Thursday, August 27, 2009

EDITORIAIS

O QUE PENSA A MÍDIA
27/8/2009 - EDITORIAL
ALÉM DO LIMITE
EDITORIAL
O GLOBO
27/8/2009

Assinado em 2008, o acordo pelo qual o Estado brasileiro reconhece a personalidade jurídica da Igreja Católica enfrenta uma tramitação acidentada no Congresso, onde precisa ser ratificado. Depois de aprovado na Comissão de Relações Exteriores da Câmara, o texto foi a plenário na terça-feira, mas a bancada evangélica impediu a votação.

O impasse está criado, pois, por se tratar de um acordo internacional, ele não pode ser emendado.

É aprovar ou rejeitar.

O Vaticano, por ser também um Estado, pode assinar tratados com qualquer país. Nada a estranhar.

Fontes eclesiásticas garantem que o acordo apenas regulamenta parâmetros legais em vigor há tempos.

Em 20 artigos, o documento, de fato, em nada inova em questões tributárias e reafirma a liberdade religiosa — um direito constitucional —, mas, ao tratar do ensino religioso, considerando-o “disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental”, ameaça avançar sobre um espaço exclusivo de um Estado laico, condição adquirida pelo Brasil na primeira Constituição da República, e que deve permanecer como tal.

Se aprovado esse entendimento entre Brasília e o Vaticano, as evangélicas, todas as demais igrejas e qualquer religião podem, com razão, reivindicar um tratamento idêntico.

Nos jornais de terça, a Associação Vitória em Cristo e o Conselho de Pastores do Brasil (Cimeb) assinaram nota em que criticam o regime de urgência concedido à apreciação do projeto de decreto legislativo no qual o acordo foi convertido, para efeito de votação, e denunciam a falta de isonomia e o atropelamento do princípio da laicidade.

Numa reação em cadeia, a bancada evangélica começou a se mobilizar para apresentar o projeto da Lei Geral das Religiões, do deputado George Hilton (PP-MG), da Universal do Reino de Deus. Resumese a uma cópia do acordo do Brasil com a Santa Sé, mas extensivo a todas as religiões. Multiplicam-se, assim, as ameaças à laicidade do Estado brasileiro.

Portanto, faz sentido que a Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) também se tenha pronunciado contra os termos do entendimento, por contrariar o princípio da pluralidade do Estado. Mesmo no Ministério da Educação, há críticas, como a feita pela Coordenadoria de Ensino Fundamental, também ao ensino religioso, caminho aberto para a “discriminação dentro da escola pública”.

Parece haver motivos suficientes para o Planalto retirar o projeto legislativo de votação, a fim de rediscutilo sob o ângulo da preservação da saudável distância entre o Estado e religiões.

RISCO CHÁVEZ
EDITORIAL
O GLOBO
27/8/2009

O Brasil tem um importante e delicado papel a desempenhar amanhã, em Bariloche, no encontro da União das Nações Sul-Americanas que debaterá a decisão da Colômbia de autorizar o uso pelos Estados Unidos de sete bases militares em seu território. Mais uma vez, como no encontro de Quito, no último dia 10, paira a ameaça de ruptura entre a Venezuela de Hugo Chávez e a Colômbia de Álvaro Uribe.

Chávez considerou as bases “uma declaração de guerra à revolução bolivariana” e anunciou como iminente o corte de relações com Bogotá. A Colômbia entrou com queixa na OEA contra o “expansionismo de Chávez”. Uribe não foi à reunião de Quito — os dois lados cortaram relações após uma incursão militar colombiana contra acampamento das Farc no Equador.

Mas anunciou que estará em Buenos Aires amanhã. A ampliação da presença militar americana na América do Sul, que sempre pode ser discutida, deriva de acordo entre países soberanos na esteira do Plano Colômbia, pelo qual Washington ajuda Bogotá a combater o terrorismo e o narcotráfico. Cabe lembrar que parte da decisão americana se deveu ao fato de o Equador não ter renovado o acordo pelo qual os EUA usavam a base aérea de Manta. A Chávez interessa transformar as bases num cavalo de batalha para desviar as atenções de suas atribulações internas. Segundo o Banco Central venezuelano, o PIB terá retrocedido 2,4% no segundo trimestre e a produção industrial, 8,5%. Com isso, a população sofre. O bolivariano também quer deixar em terceiro plano suas ligações com as Farc, motivo de irritação tanto em Bogotá quanto em Washington, e que deveria preocupar o Brasil. Outro objetivo é manter o clima de tensão que sustenta seu projeto de poder, baseado num antiamericanismo irresponsável no qual arrasta seus “discípulos” Morales (Bolívia), Correa (Equador), Ortega (Nicarágua) e, com alguma frequência, Lugo (Paraguai).

Um terceiro objetivo não se dissocia do anterior: acuar o Brasil entre os EUA e o indigesto aliado de primeira hora do governo Lula — ele próprio. Embora, desde 2003, simpatias ideológicas frequentemente desorientem a diplomacia brasileira, este é um falso dilema. O objetivo maior do Brasil é a união das nações sul-americanas, conforme expresso no nome da Unasul, e precisa ser, também, a defesa da democracia.

Por isso, deve preservar a condição de mediador imparcial e de defensor, em última análise, dos interesses nacionais. A busca de maiores esclarecimentos sobre o acordo entre Colômbia e EUA nada tem a ver com embarcar em canoas furadas, como a de Chávez.

UMA IDEIA FORA DO LUGAR
EDITORIAL
JORNAL DO BRASIL
27/8/2009

RIO - A proposta do governo de ressuscitar a antiga Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), derrubada em 2007 pela oposição, só pode ser entendida como um revide tardio ou uma blague de péssimos roteiristas.
Seria curioso, se não fosse trágico, a recriação de um tributo que possivelmente entraria para a história fiscal brasileira com a reputação de ser um autêntico imposto Jason, numa alusão ao patético personagem de filme de terror que sempre ressurge após a morte. Seria a terceira vida do chamado imposto do cheque.
Criada em 1993, com o nome de IPMF (Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira), a cobrança passou a vigorar no ano seguinte. Mas, respeitando seu caráter circunstancial, foi abolida ainda no fim de 1994. Três anos depois, no entanto, retornou, rebatizada de contribuição (CPMF) e com uma alíquota menor, de 0,25% para 0,2%. A partir de então, durante os 11 anos seguintes, ela viveu seu auge. Avançou sobre os bolsos dos contribuintes e arrancou 0,38% de todas as movimentações bancárias. Em momentos de suspense, quando poderia ter morrido, mostrou sua força em sucessivas prorrogações (1999, 2002 e 2004). Até que, em dezembro de 1997, a CPMF foi cercada e recebeu o tiro de misericórdia, na maior vitória legislativa da oposição durante o governo Lula.
É nesse sentido que a proposta de ressurgimento do imposto pode ser entendida menos como a continuação do mesmo terrível filme-em-série - cuja ideia original, diga-se, foi dos atuais oposicionistas - e mais uma revanche de Lula. Afinal, a extinção da CPMF representou não só uma derrota, como um desmentido.
Um dos principais argumentos utilizados então pelos governistas para a permanência do imposto era o de que ele seria justo (por supostamente atingir a todos), impossível de ser sonegado e imprescindível para a sustentação do sistema público de saúde. Com a derrubada da CPMF, dizia-se, a área da saúde perderia R$ 40 bilhões e entraria em colapso. Nada disso ocorreu e o impacto da medida foi perfeitamente assimilado.
Não se discute o propósito nobre de se destinar mais verbas para a saúde. Mas há boas razões para se combater a recriação do imposto, que agora ganharia o nome de Contribuição Social para a Saúde (CSS), com uma alíquota de 0,10%.
Em primeiro lugar, a arrecadação da CPMF não servia ao objetivo exclusivo de levantar recursos para a saúde. Em segundo lugar, os problemas do sistema público de saúde brasileiro devem-se, muitas vezes, mais à má administração pelos gestores do que à falta de dinheiro. Em terceiro lugar, a carga tributária imposta aos brasileiros já é altíssima, ultrapassando os 35% do Produto Interno Bruto (PIB), levando-se em conta que não há o devido retorno ao contribuinte em termos de serviços públicos de qualidade. Por último, não é nada desejável que governo e oposição se engalfinhem novamente em torno do imposto - cuja rejeição da sociedade é mais do que evidente. Ainda mais no atual cenário devastado do Congresso.
As razões são tantas que até mesmo entre os governistas não há consenso. O tema é impopular e as eleições de 2010 estão logo ali. Se a sensatez prevalecer, a proposta de um novo imposto do cheque será sepultada. Sem chance de reencarnação.

CARTÃO VERMELHO
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
27/8/2009

O golpe de cena do senador petista Eduardo Suplicy, de sacar de um cartão vermelho para dramatizar, da tribuna onde discursava, a sua posição pela renúncia de José Sarney à presidência da Casa, foi apenas a expressão mais vistosa da persistência de uma crise que os parceiros do cacique maranhense supunham superada quando, com a inestimável contribuição do presidente Lula, impediram na semana passada o desengavetamento de qualquer das 11 denúncias e representações contra Sarney no Conselho de Ética. A realidade é que o Senado travou e não se imagina como conseguirá se recuperar sem o afastamento do seu dirigente. A tropa de choque do governismo pode intimidar os adversários no grito. Lula pode impor a sua vontade aos senadores do seu partido desconfortáveis com a operação-abafa dos pedidos de investigação das malfeitorias de Sarney. Mas nem as milícias da maioria nem, muito menos, a descarada intromissão do Planalto para assegurar a impunidade do seu aliado podem deter o esvaecimento do Senado como instituição legislativa.

"A crise não está no Senado", resumiu com propriedade o tucano Sérgio Guerra, de Pernambuco. "É o Senado." Isso porque, embora o repúdio da opinião pública ao descalabro ético encarnado na figura do obsoleto oligarca não tenha levado multidões às ruas, os senadores continuam a receber mensagens de protesto em volume tal que não os deixa resvalar para a acomodação, na proverbial paz dos cemitérios. (Segundo uma recente pesquisa, 74% dos brasileiros querem que Sarney se vá.) Obrigados, portanto, a dar um mínimo de satisfação à sociedade, ou fazem como Suplicy - que simbolizou com o lance do cartão o fato de que "o País não suporta mais tantas denúncias sem respostas à altura", como afirmou - ou fazem como os 9 membros do PSDB e do DEM no desmoralizado Conselho de Ética, renunciando aos seus cargos. Ou fazem como os integrantes oposicionistas - e do PT - no colégio de líderes da Casa. Eles boicotaram na terça-feira a primeira reunião convocada por Sarney desde a farsa no Conselho para definir a pauta dos próximos trabalhos parlamentares.

Foi um ato que não causa sensação como o gesto de Suplicy, mas teve impacto no ambiente político interno. Com a sua ausência, os condutores das bancadas da oposição fizeram ver a Sarney que não adianta se comportar como se a página tivesse sido virada. Na véspera, ele já tentara fazer de conta que tudo estava apaziguado. Com o ar de literato que aprecia exibir, subiu à tribuna para proferir um discurso pela passagem do centenário da morte do escritor Euclides da Cunha (e pelos 55 anos do suicídio de Getúlio Vargas). Foi colhido por um duro aparte do senador Suplicy, antecipando o seu pronunciamento do dia seguinte. Ao advertir Sarney de que não era hora de "mudar de assunto", o petista decerto transgrediu a praxe pela qual se espera dos congressistas que fiquem no assunto dos discursos que aparteiam. Mas não deu ao orador o conforto de acreditar que aplacara a turbulência desencadeada pela revelação dos escândalos que pontuam a sua longeva carreira no Senado. Os seus aliados acham que, se ele "voltasse aos poucos", o quadro se normalizaria. Nada indica isso. No vácuo das deliberações sobre projetos de lei, a tribuna é um convite permanente aos senadores desejosos de demonstrar inconformismo perante o eleitorado.

Em meio ao desfiguramento político da instituição, eis que o público recebe a notícia de que o primeiro-secretário Heráclito Fortes (DEM-PI) tem engatilhadas duas formidáveis iniciativas. Uma é a da reforma - não dos costumes dos seus pares, mas das instalações do plenário. Ao custo de R$ 12 milhões, ao que se divulgou, será refeito o forro e modificado o sistema de iluminação do local, entre outras novidades de duvidosa oportunidade. A segunda iniciativa, na mesma linha, é a da construção em um dos estacionamentos da Casa de uma praça de alimentação de 800 metros quadrados, com dois restaurantes e uma lanchonete que acomodarão 150 pessoas. No começo do ano, quando assumiu a presidência, Sarney anunciou um corte de 10% nos investimentos do Senado. Mas não é pelo dinheiro que isso acentua o desalento com a instituição, cuja razão de ser muitos até questionam (equivocadamente). É pela insensibilidade dos que a conduzem - que acham que, mudando luminárias e construindo lanchonetes, superarão o impasse político sem precedentes na história do Senado.

O golpe de cena do senador petista Eduardo Suplicy, de sacar de um cartão vermelho para dramatizar, da tribuna onde discursava, a sua posição pela renúncia de José Sarney à presidência da Casa, foi apenas a expressão mais vistosa da persistência de uma crise que os parceiros do cacique maranhense supunham superada quando, com a inestimável contribuição do presidente Lula, impediram na semana passada o desengavetamento de qualquer das 11 denúncias e representações contra Sarney no Conselho de Ética. A realidade é que o Senado travou e não se imagina como conseguirá se recuperar sem o afastamento do seu dirigente. A tropa de choque do governismo pode intimidar os adversários no grito. Lula pode impor a sua vontade aos senadores do seu partido desconfortáveis com a operação-abafa dos pedidos de investigação das malfeitorias de Sarney. Mas nem as milícias da maioria nem, muito menos, a descarada intromissão do Planalto para assegurar a impunidade do seu aliado podem deter o esvaecimento do Senado como instituição legislativa.

"A crise não está no Senado", resumiu com propriedade o tucano Sérgio Guerra, de Pernambuco. "É o Senado." Isso porque, embora o repúdio da opinião pública ao descalabro ético encarnado na figura do obsoleto oligarca não tenha levado multidões às ruas, os senadores continuam a receber mensagens de protesto em volume tal que não os deixa resvalar para a acomodação, na proverbial paz dos cemitérios. (Segundo uma recente pesquisa, 74% dos brasileiros querem que Sarney se vá.) Obrigados, portanto, a dar um mínimo de satisfação à sociedade, ou fazem como Suplicy - que simbolizou com o lance do cartão o fato de que "o País não suporta mais tantas denúncias sem respostas à altura", como afirmou - ou fazem como os 9 membros do PSDB e do DEM no desmoralizado Conselho de Ética, renunciando aos seus cargos. Ou fazem como os integrantes oposicionistas - e do PT - no colégio de líderes da Casa. Eles boicotaram na terça-feira a primeira reunião convocada por Sarney desde a farsa no Conselho para definir a pauta dos próximos trabalhos parlamentares.

Foi um ato que não causa sensação como o gesto de Suplicy, mas teve impacto no ambiente político interno. Com a sua ausência, os condutores das bancadas da oposição fizeram ver a Sarney que não adianta se comportar como se a página tivesse sido virada. Na véspera, ele já tentara fazer de conta que tudo estava apaziguado. Com o ar de literato que aprecia exibir, subiu à tribuna para proferir um discurso pela passagem do centenário da morte do escritor Euclides da Cunha (e pelos 55 anos do suicídio de Getúlio Vargas). Foi colhido por um duro aparte do senador Suplicy, antecipando o seu pronunciamento do dia seguinte. Ao advertir Sarney de que não era hora de "mudar de assunto", o petista decerto transgrediu a praxe pela qual se espera dos congressistas que fiquem no assunto dos discursos que aparteiam. Mas não deu ao orador o conforto de acreditar que aplacara a turbulência desencadeada pela revelação dos escândalos que pontuam a sua longeva carreira no Senado. Os seus aliados acham que, se ele "voltasse aos poucos", o quadro se normalizaria. Nada indica isso. No vácuo das deliberações sobre projetos de lei, a tribuna é um convite permanente aos senadores desejosos de demonstrar inconformismo perante o eleitorado.

Em meio ao desfiguramento político da instituição, eis que o público recebe a notícia de que o primeiro-secretário Heráclito Fortes (DEM-PI) tem engatilhadas duas formidáveis iniciativas. Uma é a da reforma - não dos costumes dos seus pares, mas das instalações do plenário. Ao custo de R$ 12 milhões, ao que se divulgou, será refeito o forro e modificado o sistema de iluminação do local, entre outras novidades de duvidosa oportunidade. A segunda iniciativa, na mesma linha, é a da construção em um dos estacionamentos da Casa de uma praça de alimentação de 800 metros quadrados, com dois restaurantes e uma lanchonete que acomodarão 150 pessoas. No começo do ano, quando assumiu a presidência, Sarney anunciou um corte de 10% nos investimentos do Senado. Mas não é pelo dinheiro que isso acentua o desalento com a instituição, cuja razão de ser muitos até questionam (equivocadamente). É pela insensibilidade dos que a conduzem - que acham que, mudando luminárias e construindo lanchonetes, superarão o impasse político sem precedentes na história do Senado.

O DÉFICIT DE VAGAS NAS PRISÕES
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
27/8/2009

Três semanas após o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ter divulgado o relatório sobre os mutirões que promoveu nos superlotados estabelecimentos penais de diferentes unidades da Federação, mostrando a situação degradante em que vive a maioria esmagadora da população encarcerada, o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), vinculado ao Ministério da Justiça, lançou outro estudo revelando que os problemas do sistema prisional podem se agravar ainda mais, por causa do déficit de vagas.

Em dezembro de 2008, havia 469 mil pessoas presas, vivendo em condições deploráveis nas 295 mil vagas oferecidas em 1.771 presídios no País. Segundo as estatísticas do Depen, o déficit de vagas, que era de 150 mil, em 2007, ficou em mais de 174 mil no final de 2008. E a estimativa é de que a situação vá se agravar, uma vez que há cerca de 490 mil mandados de prisão expedidos pela Justiça, que ainda não foram cumpridos pela polícia.

Somente no Estado de São Paulo, onde há 149.647 pessoas encarceradas, cumprindo pena ou aguardando julgamento, é necessária a criação de pelo menos 55 mil vagas para se resolver o problema de superlotação das prisões. Na região metropolitana, os Centros de Detenção Provisória (CDPs) abrigam 21.670 presos a mais do que o número de vagas disponíveis. Os criminalistas afirmam que as condições de vida dentro dessas unidades podem ser comparadas com as da antiga Casa de Detenção, no bairro do Carandiru - com a agravante de que os CPDs não têm estruturas de presídios.

"São infernos na terra. Lá a carência é absoluta. Faltam colchões, funcionários, remédios e até água", diz Alessandra Teixeira, do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. Proporcionalmente, a unidade mais superlotada é a Penitenciária Feminina da capital, onde 759 presas se amontoam em celas com capacidade para 251 pessoas. Dos 147 estabelecimentos penais sob controle da Secretaria da Administração Penitenciária, 33 unidades concentram 38% da população encarcerada de todo o Estado.

O preocupante é que o problema da superlotação do sistema prisional não tem perspectiva de solução a curto prazo. E, mais grave ainda, há um jogo de empurra-empurra no setor. O governo federal alega que o Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) dispõe de R$ 200 milhões para repassar aos governos estaduais, para a construção de novos estabelecimentos penais, mas reclama que os projetos enviados pecam pela má qualidade. Em 2008, de cada dez propostas enviadas pelos Estados ao Funpen, oito foram recusadas por inconsistências técnicas. Preocupados com o risco de uma onda de rebeliões em 2010, que será um ano eleitoral, os governadores tentam justificar as falhas dos projetos, afirmando que elas decorrem, basicamente, da resistência dos prefeitos. Como mostrou reportagem do Estado na segunda-feira, o governador José Serra desapropriou 23 terrenos no interior para a construção de penitenciárias, mas os prefeitos impedem as obras, ora acionando o Ministério Público, ora apelando para a Justiça. Por temer que rebeliões e fugas aumentem os índices de criminalidade, eles se opõem à construção de novos presídios e penitenciárias em suas cidades, mobilizando a comunidade, entidades empresariais, movimentos sociais e os deputados estaduais e federais com base eleitoral na região. Os governadores também se queixam das ONGs ambientalistas que embargam a construção de novos presídios, sob a justificativa de que agridem o meio ambiente. Com isso, os governos estaduais não conseguem cumprir as exigências técnicas do Ministério da Justiça para a liberação das verbas do Funpen.

O aumento da criminalidade e, por tabela, a elevação do número de presos, está elevando o déficit nos estabelecimentos penais a um ritmo de 25 mil vagas por ano. Medidas de caráter penal e processual podem atenuar o problema, mas sua solução passa necessariamente pela construção de novos presídios. Os prefeitos que resistem à ideia de ter em seus municípios uma unidade prisional precisam se acostumar à ideia de ter, nas ruas de suas cidades, um número cada vez maior de criminosos soltos.

NOVO MANDATO PARA BERNANKE
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
27/8/2009

O mais poderoso presidente de banco central do mundo, Ben Bernanke, terá mais quatro anos de mandato, se o Senado americano aprovar a renovação proposta pelo presidente Barack Obama. A decisão de Obama é mais que um prêmio para a atuação de Bernanke durante a crise, na chefia do Federal Reserve (Fed). É, antes de mais nada, uma demonstração de prudência, muito bem recebida nos mercados financeiros de todo o mundo. Segundo seus críticos, o comandante do Fed hesitou em alguns momentos e poderia ter impedido, no ano passado, a quebra do banco de investimentos Lehmann Brothers. Mas, apesar de alguma ressalva, a maioria dos especialistas aplaude o seu desempenho e põe na sua conta a maior parte do crédito pelos efeitos conseguidos no combate à turbulência financeira. Sem as medidas que adotou, admitem, o desastre poderia ter sido muito maior e o resultado seria uma depressão profunda, prolongada e muito mais custosa para todo o mundo.

Com sua iniciativa, o presidente Obama elimina um importante fator de incerteza e facilita a operação dos mercados. Apesar de alguns sinais positivos, nos EUA e noutros grandes países desenvolvidos, a economia global continua frágil e não se pode afastar a hipótese de uma recaída, se houver uma nova onda de insegurança. Bernanke se tornou respeitado, academicamente, como um estudioso das crises. Como presidente do Fed, mostrou-se capaz de traduzir sua competência acadêmica em ações práticas. A perspectiva de sua permanência no posto elimina os inconvenientes da especulação sobre os possíveis nomes para sua sucessão.

Mas a permanência no poder forçará Bernanke a enfrentar problemas complicados nos próximos anos. Para conter a expansão da crise financeira e limitar as quebras no mercado, o Fed canalizou enormes volumes de dinheiro para as instituições em risco e pôs em circulação muitas centenas de bilhões de dólares, na tentativa de reanimar e normalizar o sistema de crédito. Ao mesmo tempo, o Tesouro americano capitalizou grandes bancos, interveio no setor industrial, concedeu incentivos aos consumidores e iniciou grandes programas de investimento para reerguer a economia que entrou na recessão.

Fed e Tesouro deverão manter a ação anticíclica ainda por algum tempo, até os sinais de recuperação econômica se tornarem mais firmes. Mas o socorro à economia aumentará o déficit público e a dívida federal e criará pressões inflacionárias. O rombo previsto para este ano fiscal (até setembro) foi reduzido de US$ 1,84 trilhão para US$ 1,58 trilhão, mas a projeção do acumulado em dez anos foi elevada de US$ 7,1 trilhões para US$ 9 trilhões. Com isso, a dívida pública poderá chegar a US$ 17,5 trilhões em 2019 - soma equivalente a 76,5% do PIB projetado para aquele ano. A dívida atual corresponde a 56% do valor estimado para a produção de bens e serviços.

O governo americano espera, naturalmente, continuar financiando seu débito com a ajuda de grandes compradores de papéis do Tesouro, como a China, o Japão e vários emergentes de peso, incluído o Brasil. Mas, para reequilibrar a economia dos EUA, o Tesouro terá de moderar seus gastos e o Fed precisará elevar os juros. Isso afetará o custo de financiamento de governos e empresas de todo o mundo e a economia brasileira não ficará isenta dessas consequências.

Por enquanto, a tarefa principal das autoridades americanas é impulsionar a recuperação da atividade e afastar o risco de uma recaída. Nos Estados Unidos, as encomendas de bens duráveis cresceram 4,9% em julho. As vendas de residências novas aumentaram 9,6% de junho para julho, muito acima da previsão dos analistas (1,6%). Na China, o crescimento estimado para este ano, em torno de 8%, deverá ser confirmado. Na Alemanha e na França, o PIB do segundo trimestre foi 0,3% maior que o do primeiro. Nos dois países, a produção continua muito abaixo da observada um ano antes, mas a recessão parece ter acabado. Em junho, o volume do comércio mundial foi 2,5% maior que o de maio, segundo levantamento do governo holandês. A recuperação parece cada vez mais clara, mas, por algum tempo, Bernanke e outros presidentes de bancos centrais não precisarão tomar decisões impopulares. Que aproveitem essa fase para ser felizes.

BANCOS PÚBLICOS ATENDEM O GOVERNO
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
27/8/2009

Nas últimas semanas o governo fez grandes elogios ao papel dos bancos públicos na distribuição do crédito. O relatório do Banco Central (BC) sobre as operações de crédito em julho dá a medida da influência desses bancos na distribuição dos empréstimos na economia.

O documento tem um parágrafo que merece ser reproduzido: "A participação dos bancos públicos na carteira total do sistema financeiro manteve-se em elevação, subindo de 38,6%, em junho, para 39,9%, em julho. O saldo das carteiras dessas instituições atingiu R$ 523,7 bilhões, com incremento de 6,2% no mês e 40,3% em 12 meses. Em sentido contrário, as participações relativas das instituições privadas nacionais e estrangeiras declinaram de 41,5% para 40,9% e de 19,9% para 19,2% respectivamente." Verifica-se, pois, que o aumento da participação dos bancos públicos foi anulado pela redução da participação das instituições privadas.

Admitindo que o crédito, em julho, representou 45% do PIB estimado, constata-se que os bancos públicos aumentaram sua participação de 16,9%, em junho, para 18%, em julho, e a das instituições privadas recuou de 26,9% para 26,4%.

No entanto, parece que esse aumento da atuação dos bancos públicos foi, sobretudo, em favor do setor público... De fato, em julho houve aumento de 297,2% dos empréstimos para o governo federal, de 5,1% para os governos regionais (em comparação com junho), e de apenas 1% para o setor privado - sendo 4,3% para a habitação, 2% para o comércio e 1,6% para as pessoas físicas. Enquanto isso, os empréstimos para a indústria caíam 0,1% e, para o setor rural, 0,4%. Um tipo de atuação que visa mais ao consumo do que à produção...

Tudo indica que nos empréstimos dos bancos oficiais ao governo federal - que passaram de R$ 8,4 bilhões, em junho, para R$ 33,1 bilhões, em julho - pesou muito o que foi feito para a Petrobrás pelo BNDES, cujas operações diretas aumentaram 22% em julho.

É pena que o BC não forneça as taxas de juros cobradas pelos bancos públicos e as cobradas pelos bancos privados - taxas que em todo o sistema recuaram, em média, de 36,6% para 36% ao ano.

É interessante que a inadimplência tenha ficado em 3,5%, no caso dos bancos públicos, ante 2,3%, nos bancos privados nacionais, que fizeram maiores provisões do que os públicos. O que se percebe é que os bancos públicos estão mobilizados para a campanha eleitoral do governo.

A HORA DO CHACRINHA
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
27/8/2009

Cenas no Senado Federal ultrapassam o acintoso para equipararem-se ao deboche genial do antigo apresentador de TV

A COMÉDIA é de tal ordem que talvez a única coisa a ser levada a sério no Senado Federal seja a ideia de extinguir-se, de uma vez por todas, o seu Conselho de Ética. Se a palavra deixou de constar do dicionário da Casa, nada mais lógico que lideranças partidárias proponham o desaparecimento de um colegiado que, afinal, já não tem objeto pelo qual zelar.
O exame do assunto, que ocorreria ontem, terminou sendo postergado. Não faz mal. Que se permita, neste espaço, uma modesta sugestão no sentido de aperfeiçoar a iniciativa.
É que o senador Heráclito Fortes (DEM-PI) planeja, enquanto isso, construir uma praça de alimentação no Senado. Estão previstos dois restaurantes e uma lanchonete. Como não se menciona a existência de pizzarias, quem sabe os espaços do Conselho de Ética poderiam destinar-se a tal especialidade.
O senador argumenta que a abertura do novo espaço de comilança se justifica até por razões de saúde pública, tal a precariedade das condições de higiene dos atuais restaurantes do Senado. Haverá de concordar com a tese a senadora petista Ideli Salvatti, que em outro contexto fez um desabafo acerca dos sacrifícios de seu cargo: sente-se merecedora de um "adicional de insalubridade e periculosidade" em seu salário.
A observação não é lisonjeira para seus colegas, ainda que na mesma ocasião a senadora tenha salvado os do próprio partido: "Tenho orgulho da ética petista", declarou triunfalmente.
Foi, sem dúvida, para se fazer passar como último representante da "ética petista" que o senador Eduardo Suplicy, por sua vez, encenou o espetáculo ridículo e infantilóide do cartão vermelho contra José Sarney, numa sessão em que o Senado Federal pareceu descer ao nível dos antigos programas do Chacrinha.
Suplicy, que silenciara enquanto algumas figuras isoladas, como Pedro Simon (PMDB-RS) e Cristovam Buarque (PDT-DF), reivindicavam o afastamento do presidente do Senado, resolveu jogar para a opinião pública, como sempre foi a sua especialidade. A esta altura da desmoralização geral, e depois de se saber que sua namorada viajou para Paris com passagens oficiais, tornou-se apenas motivo de chacota, desbancando seu até aqui indesbancável e irrevogável líder de bancada, Aloizio Mercadante.
O mesmo Heráclito Fortes da praça de alimentação encarregou-se de desmascarar a farsa, dizendo que Suplicy deveria mostrar o cartão vermelho, isto sim, ao presidente Lula, que coordenou a salvação de Sarney no Senado.
Atônito, enfurecido e mais vermelho que o próprio cartão, o senador petista não teve resposta. Quem sabe o ex-presidente e senador Fernando Collor, hoje especializado em lições de moral, pudesse repetir o que disse a Pedro Simon há algum tempo, ordenando que Suplicy engolisse e digerisse o tal cartão -enquanto, é claro, não chega a esperada inauguração dos novos restaurantes da Casa.

O FLANCO EXTERNO
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
27/8/2009

OS INDÍCIOS de que a economia recupera aos poucos a trajetória de crescimento recolocam em questão a deterioração das contas externas do país. O mês de julho registrou queda de 37% do superavit comercial em relação a junho, resultado do crescimento de 14% das importações e da manutenção do volume de exportações.
Daqui para a frente, a confirmar-se a expectativa de melhora econômica, as exportações brasileiras terão dificuldade cada vez maior para financiar, por si mesmas, o aumento das compras de produtos importados, o qual sempre acompanha o aquecimento da economia.
Nossas vendas externas apresentam um peso excessivo de produtos caracterizados por baixo valor relativo e grande oscilação de preços. Nos últimos anos, os produtos que consomem muita mão de obra e têm baixo conteúdo tecnológico corresponderam a uma fatia entre 50% e 60% da pauta de exportação do país.
Esse quadro reflete deficiências da estrutura produtiva do Brasil, como a ainda reduzida capacidade de inovação tecnológica das empresas. Falhas na infraestrutura e na logística da economia também prejudicam a competitividade externa dos produtos aqui fabricados.
É verdade que, desde o início de 2009, foram justamente as exportações de commodities que permitiram manter resultados positivos na balança comercial. Os preços dessas mercadorias básicas se recuperaram mais depressa do baque da crise, e a quantidade exportada pelo Brasil, especialmente para a China, também voltou a crescer.
Tal desempenho, porém, não deveria obscurecer o fato de que o perfil das exportações brasileiras tende a se revelar um obstáculo para a manutenção de uma trajetória de crescimento forte da economia em médio prazo.

BERNANKE PASSA NO TESTE DA CRISE E CONTINUA NO FED
EDITORIAL
VALOR ECONÔMICO
27/8/2009

Ben Bernanke vai continuar a dirigir o mais poderoso banco central do mundo, o Fed americano, por mais quatro anos, embora ele tenha adquirido esta chance com uma história de graves erros corrigida por outra de acertos importantes. Quando assumiu o Fed, em fevereiro de 2006, Bernanke sabia que seria difícil substituir o então onipotente Alan Greenspan, mas não imaginava o tamanho da encrenca que herdara nem a tarefa que acabou sendo a mais importante de sua vida pública - salvar os EUA da pior recessão desde os anos 1930. Ao contrário das seguidas sucessões de Greenspan, a de Bernanke não teve unanimidade do público, e, de certa forma, nem poderia. Afinal, após trabalhar com Greenspan por algum tempo, o atual presidente do Fed não viu, como também ocorreu com o guru Greenspan, uma crise de extraordinárias proporções se armar diante de seus olhos, à luz do dia.
Instalada a crise, porém, Bernanke foi salvo pelos seus conhecimentos acadêmicos e pelo pragmatismo que eles sugeriam. Um respeitado estudioso da Grande Depressão, ele prometeu que jogaria dinheiro de helicóptero para evitar a repetição do desastre. A visão transformou-se em profecia - em um ano Bernanke ampliou o balanço do Fed em US$ 1,4 trilhão com as mais variadas e inéditas ações para socorrer bancos, seguradoras e empresas. O Fed praticamente substituiu os mercados em várias frentes, dando garantias para títulos hipotecários, papéis corporativos, cartões de crédito e uma gama de títulos securitizados. Na prática, exerceu de modo amplo a atribuição do Fed de emprestador de última instância - no auge da crise, foi emprestador de primeira instância.
Como Greenspan, agora estigmatizado como um grande criador de bolhas, Bernanke via um horizonte de prosperidade guiado pelos mercados. Em março de 2005, apontava a existência de uma bolha de poupança global que provocava a ocorrência de déficits comerciais gigantescos nos EUA e superávits correspondentes nos países emergentes, e explicava que as baixas taxas de juros eram uma das principais razões da baixa taxa de poupança americana. Ele tinha confiança de que a correção se daria gradualmente, enquanto que apontava riscos subjacentes de crise, vindos, porém, de uma desvalorização desordenada do dólar. Em 18 de julho de 2007, às vésperas da crise, pressentiu as nuvens negras do mercado subprime se aproximando, mas não deu a importância merecida ao fato. Apontou apenas a "deterioração dos padrões de empréstimos" neste mercado, quando não a "fraude descarada".
Bernanke tem o mérito, junto com a equipe de Obama, de ter evitado o pior com a criação do maior programa de socorro financeiro da história do capitalismo. Mas terá ainda pela frente a enorme tarefa de administrar o caminho de volta, isto é, enxugar aos poucos o oceano de liquidez que ajudou a formar antes de que o perigo inflacionário se forme, e não tão cedo a ponto de abortar uma recuperação ainda incerta. Ele fugiu da ortodoxia e agora os ortodoxos o estão atacando, acusando-o de fazer política fiscal e não monetária ao prestar-se a comprar títulos do Tesouro e, assim, sancionar gigantescos déficits públicos.
A crise convenceu Bernanke de que o "gerenciamento do risco de liquidez é tão essencial quanto o gerenciamento do risco de crédito e a adequação do capital" e ele passará a dirigir um Fed com mais poderes, em especial o de xerife de riscos sistêmicos. O jogo de cintura de Bernanke, um republicano ex-conselheiro econômico de George W. Bush, não deve desviá-lo do conservadorismo nas opções de política econômica pós-crise. A discussão que percorre os bancos centrais de todo o mundo é a de se a política monetária pode ser usada para atacar as bolhas especulativas em sua formação, e como. Ele já gastou enorme arsenal teórico para defender que "a política monetária é um instrumento muito grosseiro para ser efetivo" diante das bolhas. Os instrumentos adequados, disse, eram a regulação e a supervisão. Neste ponto, a política do Fed não deverá mudar muito, enquanto que um rearranjo institucional que amplia a vigilância e prevenção de crises financeiras está sendo colocado de pé. Há desafios enormes pela frente e Bernanke, acadêmico de sólida formação, terá de contar muito com intuição e sorte para tirar a maior economia do mundo do atoleiro.

AS RENÚNCIAS COLETIVAS
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
27/8/2009

Decisões políticas radicais provocaram renúncias coletivas no Codefat, na Receita Federal e no Conselho de Ética do Senado. Este está ameaçado de extinção, prevista em projeto sob análise na Comissão de Constituição e Justiça

Na Receita Federal, 40 servidores em funções de confiança, em vários Estados, colocaram o cargo à disposição

Este mês de agosto está sendo marcado por estranho fenômeno de comportamento em instituições públicas federais, do Executivo e do Legislativo. É a renúncia coletiva. O ato, surpreendente e extremo, ocorreu no Codefat, na Receita Federal e no Conselho de Ética do Senado.

A receita radical foi aplicada em organismos diferentes, com atribuições que não se cruzam. Criou-se um fato inédito na história de cada um dos três organismos. Obviamente, o enredo das motivações varia. Em comum, o que existe de visível é uma impaciência impulsiva.

No Codefat (Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador), as confederações da Indústria (CNI), do Comércio (CNC), da Agricultura (CNA) e do Sistema Financeiro (Consif) renunciaram à sua participação no órgão. Viram nessa atitude a forma de protesto adequada à interferência do ministro do Trabalho, Carlos Lupi, no processo de eleição da presidência do conselho.

As confederações não aceitaram a eleição de Luigi Nese – apadrinhado por Lupi – para a presidência do Codefat no biênio 2009/2011. Acusaram quebra de acordo no rodízio para o cargo, e agora seria a vez do representante da CNA.

O caso ganhou coloração política explícita. Lupi não negou a interferência e a justificou como forma de evitar que o colegiado se transformasse em um "senadinho da oposição", referindo-se à senadora Kátia Abreu (DEM-TO), presidente da CNA.

Na Receita Federal, o incêndio, também de caráter político, tomou proporção possivelmente não prevista no âmbito do governo. Pelo menos 40 servidores em funções de confiança colocaram o cargo à disposição.

A decisão desses funcionários, entre os quais 12 integrantes da cúpula da Receita, expressa protesto à exoneração da ex-secretária Lina Maria Vieira – que teria saído por contrariar interesses do Palácio do Planalto. Sobretudo quando não aceitou a manobra contábil da Petrobras, deixando de recolher os R$ 4 bilhões ao Fisco.

Na avaliação dos renunciantes, a Receita deixará de priorizar a fiscalização dos grandes contribuintes, e sua atuação se restringirá a "recibos médicos" – o que foi rebatido ontem pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, e pelo novo secretário Otacílio Cartaxo. Era inevitável que o fato resvalasse para o aspecto funcional da instituição.

No Senado, a crise provocada pela insistência do senador José Sarney em continuar na presidência fez aflorar uma síndrome manifestada pela debandada no Conselho de Ética. Dos 15 membros, cinco (integrantes de partidos da oposição) renunciaram às cadeiras de titular. A alegação repete as críticas da sociedade: o órgão está descaracterizado, age partidariamente, às vezes de costa para o decoro, e, por isso, não cumpre o papel que lhe compete. A renúncia coletiva provocou outra iniciativa apontando para o radicalismo: a extinção do referido conselho, conforme projeto de resolução do senador Tião Viana (PT-AC), atualmente em análise na Comissão de Constituição de Justiça. Pena.

Nenhum dos três episódios – o do Codefat, o da Receita e o do Conselho de Ética – engrandece esses organismos, independentemente de quem possa estar certo ou não. Aos olhos de quem acompanha os fatos pelas notícias veiculadas, parece não ter havido um grande esforço conciliador por parte dos personagens decisivos.

Resta esperar que as renúncias em grupo não virem moda. Que não se transformem em síndrome corrente nas crises institucionais. É retrocesso. O setor público nunca precisou disso para resolver os seus problemas.

A REVOADA NA RECEITA
EDITORIAL
ESTADO DE MINAS
27/8/2009

Afastamento de chefes do Fisco federal é crise da má ingerência da política

Por mais que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, tente minimizar, a rebelião de chefias na Secretaria da Receita Federal do Brasil, a reação de funcionários graduados de uma das mais sisudas carreiras do serviço público brasileiro é importante. Afinal, a demissão de 12 ocupantes dos postos mais altos da direção da Receita (EM, Política, 26/8) não se deu por mera rotina administrativa. Veio em sequência a uma demonstração de inconformismo pelo fato de a demissão da secretária Lina Vieira ter obedecido a motivos que passam longe das razões técnicas e profissionais, já que se trata de funcionária que vinha cumprindo longa e reconhecida carreira na nada risonha tarefa da fiscalização de tributos federais. A rebelião e todo o clima que ainda vive aquele importante setor do serviço público federal se deveu a mais uma tentativa, desta vez fracassada, do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de aparelhar e interferir em todos os compartimentos estratégicos da máquina estatal.

Foi, aliás, o próprio Mantega quem tinha conduzido a mineira Lina Vieira ao topo da Receita Federal. Era a ponta de um plano de afastar todo o comando do órgão que ainda guardava relação com ex-ministro petista Antonio Palocci. Este nunca escondeu que optara por manter a maior parte da equipe do governo anterior, por confiar na capacidade técnica dos quadros que serviram ao governo tucano. A demissão de Lina Vieira nunca teve seus motivos oficialmente declarados, mas é voz corrente nos corredores do poder em Brasília que ela teria desagradado ao Planalto ao não contemporizar nem esconder discordâncias de uma auditoria de sua repartição com procedimentos contábeis usados pela Petrobras para escapar do pagamento de R$ 4 bilhões dos tributos a que estaria sujeita. O mal-estar se deu em mau momento político, já que a estatal do petróleo estava sob os holofotes da luta da oposição para a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) contra ela no Senado Federal. Até então, o episódio da reunião da ex-secretária da Receita com a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, não tinha vindo à tona.

Função que depende de total independência operacional e autonomia administrativa, o combate à sonegação de tributos está entre os pontos de maior sensibilidade a eventuais investidas do interesse político partidário sobre suas atividades. E o que importa neste caso é que os funcionários rebelados tornaram pública, sob todos os riscos de perseguição interna, a rejeição ao que consideraram condenável intromissão política no órgão. Não é caso isolado. De fato, o aparelhamento de órgãos da administração federal, com a sistemática acomodação de apadrinhados políticos ou ocupação de franjas do poder pela companheirada sindicalista, nem sempre preparada, tem sido uma constante. Um bom exemplo de desastre provocado por esse modelo inadequado de gestão é o da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), estruturada no governo Lula a partir de uma diretoria incompatível com a função do órgão. Foi preciso haver o caos aéreo de 2007 para a profissionalização da agência, hoje um modelo de defesa do usuário do serviço público sob concessão. Como o da Anac, são inúmeros os exemplos de ingerência política e aparelhamento de órgãos importantes para a administração pública e para a vida do cidadão. É pena que a reação na Receita e as mudanças na Anac sejam apenas exceções.

PASSO À FRENTE NA EDUCAÇÃO
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
27/8/2009

Projeto aprovado em caráter terminativo pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados obriga o Estado a garantir, já a partir de 2010, o acesso ao ensino médio a todos os interessados. Falta a sanção do presidente da República, o que não é o problema. Como bem disse o autor da proposta, senador Cristovam Buarque (PDT-DF), “a oferta passa a ser obrigatória, mas a pessoa não é obrigada”. Aí está o xis da questão. Sem uma melhoria profunda na qualidade das escolas, continuará difícil atrair o jovem e mantê-lo em sala de aula. O desafio está em fazer do antigo segundo grau mais do que um trampolim para a universidade, uma etapa profissionalizante, ao término da qual o estudante se sentirá apto a enfrentar o mercado de trabalho e assumir a independência.

Em síntese, é crucial despertar a sede de saber no adolescente, convencê-lo de que a vida escolar determinará futuro melhor para ele. Fazê-lo crer que dedicar oito horas do dia ao aprendizado é investir em si e na família com retorno garantido. Portanto, a obrigatoriedade, sem dúvida, é um avanço — que já vem tarde, inclusive —, mas precisa estar acompanhada de uma revolução. E engana-se quem imagina que essa é uma tarefa exclusiva da rede pública. A particular, demonstram as avaliações, apresenta desempenho igualmente sofrível. Exceções, ilhas de excelência num mar de mediocridade, naturalmente há, em um e noutro sistema. Deve-se pôr fim a essas desigualdades e perseguir, com obstinação, alcançar padrão médio elevado, condição essencial para o país avançar.

Hoje, dos quase 27 milhões de alunos inscritos na etapa fundamental, o Ministério da Educação estima que menos de um terço, apenas 8 milhões, atingirá o nível médio. Trata-se de tragédia nacional. Revela que tampouco resolve uma mudança profunda restrita ao secundário, uma vez que grande parte dos jovens já terão ficado pelo caminho. Em ambos os níveis, as taxas de abandono são inaceitavelmente altas, como também as de reprovação. As razões são similares. Nos dois casos, as escolas falham pela precariedade das instalações, pela baixa qualificação e valorização dos professores, por oferecerem conteúdos sem utilidade prática — com os quais, para agravar, crianças e adolescentes em pouco ou nada se identificam. É como se, ao chegarem para a aula, deixassem a vida do lado de fora dos muros escolares.

Essa é a realidade a se mudar. Desde a década de 1970 o Brasil se esforça para universalizar o ensino. Nos anos 1990, a preocupação com a qualidade entrou em cena. Estudantes e escolas passaram a ser submetidos a avaliações periódicas. A própria apreciação evoluiu desde então. Os recursos também têm crescido ultimamente. Mas continuamos distantes de poder nos orgulhar de nossas escolas, públicas ou privadas. No quadro atual, é até difícil imaginar alguém ir à Justiça cobrar a vaga a que, por lei, passará a ter direito em 2010. É responsabilidade dos governadores, portanto, não apenas supri-las, mas fazer isso com eficiência capaz de tornar a carteira escolar objeto de desejo da juventude brasileira.

TRISTE HERANÇA
EDITORIAL
DIÁRIO DE CUIABÁ (MT)
27/8/2009

No começo da semana que vem, o vereador Lutero Ponce (PMDB) deverá apresentar sua defesa perante a Comissão Processante da Câmara Municipal de Cuiabá. O ex-presidente iniciará, assim, mais uma “via crucis”, no sentido de tentar se safar das acusações de improbidade administrativa, sobretudo, do suposto desvio de R$ 7,5 milhões dos cofres públicos.

O comitê foi instaurado para investigar atos de improbidade, supostamente cometidos por Lutero, quando presidia o Legislativo, entre 2007 e 2008. As irregularidades foram apontadas pela Delegacia Fazendária e as investigações resultaram no indiciamento do parlamentar, pelos crimes de formação de quadrilha ou bando, falsidade ideológica, falsidade de documento particular e público, peculato e fraude à licitação.

O vereador também é acusado de liderar o esquema que fraudava processos licitatórios na Câmara, durante sua gestão como presidente do Legislativo.

Lutero caminha para ter o mesmo fim (no sentido político do termo) do seu colega Ralf Leite (PRTB), que pagou com a perda do mandato parlamentar a profusão de escândalos que patrocinou no âmbito do Legislativo. Sua cassação, desde já, configura um imperativo, além de uma exigência da sociedade. Sua permanência no Legislativo, sem dúvida, significará uma afronta aos cidadãos.

A “herança” que o vereador do PMDB tem deixado, ao longo do tempo, vai muito além dos escândalos, que, segundo as investigações policiais, provocaram prejuízos de grande monta para os cofres públicos. Com efeito, na última sessão ordinária, o atual presidente da Câmara, Deucimar Silva (PP), anunciou que vai pedir novos laudos sobre a estrutura física da Casa A perícia vai respaldar a execução de obras de recuperação do Legislativo, que, segundo o vereador, “pode cair a qualquer momento”.

Em verdade, Deucimar já tem em seu poder laudo que aponta falhas no processo de obras realizado na Câmara, justamente na polêmica gestão de Lutero Ponce (PMDB). E faz parte da auditoria determinada pelo atual presidente, sobre a gestão do colega que apontou irregularidades entre as obras realizadas e o valor contratado.

Como se vê, o rol de ações deletérias de Lutero Ponce no âmbito do Legislativo cuiabano inclui, além dos supostos atos de improbidade administrativa, com as falcatruas financeiras, obras mal-feitas e que não apenas contribuíram para o “rombo” nas finanças, mas para colocar em risco a integridade física de parlamentares, funcionários e demais cidadãos que freqüentam o Poder.

“Ação deletéria de Lutero Ponce inclui escândalo financeiro e obras que põem em risco a integridade física de cidadãos”

MISTÉRIOS DA RECEITA
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
27/8/2009

Os efeitos da demissão da secretária Li¬¬na Vieira na Receita Fede¬¬ral estão servindo como oportunidade única para desnudar os enigmáticos bastidores da instituição. E para tornar visíveis seus vínculos políticos nas altas esferas do poder central e nos meios empresariais mais importantes do país. A crise fez com que o ministro Guido Mantega, da Fazenda, saísse para a ofensiva, ontem, para descaracterizar o aspecto político do caso. Ele apressou-se a dizer que a fiscalização da Receita está funcionando normalmente, apesar das exonerações e pedidos de demissões, nesta semana, de 12 pessoas da alta cúpula ligadas à ex-secretária e de dezenas de servidores que atuam nas regionais da Receita.
Um dos fatos mais polêmicos envolvendo a Receita – a denúncia de Lina Vieira de que a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, tentou interferir nas investigações das empresas da família Sarney – ainda não está bem explicado. No Congresso, a oposição está tentando convocar auxiliares de Li¬¬na e a própria ministra, com o intuito de aprofundar as denúncias e questionar Dil¬¬ma, em pessoa, sobre o seu real envolvimen¬¬to no episódio. Mas a saída dos altos funcionários de postos-chave da instituição em todo o país é igualmente reveladora da contaminação política de órgãos cuja atividade é, ou deveria ser, eminentemente técnica.
Não há dados consistentes para comprovar que tenha partido do Palácio do Planalto a ordem para afrouxar a fiscalização de grandes contribuintes. Para Mantega, isso é “balela”, uma forma de os demissionários encobrirem sua ineficiência. Difícil aceitar esse argumento diante de um número tão grande de afastamentos voluntários. A carta dos demissionários evidencia uma dificuldade real na condução do trabalho. Situações assim, de prevalência da política sobre a atividade técnica, têm ficado visíveis também em outras importantes instituições da administração pública, como o Ipea, o BNDES e o Itamaraty.
Por atuar de forma independente, livre da influência indevida do Palácio do Planalto é que Lina teria sido exonerada. Informações preliminares não divulgadas pela Receita apontam para um dado contundente: a fiscalização dos grandes contribuintes teria caído no primeiro semestre. O número de fiscalizações e o valor das autuações teriam sido praticamente os mesmos da primeira metade de 2008. A diferença é que, no ano passado, houve greve de fiscais, enquanto em 2009 não houve paralisações do gênero.
Nenhuma gestão tributária inteligente deixaria de lado os grandes contribuintes que, de modo geral, respondem por mais de 80% da arrecadação do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas. Não é por acaso que a Receita possui uma estrutura especializada, conhecida como Coordenação Especial de Maiores Contribuintes, para atuar neste segmento. Diante da queda de arrecadação, mandam os manuais de gestão que a questão seja minuciosamente apurada. É neste ponto que se encontram as razões para dar ouvidos à palavra dos ex-servidores da Receita. Afinal de contas, por que o governo parece tão pouco interessado em entender, e explicar à sociedade, quais os motivos que levaram à queda de arrecadação?

BIODIESEL NOS ÔNIBUS
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
27/8/2009

A informação de que Curitiba já tem seus primeiros ônibus operando integralmente com biodiesel mostra que o poder público, quando disposto, consegue trazer melhorias importantes para a sociedade. Começam a trafegar com 100% de biodiesel a base de soja, produzido em Passo Fundo, Rio Grande do Sul, seis dos 18 veículos que operam na Linha Verde e fazem o percurso entre o Pinheirinho e a Praça Carlos Gomes. É um começo modesto, mas que pode servir de modelo para uma ampla reformulação do sistema de transporte coletivo da capital e da região metropolitana. Os veículos serão monitorados du¬¬ran¬¬te quase dois anos, para que a experiência, se aprovada, possa ser gradativamente am¬¬pliada. A redução do nível de poluição am¬¬biental e o incentivo ao desenvolvimento da tecnologia nacional são razões suficientes para dar boas-vindas à iniciativa.

SOLUÇÃO DEMAGÓGICA
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
27/8/2009

Embora simpática aos trabalhadores, a proposta de redução de jornada de trabalho no país, que esta semana mobilizou a Câmara dos Deputados, está na contramão do esforço brasileiro e mundial para superação da crise econômica. Além disso, não atende aos interesses maiores da nação, que precisa produzir muito para gerar renda e emprego. O mundo desenvolvido, com raras exceções, observa jornadas maiores do que as 44 horas vigentes no Brasil, que algumas lideranças sindicais mais afoitas e políticos demagógicos pretendem reduzir para 40 horas. A própria França, que aprovou a redução radical da jornada para 35 horas semanais, vive hoje um processo de rediscussão dessa decisão, que muitos veem como contrária aos interesses do país. Para fugir a esse encargo, algumas empresas preferiram transferir-se para países vizinhos e criar neles filiais.

A jornada de trabalho vigente em nosso país, de 44 horas semanais, foi estabelecida pela Constituição de 1988, com acréscimo de 50% no valor a ser pago sobre cada hora excedente. Antes, a lei previa 48 horas. A atual tentativa de baixar para 40 horas já tramita no Congresso há 14 anos, num projeto de reforma constitucional proposta pelo deputado Vicentinho (PT-SP). Nesse período, só agora a matéria chega à decisão do plenário da Câmara, onde precisará ser aprovada por uma maioria qualificada, duas vezes, antes de ser remetida ao Senado. Entre as vantagens da redução, está, segundo seus apoiadores, a de criar cerca de 2 milhões de novos empregos, a ampliação do período de lazer dos trabalhadores e a conquista de novos padrões de qualidade de vida.

A discussão sobre o tema deve ser feita tendo em vista também as consequências estruturais que haverá para as empresas e para o país. Não há dúvida de que a redução da jornada-padrão implicará aumento de custos de produção para as empresas, o que será repassado para o preço dos produtos, num processo que afetará negativamente os próprios trabalhadores.

A crise global, que devastou algumas das economias tidas como mais sólidas, ensejou uma rediscussão desses temas. A retomada do crescimento da economia e dos empregos só poderá ser efetivada se as empresas forem fortes. Onerar os custos num momento de crise é reduzir a capacidade de ampliar a competitividade nos mercados interno e externo.

Por razões como esta, a redução da jornada de trabalho pode ser um tiro no pé, além de ser extemporânea, já que ocorre num momento em que cada vantagem competitiva precisa ser valorizada. Num país tão complexo e de assimetrias econômicas tão visíveis, a redução da jornada não pode ser objeto de uma decisão geral que afete todas as empresas e todas as regiões. Melhor seria se, setorialmente, empregados e empregadores trabalhassem para estabelecer acordos com abrangência mais restrita e com atenção a situações objetivas.

O INTERESSE PÚBLICO
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
27/8/2009

Fomentado propositalmente por parlamentares da situação e da oposição, o clima de confronto que antecedeu ontem a instalação da CPI da Corrupção na Assembleia acabou atenuado em parte por manifestações como a do presidente da Assembleia, Ivar Pavan (PT), para quem é preciso privilegiar o interesse público, buscando o esclarecimento das denúncias. De natureza política, comissões parlamentares de inquérito são importantes por propiciarem uma oportunidade para os parlamentares cumprirem seu papel de fiscais do Executivo. Até mesmo pelo fato de o esforço ser complementar ao de outras instituições, como Polícia Federal, Ministério Público e Judiciário, o Legislativo deveria tentar se colocar, nesses momentos, acima de quailquer interesse que não seja o de perseguir a verdade.

Antes de se decidirem por uma eventual estratégia de enfrentamento durante o horizonte de tempo para investigações que têm pela frente, os parlamentares deveriam se propor a deixar de lado posicionamentos radicais como tentativas de “blindagem” ou superexposição de depoentes. O período anterior à instalação dos trabalhos deixou evidentes divergências em relação ao cronograma de trabalhos e o risco de uma verdadeira guerra de requerimentos, como se essas questões fossem mais importantes do que o próprio objetivo central da comissão parlamentar.

Além de dificultar o que deveria se constituir na preocupação central de todos os deputados, governistas ou oposicionistas – a elucidação das denúncias no âmbito político –, um acirramento dos ânimos só ajudaria a frustrar ainda mais quem já não se conforma com a situação atual. Os parlamentares precisam fazer um esforço para privilegiar os fatos denunciados e não as consequências às quais possam dar origem.

As CPIs, particularmente as dedicadas a temas mais rumorosos, como os desvios no Detran, têm um significado que vai além da atuação de seus integrantes. Nesses momentos, a própria Assembleia tem sua atuação posta em xeque e esse é um aspecto que integrantes da CPI da Corrupção – situacionistas e oposicionistas – deveriam levar devidamente em conta.

UMA DATA ESPECIAL
EDITORIAL
GAZETA DE ALAGOAS
27/8/2009

Este 27 de agosto de 2009, dia dedicado a Nossa Senhora dos Prazeres, centenariamente festejado em Maceió como o dia de sua padroeira, tem uma característica especial, pois se insere nas comemorações pelo sesquicentenário da inauguração da igreja da Catedral, realizada nos idos de 1859, num ato que marcou, para sempre, a história alagoana.
Coroando o ciclo natalino daquele ano de 1859, suas majestades, o imperador Dom Pedro 2º e a imperatriz Dona Tereza Cristina, e respectiva comitiva imperial, fizeram-se presentes em Maceió, na “virada” daquele ano para inaugurarem a imponente Catedral de Nossa Senhora dos Prazeres.
Nossa Senhora dos Prazeres tornou-se reverenciada por volta de 1590, em Portugal. Uma imagem da Virgem teria aparecido, naquele ano, sobre uma fonte em Alcântara. As crônicas daquele tempo indicam que uma menina, ao tentar beber a água daquela fonte, aproximando-se da imagem, teve a visão de Nossa Senhora, que teria pedido a edificação, naquele local, de uma igreja e que ela devia ser invocada como Nossa Senhora dos Prazeres.
Segundo estudiosos católicos, Nossa Senhora dos Prazeres é a mesma Nossa Senhora das Sete Alegrias e os franciscanos teriam sido os responsáveis pela disseminação de sua devoção. O significado de Prazeres ou Alegrias, descritos por um frande franciscano, tem como referências “a Anunciação, a saudação de Isabel, o Nascimento de Jesus, a visitação dos Reis Magos, o encontro com Jesus no Templo quando ele conversava com os doutores da lei, a aparição de Jesus ressuscitado e a coroação de Maria no céu”. De uma forma ou de outra, além dos mistérios da religião, os significados de Nossa Senhora dos Prazeres, somados ao significado do grande ato realizado há 150 anos, conferem a este 27 de agosto de 2009 uma luz especial, um brilho que fulgura em história e fé ao mesmo tempo.

MAR DE LAMA E CONTRADIÇÃO
EDITORIAL
JORNAL DO COMMERCIO (PE)
27/8/2009

Ruim ou péssimo são as qualificações (ou melhor, desqualificações) que 44% dos brasileiros dão ao Congresso Nacional, segundo recente pesquisa divulgada no Sudeste. É a pior avaliação feita sobre o parlamento desde o auge do escândalo do "mensalão", quando os índices de reprovação dos congressistas incluíram 48% das pessoas pesquisadas. Segundo a mesma pesquisa, do Datafolha, 74% dos entrevistados querem o afastamento do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). O mais notável é que é de 67% o índice de aprovação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o grande defensor da permanência do patriarca maranhense na chefia do Senado e que exigiu do PT a aprovação do engavetamento de denúncias e pedidos de destituição contra o presidente dessa casa legislativa. O que acarretou a saída do senador petista catarinense Flávio Arns do partido e a ameaça não concretizada do senador paulista Aloísio Mercadante de deixar a liderança petista. A senadora acreana Marina Silva também saiu do PT, mas por motivação mais abrangente.
Os dados indicam, então, que os ouvidos na referida pesquisa mantêm sua aprovação a Lula, mas não engolem tudo o que ele faz e fala. Fundadores e apoiadores do PT, incluindo alguns que já abandonaram a agremiação, opinam que o presidente "reduziu" o PT. O sociólogo Francisco Oliveira, fundador do partido e que foi superintendente adjunto da Sudene na época de Celso Furtado, vai fundo: "A relação da crise atual com as anteriores é a mesma: o Lula tornou-se maior que o partido e o partido vive a reboque do presidente. Impõe o estilo autoritário que é próprio do Lula e foi escondido devido ao fato de que ele era um prestigioso líder sindical em oposição à ditadura. Lula é muito autoritário, arrasou o PT, fez do partido trampolim para suas alianças políticas espúrias". Disse ainda que a tese da governabilidade é conservadora, pois todos no País que preferem manter o statu quo usam o argumento da governabilidade.
Se o partido que pretendia mudar tudo para melhor no Brasil e na política nacional é visto assim por ex-membros mais críticos, fica mais fácil entender a baixíssima apreciação por que passa o Congresso. Devido a suas alianças, que Francisco Oliveira vê como espúrias, Lula se vê obrigado a defender incondicionalmente a sustentação do cacique maranhense na presidência do Senado, pois seu sucessor seria o senador tucano de Goiás Marconi Perilo. Isso em tempos de pré-eleições e eleições. O fato é que, com Sarney ou sem ele, o Senado está afogado em mar de lama muito mais espessa e fedorenta que aquele, detectado por Carlos Lacerda em 1954, que levou o presidente Getúlio Vargas ao suicídio.
Nem toda a sujeira pode ser posta na conta do grão-coronel maranhense, senador pelo Amapá. Ela se acumulou ao longo de décadas e abrange nepotismo, compadrio, excesso de cargos comissionados em detrimento de servidores concursados e profissionais, e até os atos secretos só recentemente vindos à luz. Desde a mudança da capital do Rio para Brasília, acumulam-se vantagens, devidas e indevidas, mordomias, decisões "por baixo do pano" e expedientes similares de quem se acredita uma casta superior e não tem a consciência de ser representante do povo, dos Estados. Para convencer os congressistas e os funcionários públicos de que deveriam se mudar para o novo Distrito Federal, Juscelino Kubitschek começou dobrando os seus vencimentos e lhes dando moradia gratuita. A partir daí, durante os últimos 50 anos, não se parou mais.
Quando o Executivo achou que estava bom de parar com tanta vantagem, os próprios parlamentares passaram a criar trens da alegria e mais mordomias. Ao abrigo dessa mentalidade de casta superior, de marajás contra párias, cabe tudo, desde a nomeação para uma sinecura do namorado de uma neta até atos mais graves contra os interesses da sociedade, dos eleitores. Agora, para completar, temos partidos confessionais, ligados a igrejas, em total contradição com a Constituição e o regime republicano de governo. Outra aberração: um terço dos senadores é de suplentes, sem um voto sequer, como os biônicos da ditadura.

MORADORES DE RUA
EDITORIAL
DIÁRIO DO NORDESTE (CE)
27/8/2009

A presença dos sem-tetos improvisando moradias na paisagem urbana é uma constante. Fruto da migração campo-cidade, esse quadro social resulta do desemprego, da falta de qualificação profissional para o mercado urbano de trabalho e da aventura dos que procuram a cidade grande em busca de melhorar sua condição de vida. Como pano de fundo dessa problemática, há um todo mais complexo, representado por grupos especializados em ocupar terrenos ou empreendimentos habitacionais em fase de construção pelo poder público.

A montagem de um barraco de madeira sobre o viaduto da Avenida Presidente Castello Branco (Leste-Oeste), no qual estão convivendo onze pessoas, sugere duas leituras: a primeira, uma forma de escandalizar a miséria vivida por duas famílias de sertanejos desgarrados de suas origens, sobrevivendo na metrópole da coleta de lixo reciclável; a segunda, o total descontrole do espaço urbano, prerrogativa legal atribuída ao município de Fortaleza, mas quase sempre descurada.

Como o nível social do grupo arribado dos bolsões de miséria não permite concluir pela primeira alternativa, resta, sem dúvida, a segunda. Falta à administração de Fortaleza uma política capaz de controlar a ocupação dos espaços vazios e de fazer valer o cumprimento das posturas municipais. Os dois casais que improvisaram o barraco exatamente onde a Capital recepciona os visitantes não têm a menor idéia da existência das normas legais , nem do gesto extemporâneo cometido.

Moradores de rua ocupando artérias projetadas, terrenos públicos reservados a equipamentos sociais ou áreas remanescentes dos viadutos, tem sido uma constante. Do cruzamento das avenidas Mister Hull e Perimetral, em Antônio Bezerra, já foram removidos vários grupos, alojados em habitações salubres. Depois de revendê-las, eles costumam retornar às áreas de risco, mais próximas de seu mercado informal de trabalho.

O viaduto da BR-116, nas proximidades da Base Aérea, tem sido outro espaço escolhido pelos sem-tetos para improvisar moradias, sem qualquer reação do poder público, a não ser quando o problema se torna mais grave, em razão dos constantes assaltos ali registrados. O viaduto existente na bifurcação das avenidas Santos Dumont e Engenheiro Santana Júnior também abriga desocupados, viciados em substâncias entorpecentes e pessoas desprovidas de um mínimo de condições dignas de sobrevivência: um abrigo.

A Fundação de Desenvolvimento Habitacional estima o déficit de moradias na Capital em 77.655 unidades. O governo federal destinou uma cota expressiva de habitações para Fortaleza, dentro do programa Minha Casa, Minha Vida. Contudo, a oferta não corresponde à demanda, mas, nem por isso, o problema se apresenta como insolúvel. Há outras soluções, como os mutirões habitacionais, onde os interessados oferecem a mão-de-obra e o poder público o material.

Depois, o argumento segundo o qual o cadastro para a ocupação das moradias previstas no programa Minha Casa, Minha Vida já teve o prazo de adesão expirado é uma confissão manifesta da exclusão dos moradores de rua. Não é por aí. A Fundação de Desenvolvimento Habitacional , se for gerida com proficiência, deverá dispor de meios para enfrentar emergências como esta do viaduto da Leste-Oeste.

A moradia é um direito do cidadão. Provê-la é o melhor meio para tornar a cidade mais humana, socialmente mais justa.

DESELEGÂNCIA E FRAGILIDADE INSTITUCIONAL
EDITORIAL
A CRÍTICA (AM)
27/8/2009

Os políticos em geral têm a estranha mania de antecipar as coisas com vistas a ocupar os espaços eventualmente vagos. Nesse mister chegam até as raias da deselegância e também da ganância, quando não da explicita dependência diante do mandatário de plantão. É o que ocorre no momento na relação entre o Governo do Estado e a Assembleia Legislativa.

Nem bem o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, Júlio Cabral, sinaliza que pedirá aposentadoria por invalidez, movimentos de ambos os poderes botam para funcionar as engrenagens que culminarão com a escolha do nome do substituto. Se já não fosse uma falta de respeito com Cabral, que parece estar acometido de doença grave, mas continua na labuta no TCE, a disputa entre os poderes Legislativo - a quem cabe a vaga - e Executivo expõe ou exporá a verdadeira natureza da relação entre o governador do Estado e os deputados.

Na Assembléia, como A CRÍTICA mostra hoje, deputados de todas as matizes invocaram a independência entre os poderes para garantir que o indicado será um dentre eles. Na outra ponta o governador garante que não vai interferir na escolha.

Seria muito bom que essas palavras não fossem folhas ao vento e sim reflexo de uma realidade democrática de respeito mútuo. A tradição, contudo, tem mostrado que em casos semelhantes prevalece a vontade do governante de plantão. Sequer há registro do último deputado indicado para o Tribunal de Contas, embora nas últimas substituições o nome de Liberman Moreno tenha sido aventado em todas.

Não custa lembrar também que uma das últimas vagas abertas na corte ficou quase dois anos sem ser preenchida a espera de um nome do governo, que era o do secretário José Melo.

Neste sentido, é bom recordar que a corte de contas é órgão auxiliar da Assembleia Legislativa, a responsável última pela aprovação das contas do Executivo. É assim porque no sistema republicano brasileiro a ALE, com seus deputados estaduais, funciona como “freio e contrapeso” diante do poder avassalador do ocupante do Executivo.

Não fazer uso da prerrogativa de indicar o substituto no caso de uma eventual aposentadoria de Cabral vai tornar a Assembléia menor e, conforme a boa teoria política, não é para ficar de joelhos diante do Executivo que o povo elege os deputados.

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