EdITORIAIS 30/08/2009
30/8/2009 - EDITORIAL
EDITORIAL
O GLOBO
30/8/2009
Qualquer que seja a proposta que o governo deverá anunciar amanhã para a exploração da chamada cada de pré-sal, em uma celebração para a qual foram convidadas cerca de três mil pessoas — em grande número não relacionadas com a atividade do petróleo — significará um retrocesso. Face à expectativa da existência de enormes reservatórios (confirmados inicialmente em alguns blocos da Bacia de Santos, licitados pelas regras ainda em vigor) de óleo e gás no pré-sal, o governo simplesmente resolveu abandonar a experiência acumulada desde a abertura do mercado brasileiro no setor e deve partir para uma aventura.
O modelo de concessão, posto em prática a partir de 1997, mostrouse eficaz em todos os sentidos — tanto que, sob ele, foram encontradas estas reservas. A Petrobras deixou de ser uma estatal cheia de amarras e condicionada ao monopólio, e se transformou em uma companhia apta para concorrer em qualquer parte do mundo, multiplicando sua capacidade de investimento por meio de diversas parcerias.
Outras empresas de petróleo vieram para o Brasil, trazendo contribuições importantes para a indústria.
Surgiram também companhias nacionais, de pequeno, médio e grande portes, com grande probabilidade de êxito.
A formação de especialistas e a pesquisa, antes circunscrita à Petrobras, por causa do antigo monopólio, espraiou-se por universidades do país inteiro. A atividade da indústria do petróleo tem reforçado diretamente economias até mesmo de estados não produtores.
E os cofres da União efetivamente arrecadam somas consideráveis de recursos, provenientes de diferentes impostos, royalties e participações especiais. Eles recebem 50% dos royalties.
A título de melhor distribuir as riquezas que poderão ser geradas na exploração do pré-sal, o governo pretende adotar um novo modelo, o de partilha, extremamente controverso por ser o mais usual em países com regimes autoritários e que apresentam elevados índices de corrupção. É um modelo centralizador e estatizante. Portanto, um retrocesso em relação ao que está em vigor.
O potencial econômico do présal é de fato muito alto, e justificaria a aplicação de regras específicas para sua exploração.
No entanto, os marcos regulatórios atuais são suficientemente flexíveis e capazes de levar o governo a atingir os objetivos supostamente pretendidos. A parte que já leva a União lhe permite exercitar o distributivismo com outros estados e municípios, sem atropelar a legislação e punir outras unidades da Federação, como o Rio de Janeiro, que recebem royalties e participações especiais, alvo da ganância tributária do Planalto.
Há um temor, que vai se tornando cada vez mais verdadeiro pela maneira que o governo tem conduzido toda esta questão, de as autoridades estarem usando o pré-sal apenas como pretexto para retornar ao velho e retrógrado monopólio, induzidas pela ideologia estatizante que reina em Brasília. É um saudosismo sem fundamento, que até já conseguiu interromper o transcurso de novas concessões nos blocos fora do pré-sal.
Amanhã não haverá o que se comemorar.
A razão da mudança no modelo do petróleo é ideológica
BRASIL, FONTE DE DÓLARES
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
30/8/2009
A Argentina precisa de dólares, enquanto procura reconquistar o acesso ao mercado financeiro internacional, e o Brasil pode ser parte da solução. Por isso, o governo brasileiro deve entrar com dólares, não com reais, no acordo de swap, isto é, de troca de moedas, anunciado no dia 19 pelo ministro da Economia da Argentina, Amado Boudou, e pelo ministro da Fazenda do Brasil, Guido Mantega. Formalmente, as autoridades brasileiras assumiram o compromisso de pôr à disposição do governo argentino R$ 3,5 bilhões, em troca de 7 bilhões de pesos. Esse acordo, segundo Mantega, seria um passo para fortalecer o comércio entre os dois países. Entendimento semelhante, acrescentou o ministro, foi estabelecido entre os bancos centrais do Brasil e dos Estados Unidos, o Federal Reserve. O acerto envolveu recursos de US$ 30 bilhões do lado americano e montante equivalente em reais do lado brasileiro.
Mas o acerto entre Mantega e Boudou é um tanto diferente e envolve, para o lado brasileiro, um compromisso especial. Para cumprir o prometido, a autoridade brasileira terá de comprar os dólares para entregá-los ao governo argentino. A operação, se for concretizada, servirá não para ampliar o comércio bilateral, mas para reforçar as reservas internacionais do país vizinho. Exportadores e importadores dos dois países não precisariam de mais essa iniciativa para negociar com as moedas nacionais. Já dispunham de autorização para isso e até agora, de fato, poucos recorreram a essa forma de pagamento. De um e de outro lado, a maior procura é por dólares, porque o intercâmbio bilateral, embora importante, é apenas parte da atividade dos empresários.
Na prática, a operação de swap foi concebida como um empréstimo. O governo brasileiro chegou a mencionar a hipótese de acordos semelhantes com os demais países do Mercosul e com a Bolívia, também com a justificativa de facilitar o comércio. Deve ter sido retórica de ocasião, porque a troca de moedas com a Argentina envolve pesos e dólares, e não reais, e sua finalidade não é comercial.
Do ponto de vista argentino, o benefício de uma operação desse tipo é claro. Desde o calote na dívida externa, há quase oito anos, o mercado financeiro internacional praticamente se fechou para o Estado argentino. Houve uma negociação parcial com os credores privados e milhares de investidores ficaram fora de qualquer acordo. Além disso, o país ficou em situação muito difícil perante os governos credores (o Clube de Paris) e marginalizado no FMI e no Banco Mundial.
O governo argentino agora procura percorrer o caminho de volta, fazendo o possível para não renegar todas as bravatas dos últimos anos. Na sexta-feira, o Ministério da Economia iniciou a troca de títulos até agora corrigidos com base na inflação medida pelo instituto oficial de estatísticas. O vencimento da maior parte desses papéis deve ocorrer em 2010 e 2011. A ideia é trocá-los por bônus de prazo mais longo. Mas a operação envolve um detalhe politicamente muito importante: será adotada uma nova forma de atualização e os índices do Indec, sem a mínima credibilidade, serão postos de lado.
Amado Boudou tem agido, até agora, como se a sua missão fosse muito mais ambiciosa do que simplesmente continuar a administração fiscal dos últimos anos. Entre seus objetivos se inclui a normalização de relações com o FMI. Ele conversou nos últimos dias com o diretor do Fundo para o Hemisfério Ocidental, o chileno Nicolás Eyzaguirre, e o encontro parece ter sido promissor. Novo contato deverá ocorrer em setembro, na próxima reunião de ministros do Grupo dos 20.
Com o peculiar acordo de swap, o Brasil deve reforçar a segurança financeira argentina enquanto as autoridades de Buenos Aires tentam o retorno ao mercado e a normalização de relações com o FMI. Neste momento, é especialmente importante para o governo argentino afirmar sua capacidade de pagar os débitos em 2010. Toda ajuda é importante e a presidente Cristina Kirchner já não tem a segurança dos petrodólares venezuelanos. O presidente Lula assume o papel desempenhado até recentemente pelo companheiro Hugo Chávez. E o faz sem expectativa de obter, em troca, sequer uma redução do protecionismo comercial argentino. Da perspectiva de Buenos Aires, a indústria brasileira merece tanta consideração quanto a chinesa. Mercosul é para isso.
AS FUNDAÇÕES UNIVERSITÁRIAS
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
30/8/2009
O grande problema de certas tentativas de moralização da administração pública que se fazem no País é a aplicação generalizada de remédios heroicos que, muitas vezes, matam o doente em vez de curá-lo da doença. Exemplo disso é o que está se passando com as fundações universitárias. Professores e cientistas estão muito preocupados - e com razão - com medida do Tribunal de Contas da União (TCU) que impede o repasse de verbas para financiamento de pesquisas para fundações de apoio a universidades federais. A determinação consta de acórdão, cuja aplicação foi adiada para março do ano que vem.
A origem dessa medida foi o abuso escandaloso, no ano passado, na utilização de verbas públicas, destinadas à pesquisa científica, para a reforma e a decoração milionária do apartamento do então reitor da Universidade de Brasília (UnB), Timothy Mulholand - "o reitor do saca-rolha", como ficou conhecido por ter comprado para sua residência um saca-rolha de quase R$ 1 mil, afora latas de lixo de valor equivalente. Com isso o perdulário reitor desmoralizou a fundação de apoio à UnB, o que levou o TCU a auditar mais de 400 contratos de 14 instituições de ensino superior federais, nelas encontrando irregularidades. O órgão de fiscalização decidiu, então, que as universidades deveriam receber as verbas diretamente, no lugar das fundações - pois estas, por terem regime jurídico privado, não se obrigam a seguir a lei das licitações. O problema é que as universidades não têm estrutura para administrar tais recursos e a submissão dos financiamentos à burocracia funcional das instituições de ensino inviabilizaria a pesquisa de ponta que é feita nas fundações.
Aproximando-se o prazo em que a medida restritiva entrará em vigor, reitores e dirigentes de fundações universitárias pressionam para impedir que aquelas receitas para pesquisas sigam ínvios caminhos e acabem por desaparecer. Se não conseguirem, dizem eles, os principais projetos científicos do País podem ser paralisados. "Se até março não houver uma saída, eu proponho fechar as portas. Parar tudo", disse Luiz Pinguelli Rosa, diretor do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe) da UFRJ. O instituto é o gestor de verbas para a pesquisa provenientes de convênios com empresas, como a Petrobrás, além dos celebrados com instituições de fomento.
Está prevista para outubro, em Juiz de Fora (MG), uma reunião do Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior (Confies), tendo em vista a formulação de uma proposta para regular a matéria. "Sem as fundações não é possível hoje desenvolver a ciência e a tecnologia que o País precisa", afirma o presidente do Confies, Paulo Bracarense Costa. "Se há desvios, devem ser corrigidos. Mas a falta de transparência é falaciosa. Os recursos passam pela universidade e são fiscalizados pelo TCU, Controladoria-Geral da União e conselho universitário, e a lei obriga que as fundações tenham auditoria externa", observa Bracarense Costa.
Efetivamente, o modelo das fundações acopladas às universidades, notadamente para o desenvolvimento de pesquisas científicas, de tecnologias e de serviços de atendimento de ponta, permite a superação dos crônicos entraves do serviço público. E um bom exemplo disso é a conexão da Fundação Zerbini com a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, na estruturação de uma instituição de referência, como o Instituto do Coração (Incor).
É claro que a fiscalização deve ser atuante e rigorosa - como, de resto, deve ocorrer com tudo o que diga respeito a emprego de verbas públicas. O que não tem sentido é um episódio de irresponsabilidade - como o patrocinado pelo "reitor do saca-rolha" e pelos funcionários que o encobriam - provocar uma radicalização como a determinada pelo TCU, capaz, se não for revertida, de prejudicar seriamente o andamento da pesquisa científica no País. No lugar de tirar das fundações universitárias a sua função de apoio à pesquisa, devem os órgãos de fiscalização controlar com rigor a utilização dos recursos gerados pelo esforço dos contribuintes.
CHANTAGEM EXPLÍCITA
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
30/8/2009
Certamente o presidente Lula julgava que todo o esforço despendido na "salvação" do presidente do Senado, José Sarney, haveria de produzir a maior tranquilidade no relacionamento com seu mais importante aliado da base de sustentação, o PMDB. Tendo forçado os três membros do PT no Conselho de Ética a contrariar a orientação do líder da bancada - Aloizio Mercadante, o protagonista da já famosa renúncia à renúncia irrevogável - e a rechaçar as 11 representações contra o presidente da Casa, Lula contava com o fortalecimento da aliança para as eleições presidenciais de 2010, e com o apoio firme das bancadas peemedebistas para a aprovação de projetos de interesse do governo.
O que o Planalto não esperava era que, em lugar de mostrar-se apascentado, o PMDB se tornasse muito mais voraz do que sempre foi e apelasse para a chantagem explícita como sempre faz: sem a liberação dos recursos orçamentários para as suas emendas parlamentares, a bancada da Câmara continuaria obstruindo a pauta de votações de interesse do governo. Argumentavam os deputados peemedebistas que a liberação das emendas seria uma forma de compensação pela perda de repasses de recursos federais aos municípios. Mas se o governo federal reduziu tais repasses é porque também sofreu uma significativa perda de arrecadação - de cerca de R$ 85 bilhões, este ano, em relação ao estimado no Orçamento. É claro que isso é resultado da crise econômica que não poupou nenhuma entidade da Federação - nem União, nem Estados, nem municípios - da quebra de receitas. E a única forma de "compensar" a redução das transferências obrigatórias é a austeridade fiscal - o tradicional corte orçamentário. Mas essa receita ninguém quer usar em período eleitoral.
Nem é preciso dizer - por óbvio - que a grande preocupação dos parlamentares federais é a de atender os municípios de suas bases eleitorais às vésperas de um ano eleitoral. No Orçamento há cerca de R$ 6 bilhões referentes a emendas parlamentares, dos quais apenas R$ 1,2 bilhão foi liberado. A forma que os peemedebistas encontraram para pressionar o governo a liberar suas emendas - nisso também influenciando outros partidos da base aliada, que têm o mesmo objetivo - foi a obstrução de matérias de interesse específico do governo, como são os casos do projeto de emenda constitucional (PEC) que recria a CPMF com o nome de Contribuição Social para a Saúde; da PEC que libera parte do dinheiro destinado à educação, que é retida pela Desvinculação de Receitas da União; da MP que libera créditos para a exportação e permite a participação da União em fundo garantidor de crédito; e do convênio pelo qual o Brasil aumenta a sua cota no FMI.
Normalmente, quem faz obstrução é a oposição. A situação, na palavra irônica do deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP), o que faz é "greve". Seja como for, os peemedebistas decidiram não permitir que o governo aprovasse novas leis de seu interesse. E o governo não encontrou meios de resolver o problema, senão ceder. Isso explica o tom conciliatório que o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, usou desde o início. Para ele, as reclamações dos parlamentares peemedebistas procedem: "Vamos trabalhar com o universo das emendas individuais, não temos condições de liberar as de bancada ou as de comissão." Certamente estas são as que mais interessam aos parlamentares em ano eleitoral. E o ministro disse mais: "Estamos conversando para ver se a gente define um cronograma de liberação, mas não posso deixar de registrar que temos uma mudança muito importante no quadro fiscal." Quanto a isso não há dúvida. Até agora o Ministério do Planejamento só conseguiu liberar R$ 1,2 bilhão em emendas individuais, contra R$ 3 bilhões liberados no mesmo período do ano passado. Mas estava claro que o governo faria das tripas coração para saciar o apetite do seu principal aliado eleitoral.
Bastaram duas horas de reunião com os líderes dos partidos aliados para que o ministro Paulo Bernardo se comprometesse a liberar quatro parcelas de R$ 1 bilhão cada uma, para as emendas. O ministro ainda tentou condicionar a liberação do dinheiro ao comportamento da receita, mas os deputados foram inflexíveis. O que mostra que o governo do PT é, cada vez mais, do PMDB.
A EVOLUÇÃO DO SETOR DE SERVIÇOS
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
30/8/2009
A Pesquisa Anual de Serviços, do IBGE, demora para ser divulgada, mas é um retrato confiável do emprego, do salário e da renda no setor que mais contribui para o PIB (65,8%). Na que saiu agora, de 2007, o IBGE se valeu de dados de 1 milhão de empresas, que empregavam 8,7 milhões de pessoas e obtiveram receita operacional de R$ 580,6 bilhões.
Nela, o IBGE comparou dados de 2003 com os de 2007, período em que a massa salarial paga pelas empresas pesquisadas evoluiu de R$ 61 bilhões para R$ 106,8 bilhões.
A participação da folha de salários no valor adicionado caiu de 51,8%, em 2003, para 47,4%, em 2007. É um indício de que mais recursos foram destinados para pagamento de tributos ou para aumentar os lucros das companhias.
O rendimento médio dos trabalhadores do setor declinou de 3,2 salários mínimos para 2,5 salários mínimos no período. Sabe-se que o salário mínimo foi corrigido bem acima da inflação, mas o salário real nos serviços cresceu apenas 6,3% entre 2003 e 2007, abaixo do PIB.
A pesquisa confirmou, indiretamente, o alto grau de concentração das atividades formais na Região Sudeste: superior a 2/3 do total do País.
A participação do pessoal ocupado no Sudeste passou de 59,1%, em 2003, para 60,9%, em 2007, seguindo-se o Sul, com porcentuais de 17% e 16,4%. A renda salarial, na região, participou com 66,4%, em 2003, e com 66,9%, em 2007, do total dos salários do setor. Somando Sudeste e Sul, a participação foi de 81,3%. É grande a concentração do emprego e da renda nos serviços. A participação pequena do Norte e do Nordeste confirma, indiretamente, o alto grau de informalidade nessas áreas.
Sugere, ainda, que programas assistencialistas, como o Bolsa-Família, pouco contribuem para a formalização.
Quando se somam salários, retiradas e outras remunerações, alguns setores apresentaram recuperação expressiva entre 2006 e 2007 - caso dos serviços financeiros de corretoras e distribuidoras de valores (+28,6%), atividades imobiliárias e aluguel de bens (+l8,6%), serviços de informação (+10,3%) e serviços prestados às famílias (+9,8%). Mas o que se verifica é que ganhos dessa magnitude ocorreram em segmentos isolados.
Nos subsetores que empregam muito, como o de limpeza (1,475 milhão de vagas), de transporte rodoviário (1,255 milhão) e de alimentação (1,204 milhão), os salários cresceram pouco. A crise econômica certamente agravou o quadro, o que só aparecerá nos dados de 2008.
CAPITAL PATROCINADO
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
30/8/2009
Na falta de alavancas para poupança privada, governo aumenta peso em grandes empresas de modo preocupante
ESTÁ PRESTES a surgir mais um gigante industrial patrocinado pelo governo, agora no setor petroquímico. A provável compra da Quattor pela Braskem, mediante o apoio da Petrobras, que detém participações acionárias em ambas as companhias, resultará em monopólio da produção de resinas no mercado doméstico.
Não se trata de relâmpago em céu azul. Nos últimos três anos, intensificou-se a formação de conglomerados, na maior parte das vezes por meio de operações que contaram com dinheiro ou aval do governo. Reconfiguram-se, desse modo, as regras do jogo, o poder econômico e o controle do capital em setores como alimentos, siderurgia, logística, energia, finanças e telefonia.
A atribulada abertura da economia brasileira nas últimas décadas, na direção de práticas consagradas de mercado, não prescindiu do apoio público. O BNDES e os fundos de pensão estatais participaram de praticamente todas as grandes privatizações da era FHC. Se o Estado deixou de dirigir as empresas, o que sem dúvida redundou em avanço, tornou-se uma espécie de "acionista de última instância" de grandes companhias.
Era de esperar, contudo, que esse fosse apenas um estágio no processo de afastamento paulatino do governo em relação à esfera das decisões empresariais. Mas o país, de lá para cá, não desenvolveu os meios para viabilizar tal emancipação.
O substrato que poderia ensejar o enraizamento do mercado de capitais -a multiplicação de fundos de pensão voltados à poupança de longo prazo- pouco evoluiu. Sugados por uma máquina voraz de gastar, e atraídos por juros fora do contexto internacional, os capitais disponíveis fluíram desproporcionalmente para financiar a dívida pública.
O circuito dos ganhos generosos com risco desprezível dos títulos governamentais também aprisionou e viciou o sistema bancário. Faz pouquíssimo tempo que os grandes bancos, públicos e privados, começaram a impulsionar seus empréstimos para o setor privado. Ainda assim, concentram as operações em modalidades de curto prazo, como o crédito ao consumo e ao giro das empresas.
Não foram superados obstáculos à alavancagem da poupança das famílias, como os juros tabelados da caderneta, os compulsórios bancários exagerados, a obrigação de destinar créditos para este ou aquele setor, a falta de estímulo à proliferação de fundos de pensão. O caixa das companhias, o volátil mercado externo -ao qual só um punhado delas tem acesso-, o BNDES, tradicionais fundos de pensão controlados pelo governo e a Petrobras permanecem as principais fontes de capital para grandes projetos e grandes fusões.
Não é sem mal-estar que se constata o novo ciclo de proliferação de capitais e créditos estatais em grandes empresas. Quando o poder econômico e o político se mesclam dessa maneira, o controle das decisões de Estado tende a distanciar-se dos cidadãos -e o sucesso nos negócios passa a medir-se menos pelo mérito de iniciativas empresariais e mais pelo grau de aproximação com os governantes.
PROPAGANDA PARA CRIANÇAS
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
30/8/2009
É UM bom sinal que 24 empresas do setor alimentício tenham decidido banir a propaganda voltada para crianças de até 12 anos em programas de TV com audiência formada majoritariamente por esse público. A restrição se estende a seções de jornais e revistas, sites e programação de rádio com características semelhantes.
A proposta reconhece que crianças, mais vulneráveis, devem ser protegidas de alguns tipos de publicidade. Pena que a elogiável decisão corra o risco de se revelar inócua, pois nenhuma atração da TV aberta ou dos canais por assinatura possui mais 30% de público dentro da referida faixa etária. Apenas a TV Cultura leva ao ar programas que se enquadram nos termos propostos, mas a própria emissora não aceita publicidade nesses casos.
É sintomático que a medida tenha sido anunciada no momento em que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária coloca em consulta pública uma série de normas para cercear a propaganda de alimentos dirigida as crianças.
O órgão quer proibir anúncios de itens com baixo valor nutricional e vetar o recurso a brindes, desenhos e personagens admirados pelo público infantil na divulgação desses produtos.
A autorregulamentação é a melhor resposta ao problema. Antecipando-se às demandas da sociedade, a indústria tem mais chances de evitar a indesejável intervenção do Estado por meio de leis draconianas. Iniciativas como a da Anvisa representam uma ameaça de tutela indevida sobre a liberdade dos indivíduos e o discernimento dos pais acerca do que é melhor para os filhos.
Seria louvável se os próprios fabricantes pensassem em desativar linhas de produtos reconhecidamente prejudiciais à saúde infantil e se entendessem a restrição à publicidade para crianças como algo efetivo, e não apenas um lance de marketing politicamente correto.
A BUSCA DA PARTILHA JUSTA
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
30/8/2009
Decisões de governo são políticas por natureza. Mas essa flexibilidade parece extrapolar o senso comum no caso da proposta da União para dividir os royalties da exploração petrolífera na camada pré-sal.
Até ministro do governo Lula levanta a voz contra. É o caso do titular da Pasta do Meio Ambiente, Carlos Minc. Publicamente, ele defende que Estados produtores de petróleo tenham posição diferenciada em relação aos demais na partilha dos royalties. "Mesmo com toda a tecnologia, o risco de acidente não é zero", adverte Minc, referindo-se ao transporte, ao armazenamento e à transformação, focados sob o ponto de vista ambiental.
É óbvio: risco pressupõe recompensa pecuniária, e questões ambientais embutem custos. Mas não é apenas em função desses dois aspectos que as regiões petrolíferas merecem receber em royalties tratamento compatível com essa condição. A exploração de óleo e de gás natural cria impactos de demandas sociais e econômicas para Estados e municípios. Gera um conjunto de múltiplas pressões exercidas pela população e que necessitam de respostas rápidas para evitar agravamento de problemas.
Especialistas também defendem direitos de Estados produtores. Participantes de um seminário realizado sexta-feira, na área de Engenharia da UFRJ, encaminharam ao presidente Lula um documento de apoio à maioria das medidas para a região do pré-sal, já antecipadas pela comissão interministerial, mas ressaltando que as unidades federadas produtoras devam receber royalties adequados e participações especiais.
Não é justo que a União fique apenas com os resultados econômicos, supostamente polpudos, do petróleo, deixando os problemas para Estados e municípios. É inaceitável, seja qual for o argumento que o governo federal tenha para usar os recursos petrolíferos.
Esse entendimento é lógico. O produtor deve receber o correspondente aos custos da produção. Por isso, tornou-se estranha a exclusão de seus representantes da comissão formada pelo Palácio do Planalto para definir o marco regulatório. Esse colegiado atuou durante 14 meses, e, em momento algum, foi pedida opinião aos governos estaduais. Esse veto tem ranço autoritário.
Especula-se sobre propostas robinhoodeanas na destinação dos recursos que advirão do pré-sal. Serviriam para melhorar o nível da educação no país, para financiar outras áreas sociais e para ajudar a desenvolver a ciência. Ótimo. O homem deve ser sempre o centro de todas as ações. "Que Deus abençoe o próximo presidente para fazer bom uso do dinheiro", conforme disse o próprio Lula, há poucos dias.
Espera-se, porém, que o novo marco da exploração petrolífera não se transforme em plataforma eleitoral, e que não se criem mitos de prosperidade, dando ao pré-sal a conotação de panaceia para os problemas do país. Essa fantasia política inclui um antiquado viés nacionalista com a criação de nova empresa estatal.
Enfim, o presidente da República anunciará amanhã, em megarreunião para dois mil convidados, as regras para exploração petrolífera. Mas não ficará tudo resolvido. O projeto será enviado ao Congresso e, mesmo que tenha caráter de urgência – o que seria inadequado pela complexidade da questão –, deverá ser discutido por pelo menos 45 dias.
O tempo é exíguo, mas, por certo, ensejará das bancadas a apresentação de emendas. É a chance de os Estados produtores finalmente se pronunciarem.
BANDIDOS IMPUNES
EDITORIAL
ESTADO DE MINAS
30/8/2009
Municípios de pequeno porte são vítimas da corrupção, que não é punida
As frequentes espertezas praticadas em Brasília por políticos que ocupam altas posições e dispõem de sofisticadas maneiras de desviar o dinheiro do povo têm sido alvo permanente da vigilância da imprensa. Mas engana-se quem pensa que o velho hábito de transformar o bem público em patrimônio particular é próprio dos grandes centros do poder. Pelo contrário. Longe dos holofotes, o que fazem políticos com o dinheiro de comunidades pequenas, principalmente as remotas, não fica proporcionalmente nada a dever aos campeões do Planalto Central. A maior diferença está nas consequências: quanto mais pobre o município, mais falta fará o desfalque à população do lugar. Reportagem do Estado de Minas mostra, hoje, que infelizmente a maioria das pequenas cidades mineiras que convivem com a pobreza e a má qualidade dos serviços públicos são, não por mera coincidência, as listadas entre as que também hospedam a corrupção.
Bastou cruzar a lista dos municípios que têm os menores índices de desenvolvimento em todo o estado, conforme levantamento preparado nacionalmente pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), com a dos casos que foram alvo de operações da Polícia Federal (PF) e investigações do Ministério Público, para chegar a uma triste realidade. Em pelo menos 81 dos 85 municípios mineiros da rabeira do ranking de desenvolvimento econômico e social, a pobreza não apenas está de mãos dadas com a corrupção, como também dá mostras de que não é fácil erradicar essa prática. Um exemplo é a pequena São João do Pacuí, no Norte de Minas, município com o índice de desenvolvimento humano (IDH) mais baixo do estado e um dos 30 piores do país, pelo critério da Firjan, que leva em conta a qualidade dos serviços de educação e saúde. Desde 2002, a administração municipal é alvo de ações por improbidade administrativa, fraude em convênios, licitações fraudulentas e contratação de empresas fantasmas.
Há casos em que o porte acanhado das finanças do município não desestimulou os golpes. Pelo contrário. Vários assaltos foram detectados pelas investigações em mais de uma operação em uma só comunidade. É o caso de Minas Novas, no Vale do Jequitinhonha, que ocupa o desonroso 768º lugar entre os 853 municípios mineiros. A prefeitura esteve no foco da Operação Pasárgada, da PF, que apurou fraudes perpetradas para liberar recursos do Fundo de Participação de Municípios (FPM), e ainda teve espaço para se destacar na Operação João-de-barro, também da PF, que tratou de desvio de dinheiro em emendas parlamentares para obras de saneamento. Já na Operação Sanguessuga, em que foram apuradas licitações superfaturadas para a compra de ambulâncias, a administração de Bonito de Minas negou o sugestivo nome da cidade e aparece entre as que impediram a população de ter acesso a esse serviço de saúde pública. A fragilidade da legislação e a infinita possibilidade de recursos protelatórios impedem a aplicação de punições exemplares. Corrigir essas falhas e fechar as portas por onde entram na vida pública os que são movidos pelas piores intenções é o desafio que permanece aos legisladores e juristas de boa índole. Não fazer nada já é quase ser conivente.
CONFLITO PÕE EM RISCO CRIANÇAS DO DF
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
30/8/2009
As operadores privadas de seguro saúde se tornaram cada vez mais necessárias ante a incapacidade de o aparelho estatal prover assistência médico-hospitalar eficaz e universalizante ao conjunto da sociedade. Resvalou ao plano de simples alegoria o compromisso de que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e no acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (art. 196 da Constituição).
Por causa da escassa presença do poder público no atendimento às demandas sanitárias da população, a busca à proteção oferecida pela iniciativa particular segue em crescente expansão. Até agora, a despeito de seguidas reformas da legislação pertinente, perdura conflito expresso em equação com três incógnitas. Uma delas representa a tendência das empresas de atuarem para obter maiores níveis de retorno financeiro. A outra projeta a comunidade médica disposta a lutar para alcançar remuneração adequada dos serviços prestados. A terceira sinaliza o peso financeiro nos orçamentos domésticos da assistência contratada.
Equação não resolvida, crise sistêmica. No Distrito Federal, as crianças são, no momento, as principais vítimas da anomalia. Após seis meses de infrutíferas negociações, os pediatras da rede privada romperam com os planos de saúde. Decidiram suspender os atendimentos previstos em convênios. Trata-se de reação à resistência das operadores em pagar-lhes R$ 90 pelas consultas nas emergências dos hospitais e R$ 120 quando o cliente é atendido em consultório. Hoje, o valor pago, em termos respectivos, é de R$ 30 a R$ 40 — quantias reduzidas à média de R$ 30 em razão de taxas administrativas e impostos.
Desde sexta-feira, o conveniado ou não deverá desembolsar R$ 90 para receber assistência de pediatra em consultórios particulares. Para complicar a situação, a rede pública de saúde está desfalcada de 200 profissionais da área, pelo menos, segundo a Secretaria de Saúde. O caos se instala no exato instante em que a pandemia da influenza A (H1NI), conhecida como gripe suína, a cada dia aumenta as estatísticas de mortes. As crianças, como provam os dados coletados e a análise de infectologistas, são um dos grupos de risco mais expostos ao ataque da doença.
A Agência Nacional de Saúde (ANS) diz que os planos, em qualquer circunstância, devem oferecer opções de médicos. Manda, então, que os prejudicados os denunciem perante o órgão. É muito pouco. Ora, os prejudicados são todas as crianças do DF. E a imprensa já cuidou de debater o problema em todos os aspectos. Decerto é dever da ANS agir para o rompimento do impasse, se necessário com o uso dos poderes intervencionistas que a lei lhe defere.
TURISMO E BOM SENSO
EDITORIAL
DIÁRIO DE CUIABÁ (MT)
30/8/2009
Ao longo das gestões que passaram pelo Palácio Paiaguás, bem poucas deram a atenção que se faz necessária ao Parque Nacional de Chapada dos Guimarães, pelo menos na parte que toca ao Estado. Criado em 1989, o Parque é um patrimônio natural brasileiro e foi criado justamente com o objetivo de proteger essas paisagens naturais de uma beleza ímpar, sítios arqueológicos e ecossistemas de grande interesse científico.
O descaso em relação à sua preservação e a precária fiscalização (competência do Ibama, vale registrar) têm contribuído para a destruição gradativa de alguns pontos de atração turística. Cite-se como exemplo a Cachoeira Véu de Noiva, cujo acesso, até hoje, depois de muitas obras sem fim, é dificultado a milhares de turistas que procuram o Parque para visitação. Sem se contarem as queimadas, que, todos os anos, destroem parte considerável da flora e da fauna.
No começo do ano, levado pela euforia da escolha de Cuiabá como uma das 12 sedes da Copa do Mundo de 2014, o Governo do Estado, por meio da Secretaria de Desenvolvimento do Turismo (Sedtur), anunciou um pacote de obras de infraestrutura, no montante de R$ 15 milhões, contemplando o Parque e o Município de Chapada, como um todo.
Nesse contexto, insere-se a construção de um teleférico, equipamento que, parece não haver dúvida, tem tudo para se tornar um extraordinário feito, numa região por demais carente de atrativos, exceto aqueles com os quais a natureza presenteou Mato Grosso. O inconveniente é que essa obra, antes mesmo de se concretizar, já se transformou numa enorme polêmica, que coloca em lados opostos o Governo do Estado e o Ministério Público.
Com efeito, por decisão da Justiça, que acatou pedido de liminar do MPE, as obras do teleférico foram barradas, sob a justificativa de que haveria riscos ambientais na área de paredões escolhida para a instalação do equipamento. A ação, interposta pelo promotor Jaime Romaquelli, saiu da área judicial e adentrou o perigoso terreno do ambiente político. De fato, o promotor e o secretário de Turismo, Yuri Bastos Jorge, hoje, são protagonistas de uma briga que remete à suspeita de que as conveniências políticas e pessoais se sobrepõem ao interesse coletivo e ao fator meramente ambiental.
O entrevero judicial se arrasta e, com ele, as obras do teleférico. Passa despercebido por parte da opinião pública – muito mais, das partes envolvidas nessa briga – o fato de que, se houvesse bom senso, as obras seguiriam seu curso normal. Afinal, toda essa confusão só ocorre porque o Governo do Estado se recusa, sem uma justificativa plausível, a apresentar imprescindível a licença ambiental.
“A ação saiu da área judicial e adentrou o perigoso terreno do ambiente político”
O DESAFIO DO PRÉ-SAL
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
30/8/2009
O governo do presidente Lula promete divulgar amanhã o novo marco regulatório para o petróleo – o conjunto de regras que vai estabelecer as relações entre o público e o privado tendo em vista, principalmente, a exploração das gigantescas jazidas de óleo do pré-sal, que colocam o Brasil como potencial ocupante, em futuro próximo, entre os maiores produtores mundiais. A expectativa quanto ao alcance dessas regras ultrapassa meros aspectos tecnológicos ou comerciais para adentrar num terreno onde se cruzam as opções políticas, ideológicas e econômicas para o estabelecimento de estratégias que melhor atendam aos interesses nacionais.
Para se ter ideia da importância e dos reflexos que podem ter as medidas, basta lembrar que, hoje, sem o pré-sal, o país dispõe de reservas confirmadas de 12 bilhões de barris, o que o coloca na 16.ª colocação entre os maiores estoques do mundo. Com o pré-sal, segundo calcula a Agência Nacional do Petróleo (ANP), as reservas brasileiras sobem para 50 bilhões a 80 bilhões de barris. Se provadas, tais volume colocariam o país na sétima ou oitava posição, quase em igualdade com a Rússia e a Venezuela, dois expressivos membros da poderosa Opep.
Informações antecipadas sobre as linhas gerais da regulação concebida pelo governo já são suficientes para indicar a direção que se planeja tomar. São preocupantes. Preocupantes porque podem significar um retrocesso quanto à moderna legislação instituída pelo país na década de 90 e, consequentemente, podem significar também uma diminuição do potencial de sucesso da exploração do valioso recurso mineral guardado nas águas profundas do nosso mar territorial.
De fato, pelo que já se sabe, a opção do governo será mesmo pela criação de uma nova estatal, chamada informalmente de Petrosal, que seria a “proprietária” das reservas, delegando-se à Petrobras (outra estatal) a operação da exploração. À iniciativa privada, quer brasileira, que estrangeira, depreende-se desde logo, caberá um papel aparentemente secundário no complexo e caríssimo processo de fazer brotar das profundezas o petróleo e o gás que nelas se escondem.
De um lado, compreende-se a preocupação do governo, que dá mostras de seu interesse em deter o controle quase absoluto do pré-sal para transformar seus frutos econômicos em obras sociais, sobretudo em educação e saúde, para o benefício do povo brasileiro. De outro lado, porém, corre-se o risco de tornar mais difícil o alcance desses objetivos ao tornar menos atrativa a participação de capitais e de tecnologia estrangeiros, sem dúvida essenciais para o êxito da desse tipo de exploração petrolífera, inédito no mundo.
Ao que tudo indica, o modelo escolhido pelo governo para regular a participação privada no processo prevê que as empresas interessadas corram todos os riscos em troca de uma partilha dos resultados que pode não ser compensadora. Basicamente, segundo se informa, pelo sistema de partilha as empresas investiriam intensivo capital e o conhecimento tecnológico de que dispuserem para, em contrapartida, receberem parte fixa do resultado. Em outras palavras, significa que o investimento de milhões de dólares pode – este é um risco natural no ramo! – redundar em nada de produção ou em volume insuficiente para tornar o processo economicamente viável.
Trata-se, este modelo, de uma regressão em relação àquele instituído pela Lei do Petróleo, durante a presidência de Fernando Henrique Cardoso, que acabou com o monopólio da Petrobras na extração do óleo. Por ela, a iniciativa privada participa sob o regime de concessão (e não de partilha, como pretende agora o governo), adquirindo blocos de exploração mediante leilões promovidos pela Agência Nacional de Petróleo (ANP). Ganham as que oferecerem os melhores lances.
Revelou-se tal modelo altamente eficiente. Foi a partir dele que 72 empresas, metade das quais brasileiras, se habilitaram à exploração. Os resultados foram excelentes: sob tal regime o Brasil alcançou a autossuficiência e o petróleo, que antes representava apenas 3% do PIB, passou a participar com 12%. Como benefício suplementar, há o pagamento de royalties, que enriquece estados e municípios – aliás, um aspecto ainda não de todo esclarecido pelos formuladores da proposta oficial e que tem acirrado os ânimos dos governadores dos estados onde se localizam as reservas.
Acreditamos que a opção pela qual o governo vem manifestando preferência não é, em princípio, ilegítima ou de todo ineficaz, assim como pode não ser perfeita nem a mais aconselhável, diante da nova realidade do pré-sal, a aplicação dos exatos termos da Lei do Petróleo. Portanto, antes do aprofundamento das discussões, ouvidos os especialistas e os setores interessados em contribuir, não se deve considerar como definitiva e irreversível qualquer das hipóteses.
PRERROGATIVA DISTORCIDA
EDITORIAL
ZERO HORA(RS)
30/8/2009
Toda vez que uma autoridade política vai a julgamento pelo chamado foro privilegiado, como ocorreu na última quinta-feira com o deputado e ex-ministro Antonio Palocci, os brasileiros têm motivos para ficar apreensivos. Este instituto, concebido para garantir mais imparcialidade e maior proteção à função pública, é uma herança do Brasil colonial – quando políticos e pessoas importantes não admitiam ser julgados pelos mesmos tribunais que escravos e cidadãos comuns. A Constituição de 88 manteve a prerrogativa para ocupantes da cúpula do Executivo, do Legislativo, membros do Judiciário e do Ministério Público. Só que o foro privilegiado se transformou numa verdadeira anomalia em nosso país, servindo como instrumento de impunidade e como alternativa para os defensores se valerem da morosidade da Justiça.
É tamanha a distorção, que os agentes públicos flagrados em delitos fazem o possível para serem julgados pelos tribunais recursais. Não faz muito, houve um movimento para que a proteção se estendesse aos acusados de improbidade administrativa – o que, felizmente, não prosperou. O Supremo Tribunal Federal também derrubou a extensão do privilégio para pessoas que não estão mais no exercício da atividade pública, já que seu objetivo é exatamente proteger a função – não os indivíduos.
Mas a deformação persiste, principalmente porque os políticos acusados de delitos invariavelmente encontram brechas legais para escapar da punição. Causa perplexidade a estatística de absolvições nas ações criminais de pessoas que gozam do foro especial por prerrogativa de função. São raros os casos de condenação recente, mesmo de envolvidos nos grandes escândalos da administração pública nacional.
Um dos motivos apontados para a dificuldade dos tribunais superiores de dar a resposta esperada pela sociedade é o fato de eles não serem dotados, como os juizados de primeira instância, de estruturas adequadas para a produção de provas. Neste contexto, fica bem mais fácil para os procuradores dos acusados utilizarem pretextos formais para derrubarem as acusações. Além disso, o próprio processo de indicação dos membros dos tribunais superiores coloca sob suspeita julgamentos que envolvem, em alguns casos, as autoridades que os nomearam.
Tais razões deveriam ser suficientes para uma revisão deste instituto, que se transformou em fator de impunidade na política nacional. Evidentemente, as decisões dos tribunais superiores têm que ser respeitadas e cumpridas, mesmo quando contrariam a expectativa da maior parte da população. Mas a manutenção da prerrogativa do jeito que está só contribui para estender a integrantes do Judiciário a descrença que os cidadãos dispensam hoje a governantes e representantes parlamentares que não se guiam pela cartilha da moralidade.
UMA NAÇÃO LEIGA
EDITORIAL
ZERO HORA(RS)
30/8/2009
Assegurado pela Constituição Federal, o livre exercício dos cultos religiosos voltou ao debate nesta semana em razão da aprovação pela Câmara dos Deputados de um tratado entre o Brasil e o Estado do Vaticano, que cria o estatuto jurídico da Igreja Católica, e, por iniciativa e pressão da chamada bancada evangélica, de um projeto que estende aos demais credos as vantagens daquele tratado. Quase todos os partidos, tanto os do governo quanto os da oposição, deram encaminhamento favorável aos dois instrumentos, o que permitiu que sua aprovação se fizesse em votação simbólica.
A questão tem implicações mais amplas do que uma simples definição sobre o tratado entre dois Estados soberanos ou sobre vantagens estendidas a instituições religiosas que mantêm templos e, mais do que isso, que promovem ensino religioso. Embora o texto de uma das leis aprovadas faça expressa referência à liberdade de culto, é indiscutível que os projetos aprovados na Câmara possam estar arranhando um dos pilares do Brasil republicano. Desde a primeira Constituição pós-Império, nosso país mantém como um de seus fundamentos o de ser uma nação leiga, que preserva a liberdade dos cultos, mas não se vincula a nenhum nem concede a qualquer deles prerrogativas que firam a igualdade.
É dever do governo brasileiro, seja pelas autoridades executivas seja pelas casas legislativas, preservar de maneira corajosa tanto a liberdade de crença quanto a laicidade do Estado. A questão, que agora será apreciada pelo Senado, merece, por isso, atenção especial. Até agora, a opinião pública praticamente ignorou o debate, embora a assinatura do tratado com o Vaticano já tenha mais de um ano. Estão em jogo princípios importantes demais para que se mantenha essa omissão.
LUZ NO TÚNEL GLOBAL
EDITORIAL
GAZETA DE ALAGOAS
30/8/2009
Com o mundo ainda ressabiado pela mais recente crise global, começam a ser emitidos sinais de que o Brasil, além de não ter sido tão dramaticamente afetado pela quebradeira que alcançou boa parte do globo, pode ter confirmadas suas melhores chances de bons negócios no pós-crise. Pelo menos essa é a opinião de uma das maiores agências internacionais de classificação de riscos para investimentos, a Moody’s.
A boa nova foi divulgada em primeira mão pela britânica BBC, uma referência internacional em comunicação. Segundo o anunciado, dentre uma centena de países analisados pela Moody’s, o Brasil “reúne as condições necessárias para se tornar, nos próximos dias, o primeiro país a ser avaliado como ‘grau de investimento’”, um termo considerado sinal verde para o trânsito, em direção à economia brasileira, de capitais transnacionais.
Segundo a BBC, “outras duas agências de risco, a Standard & Poor’s e a Fitch Ratings, já haviam elevado a classificação do Brasil para grau de investimento, no ano passado. Mas a Moody’s, ao contrário das duas outras, decidiu não elevar a categoria do País no ano passado, a fim de aguardar para ver o quanto o País seria afetado pelos efeitos da crise econômica mundial”.
Essa posição da Moody’s, portanto, longe de ser um parecer isolado, tem o condão de consolidar uma opinião positiva, de respeitabilidade global, sobre a economia brasileira e suas perspectivas.
É desnecessário dizer o quanto tais opiniões (abalizadas) são essenciais para que os fluxos de capitais e de investimentos voltem a ter o Brasil como destino seguro. Igualmente é desnecessário lembar que especialmente nos tempos em curso, a vitalidade desse fluxo é indispensável para que um país possa almejar a um desenvolvimento sustentado, sólido.
Uma notícia muito boa para as esperanças brasileiras.
DESRESPEITO AOS MORTOS
EDITORIAL
JORNAL DO COMMERCIO (PE)
30/8/2009
O Cemitério de Santo Amaro é um patrimônio sentimental e cultural do Recife, de Pernambuco. Ali estão sepultadas veneráveis figuras da nossa história, como Joaquim Nabuco, José Mariano, Agamenon Magalhães, Herculano Bandeira, famílias tradicionais que fizeram a agroindústria canavieira e também milhares de pessoas anônimas. Todo ano, no Dia de Finados, é visitado por uma multidão de parentes dos mortos, que ali vão levar flores como símbolo de sua saudade. Deveria ser tratado com mais cuidado pelo poder público municipal, ao qual está confiado desde que a Igreja Católica perdeu a posse dos cemitérios públicos, com o advento da República.
Antes disso, quem não fosse católico ou estivesse entre os malvistos pela Igreja não podia ser sepultado ali. Daí que foi criado o British Cemitery, que chamamos Cemitério dos Ingleses, ali perto, para abrigar as sepulturas dos ingleses que vieram para o Recife com a instalação da Great Western (ferrovias) e outras empresas britânicas. Como a maioria dos funcionários ingleses era da Igreja Anglicana, não era permitido o seu enterro no tradicional Cemitério de Santo Amaro. Os judeus também têm seu cemitério no Barro. Quando morreu o general Abreu e Lima, lutador, com Simón Bolívar, nas guerras de libertação da América espanhola, não foi permitido que ele recebesse sepultura no cemitério católico e ele foi recebido ecumenicamente no British Cemitery.
Recente reportagem do Jornal do Commercio mostra como o velho Cemitério de Santo Amaro está sofrendo de estranho abandono. Veem-se ataúdes usados amontoados ao léu, restos de ossadas a céu aberto, túmulos depredados, muita sujeira nos mausoléus e alamedas. Inaugurado em 1851, o cemitério dispõe de um espaço de 140 mil m². Recebe 18 mil visitantes por mês, segundo estimativa da PCR. Seu projeto é do arquiteto francês Louis Vauthier, o mesmo que projetou o Teatro Santa Isabel e outros monumentos recifenses. Tem uma capela que imita o estilo gótico, obra do engenheiro José Mamede Alves Ferreira.
Por falta de cuidados, mausoléus de importância histórica, como os dos abolicionistas Joaquim Nabuco e José Mariano, estão empoeirados e sujos. É obrigação das famílias dos mortos manter limpos os mausoléus, mas, no caso de personalidades históricas, a obrigação de manutenção e limpeza passa para a prefeitura. Ela tem também o dever de manutenção e limpeza das áreas comuns da necrópole. O setor de Manutenção Urbana da PCR informou que vai acionar as famílias dos mortos para que tomem as providências necessárias, e que a parte de manutenção e limpeza que cabe à prefeitura será cobrada.
Fernando Melo, o diretor do setor, disse ao JC que existem mausoléus do tempo em que o cemitério foi inaugurado e a administração não tem mais contato com as famílias dos que ali estão enterrados. Mexer com o que está danificado poderia trazer problemas, como a responsabilização da PCR por danos. Os túmulos mais antigos poderiam até desmoronar. Quaisquer que sejam os motivos causadores do problema que abordamos, urgentes providências têm de ser tomadas, não só por respeito a esse importante patrimônio, mas principalmente à memória dos mortos ali sepultados, famosos ou anônimos.
O costume de enterrar mortos se perde na aurora dos tempos. Graças a esse uso, foram possibilitadas, ou facilitadas, pesquisas históricas importantíssimas para a humanidade. A abertura, para estudo, de sepulturas e cemitérios de eras antigas não é considerada crime de violação. Graças a tais estudos, foi possível aprender muito sobre civilizações como a dos antigos egípcios, dos babilônios, fenícios. É assim também que foi possível acompanhar a evolução do homem desde o Pithecanthropus Erectus, o Homo Erectus até o Homo Sapiens Sapiens.
Mais modernamente, também países ocidentais começaram a praticar a cremação de cadáveres, costume antigo dos hindus, por exemplo. Tem a vantagem de não ocupar áreas cada vez mais extensas das cidades, de ser mais higiênico, mas ainda não é aceito de maneira mais abrangente. O Recife contará em breve com um crematório.
EVASÃO ESCOLAR
EDITORIAL
DIÁRIO DO NORDESTE(CE)
30/8/2009
Novas conclusões foram obtidas sobre um dos mais sérios aspectos entre os problemas educacionais brasileiros, em pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) com a finalidade de analisar as causas da evasão escolar, segundo a visão dos próprios jovens e de seus pais.
O trabalho foi construído a partir de dados apresentados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios e da Pesquisa Mensal do Emprego, com índices cotejados no sentido de avaliar o peso de um dos mais alegados motivos para os jovens abandonarem a escola.
A pesquisa desmente alguns mitos, ou preconceitos, como o de que a maioria dos jovens de comunidades e regiões mais pobres se vê obrigada a deixar o colégio pela necessidade de trabalhar para sustento da família.
Verificou-se que, exatamente nas regiões mais ricas do País, o crescimento econômico e as oportunidades de emprego é que afastam o jovem dos estudos, pois as localidades caracterizadamente pobres não oferecem oportunidade de trabalho para pais ou filhos.
A recente crise econômica, ainda de acordo com o estudo procedido pela Fundação Getúlio Vargas, gerou um efeito dúbio: apesar da falta de empregos, o jovem procedente de classes sócio-econômicas inferiores persiste nos estudos por julgar que desta forma vai obter mais chances no competitivo mercado de trabalho.
No grupo dos alcançados pelo programa Bolsa Família, entre crianças de até 15 anos, o papel do benefício se torna mais visível pelo controle da freqüência dos alunos do que pela própria matrícula.
O maior desafio se localiza, no caso, entre estudantes na faixa etária de 16 a 18 anos, refletindo o que também acontece nas escolas públicas no campo do ensino médio, setor sempre mais problemático do que o ensino fundamental.
O difícil acesso ao livro, bem como aos equipamentos da informática, nas camadas menos favorecidas da população, é outra flagrante causa de desestímulo para os jovens em idade escolar no Brasil.
As bibliotecas públicas, único recurso utilizado em centenas de localidades, literalmente não existem em cerca de 360 municípios brasileiros.
Registram-se, também, casos de cidades com bibliotecas cadastradas no Serviço Nacional de Bibliotecas Públicas, mas que tiveram de cerrar suas portas por causa da baixa remuneração oferecida aos funcionários.
Muitos razoáveis acervos de livros, reunidos tantas vezes pelo esforço de pessoas dedicadas à educação e à cultura, deterioram-se devido à inexistência de um local adequado para abrigá-los, ou simplesmente pela falta da necessária manutenção.
Todas as batalhas empreendidas em favor da melhoria de qualidade da educação pública requerem, sobretudo, o efetivo engajamento de mestres, pais e estudantes, tanto no empenho constante de formularem reivindicações procedentes quanto na fiel observação, inclusive a partir do núcleo familiar, sobre qual a melhor e mais viável maneira de desenvolver o processo educacional.
Salvo em casos excepcionais, a pobreza não anula o senso de responsabilidade familiar pela formação escolar dos filhos, quando a intenção real e objetiva é fazer valer a vontade cidadã.
PARA QUE SERVE UM CIDADÃO ARMADO
EDITORIAL
A CRÍTICA (AM)
30/8/2009
A violência urbana chegou a níveis em que o cidadão comum, na ânsia de proteger-se, acaba retroalimentando a roda que descamba em briga, ferimentos, em mortes e na infelicidade geral de milhares de famílias. A expressão deste fenômeno social pode ser medida em A CRÍTICA hoje. Matéria baseada em dados oficiais relata a apreensão de mais de uma arma de fogo por dia em Manaus.
Somos hoje, pelo que expressam os números da Secretária de Segurança Pública, uma sociedade armada, belicista e exposta. Foram 587 armas de fogo apreendidas em 20 meses. Somente nos oito primeiros meses deste ano foram retiradas de circulação mais armas do que em todo o ano passado. Neste ritmo vamos fechar o ano com um verdadeiro arsenal militar retirado das ruas.
Nesse aspecto, louve-se o trabalho dos órgãos de segurança, que foram capazes de retirar de circulação objetos que são potencialmente geradores de violência urbana, pois é sabido que alguém armado está predisposto a cometer um ato de violência.
Esse fato, nas palavras de um magistrado, expressa-se nos processos que lhe chegam as meses. Destes, de cada 10 casos de violência com armas, apenas dois são com as chamadas armas brancas (facas, espetos e etc...).
Esse fenômeno invoca ainda uma outra questão: como a população está conseguindo se armar? O Estatuto do Desarmamento, uma legislação avançada que infelizmente logrou enfrentar um duríssimo lobby, reduziu substancialmente o acesso do cidadão a uma arma legalizada. A resposta está na ilegalidade, no tráfico internacional de armas, no acesso a armas roubadas ou desviadas de corporações militares. Seja de que forma for, o Estado ganha uma outra missão: cortar esse mal pela raiz o mais breve possível sob pena de também retroalimentar o fenômeno da violência urbana.
O comando da Polícia Militar está preocupado com os números, que expressam essa tentativa do cidadão de se proteger, mas cujo efeito final é exatamente o contrário. Para se ter idéia dessa inversão de objetivos, estudo patrocinado por organização não-governamental prevê que em cinco anos 1,8 milhão de pessoas vão morrer a tiros disparados de armas ilegais.
Sabedor do problema, fica mais fácil agora para o Poder Público atacá-lo e garantir a paz social. É isso o que toda pessoa de bem
espera.