Thursday, August 06, 2009

EDITORIAIS 6/8/2009

O QUE PENSA A MÍDIA
6/8/2009 - EDITORIAIS
DESRESPEITO
EDITORIAL
O GLOBO
6/8/2009

Não há como negar fatos.
Jornalistas são perseguidos, uma das principais emissoras de TV, a RCTV, teve a concessão cassada de maneira autoritária, 34 rádios acabam de ser silenciadas e a outra estação de televisão que não segue a cartilha bolivariana, a Globovisión, foi atacada por um grupo armado do partido chavista UPV. Diante desta nova onda de cerceamento da liberdade de expressão, várias entidades internacionais — Sociedade Interamericana de Imprensa, SIP, Associação Internacional de Radiodifusão, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA — condenaram mais esta investida do governo autocrata de Chávez contra a democracia.
Até o presidente paraguaio, Fernando Lugo, simpático a Chávez, fez reparos ao que acontece na Venezuela. “Somente a diversidade de pensamentos de esquerda, de centro ou de direita pode garantir uma democracia autêntica”, comentou Lugo ao criticar o fechamento das rádios.
Mas o governo Lula teve atitude diversa. O assessor internacional da Presidência Marco Aurélio Garcia, uma espécie de “Itamaraty do B” instalado em Palácio, inclusive enxerga liberdade de imprensa na Venezuela. “Se acabou, deve ter sido depois que saí”, respondeu um irônico Garcia, recém-chegado da Venezuela, à pergunta sobre se a liberdade de imprensa havia acabado no país de Hugo Chávez.
É um escárnio, um desrespeito à inteligência alheia e ao nível de informação que se tem sobre o que de fato ocorre, e não é de hoje, na Venezuela. Talvez por cegueira militante ou efeito anestesiante dos ares de Brasília, Garcia, um escancarado defensor de Chávez pago pelo contribuinte brasileiro, considera haver liberdade de expressão na Venezuela. Com essa declaração, o assessor de Lula faz lembrar a falta de respeito com que comemorou, em meio a gestos obscenos, a notícia do “Jornal Nacional” sobre evidências de que a tragédia com o Airbus da TAM em Congonhas, onde 199 pessoas foram carbonizadas, poderia ter sido causada por problemas mecânicos. E não por falhas da Anac, àquela altura aparelhada pelo governo de que faz parte Marco Aurélio. O assessor, uma linha de comando paralela da diplomacia brasileira, é pelo menos coerente: está sempre a serviço da sua ideologia, custe o que custar, mesmo que tenha de exercer papéis deploráveis, como agora.
Chávez mandou prender a líder do ataque à Globovisión e sustar a tramitação da lei draconiana que despachou para o Congresso dominado de bolivarianos com o objetivo de reprimir, inclusive com prisão, a divulgação de notícias que desagradem ao governo. E não apenas jornalistas, mas também conferencistas que contrariem o caudilho, e assim por diante.
Mas o aparente recuo chavista não passa de cortina de fumaça.
Não será a primeira vez que o caudilho parece retroceder, para depois avançar com mais truculência contra as liberdades. Lembre-se que uma proposta de mudança constitucional feita por Chávez foi derrotada em plebiscito, o que nada significou, pois ele implementou tudo que desejava de forma discricionária.
Marco Aurélio não está no Planalto por acaso, é óbvio. Ele existe porque é parte de uma corrente autoritária, antidemocrática, representada no governo.
Não faltam evidências da atuação deste lado, oculto, ou pouco exposto, da gestão Lula — mas nem por isso inativo.
Coloquem-se na mesma moldura iniciativas como a da criação da agência idealizada para, além de aumentar a carga tributária sobre as emissoras de televisão, controlar o conteúdo da produção audiovisual no país (Ancinav). Assim como a boa acolhida dada no Planalto à proposta sindical de criação do Conselho Nacional de Jornalismo (CNJ), projeto destinado a restringir a atuação dos jornalistas profissionais. As duas iniciativas foram abortadas por Lula, mas não se pode esquecer que existiram.
Deriva desta mesma cultura autoritária a intenção de censurar a publicidade, assim como intervir na distribuição de recursos das empresas que decidem destinar parte dos impostos ao financiamento de projetos culturais.
Também não passou despercebido que, no julgamento pelo Supremo da Lei de Imprensa, herança da ditadura, a Advocacia Geral da União discordou da suspensão integral da legislação.
Há inúmeros outros casos que denunciam a atuação desta corrente autoritária em Brasília. O caso de Marco Aurélio Garcia é apenas um, porém grave, porque ele fala em nome do presidente da República. Logo, salvo desmentido oficial, a posição do Brasil é que nada cerceia a liberdade de expressão na Venezuela. O Itamaraty tem de arcar com as consequências desta estapafúrdia posição.
E, no plano interno, é preciso aumentar a vigilância das instituições contra a importação contrabandeada de instrumentos chavistas de garroteamento de direitos individuais e liberdades públicas

DESIGUALDADES E PERDAS SALARIAIS
EDITORIAL
JORNAL DO BRASIL
6/8/2009

RIO - Diferentemente de outras crises econômicas, que agravaram a pobreza nas regiões metropolitanas do Brasil, diante da atual turbulência global o país vem conseguindo reduzir o número de pobres e aplacar o nível da desigualdade de renda. Foi o que constatou o estudo divulgado terça-feira pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Se a diminuição da miséria merece aplausos sob quaisquer aspectos, a queda da desigualdade cobra um comentário mais crítico, pois veio às custas de perdas em salários mais elevados.
Entre outubro de 2008 e junho de 2009, 503 mil brasileiros saíram da condição de pobreza, como atestou o estudo Desigualdade e pobreza no Brasil metropolitano durante a cise internacional: primeiros resultados. Se as datas forem alargadas para efeito de cálculo, os números tornam-se ainda mais significativos: entre março de 2002 e junho deste ano, a taxa de pobreza caiu quase 27% (o que representa 4 milhões de cidadãos retirados do estrato social menos favorecido e elevados a um nível de vida mais digno). Como não há no Brasil um indicador oficial para medir pobreza, o Ipea considerou “pobreza” uma renda per capita familiar de até meio salário mínimo.
Entre as seis regiões metropolitanas avaliadas – Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador, Porto Alegre, Recife e Belo Horizonte – a capital fluminense e sua circunvizinhança foi a que apresentou a maior queda no número de pessoas que deixaram de ser pobres: 1,4 milhão. Como ressaltou o presidente do Ipea, Marcio Pochmann, a redução do desemprego, o aumento do salário mínimo e, sobretudo, os programas de transferência de renda para as camadas mais pobres – como o tão controverso Bolsa Família – foram os principais responsáveis pela queda. O presidente do Instituto Brasileiro de Pesquisa Social (IBPS), Geraldo Tadeu, destacou a importância das pensões e aposentadorias e a valorização do real diante do dólar para o combate à pobreza. Tadeu acredita que a retomada da produção (já percebida em alguns setores da indústria) e o aumento de 10% nos benefícios do Bolsa Família (anunciado esta semana) vão contribuir para que as taxas de pobreza diminuam ainda mais.
Também foi constatada pelo Ipea a queda no chamado coeficiente de Gini. O índice é usado para medir desigualdade, e varia de 0 a 1. Quanto mais próximo de 1, mais desigual é a sociedade. Em junho, o índice de Gini alcançou nas seis principais regiões metropolitanas do Brasil seu menor patamar, 0,493 – ainda muito distante dos países mais avançados.
Mas ao contrário do que seria o ideal, a desigualdade de renda não diminuiu porque os mais pobres passaram a ganhar mais, e sim porque os trabalhadores com maior remuneração, principalmente os da indústria, foram os mais afetados pela crise. Queda acentuada na renda dos mais bem remunerados não é a maneira mais apropriada de reduzir a distância entre os polos. O governo, então, deve prosseguir na luta em favor dos mais pobres e insistir com políticas capazes de neutralizar os efeitos da crise sobre os mais abastados.

TAMANHO DO ESTADO, O TEMA DE LULA EM 2010
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
6/8/2008

Mais uma vez convertendo um evento oficial em comício político, o presidente Lula aproveitou a solenidade de sanção da lei que criou 230 Varas na Justiça Federal para defender a contratação de mais servidores públicos e refutar as críticas de que seu governo teria promovido o "inchaço" do Estado, comprometendo o equilíbrio das finanças públicas ao elevar com prodigalidade os gastos com funcionalismo.

Em 2009, a União gastará R$ 169,9 bilhões com pessoal e encargos - despesa essa que tem crescido mais do que a receita não só pela contratação de novos servidores, mas também pela generosa concessão de reajustes salariais apresentados, em alguns casos, como "reestruturação de carreiras".

"Vivemos um conflito e uma incompreensão. Quando resolvemos tomar medidas para melhorar o funcionamento das instituições, há sempre duas críticas: a de que o Estado está inchando e de que é preciso um ‘choque de gestão’. As pessoas ainda não se deram conta de que, quanto melhor funcionar o Estado, melhor fica para todo mundo", disse o presidente, depois de defender a nomeação de mais servidores para as "áreas de fiscalização" do governo.

Lula está confundindo as coisas. "Choque de gestão" é uma maneira de qualificar o funcionalismo e reformar a máquina governamental, para torná-la mais eficiente. Por sua vez, aumento do número de servidores não é sinônimo de melhoria automática de qualidade na prestação de serviços públicos - como mostramos, ontem, no editorial O serviço público reprovado. Se os novos funcionários não tiverem preparo, a burocracia apenas incha, gerando mais gastos com salários para o Tesouro sem elevar a produtividade do Estado.

Essa distinção consta de qualquer manual de introdução à administração pública - assunto que Lula conhece suficientemente bem. E se se refere, naqueles termos, ao tamanho do Estado, é apenas por interesse eleitoreiro. Como acredita que a campanha de 2010 será "plebiscitária" e está ciente de que o inchaço do Estado será um dos temas da oposição, ele age preventivamente quando defende a contratação de mais servidores e afirma que "um Estado maior é melhor para todos".

A estratégia é ardilosa. Na visão do governo, "Estado máximo" ou "Estado mínimo" é uma discussão que o eleitorado não compreende bem, mas intui exatamente aonde leva - em princípio, um Estado maior significaria mais pessoas atendidas pelo serviço público. Para se defender das críticas que sofrerá por ter multiplicado cargos em Ministérios, autarquias e estatais, com o objetivo de alojar a "companheirada", Lula desde já vem lembrando que o aumento do funcionalismo em seu governo se deve à contratação de professores, delegados federais, advogados da AGU e auditores da Controladoria-Geral da União - áreas que envolvem temas eleitoralmente atraentes, como educação, segurança e combate à corrupção.

Não foi por acaso que, ao sancionar a lei que cria 230 Varas na Justiça Federal, Lula referiu-se a quem o critica por defender mais contratações para as "áreas de fiscalização". Essa é a "deixa" de que precisa para acusar os tucanos de terem, em sua gestão, "desmontado" o Estado na sua capacidade de planejamento e fiscalização. Na ótica maniqueísta do presidente Lula, 2010 será um plebiscito entre quem defende um Estado maior, portanto capaz de atender mais pessoas, e quem propõe um Estado menor, portanto, ineficiente. Foi para justificar essa estratégia que, em março, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) publicou um "estudo" no qual afirma que haveria "espaço" para contratações de mais servidores.

O trabalho compara a situação do emprego público no Brasil com a de vários países. A comparação é baseada na relação entre o número de empregados do setor público e o total dos ocupados, mas os critérios comparativos são duvidosos, pois, para comparação, só foram escolhidos países que justificassem conclusões de interesse do Planalto. Embora tenha sido classificado como "peça de ficção" pelos especialistas, o "estudo" tem sido invocado por Lula para justificar a afirmação de que não existiria o Estado gastador tão propalado pela oposição. É esse o tipo de campanha que Lula fará em 2010.

NA CONTRAMÃO DA VIDA
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
6/8/2009

O projeto de lei que regulamenta a profissão de mototaxista tramitou no Congresso por oito anos e acabou sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apesar dos alertas de entidades e de especialistas em segurança no trânsito e do próprio ministro da Saúde, José Gomes Temporão, que o qualificou como preocupante pelo impacto que a disseminação dessa atividade pode provocar no sistema de saúde. Nos cinco primeiros meses deste ano, 20.622 motociclistas acidentados foram atendidos em unidades públicas de saúde. Em 14 Estados as mortes de motociclistas superaram as de pedestres.

Metade das vítimas atendidas no Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas (HC) da capital é de motociclistas, embora esse veículo componha apenas 12% da frota paulistana. Os custos com a internação desses acidentados já ultrapassam os R$ 100 milhões por ano no HC.

No país onde os acidentes com motos matam 19 pessoas por dia - e no ano passado deixaram mais de 500 mil feridas, sendo que o gasto com atendimento foi de R$ 8 bilhões -, razão tem o presidente da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego, Flávio Emir Adura, ao dizer que a nova lei surge "na contramão da vida".

O ministro das Cidades, Márcio Fortes, no entanto, no evento que marcou a sanção da lei, explicou o que, para o presidente Lula, a justifica: "Não podemos fechar os olhos à realidade. Essa atividade já existe e precisava ser regulamentada." A questão é saber se uma atividade que coloca em risco a vida e a saúde das pessoas deve ser legalizada só porque já existe. A mesma justificativa se poderia apresentar para a regulamentação do uso de tóxicos. Para o ministro das Cidades, a lei traz aperfeiçoamentos ao estabelecer requisitos básicos de segurança, obrigatórios, para os mototáxis, como uso de colete e capacete, além de curso especializado para o transporte de passageiros em moto. A atividade só poderá ser exercida por maiores de 21 anos e por condutores habilitados há ao menos dois anos.

São exigências brandas para uma atividade de alto risco, tanto para os ocupantes das motos como para os demais motoristas e os pedestres em geral. Motocicleta não é veículo adequado para transportar passageiros e a reconhecida incapacidade de fiscalização dos órgãos de trânsito agrava a situação.

Em São Paulo já houve várias tentativas, frustradas, de organizar a atividade de motofrete, profissão também regulamentada pela mesma lei federal. E a causa maior da frustração sempre foi a dificuldade de fiscalizar o grande número de motos que se esgueiram por entre os carros de maneira temerária e muitas vezes agressiva. Poucos respeitam as regras de trânsito, e alguns formam verdadeiras gangues que ameaçam quem lhes chama a atenção. A pressa que as empresas de motofrete exigem na entrega de mercadorias e documentos, certamente, será a mesma no transporte de passageiros, principalmente em cidades que sofrem com o trânsito congestionado. Testes mostram que, numa queda, o ocupante de uma moto a 60 km/h desliza entre 20 e 30 metros no asfalto, que age como uma lixa em seu corpo. A 72 km/h, o impacto equivale a uma queda do sexto andar de um edifício. Nos mototáxis serão sempre duas pessoas.

O presidente da Associação Nacional de Transportes Públicos, Ailton Brasiliense, ainda adverte que, além da falta de segurança para seus ocupantes, com consequente aumento do número de vítimas de acidentes de trânsito, a atividade dos mototaxistas trará maior desorganização para o setor de transporte público, que já arca com a concorrência clandestina de ônibus e vans irregulares.

A lei teve o cuidado de estabelecer que caberá aos municípios decidir se a regulamentam ou não, já que, de acordo com especialistas, é atribuição deles a organização da circulação de veículos no sistema viário. Esse é o seu único ponto positivo dessa lei. Felizmente, São Paulo, a maior cidade do País - assim como todas as cidades da região metropolitana com mais de 200 mil habitantes -, já deixou claro que não permitirá o serviço de mototáxi.

SEM DOHA, SOBRA A EUROPA
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
6/8/2009

Sem esperança de concluir até o próximo ano a Rodada Doha, lançada em 2001 e ainda emperrada, o governo brasileiro tentará reativar as discussões de um acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia. Essa foi a alternativa apontada pelo chanceler Celso Amorim, na semana passada, diante do pouco interesse do governo americano em retomar as negociações globais de comércio. Mas o acordo com o Mercosul, embora possa interessar ao bloco europeu, não está na lista de suas prioridades para este semestre. Também falta saber se o governo e os empresários da Argentina estão interessados em participar de conversações comerciais com um parceiro importante e exigente como a União Europeia. Esse interesse é altamente improvável. Afinal, desde o ano passado a Argentina se tornou cada vez mais protecionista.

O governo petista preferiu jogar quase todas as fichas na Rodada Doha, praticamente abandonando as possibilidades de acordos com os mercados mais desenvolvidos. O projeto da Alca foi liquidado em 2003-2004, numa ação coordenada com as autoridades argentinas. Na fase final, o governo americano contribuiu para enterrar a integração comercial do hemisfério, mas o fracasso do projeto resultou principalmente do esforço dos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Néstor Kirchner.

O governo brasileiro ainda se mostrou interessado em continuar as negociações com a União Europeia. Por alguma razão obscura, um compromisso com os europeus foi considerado ideologicamente aceitável pelos estrategistas do Planalto. Inaceitável mesmo seria um acordo com a participação dos EUA, ou, no dialeto bolivariano, do Império. Mas essa concessão ao capitalismo não deu certo. Os argentinos não quiseram facilitar o acesso de produtos industriais a seu mercado. Não podia dar certo: em condições normais, um acordo envolve troca de ofertas.

Negociadores da União Europeia e do Mercosul tentaram retomar as negociações várias vezes, mas nunca foram muito longe. Em relação ao comércio agrícola, os europeus nunca ofereceram tanto quanto pediam os sul-americanos. As ofertas mais importantes, segundo os europeus, deveriam ocorrer na Rodada Doha. Apesar disso, apresentaram algumas propostas e o governo brasileiro respondeu com ofertas de acesso para produtos industriais. Mas os argentinos sempre foram reticentes em relação a essas ofertas. Adotaram a mesma posição, depois, quando houve os últimos esforços para desemperrar a Rodada Doha. Numa dessas ocasiões, acusaram de traição os diplomatas brasileiros, participantes do restrito grupo envolvido naquela tentativa.

A pauta da União Europeia, neste semestre sob a presidência da Suécia, inclui conversações comerciais com Canadá, Ucrânia, Índia, Japão, Taiwan, Vietnã e Cingapura. O Mercosul não consta do programa oficial. O governo sueco, no entanto, inclui o Brasil na lista de conferências de cúpula programadas para este ano. Os outros parceiros listados na agenda são Estados Unidos, Índia, China, Rússia, África do Sul e Ucrânia. O Brasil foi oficialmente selecionado há mais tempo como parceiro estratégico da União Europeia, mas essa decisão tem consequências comerciais muito limitadas. A Comissão Europeia só tem mandato para negociar livre comércio com o Mercosul, não com qualquer de seus integrantes. De toda forma, como o Mercosul é uma união aduaneira, nenhum de seus membros poderia participar isoladamente de uma negociação desse tipo. O Brasil continuará amarrado, exceto se o Mercosul voltar ao status de zona de livre comércio, mas o governo brasileiro nem sequer discute essa hipótese.

A União Europeia, dizem funcionários do bloco, poderia retomar as conversações com o Mercosul, mas para isso Brasil e Argentina precisariam entender-se. Outros latino-americanos, incluídos o Chile, o México e alguns andinos, concluíram acordos com os Estados Unidos e outros grandes parceiros. O Brasil ficou limitado a acordos modestos com economias em desenvolvimento, sozinho ou juntamente com o Mercosul. Sem a Rodada Doha, é quase obrigatório retomar as conversações com a União Europeia. Mas para isso o Brasil dependerá dos Kirchners - e também de Hugo Chávez, se a Venezuela afinal entrar no Mercosul.

MUDANÇAS NO FLUXO CAMBIAL
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
6/8/2009

Em julho, o fluxo cambial teve saldo positivo de US$ 1,279 bilhão, ante um saldo negativo de US$ 2,494 bilhões no mesmo mês de 2008, reflexo da melhoria que se verificou neste ano.

No entanto, essa diferença de um ano para o outro não se limita ao resultado final, mas se estende aos fatores que o produziram. Enquanto, no ano passado, a conta financeira mostrava déficit de US$ 5,130 bilhões, em julho deste ano o superávit foi de US$ 4,103 bilhões e - fato pouco usual - a conta comercial apresentou déficit pelo segundo mês consecutivo, agora de US$ 2,833 bilhões, ao passo que, no ano passado, houve déficit apenas em dezembro, em valor muito reduzido (US$ 119 milhões).

Essa mudança pode parecer curiosa. É altamente positivo o superávit das contas financeiras, pois mostra a normalização das entradas de capitais - investimentos diretos estrangeiros, operações bolsistas e outras. De fato, a partir de junho os ingressos de capitais voltaram a se aproximar da média mensal registrada em 2008, enquanto as saídas continuaram abaixo dessa média.

A evolução das contas comerciais é mais estranha. É evidente que a valorização do real ante o dólar pode ter contribuído para uma queda das exportações e um aumento das importações. A balança comercial (dados aduaneiros) mostra, para os sete primeiros meses do ano, uma queda de 23,8% das exportações e de 29,9% para as importações. No caso dos fluxos de câmbio, temos uma queda de 28,6%, para as exportações, e de 29,8%, para as importações. A maior diferença está no caso das exportações.

Os resultados dos dois últimos meses, no que se refere às exportações, têm de fato uma explicação: os exportadores, a partir de junho, acharam mais interessante não internar suas receitas, mas sim depositá-las no exterior - como, aliás, foi autorizado neste ano, utilizando esses recursos seja para pagar suas despesas lá fora (incluindo despesas com juros), seja para pedir financiamentos, que então puderam obter a um custo menor do que aqui dentro, com base nos depósitos.

De fato, verificou-se nos últimos meses um certo desinteresse das empresas em obter, no Brasil, financiamentos para o comércio exterior. O Banco Central, que havia substituído os bancos comerciais na realização dessas operações, foi reembolsado quando o custo dos Adiantamentos de Contrato de Câmbio (ACCs) foi reduzido de 4% mais Libor para 1,2% mais Libor.

BOLA PERDIDA
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
6/8/2009

Presidente da CBF muda discurso e afirma que estádios para Copa de 2014 vão precisar de verbas do setor público

COMO NÃO ERA difícil de prever, recursos públicos serão consumidos na construção e reforma de estádios para as partidas da Copa do Mundo de 2014. A versão de que a iniciativa privada estaria à frente desses investimentos foi afastada por seu principal divulgador, o presidente da Confederação Brasileira de Futebol, Ricardo Teixeira.
O dirigente, que preside a entidade há duas décadas, reiterou em diversas oportunidades -entre as quais num artigo publicado em 2008 por esta Folha- que o modelo previsto para o evento teria "viés predominantemente privado". Caberia ao setor público, na proposta anteriormente apresentada pela CBF, investir apenas naquilo que é de sua competência -infraestrutura, aeroportos, transportes etc.
Agora, em entrevista a alguns dos principais jornais do país, Teixeira diz o que a experiência e o bom senso davam como certo: será inevitável o desembolso de verbas governamentais para modernizar antigas arenas esportivas e construir duas novas.
Não se sabe como os custos serão divididos. O total, por ora, é estimado em R$ 3 bilhões. Mas basta lembrar o descalabro em que se transformaram as contas dos Jogos Pan-Americanos de 2007 para observar com cautela cálculos dessa natureza.
Paixão nacional, o futebol tem servido no Brasil a interesses políticos e continua a abrigar um sem número de irregularidades, como lavagem de dinheiro, caixa dois, evasão fiscal, enriquecimento ilícito e corrupção.
Não é necessário um exame mais aprofundado para perceber que as bases sobre as quais se organiza esse esporte no país estão em ruínas. Tivessem os clubes estatuto de empresas, e não contassem com o deplorável beneplácito das autoridades, já estariam legalmente falidos em sua quase totalidade.
Em grande parte apegados a rotinas amadorísticas e patrimonialistas, sempre a contar com a leniência e a cooperação de políticos municipais, estaduais e federais, os dirigentes brasileiros não se prepararam para as mudanças ocorridas nas últimas décadas, quando se aprofundou o processo de globalização.
A consolidação do esporte como peça da indústria internacional de entretenimento deixou o Brasil em vexatória posição periférica. O quadro, que já era de atraso, tornou-se insustentável.
Quando assumiu a Presidência da República, o torcedor Luiz Inácio Lula da Silva alimentou esperanças de que mobilizaria instrumentos governamentais para tentar superar a situação.
Não foi o que aconteceu. O governo Lula frustrou as expectativas mais sensatas e progressistas do setor ao reincidir na velha prática de conceder benefícios públicos a clubes e entidades sem exigir contrapartidas que pudessem induzi-los a um regime de gestão mais responsável e transparente. Esse histórico só faz aumentar as apreensões acerca de como será conduzida a organização da Copa no Brasil.

BRINCADEIRA COM FOGO
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
6/8/2009

OS NÚMEROS do desmatamento na Amazônia se transformaram num critério destacado de desempenho do Ministério do Meio Ambiente. Quando sobem, o titular da pasta perde pontos na opinião pública nacional e internacional. O ministro de plantão, assim, tem forte incentivo para tergiversar quando os dados não lhe são de todo favoráveis.
Os sensores de satélite que medem a destruição não se sujeitam, contudo, à encenação palaciana. Do ponto de vista histórico, a última cifra confirmada registra que o desmate aumentou. Em 2008, subiu 12%, com 12.911 km2 (o equivalente a 8,6 vezes a área do município de São Paulo), contra 11.968 km2 em 2007. Esse dado é apurado anualmente pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), desde 1988, pelo sistema Prodes.
Na divulgação das estatísticas, anteontem, o ministro Carlos Minc preferiu dourar a pílula. Destacou números provisórios do sistema auxiliar Deter, criado em 2004, pelo qual houve queda de 55% no desflorestamento nos últimos 11 meses.
Com a facilidade habitual com que lança palavras ao vento, Minc profetizou que 2009 terá "o menor desmatamento dos últimos 20 anos". Não há base objetiva para tal predição.
O Deter trabalha com imagens de resolução pior, menos precisas que as do Prodes, mas suficientes para orientar a fiscalização. Não detecta pequenas áreas desmatadas. Além disso, metade da Amazônia estava coberta por nuvens no período de medição, bloqueando a visão dos satélites.
Na melhor das hipóteses, o Deter indica uma tendência de queda -de resto bem-vinda, em especial diante do aumento verificado em 2008, após três anos de redução. Todos podem torcer para que se confirme, mas beira a irresponsabilidade ignorar alguns sinais preocupantes, como o avanço dos cortes fora do chamado Arco do Desmatamento -sudeste do Pará, norte de Mato Grosso e Rondônia.

A RECESSÃO ESTÁ NO FIM, MAS A FORÇA DA RECUPERAÇÃO É INCERTA
EDITORIAL
VALOR ECONÔMICO
6/8/2009

Há sinais cada vez mais evidentes de que a fase mais aguda da recessão mundial já passou. Uma bateria de dados mostrando melhoria nas atividades econômicas nos Estados Unidos, União Europeia, Reino Unido, China e Japão deixou claro que o ponto de inflexão já foi atingido em vários países e está próximo em outros. Nada garante, porém, que a recuperação será rápida e que reviravoltas para pior deixem de ocorrer.
Os indícios claros de recuperação são resultado, em grande parte, dos megapacotes de assistência financeira e de subsídios lançados pelos governos dos países desenvolvidos, que chegam a astronômicos US$ 12 trilhões. Um de seus efeitos manifestos foi sustentar o sistema financeiro, nele injetando uma montanha de dinheiro. Em consequência, não só os bancos voltaram a prover crédito à economia como passaram a exibir lucros, depois de trimestres de perdas desastrosas, em grande parte graças à vantagem de contar com aval oficial para obter recursos baratos. Pacotes de auxílio direto à economia estão também fazendo parte do serviço esperado. Os programas de sustentação da venda de carros, com incentivos monetários para troca de veículos usados por novos, deram uma injeção de ânimo nas montadoras americanas e francesas. Quando as bolsas subiram na segunda-feira e bateram recordes no ano, bancos e montadoras, os setores mais castigados pela crise, puxaram as cotações.
De maneira geral, estima-se que os EUA voltarão a crescer no terceiro trimestre. O índice dos gerentes de compras (ISM) subiu fortemente em julho e, aos 48,94 pontos, encontra-se na fronteira de indicar expansão. Na China, o mesmo índice está em alta há cinco meses, enquanto que no Reino Unido ele é o maior desde março de 2008. Na zona do euro, ele mostra a primeira reativação de encomendas em um ano. As bolsas de valores já voltaram, na maior parte, à pontuação de antes da quebra do Lehman Brothers, no início de setembro. As expectativas são mais otimistas e o cenário de catástrofe iminente foi riscado do mapa.
A comedida euforia não é suficiente para esconder as fraquezas e fragilidades da recuperação. Ela está sendo sustentada pelo gasto público de forma mais patente, por exemplo, nos EUA. A renda pessoal em junho caiu 1,3%, na mesma proporção em que havia subido em maio, graças ao estímulo fiscal que colocou mais dólares nas mãos do consumidor. A renda real disponível levou um tombo maior, de 1,8%, enquanto que a renda de salários no mês encontrava-se 5% abaixo da de um ano atrás. Os gastos reais de consumo declinaram 0,1%. E, dois dias depois da euforia nas bolsas, o índice que mede a saúde do setor de serviços mostrou queda de 43,4 para 41,5. Os serviços, bem mais que a indústria, definem o destino dos empregos e do ritmo da economia americana, e continuam fraquejando.
Boa parte da batalha da recuperação na maior economia do mundo dependerá da reação do consumo e parece claro que ele demorará para se reerguer. Até mesmo a incipiente reação de segmentos do mercado imobiliário foi insuflada por um aumento dos gastos públicos. No geral, eles avançaram 10,9% no segundo trimestre e contribuíram com 2 a 3 pontos do PIB americano, que encolheu 1% no período.
Há também dúvidas sobre a sustentabilidade da expansão no verdadeiro polo dinâmico da economia global, a China. Ela reagiu bem ao pacote de quase US$ 600 bilhões destinado principalmente a investimentos de infraestrutura, mas não atacou o problema do baixo consumo chinês. Por outro lado, aparecem indícios de que a China recompôs seus estoques de commodities, de soja a minério de ferro e metais, e que seu enorme poder de puxar o consumo global pode arrefecer daqui para a frente. Além disso, o setor financeiro global ainda acumula montanhas de títulos imprestáveis em suas carteiras, com perdas possíveis de US$ 600 bilhões até o fim de 2010.
A queima de estoques nas economias desenvolvidas abriu o caminho para uma retomada da produção industrial. Ela, entretanto, não deve ser vigorosa, porque o consumo nos EUA caiu e pode não reagir. Por esse e outros motivos, não saiu do cenário a ingrata possibilidade de nova retração mais à frente nos países desenvolvidos.

O DESAFIO DA SEGURANÇA PÚBLICA
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
6/8/2009

A principal manchete do gazetaonline de ontem dizia que a "ocupação da PM em bairro de conflito armado pode ser permanente". A insegurança da sociedade chegou a esse ponto. A presença ostensiva da força policial se faz necessária diuturnamente, em todos os locais, em função da violência, que vai assumindo dimensões ilimitadas.

É óbvio que a atuação da Polícia Militar, como também a da Polícia Civil, não tem pretensão de extinguir por completo a prática de delitos. Essa fórmula não foi inventada em nenhuma parte do mundo. Os objetivos policiais são a prevenção e a repressão da violência - tarefas extremamente complexas.

A intenção da PM é fincar presença permanente em todos os morros da Capital, obedecendo a plano estratégico de policiamento. Com certeza, essa intenção é aprovada pelos cidadãos de bem que moram ou transitam nessas comunidades. Minimamente, a presença policial é fator de inibição ao ímpeto criminoso.

Atualmente, a Polícia Militar ocupa sete bairros na Região Metropolitana da Grande Vitória: Morro do Jaburu e da Ilha da Conceição (a partir de ontem), Feu Rosa, Vila Nova de Colares e Novo Horizonte, na Serra; e Castelo Branco e Nova Rosa da Penha, em Cariacica. São áreas de forte incidência delituosa, e, nessa condição, precisam de atenção específica. A verdade, porém, é que a violência se espalhou por todos os lugares, no Espírito Santo e nos demais Estados.

Os cidadãos de bem gostariam de ver policiamento ostensivo 24 horas por dia, em todos os logradouros citatinos. É lógico que a unipresença policial faz parte de um imaginário utópico. E não garantiria a extinção do crime. A insegurança não está só nas ruas. Invade lares, causando tragédia. Há poucos dias, foi noticiada a execução de um adolescente de 17 anos, dentro do seu próprio quarto de dormir, invadido por traficantes. Eles cobravam uma dívida de R$ 5 mil, e se recusaram a negociar o pagamento com o pai da vítima. O terror atingiu requintes extremos de crueldade. E avança sem limites.

No Espírito Santo, quase duas mil pessoas morrem assassinadas a cada ano, e essa estatística, infelizmente, não para de crescer. A polícia estima que cerca de 70% dos homicídios guardam ligação com o tráfico de drogas. É uma prática de combate difícil, mas indispensável.

Aliás, o tráfico de alucinógenos é um problema de dimensão internacional. O secretário de Estado de Segurança, Rodney Miranda, defende a tese de que os países que mais produzem cocaína - como Bolívia, Peru e Venezuela -, deveriam ser alvo de forte cobrança, por parte de todas as nações, para que cumpram metas rigorosas de repressão. É uma visão pragmática, que de há muito deveria estar em vigor, mas depende de vontade política e hábil ação diplomática.

Balanço apresentado a jornalistas pelo secretário Rodney Miranda aponta a contratação de mais 1,7 mil PMs, além da abertura de dois concursos na Polícia Civil, nos últimos sete anos. A partir de 2003, os investimentos estaduais em segurança pública saltaram de R$ 47 milhões para R$ 396 milhões em 2009. No entanto, a demanda de policiamento tem crescimento constante, e rápido.

O mesmo pode se dizer em relação ao sistema prisional. No Espírito Santo, são efetuadas cerca de 100 prisões de segunda a quinta-feira, sem contar as ocorrências de fim de semana. Não há cadeia que chegue, e a polícia não pode deixar de prender.

Enfim, a garantia da segurança pública requer esforços incessantes. Certamente, quanto mais afinadas forem as relações entre a sociedade e a polícia, melhores serão os resultados.

EPIDEMIA DE MOROSIDADE
EDITORIAL
ESTADO DE MINAS
6/8/2009

Ministério da Saúde errou ao retardar a liberação de tratamento da gripe A

É preocupante a diferença entre a velocidade de disseminação do vírus H1N1, da gripe A (ou suína), em território brasileiro e a rapidez das respostas que as autoridades do país são capazes de dar. Depois de uma longa e equivocada resistência, o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, decidiu oficializar, ontem, a liberação para que os médicos receitem o medicamento eficaz no tratamento da nova gripe. Os comprimidos do fosfato de oseltamivir – nome genérico do antigripal comercializado sob a marca Tamiflu – já poderiam estar sendo usados há meses pelos brasileiros infectados, o que teria evitado a quantidade de mortes, que já passam de 100 e ameaçam pôr o Brasil entre os menos capazes de controlar a nova gripe e seus efeitos letais.

Desde o início, quando a doença surgiu, há seis meses, na América do Norte, sabia-se que o tratamento com Tamiflu era recomendado, se aplicado no máximo 48 horas depois de o doente ter sido infectado. Essa exiguidade do tempo entre o surgimento dos sintomas e o início do tratamento, além do elevado número de casos registrados em poucos meses no México e nos Estados Unidos, já deveria ter funcionado como um alerta ao Ministério da Saúde. A preparação para enfrentar a epidemia teria de ser rápida e sem a parcimônia de quem ainda acha que o Brasil goza de especial proteção dos deuses e estaria sujeito a não mais do que marolinhas. O primeiro erro, inspirado por essa visão cor- de-rosa de nossa imunidade aos males do mundo, foi ter concentrado em apenas três centros de pesquisa – Adolfo Lutz (SP), Famanguinhos (RJ) e Evandro Chagas (PA) – a licença para fazer os exames de comprovação da gripe. Com isso, não se conseguia o diagnóstico com menos de um semana, o que anulava a possibilidade de tratamento com o Tamiflu, transformando os exames em nada mais do que laudos de causa mortis.

Foi preciso que o número de contaminados no país chegasse perto dos 600 para que o Ministério da Saúde autorizasse o exame por outros laboratórios. Mas as consequências mais graves dessa espécie de doença burocrática e de excesso injustificado de controle foram o impedimento dos médicos de receitar o tratamento e o represamento do medicamento em poucos centros controlados pelo governo. Segundo o próprio ministério, os fabricantes foram obrigados a dar prioridade à entrega a esses centros, o que eliminou os estoques do remédio no mercado. O ministro argumenta com a necessidade de impedir a banalização do único recurso no tratamento da nova gripe, o que poderia provocar, segundo ele, a mutação do vírus e a possível anulação da eficácia do remédio. Mas nem isso justifica a demora em liberar os médicos para decidir em cada caso e ministrar o tratamento em tempo hábil. A exigência da receita, com seu recolhimento pela farmácia, funciona como razoável impedimento à automedicação e à banalização. E, a essa altura, feitas as contas, não há dúvida de que, se a nova gripe tem tratamento, o pior dos males não será banalizar o medicamento e, sim, as mortes que ele pode evitar.

SÓ TRABALHO TIRA O SENADO DA CRISE
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
6/8/2009

Não será com boca suja que se lavará a imundície que emporcalha o Senado Federal. Enquanto a Casa corre atrás do próprio rabo, a crise interna se perpetua, a análise e votação de projetos essenciais ao país são empurradas para o infinito e o abismo entre a instituição e os eleitores se aprofunda. Urge, em primeiro lugar, separar o joio do trigo e buscar entendimento suprapartidário rumo a ampla e profunda reforma administrativa capaz de prevenir os erros do passado e recolocar de volta aos trilhos a moralidade e o decoro parlamentar. Em suma, restabelecer, com a devida urgência, as condições necessárias para o bom funcionamento da Câmara Alta.

Ao mesmo tempo em que se cumpre essa etapa, cabe definir a pauta de deliberações a ser tocada de imediato, com força para resgatar a credibilidade perdida. Por pelo menos duas razões, é imperioso dar prioridade à reforma eleitoral. A primeira: as novas regras apenas valerão em 2010 se estiverem aprovadas e sancionadas pelo presidente da República até outubro, com a antecedência de um ano prevista pela Constituição. A segunda: o debate será revelador do grau de coragem dos senadores para cortar a própria carne, se livrar dos vícios do corporativismo, do apadrinhamento, do nepotismo — enfim, passar a limpo a própria história.

Essa reforma somente será válida se contribuir para a melhor qualificação da classe política, assegurar que os futuros parlamentares estejam à altura do novo padrão que se pretende para o Congresso. Um Legislativo moderno, transparente, confiável não combina com as mudanças eleitorais projetadas pela Câmara. Há que rejeitar os fichas sujas, os senadores sem voto, os financiamentos de campanha nebulosos, e garantir o uso democrático dos meios de comunicação pelos candidatos, incluindo a internet. Revisto, o projeto aprovado pelos deputados carecerá de tempo para voltar à análise da Casa, o que aumenta a urgência da ação do Senado.

Mas as crises — seja a do travamento da pauta pelas medidas provisórias, seja a do mensalão, seja a atual (dos atos secretos e outras práticas indecorosas) — têm desviado o foco de inúmeras questões vitais para o país. Nem o abalo das finanças mundiais provocado pelo mercado imobiliário norte-americano tirou o Congresso da inércia. O parlamento brasileiro ficou devendo contribuição substancial, como as reformas tributária, da previdência, da modernização do mercado de trabalho. Tem falhado também na fiscalização e controle dos gastos do Executivo, em desembalada progressão.

Entre outras urgências a resolver, está a questão do pré-sal. Mais: pronto para ser votado, projeto que aperfeiçoa (de modo a evitar fraudes) a Lei de Licitações não anda. A fila, ao contrário, cresce. A paralisação do Congresso atrasa o país. A imagem de um Legislativo fraco, constrangido, habituado a práticas condenáveis, compromete a democracia. O debate não pode se limitar à decisão de manter ou afastar da Presidência o senador José Sarney (PMDB-AP). É preciso dar fim aos desmandos, restabelecer a moralidade administrativa e recuperar de imediato a atividade legislativa.

RETOMADA AMERICANA
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
6/8/2009

Estatísticas econômicas devem ser usadas com cautela, pois uma conclusão pode revelar-se errada quando examinada com detalhes. Duas boas informações a respeito da economia americana serviram para comentários otimistas sobre a recuperação dos Estados Unidos, depois do inferno astral que marcou o pico da crise financeira a partir de julho do ano passado. A primeira informação vem do desempenho positivo das bolsas de valores, cuja elevação das cotações das ações deixou a impressão de que os investidores já apostam no crescimento do Produto Interno Bruto. A segunda informação vem da safra de balanços das empresas cotadas em bolsa, com a constatação de que muitas delas tiveram lucros bem melhores do que a onda pessimista indicava.
O mais importante dos indicadores de bom estado da economia é o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). É nesse ponto que a correlação entre aquelas boas notícias e a recuperação da produção parece não estar correta. Há nove anos, o PIB dos Estados Unidos respondia por mais de 33% de todo produto mundial. Atual¬¬mente, esse porcentual não passa dos 24%, revelando que houve transferência de parcelas do produto mundial dos países desenvolvidos para os países não desenvolvidos. Assim, nesta primeira década do terceiro milênio, a produção americana cresceu menos do que a produção mundial e os percentuais de aumento do PIB dos Estados Unidos são calculados sobre uma base proporcional menor. Além disso, a queda do PIB nos dois últimos trimestres do ano passado, que jogou a produção daquele país em patamar bastante baixo, poderá fazer qualquer recuperação parecer percentualmente expressiva.
As informações sobre o crescimento do PIB americano no segundo trimestre de 2009 não estão concluídas e o que se tem, até o momento, é apenas uma estimativa. Muitos acreditam que o fundo do poço já passou e uma recuperação está em andamento. Mas, apenas as informações sobre os balanços das empresas e o desempenho das bolsas de valores, ainda que sejam positivas, não autorizam a afirmar que o PIB americano retomou uma fase altista. Dados recentes revelam que os consumidores estão mudando seu comportamento, reduzindo as compras médias por habitante, o que dificulta a recuperação. Portanto, qualquer conclusão é precipitada.
Um ponto importante para prever o futuro é a preocupação de muitos especialistas com as consequências da montanha de dinheiro jogada no sistema para fazer frente à crise do sistema financeiro. Existe receio de que o excesso de liquidez pode forçar os índices de inflação para cima e, se isso ocorrer, a recuperação americana iniciada em 2009 poderá ser abortada por uma recessão mais à frente. O sistema econômico é um mosaico de difícil manejo e toda crise deixa sequelas, cujo custo é sempre sentido mais tarde. O déficit público dos EUA deste ano, que deve passar de 10%, é um dos fundamentos macroeconômicos mais frágeis, uma sequela que causa preocupação.
Apesar dos problemas, a capacidade de recuperação da economia americana sempre foi muito grande, e é possível que o país consiga sair rápido da crise. Porém sairá mais fraco em termos de hegemonia e influência sobre a economia mundial. Mesmo assim, o que ocorre nos Estados Unidos é importante para os demais países, pois o mercado interno americano é muito grande e afeta diretamente o desempenho da economia interna de cada nação, incluindo o Brasil.

O VALOR DAS METAS
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
6/8/2009

O balanço do desempenho do Paraná em relação às Metas do Milênio indicam que o estado logrou sucesso em diversos objetivos traçados pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 2000, para a melhoria dos indicadores sociais. O desempenho foi notável em ações de combate à fome e de saneamento, com o aumento da população com acesso à agua potável – resultado alcançado, em grande parte, graças à parceria entre a administração pública, empresas e órgãos do terceiro setor reunidos no grupo “Nós Podemos Paraná”. Os maiores desafios paranaenses, segundo o balanço publicado ontem pela Gazeta do Povo, são reduzir a mortalidade materna, combater a evasão escolar e garantir a sustentabilidade ambiental. Há tempo para avançar também nessas áreas, uma vez que o prazo fixado pela ONU para que se alcance os objetivos é 2015. Feito o balanço, cabem algumas perguntas: como estaria o desempenho do estado nessa áreas se não houvesse a identificação das carências nem a consequente fixação de metas para reduzi-las? Como o Paraná teria se saído se não tivesse contado com uma ação conjunta? As repostas podem ser resumidas em duas importantes lições. Primeira: a parceria entre agentes públicos e privados é fundamental para combater mazelas sociais. Segunda: identificar problemas e traçar metas para resolvê-los é o caminho mais direto para o desenvolvimento.

O ESTADO ABALADO
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
6/8/2009

O Rio Grande nunca passou por um constrangimento desta dimensão. Ao protocolar na 3ª Vara da Justiça Federal de Santa Maria uma ação civil de improbidade administrativa contra a governadora Yeda Crusius e outras oito pessoas com função pública no Estado, a força-tarefa do Ministério Público Federal transformou em denúncia formal as suspeitas que há vários meses recaíam sobre o governo gaúcho. Agora não se trata mais de acusações sem provas, como vinham fazendo integrantes da oposição. No inquérito de mais de mil páginas encaminhado pelo MPF à juíza Simone Barbisan Fortes, estão catalogados documentos e gravações referentes a escutas telefônicas feitas durante as operações Rodin e Solidária, que apuraram irregularidades no Detran e na distribuição de merenda escolar a municípios do Estado. Diante dessas evidências, que infelizmente não foram detalhadas ao conhecimento da opinião pública, os procuradores federais solicitaram liminarmente à juíza que seja levantado o sigilo das ligações que interessam ao processo, pediram também a indisponibilidade dos bens dos réus e o afastamento temporário dos agentes públicos referidos na ação, inclusive da governadora.

Trata-se, portanto, de uma gravíssima e angustiante situação. De um lado, estão governantes e políticos acuados por uma denúncia formal que os incapacita para o exercício normal de suas funções públicas. De outro, estão os cidadãos sentindo-se traídos na confiança que depositaram em seus representantes, sem saber exatamente as irregularidades pelas quais estão sendo denunciados. O mínimo que se espera dos acusados diante da ação proposta ontem é que venham a público pedir a abertura do sigilo das provas e que deem explicações convincentes sobre suas participações nos episódios. Não se compreende, por exemplo, que diante de um fato desta natureza a governadora fique em silêncio, deixando a resposta do governo a cargo de porta-vozes.

Ainda que todos os acusados tenham direito à presunção de inocência e a amplo direito de defesa, já não se pode mais atribuir as denúncias contra eles a articulações movidas por interesses políticos. O Ministério Público Federal, com a legitimidade e a independência que a Constituição lhe assegura, depois de examinar as provas, concluiu pela ação de improbidade administrativa que pede a perda dos bens adquiridos indevidamente pelos denunciados, o ressarcimento da lesão ao patrimônio público, a perda dos cargos, a suspensão de seus direitos políticos e ainda uma multa civil. Ao limitar a natureza da ação à área cível, os procuradores evitam estrategicamente que algum dos acusados se refugie no instituto do foro privilegiado, o que deve transmitir maior transparência para o processo.

É saudável que seja assim, pois o Rio Grande tem pressa de resolver este imbróglio que dificulta a governabilidade e emperra a administração. Neste sentido, é desejável também que o Judiciário, em todas as instâncias requeridas, aprecie a ação com o máximo de celeridade, para evitar que o Estado fique purgando esta ferida pelo restante dos mandatos dos acusados investidos de cargos públicos. Além da governadora, a demanda atinge diretamente quatro ex-presidentes da Assembleia Legislativa – o deputado federal José Otávio Germano, os deputados estaduais Luiz Fernando Záchia e Frederico Antunes, e o presidente do Tribunal de Contas do Estado, João Luiz Vargas. Também estão citados o vice-presidente do Banrisul Rubens Bordini, o ex-secretário Delson Martini, o ex-marido da governadora, Carlos Crusius, e a assessora especial Walna Vilarins Meneses.

O que se espera desses agentes públicos é que exijam acesso ao inquérito para que a população também possa saber quais são as acusações e quais são os seus argumentos de defesa. Só a transparência total poderá atenuar o choque pelo qual passa o Estado neste momento, ao constatar um provável envolvimento direto de governantes e representantes políticos em esquemas delituosos que envergonham a história do Estado. O Rio Grande precisa da verdade. Agora com muito mais urgência do que antes.

VANDALISMO CONTRA A POESIA
EDITORIAL
JORNAL DO COMMERCIO (PE)
6/8/2009

Para melhorar o visual do Centro do Recife, submetido a amplamente generalizada degradação, além de outras providências, foram colocadas estátuas dos nossos poetas em diversos pontos. O encontro da população com seus poetas ameniza um pouco a aridez de tantas agressões a monumentos, edifícios e ao meio ambiente. Acontece que grande parte da população do Grande Recife se origina em migrantes que, arrancados por circunstâncias adversas à cultura da sua terra, não assimilaram uma nova cultura ao serem transplantados para a capital do Estado. Esse desenraizamento sem a criação de novas raízes é responsável, aliado ao descuido com o social, com educação, por grande parte dessas agressões à cidade e a seu meio ambiente, como lixo jogado na rua, no rio, em canais e até no mar, pichações, vandalismo em geral contra uma metrópole que não é enxergada como sua por aqueles migrantes e descendentes.
As estátuas dos poetas, alvo fácil e à mão, não poderiam escapar a essa fatalidade, ou melhor, conjuntura, pois miséria não é fatalidade, é algo produzido pelo próprio homem. O fato é que Manuel Bandeira, João Cabral, Capiba, Mauro Mota, Carlos Pena, Antônio Maria, Chico Science, Ascenço Ferreira, Joaquim Cardozo, Solano Trindade, Luiz Gonzaga e Clarice Lispector (imigrante russa que foi adolescente no Recife) estão sendo agredidos post mortem em ruas e praças da cidade. Joaquim Cardozo, o grande poeta que também era engenheiro e trabalhou com Oscar Niemeyer na construção de Brasília, fazendo os cálculos dos seus arrojados projetos, já perdeu o nariz em plena Ponte Maurício de Nassau, que integra o Circuito dos Poetas. Antônio Maria foi pintado com tinta vermelha (será que para castigá-lo por ter convivido com "subversivos" na boemia carioca?).
Apenas quatro das estátuas, obras do escultor Demétrio Albuquerque, ainda estão intactas. As placas que identificam as esculturas e trazem um pouco da vida e obra dos homenageados também já não cumprem sua função, pois não se consegue ler nada. Seria preciso fazer a manutenção das obras e melhorar muito a segurança no Centro, para não espantar interessados em conhecer o Circuito dos Poetas, principalmente à noite. Com a instalação de 50 câmeras de vigilância, pela Secretaria de Defesa Social, a situação por ali melhorou um pouco. Falta melhor iluminação e fiscalização constante.
Reportagem do Jornal do Commercio alertou a PCR para o problema das agressões às estátuas do Circuito dos Poetas. E na semana passada uma equipe da Emlurb começou trabalhos de reparação dos danos. De acordo com o diretor de Manutenção da empresa pública, Fernando Melo, são feitas entre 10 e 15 restaurações por mês nas 150 estátuas que há no Recife, mas elas sempre voltam a sofrer depredações. Trata-se de uma questão de educação, de cidadania. E não são apenas aqueles desenraizados de que falamos acima que precisam se educar e ingressar na larga alameda da cidadania. Entre os agressores das estátuas dos poetas há de tudo, de prostitutas da Praça da Independência a boêmios em fim de farra. Nem todos são de baixa renda, sem noções de civilidade.
Cidadania, é o de que precisamos. Apesar da situação adversa por que está passando a Europa, devido à megacrise mundial, não se tem notícia de vândalos atacando o Arco do Triunfo, em Paris, a Colunata de Bernini, na Praça de São Pedro de Roma, a estátua de Lord Nelson, na Trafalgar Square de Londres. Numa cidade cheia de problemas acumulados em décadas, como o Recife, certamente precisamos de empregos, oportunidades. Mas não basta. A pessoa pode obter um emprego, até um bom lugar, ascender econômica e socialmente, se não tiver recebido educação em casa e na escola, vai aproveitar o dinheiro que sobra para pedir matrícula no circuito da bagunça, do desrespeito a todos (inclusive a si mesmo), e sair por aí bebendo exageradamente, consumindo drogas proibidas, atropelando pedestres, depredando bens públicos e privados. Na educação das novas gerações, crianças, adolescentes, reside a esperança de que uma situação tão desumana e lamentável venha a mudar no futuro. Nem por isso podemos descuidar do presente.

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