soma.
A cada deputado é destinada verba de gabinete no valor de R$ 60 mil mensais, para contratação de assessores e outros funcionários. Existe também verba indenizatória de R$ 15 mil para bancar alimentação, hospedagem, combustível, etc.; auxílio-moradia de R$ 3 mil a cada mês, ou apartamento funcional com despesas por conta do Legislativo; passagens aéreas que custam entre R$ 4.500 e R$ 17.500, de acordo com o Estado de origem do parlamentar; verba de R$ 6 mil para despesas gráficas (impressões ou reprodução de documentos); cota postal e telefônica de R$ 5.513,09 para líderes, vice-líderes, presidentes e vice-presidentes de comissões, e de R$ 4.268,55 para os demais deputados. A criação de privilégios é fértil.
Pesquisas mostram que o Congresso brasileiro é um dos mais caros do mundo em relação ao nível médio de renda da população. Mas essa condição não parece incomodar os parlamentares. Em maio de 2007, a Câmara elevou em 28,5% o benefício básico dos deputados, que saltou de R$ 12.847 para os atuais R$ 16.512. Agora, ressurge uma antiga meta: a equiparação salarial ao STF.
A tentativa anterior ocorreu no final de 2006, quando a Câmara, sob a presidência de Aldo Rebelo, aprovou projeto nesse sentido. Mas o aumento foi revogado pela Corte Suprema ao acolher ação direta de inconstitucionalidade (Adim) movida por um grupo de deputados. Será que vamos chegar novamente a esse ponto?
UM NÃO A BENESSES
EDITORIAL
ESTADO DE MINAS
14/9/2009
Caso Batistti quebra praxe antiga do STF
O julgamento sobre o refúgio político do ex-ativista italiano Cesare Batistti pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que dividiu a corte – foi suspenso por pedido de vistas de um dos ministros –, repercute nos meios políticos e jurídicos por envolver modificação profunda no exercício da representação da soberania nacional pelo Executivo, inédito no país. Por quatro votos a três, a história mudou. O STF considerou ilegal a concessão do refúgio ao acusado e, desse modo, abriu caminho para a análise do mérito da extradição. Restou do juízo preliminar que o governo tem arbítrio, mas limitado, para conceder refúgio. E os limites estão na própria lei do refúgio, que obriga a autoridade a enquadrar sua decisão num dos casos expressamente previstos. A medida tomada pelo ministro da Justiça, Tarso Genro, pretendeu transformar em perseguido por opinião política um estrangeiro condenado por assassinatos comuns e premeditados (contra um açougueiro e um joalheiro), durante vigência plena da democracia na Itália. As sentenças contra Battisti haviam sido confirmadas em seu país, na França, para onde fugira, e na Corte Europeia de Direitos Humanos. O que Genro argumentou foi facilmente desqualificado pelo relator do caso, ministro Cezar Peluso, à luz do que constava nos autos e na Lei 9.474, de 1997.
Constitucionalistas atestam que está em jogo é o reconhecimento da prerrogativa do Executivo, como maior representante da soberania nacional, de decidir sobre questões que ponham frente a frente o Estado soberano do Brasil e outro Estado soberano, estrangeiro, nesse caso, a Itália. De acordo com esse entendimento, não seria da competência do STF entrar na esfera política, cabendo à corte apenas aferir a adequação dos procedimentos administrativos às normas inscritas. Assim, a concessão de refúgio é ato político e não jurídico, ficando com o Executivo avaliar se, do ponto de vista do interesse nacional, vale a pena acolher ou não a solicitação de alguém que busca a proteção do Estado brasileiro, por razões humanitárias ou políticas, não cabendo, dessa forma, ao Judiciário interferir na avaliação política feita pelo Executivo nessa área. Questiona-se, também, se um tribunal do país deve aceitar uma representação de um Estado estrangeiro contra uma decisão interna e soberana do próprio Estado brasileiro. De acordo com a lei de 1997, o reconhecimento do refúgio bloqueia o trâmite de pedidos de extradição que recaiam sobre o estrangeiro.
Até quarta-feira (10), a conduta do STF, encarregado de julgar extradições, era arquivar, sem entrar no mérito, casos como o de Battisti. Entendia que a concessão de refúgio, pelas implicações nas relações externas do país, era um ato de cunho absolutamente político do Executivo e não poderia ser anulado no Judiciário. Mas parece que essa praxe do Supremo é uma página virada na história da relação dos poderes da República do Brasil. Mesmo em estágio parcial, o julgamento do caso Batistti é positivo para o equilíbrio das instituições brasileiras. A partir de agora, o governo federal vai ter que refletir muito antes de premiar estrangeiros com o refúgio apenas sob a lógica de uma ação de benevolência.
AUMENTAR OS RENDIMENTOS DO FGTS É POSSÍVEL
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
14/9/2009
As discussões sobre a rentabilidade do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) vêm ocupando espaço cada vez maior. Congresso, governo e entidades sindicais se articulam em torno do assunto. O debate recai sobre as perspectivas de aumentar o ganho do trabalhador sem prejudicar a destinação tradicional dos recursos — aplicação em obras como habitação e saneamento básico. Duas opções sobressaem. Uma delas: ações da Petrobras. A outra: Fundo de Infraestrutura.
Em 2000, pela primeira vez se deu certa flexibilidade à lei. Os trabalhadores tiveram a possibilidade de aplicar parte do FGTS em ações da Petrobras e da Vale do Rio Doce. Mais de 312 mil profissionais investiram R$ 1,611 bilhão na estatal do petróleo, 730 mil preferiram apostar R$ 1bilhão na exploradora de minérios. Foi ótimo negócio. Em sete anos, a rentabilidade dos investimentos, feitos a partir de 2002 no âmbito do Programa Nacional de Desestatização, ultrapassa os 1.000%.
Os números falam alto. Vale o confronto. O rendimento da conta vinculada do Fundo de Garantia — Taxa Referencial + 3% ao ano — é baixo. Equivale, hoje, a 4% ao ano, percentagem que mal supera a inflação. Em parte dos anos anteriores, registrou prejuízo. As estimativas do próprio governo indicam que o Fundo de Infraestrutura deve render cerca de 9% ao ano. É importante dar agilidade à definição das regras para que o trabalhador possa fazer a opção que considerar mais conveniente.
É justo, pois, pensar em alternativas inteligentes, capazes de chegar ao caminho do meio. De um lado, deve-se aproveitar a oportunidade de assegurar lucro um pouco mais generoso. De outro, impõe-se manter capitalizado o fundo. A construção civil emprega mão de obra desqualificada. A população de baixa renda beneficia-se duplamente do incremento da edificação de moradias e de obras de saneamento básico. Além de encontrar ocupação, pode adquirir a casa própria em condições menos excludentes. Assim, perde de um lado, mas ganha de outro. Definir, pois, o percentual de cada cesta é o desafio que deve ser enfrentado com serenidade e bom senso.
UM SALTO NA JUSTIÇA
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
14/9/2009
Há pouco mais de quatro anos foi instalado em Bra¬¬sília o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Fruto da Emenda Constitucional n.º 45/2004, o CNJ é um ór¬¬gão do Poder Judiciário ao qual compete, consoante o disposto no parágrafo 4.º do artigo 103-B, da Consti¬¬tui¬¬ção Federal, “o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura”.
É composto por 15 membros, todos com mais de 35 e menos de 66 anos de idade, sendo 9 membros oriundos da magistratura, 2 do Ministério Público, 2 advogados indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Bra¬¬sil e, ainda, 2 cidadãos de notável saber jurídico e de repu¬¬tação ilibada, um deles indicado pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal. O mandato é de 2 anos, admitindo-se apenas uma recondução. Em poucas linhas, esse é o retrato do CNJ.
Pois bem, antes e depois do seu surgimento, muitas foram as críticas e as dúvidas lançadas sobre o novo órgão: interferência indevida no Poder Judiciário; a quebra da independência entre os poderes; a impossibilidade de participação de que pessoas estranhas à carreira da magistratura participassem do Conselho; medo de abusos e de autoritarismo; e assim por diante. Aspectos importantes que, de uma forma ou de outra, contribuem para o debate e que apenas fortalecem o Estado Democrático de Direito.
Mas o CNJ não se encolheu. Pelo contrário, tem mostrado vitalidade e coragem para enfrentar sérios e históricos problemas que pareciam insolúveis e fadados a se perpetuar no tempo.
A eliminação da casos de nepotismo em vários tribunais do país, a destituição de titulares de cartórios admitidos sem concurso público, o incentivo à conciliação nos processos, a divulgação da arrecadação dos cartórios no Brasil, a adoção de metas para o julgamento de processos atrasados, o combate a irregularidades em concursos de ingresso na magistratura, o apoio à modernização tecnológica, a luta pelo acesso à justiça, o repúdio a abusos de autoridades, recomendações ao Poder Executivo e ao Poder Judiciário para a aprovação de determinados projetos de lei, o incentivo à institucionalização e à sistematização da atividade de planejamento no âmbito do Poder Judiciário e tantas outras iniciativas. Todos foram problemas enfrentados pelo CNJ ao longo dos últimos anos.
Assim, passados alguns anos, pode-se concluir que os acertos do CNJ superam em muitos os seus erros e as suas falhas. É inegável que o CNJ ganhou notoriedade e, principalmente, o respeito da comunidade jurídica e da sociedade brasileira. Mostrou a necessidade e, mais do que isso, a possibilidade de se repensar ultrapassadas e abomináveis presentes em quase toda a extensão do território brasileiro.
Uma visão que não significa, nem de longe, a de se defender uma justiça feita a qualquer custo ou às pressas, mas sim a de se enaltecer iniciativas que tendam a fazer valer o disposto no inciso 78 do artigo 5.º da Carta Política de 1988: “A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.
E, da mesma forma, ao se elogiar, por exemplo, o combate a irregularidades em concursos públicos, a adoção de metas de processos julgados e a institucionalização da atividade de planejamento, pretende-se apenas destacar e aplaudir práticas que, para além da retórica, tenham a potencialidade de contribuir para, no âmbito do Poder Judiciário, uma efetiva concretização dos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência, princípios esses que se encontram expressamente previstos no artigo 37 da Magna Carta.
O CASO BATTISTI
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
14/9/2009
A extradição ou não de Cesare Battisti para a Itália continua causando desconfortos e discussões aqui e acolá. Ao comentar o julgamento do caso no STF – interrompido por um pedido de vistas do ministro Marco Aurélio no momento em que o placar era de 4 a 3 favoravelmente à extradição – o ministro da Justiça, Tarso Genro, declarou que a eventual decisão do STF pela extradição de Battisti poderia causar um desequilíbrio na relação entre os poderes.
Ora, com o devido respeito à figura do ministro Tarso Genro, a alegação de possível desequilíbrio na relação entre os Poderes é, no mínimo, esdrúxula. Se é evidente a existência de uma lei – no caso a Lei n.º 9.474/1997 – que trata da concessão do refúgio e que dá ao ministro da Justiça o poder de decidir, em sede de recurso, pela aceitação ou não do pedido, não menos evidente é o fato de que tal decisão, proferida em sede administrativa – no âmbito do Poder Executivo – não impede que o Poder Judiciário, mais especificamente o STF, analise a legalidade da referida decisão, à luz da Constituição Federal.
O impedimento à atuação do Poder Judiciário é que, sim, seria incompatível com o sistema de freios e contrapesos adotado no Brasil e em outras democracias.
Por fim, vale lembrar que a decisão do ministro Tarso Genro foi contrária à orientação de seu próprio ministério. Isso porque o Comitê Nacional para Refugiados, órgão vinculado ao Ministério da Justiça, já havia manifestado, em primeira instância administrativa, posição contrária à concessão do refúgio.
MARCHA A RÉ
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
14/9/2009
A América Latina, que registrou duas décadas de aperfeiçoamento quase constante da imprensa e de sua liberdade, tem sido agredida nos últimos anos por atos que configuram retrocesso. O último desses episódios ocorreu quinta-feira na Argentina, quando, em Buenos Aires e Córdoba, agentes da fiscalização tributária promoveram uma agressiva devassa contra as empresas do jornal Clarín, que é uma das vozes críticas ao governo da presidente Cristina Kirchner. Não foi uma operação qualquer. Para pretensamente investigar “a situação trabalhista e fiscal da empresa”, cerca de 200 agentes foram utilizados na sede do jornal em Buenos Aires e outros cem em duas empresas do grupo em Córdoba. A gigantesca inspeção ocorreu um dia após o jornal publicar denúncias de corrupção no governo e ainda no contexto de uma oposição do Clarín e de outros grupos de imprensa a um projeto do governo sobre a propriedade dos meios de comunicação.
Infelizmente, essas operações oficiais com caráter de retaliação retratam, na Argentina ou em qualquer outro país, uma ameaça à liberdade de expressão. A Argentina repete assim o mau exemplo da Venezuela, onde o critério partidário e ideológico preside a renovação (ou não renovação) das concessões de emissoras de rádio e TV e onde os meios de comunicação independentes ou de oposição sofrem toda sorte de restrições. Em editorial sobre o episódio de agora, o jornal Clarín denuncia que a escalada contra a imprensa vem num crescendo desde 2003, quando o então presidente Néstor Kirchner, marido da atual chefe de Estado, passou a recusar-se a dar entrevistas coletivas abertas. Depois, o governo passou a promover ataques verbais contra jornalistas e veículos. Agora, além de executar as devassas espetaculosas e intimidadoras, o governo argentino patrocina uma lei considerada intervencionista e restritiva em relação às empresas de comunicação. Nenhuma empresa privada poderá ter abrangência nacional, o que será prerrogativa das rádios e tevês estatais. Assim, os meios de comunicação da Argentina, que durante dezenas de anos foram tidos como exemplos de qualidade, estão sob a ameaça do neopopulismo do casal Kirchner.
Por trás das ações argentinas e do cerco à imprensa na Venezuela, no Equador, na Nicarágua e na Bolívia, está uma tentativa de impor controle estatal sobre a imprensa, o que significa claramente uma ameaça à sua liberdade e ao direito dos cidadãos a informações plurais, diversificadas e confiáveis. A marcha a ré continental no tocante à qualidade da imprensa precisa ser contida pelos cidadãos conscientes e pelos governos responsáveis. Democracia e imprensa livre são irmãs gêmeas.
A SERIEDADE NECESSÁRIA
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
14/9/2009
Definida a tramitação do impeachment contra a governadora, inicia-se agora o longo ritual que esse fato consumado impõe ao Legislativo rio-grandense. Para os cidadãos gaúchos e para os interesses do Estado, o mais conveniente seria que os prazos para cada um dos atos fossem cumpridos e, até, que pudessem ser abreviados. O processo de responsabilidade contra um governador representa sempre um fato política e institucionalmente importante, independentemente de quem o promova e de como vá ser conduzido. Trata-se do julgamento da mais alta autoridade do Estado, que está no comando da administração estadual depois de ter sido eleita pela maioria dos eleitores.
Os fatos de que a governadora Yeda Crusius é acusada são conhecidos. Já foram objeto da CPI do Detran e estão sob julgamento em dois processos movidos pelo Ministério Público Federal, um no foro cível, outro no foro criminal da Justiça Federal de Santa Maria, no primeiro deles, para o qual não há privilégio de foro, um dos demandados é a própria chefe de governo. Assim, não há razão para que o processo de impeachment se eternize ou se transforme em mais um palanque para brilhaturas e demagogia.
Governistas e oposicionistas, antes de serem integrantes de partidos políticos que se confrontam na Assembleia ou que divergem nas propostas para administrar o Estado, são membros de um poder, com deveres para com a sociedade. Ao apreciarem uma questão tão grave como é o impeachment, o mínimo que deles se espera é que o façam com a seriedade e a responsabilidade que as instituições – e a história – do Rio Grande exigem.
A LITERATURA EM ALTA ESTAÇÃO
EDITORIAL
JORNAL DO COMMERCIO (PE)
14/9/2009
Ainda não somos um país "de homens e livros", como queria Monteiro Lobato. Mas a proliferação de eventos literários no Brasil, que acompanha o crescimento das feiras, festivais e bienais em todas as regiões é um bom sinal de que o brasileiro, enfim, parece tomar gosto pela leitura. De Porto Alegre a Salvador, de Belém a Paraty, um público cada vez maior tem comparecido a esses eventos. Mesmo que a produção total de livros tenha caído em torno de 3% em 2008, em relação a 2007, de 351 milhões para 340 milhões de exemplares, ou exatamente por causa disto, o papel das feiras é indiscutível.
Para se ter uma idéia, em 2007, a Bienal do Livro do Rio de Janeiro recebeu um público de 645 mil pessoas em seus 11 dias de duração. Segundo a organização, foram apurados R$ 43 milhões, correspondentes a 2,5 milhões de livros vendidos. Este ano, a Bienal do Rio começa no próximo dia 10. No dia 16 de outubro, tem início a Feira do Livro de Brasília, em sua 28ª edição. Alguns dias atrás, foi encerrado o Festival Recifense de Literatura, A letra e a voz, promovido pela Prefeitura do Recife.
De 2 a 12 de outubro será a vez da sétima edição da Bienal do Livro de Pernambuco, que este ano homenageia o Rio Grande do Sul. Com o tema Literatura do princípio ao fim, suscitará o debate sobre o processo de produção e comercialização do livro. Já considerada a terceira maior bienal do País, a expectativa é de que circulem pelo Centro de Convenções cerca de 550 mil pessoas.
O principal mérito da alta estação das feiras e bienais é o estímulo à formação de leitores. Ao participar de seminário promovido pelo Ministério da Cultura, em março, o poeta Affonso Romano de Sant"Anna observou que levamos 500 anos para colocar uma biblioteca em cada município, enquanto na Suécia a proporção é de uma biblioteca por bairro. Na trilha de Monteiro Lobato e outros defensores do livro, Affonso Romano ficou seis anos à frente da Fundação Biblioteca Nacional, época em que criou o Proler, programa de incentivo à leitura.
Pesquisa realizada pelo Instituto Pró-Livro no final de 2007 constatou que há relação direta entre o poder aquisitivo e o hábito de folhear páginas com prazer e atenção. O livro no Brasil é caro para a maioria da população, o que faz dele um item de consumo supérfluo, quando devia ser item básico. A ideia de uma "cesta básica" de livros, defendida no Senado em projeto de Cristovam Buarque, relatado por Marco Maciel, poderia ser uma opção também para os Estados e municípios.
Mas quem tem possibilidade financeira, por outro lado, alega não dispor de tempo ou interesse para a leitura, segundo a mesma pesquisa. É um dado cultural: se a leitura não é valorizada dentro de casa, a criança terá dificuldade em trocar a brincadeira pelos livros – ainda mais numa época em que a brincadeira pode estar na TV ou nos videogames. É por isso talvez que Monteiro Lobato tenha dito, em uma carta, que desejava "fazer livros onde as nossas crianças possam morar". Porque as casas onde moram as nossas crianças, infelizmente, são em sua maioria lugares em que os livros não habitam.
Desta forma, vale a pena destacar o espaço da Cidade do Livro, um parque temático voltado para as crianças que visitarão a bienal pernambucana. Muito mais que um filão de mercado, os livros infantis atiçam a curiosidade e despertam os leitores mirins, trazendo a perspectiva de uma geração que veja nos livros companheiros para a vida inteira. Companheiros que não dão resposta a tudo – pelo contrário, como enfatiza o escritor checo Milan Kundera: para ele, nos livros há pergunta para tudo, e nessa indagação constante é que se encontram sabedoria e tolerância.
A VII Bienal do Livro de Pernambuco, como digna representante da alta estação da literatura nacional, consolida-se no calendário cultural do Nordeste e faz jus à nossa tradição literária.