Sunday, August 23, 2009

EDITORIAIS 23/08/2009

O QUE PENSA A MÍDIA
23/8/2009 - EDITORIAL
SOB TUTELA
EDITORIAL
O GLOBO
23/8/2009

Quando uma doutrina autoritária chega ao poder, ela pode se expressar de várias formas, e até, à primeira vista e formalmente, dentro da lei. Há medidas tomadas, nas esferas federal e estadual, em que são bastante visíveis as impressões digitais de um tipo de visão segundo a qual a sociedade precisa ser vigiada, tolhida e, se for o caso, punida, para adotar “bons costumes”.
A questão da proibição do fumo em qualquer espaço público comercial, em São Paulo e agora no Rio, é emblemática. Lastreada em propósitos louváveis — a preservação da saúde —, a proibição, por radical, cassa o direito do fumante, ao suprimir as áreas antes reservadas para ele. Outra característica desta doutrina autoritária é eximir o Estado de responsabilidades, punindo terceiros por delitos configurados como tais por este tipo de norma. No caso do fumo, a punição recai sobre o dono do bar, do restaurante, do que seja. Em vez de o poder público se responsabilizar pela repressão, ela é transferida, por imposição pecuniária, a outros.
O mesmo ocorreu na louvável repressão ao uso do álcool por motoristas.
Em vez de se ampliar a fiscalização policial nas estradas, tentouse proibir a venda de bebidas no comércio à margem das rodovias, em prejuízo dos lojistas. Quase, também, fizeram o mesmo com as lojas de conveniência urbanas.
O novo enquadramento das farmácias é típico. Por determinação da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa), do Ministério da Saúde, os estabelecimentos passam a ser proibidos de vender mercadorias que não sejam medicamentos. A decisão carece de lógica, por ser risível o argumento do combate à automedicação. Mais uma vez, punese o empresário porque o Estado não consegue fazer cumprir a regra da obrigatoriedade de receita médica para certos remédios.
A mesma Anvisa, por causa deste viés autoritário, move intensa cruzada contra a publicidade de medicamentos — as de antigripais foram suspensas por causa da gripe suína — e de alimentos para crianças. Ou seja, os pais e as pessoas em geral precisam ser contidas na ânsia consumista, pois não têm discernimento para decidir o que é bom para a família.
A visão de um Estado tutelador de uma sociedade tida pela autoridade pública como infantil e imatura também transparece na ação do Ministério da Saúde de fazer desaparecer o antiviral Tamiflu das farmácias, eficaz droga contra a gripe suína, supostamente também para evitar a automedicação.
Não é leviandade pensar que pessoas possam ter morrido pela falta do remédio nas prateleiras do comércio, somada à incapacidade de o Estado distribuí-lo pela rede pública. O Brasil vive uma fase kafkiana: há liberdade, democracia, mas direitos individuais, inscritos na Constituição, começam de forma crescente a ser tolhidos por normas, portarias e leis redigidas alegadamente para defender a população. O Estado quer trancar a sociedade numa redoma, em nome da segurança dela, e ficar com a chave.

GOLPE (ELEITORAL) CONTRA A AGRICULTURA
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
23/8/2009

Empenhado em ganhar as próximas eleições a qualquer custo, o presidente Lula decidiu recrutar para a campanha os desordeiros do MST. Para garantir seu apoio, planeja golpear um dos setores mais produtivos e estrategicamente mais importantes da economia brasileira, o agronegócio. Para isso, o presidente exigiu de seus ministros a apresentação, nas próximas duas semanas, dos novos índices de produtividade usados como critério para a desapropriação de terras. A intenção é clara. O comando eleitoral do Palácio do Planalto não está interessado em produtividade. Se estivesse, daria mais apoio a quem realmente produz e já demonstrou vocação para modernizar a própria atividade e competir entre os melhores do mundo. O agronegócio brasileiro assusta os concorrentes da Europa, dos Estados Unidos e das maiores economias do resto do mundo por sua capacidade competitiva. No centro do governo, é acusado de improdutivo e de não respeitar a "função social" da propriedade agrícola.

Se perguntarem ao presidente Lula por que ele prometeu aos dirigentes do MST a renovação dos tais índices de produtividade, ele não poderá fornecer nenhuma resposta razoável, porque nenhuma resposta desse tipo estará disponível. Não há, no Brasil, nenhum déficit na produção e na oferta de alimentos. A agropecuária brasileira tem sido capaz, há muitos anos, de produzir muito mais que o necessário para o consumo interno. Se é preciso complementar a oferta de algum produto, como o trigo, a receita de exportação gerada pelo setor é muito mais que suficiente para financiar a compra. De janeiro a julho deste ano, as exportações do agronegócio renderam US$ 37,73 bilhões, enquanto as importações consumiram apenas US$ 5,88 bilhões.

Esse bom resultado, um superávit de US$ 31,85 bilhões, sustentou o saldo comercial brasileiro e contribuiu de forma importante para o País enfrentar a crise sem abalo nas contas externas. Num cenário adverso, com a procura externa retraída e as condições de concorrência muito mais duras, o agronegócio brasileiro mais uma vez mostrou sua eficiência. Ninguém condenou a indústria por trabalhar, desde o agravamento da crise, bem abaixo de sua capacidade produtiva, como observou a presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), senadora Kátia Abreu (DEM-TO). Nem haveria por que censurar. Mas querem cobrar da agropecuária índices de produtividade impostos pela burocracia de Brasília, em qualquer condição econômica e sem nenhum benefício para o País, porque não falta comida - barata - nem matérias-primas de origem agrícola.

O objetivo de Lula não é, obviamente, cuidar dos interesses da economia brasileira. Não é preciso mexer na posse da terra - e ele sabe disso - para abastecer o mercado nacional nem para tornar competitivo o produto brasileiro. Os verdadeiros produtores, grandes, médios e pequenos, têm cuidado de todos esses pontos, com o esforço próprio, com a ação da Embrapa (quase destruída, há alguns anos, pela intervenção petista) e com algum apoio do Ministério da Agricultura. O objetivo presidencial, por exclusão, só pode ser eleitoral. Não por acaso a decisão de Lula foi anunciada depois de 3 mil pessoas arrebanhadas pelo MST montarem acampamento e promoverem manifestações e desordens em Brasília. Bem tratados pela demagogia presidencial, serão convertidos em tropas de choque para atuar na campanha eleitoral coordenada por Lula, o chefe de fato do PT.

Segundo o ministro do Desenvolvimento Agrário, Gustavo Cassel, só tem de se preocupar com os novos índices quem não se preocupa com a produção. Isso é retórica de quinta categoria. Quem menos se preocupa com produtividade e bom uso da terra é o seu Ministério. Se houvesse alguma seriedade na chamada "política agrária", a próxima iniciativa deveria ser um reexame dos objetivos da "reforma" e de sua utilidade para o Brasil. O resultado de um exame honesto seria facilmente previsível: o único objetivo da política atual é a manutenção de massas de manobra disponíveis para servirem a quem as financia. O financiamento, a propósito, é feito com dinheiro público. Cabe ao ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, denunciar mais essa perigosa farsa da "política agrícola". Sua omissão será desmoralizante.

TROPA DE CHOQUE NA CPI
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
23/8/2009

Quando se toma conhecimento das irregularidades apontadas no relatório elaborado por auditores do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre as obras da Refinaria Abreu e Lima, de responsabilidade da Petrobrás, fica mais fácil entender por que, instruída pelo Palácio do Planalto, a base governista vem agindo com tanta sofreguidão para bloquear qualquer tentativa de fazer avançar os trabalhos da CPI instalada no Senado para apurar as atividades da empresa.

O primeiro lote de documentos sobre a atuação da Petrobrás que o TCU enviou há dias para a CPI aponta indícios de superfaturamento de pelo menos R$ 121 milhões na obra da Refinaria, que está sendo construída em Pernambuco pela empresa brasileira, em parceria com a PDVSA, estatal controlada pelo governo do presidente Hugo Chávez. Depois de constatar, no início do ano, indícios preliminares de irregularidades na obra, os auditores do TCU examinaram, entre o fim de abril e o início de julho, quatro contratos em vigor, cujo valor totaliza R$ 2,7 bilhões - isso representa apenas pouco mais de um décimo do orçamento da obra, que, segundo informação divulgada pela Presidência da República, é de R$ 23 bilhões.

Nesses contratos, como mostrou reportagem de Leandro Colon publicada quinta-feira pelo Estado, não há detalhamento de gastos que somam R$ 1,1 bilhão. Os auditores advertem que "se pode estar duplicando ou triplicando a quantidade de pedreiros, serventes, guindastes", e chegam a cogitar a necessidade de suspensão dos pagamentos.

Quanto ao valor restante desses contratos, a auditoria do TCU concentrou-se em despesas de R$ 347 milhões, das quais 53% podem estar com valores superiores aos de mercado. "Os indícios de sobrepreço constatados apresentam potencial de ocasionar prejuízos significativos à Petrobrás", afirmam os auditores.

O relatório aponta também a compra de equipamentos de laboratório e cozinha, mobília e instrumentos cirúrgicos sem concorrência, o que, "além de indicar desvio de finalidade na contratação", pode ser uma prática "antieconômica". Os auditores ainda observam que pode haver outras irregularidades, mas não puderam apurá-las porque seu trabalho foi dificultado pela empresa.

A Petrobrás afirmou que "não há irregularidades nas obras" e que "não houve obstáculos à fiscalização ou sonegação de documentos". Alega que, no exame dos contratos, os auditores do TCU utilizaram tabelas de custos de obras do setor de habitação, saneamento e rodoviário, sem levar em conta "as especificidades da construção de uma unidade industrial do ramo petrolífero". O relatório do TCU, concluído em 3 de julho, ainda aguarda análise do ministro Benjamin Zymler, que poderá esclarecer tecnicamente a questão.

Mas já existem indícios de irregularidades suficientes para que a CPI investigue os contratos. Lamentavelmente, porém, a Petrobrás, o governo e políticos ligados à empresa devem estar tranquilos quanto ao trabalho da CPI. A tropa de choque governista na comissão vem agindo com notável eficiência e presteza para esvaziá-la. Na terça-feira, valendo-se de sua maioria - tem 8 de 11 votos na CPI -, conseguiu em apenas dois minutos derrubar 68 requerimentos apresentados pela oposição para a convocação de autoridades para depor e para a apresentação, pela empresa, de documentos sobre as operações colocadas sob suspeição.

Dois desses requerimentos convocavam a ex-secretária da Receita Federal Lina Vieira - que depôs na terça-feira na Comissão de Constituição e Justiça do Senado - para falar sobre manobras contábeis utilizadas pela Petrobrás para reduzir tributos devidos. Outros pediam documentos relativos ao patrocínio da Petrobrás no valor de R$ 1,3 milhão a um projeto cultural de responsabilidade da Fundação Sarney - ligada ao presidente do Senado, José Sarney - que não saiu do papel.

Ao impor de maneira tão avassaladora a rejeição de todos esses requerimentos, o relator da CPI e também líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), não deixou dúvidas quanto ao que o governo quer nesse caso - o silêncio de todos.

A ´´PARCERIA´´ INCRA-MST
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
23/8/2009

Se antes a preocupação da sociedade brasileira, com os métodos de atuação do Movimento dos Sem-Terra (MST) se referia ao desrespeito sistemático aos direitos de propriedade praticado por essa entidade, agravado pelos lances de violência que marcam suas mobilizações, de uns tempos para cá há preocupação quanto aos desvios de dinheiro público, especialmente através da "parceria" Incra/MST. Como o MST mantém-se, há duas décadas, sem existência legal, escapando assim dos controles oficiais ou da obrigação de prestar contas do dinheiro público recebido, recebe verbas e subsídios governamentais através de interpostas entidades, devidamente legalizadas - em geral cooperativas -, na maioria formadas por seus militantes. Por meio dessa terceirização, serviços são contratados e muito bem pagos pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, sem licitação e beneficiando "empresas" sem qualquer especialização que justifique os contratos - sem falar nos caso de superfaturamento propriamente ditos.

Matérias publicadas no Estado de terça-feira ilustram bem essa promiscuidade financeira entre o órgão governamental e o dito movimento social. Um tal de Instituto de Orientação Comunitária e Assistência Rural (Inocar), presidido por um humilde lavrador - que na reportagem se revela de todo alheio ao próprio "negócio" -, está no centro de um inquérito, aberto pela Polícia Federal (PF), para investigar repasses do governo federal a ONGs controladas pelo MST. Trata-se de empresa que nos últimos três anos recebeu do governo quase R$ 5 milhões para fazer o levantamento de propriedades rurais com até 80 hectares. A entidade foi criada na década de 1990 para fomentar a agricultura orgânica em assentamentos da região de Itapeva e, depois de alguns meses, tornou-se inativa. Em 2006, quando o governo resolveu aplicar a Lei Federal 10.267/01, que obriga o georreferenciamento dos imóveis para registro em cartório, essa antiga associação de pequenos agricultores foi transformada em empresa. A grande "rentabilidade" do negócio consistia no fato de a medição dos imóveis com até quatro módulos fiscais - cada módulo com 20 hectares, segundo o padrão da região - ser paga com recursos do Incra.

Alguns meses depois de ter sido criada, sem ter ainda um profissional com registro no Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea) nem um mínimo de experiência na área, o Inocar assinou com o Incra um contrato de R$ 4,4 milhões, para fazer o georreferenciamento de 600 imóveis em Itapeva. Embora a assinatura desse contrato tenha ocorrido em 20 de julho de 2006, só no mês seguinte o Inocar obteve o registro de pessoa jurídica na Receita Federal. Em 2007, com o serviço apenas iniciado, essa empresa conseguiu do Incra um aditamento no valor de R$ 187 mil, para a "atualização do plano de trabalho". E em janeiro desse ano o Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi) registrou o pagamento da última parcela no valor de R$ 1,7 milhão - sem que o serviço estivesse concluído. Mas mesmo sem ter terminado o serviço em Itapeva, o Inocar iniciou o levantamento em Itaberá e Taquarivaí. A propósito, o mencionado "presidente" dessa empresa, indagado pela reportagem, revelou que não tinha noção alguma dos valores do contrato, nem do andamento dos trabalhos, nem mesmo de ter assumido o posto.

Certamente, a relação entre o Incra e o Inocar não é a única sob suspeita. Representantes dos funcionários da autarquia federal acusam o atual superintendente regional, de São Paulo, de estar utilizando cada vez mais os processos de terceirização de serviços da reforma agrária para repassar dinheiro público à militância do MST. Esses representantes chegaram a ir até Brasília, em junho, para tratar do assunto com o presidente da autarquia. Por outro lado, um agrimensor ouvido no inquérito da PF, além de confirmar a ligação entre o Inocar e o MST, concluiu que também pode ter havido superfaturamento nesse negócio. "O serviço (terceirizado) está saindo a R$ 7,6 mil por imóvel, quando o preço previsto em nossa tabela (do Crea) para a média das áreas seria de R$ 4,4 mil", informou. Donde se conclui que na espúria ligação entre estas duas siglas - a oficial e a "social" - há fortes indícios da presença de ingredientes da mais grossa corrupção.

O AUMENTO DOS BENEFÍCIOS DO INSS
EDITORIAL
O ESTADO DE S. PAULO
23/8/2009

O desequilíbrio das contas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) foi de R$ 3,09 bilhões em julho - 35,9% mais do que em julho de 2008. Entre janeiro e julho, a Previdência pagou R$ 120,6 bilhões e recebeu R$ 96,2 bilhões: o déficit cresceu 13,36% em termos reais sobre 2008, principalmente em razão da previdência rural, o que leva as autoridades, ao anunciar os dados, a dar mais ênfase à previdência urbana, ligeiramente superavitária em julho.

O ministro José Pimentel reconhece que o aumento do salário mínimo, de 12,05%, foi o grande responsável pelo déficit, pois beneficia 69,1% dos segurados.

Algumas providências do INSS, como o recolhimento de contribuições pelos Microempreendedores Individuais (MEIs), deverão reduzir o desequilíbrio. Houve quase 1 milhão de consultas de MEIs, repetindo o que ocorreu com o Simples, que incorporou 3,2 milhões de empresas em dois anos.

O INSS reduziu o número de auxílios-doença, de 1,20 milhão, em julho de 2008, para 1,11 milhão, no mês passado. Mas nem todos os esforços são bem-sucedidos: a recuperação de créditos, de R$ 670 milhões, ficou aquém dos R$ 800 milhões esperados.

Os cortes de despesas não bastam para compensar os aumentos do valor e do número de benefícios. A quantidade de aposentadorias aumentou 4,2% e o valor mensal médio dos benefícios, de R$ 614,76, em dezembro de 2007, foi para R$ 655,31, em julho de 2008, e para R$ 794,01, no mês passado, embora as aposentadorias superiores ao salário mínimo tenham apenas preservado seu valor.

O INSS vem há tempos antecipando reajustes, que historicamente eram concedidos em 1º de maio e, neste ano, foram pagos em fevereiro. E já se prevê que, no ano eleitoral de 2010, a data seja antecipada para janeiro.

Em agosto e em setembro o desequilíbrio crescerá com a antecipação de parte do 13º salário - e ainda mais se o governo ceder à pressão dos sindicalistas, pois, entre os projetos que tramitam na Câmara, há o que estende a todos os beneficiários o reajuste do mínimo e que custará R$ 38,2 bilhões em atrasados, mais R$ 10,5 bilhões em 2010, calcula a Secretaria de Políticas de Previdência Social (SPS). Como moeda de troca o governo acena com pequena elevação real de todas as aposentadorias.

Há, assim, o risco de aumentos substanciais do desequilíbrio, a menos que uma reforma eleve a idade mínima de aposentadoria e desvincule o valor do mínimo dos benefícios do INSS.

TEMPOS DE RETROCESSO
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
23/8/2009

Lula e seus aliados transformam a política em acobertamento mútuo e camaradagem sem nenhum escrúpulo

SEM NOVIDADE. Sustentando o senador José Sarney no Conselho de Ética, o PT simplesmente repete o clássico roteiro a que já se assistiu durante o escândalo do mensalão, o episódio dos "aloprados" e a manipulação do caso Oi-Brasil Telecom.
Provoca alguma tristeza, e alguns sorrisos, o drama pessoal do líder petista no Senado, Aloizio Mercadante, que anunciou em plenário sua disposição de continuar no cargo, apesar da demissão "irrevogável" veiculada na véspera.
A respeito de seu choroso depoimento no Senado, afirmando que continuaria a ser líder da bancada petista, mais vale o silêncio do que qualquer comentário crítico.
Não cabe, aqui, julgar dilemas individuais de quem quer que seja. O que importa notar, entretanto, é o vazio partidário e político que se abriu no país, conforme se consolidou o poder de Lula na Presidência e os acordos que possibilitaram seu exercício.
Mais do que cogitar acerca do caráter pessoal dos participantes da comédia, seria importante refletir sobre as condições práticas do que, a torto e a direito, chama-se a "governabilidade".
Será de fato necessário preservar uma suposta ordem nos negócios de Estado ao preço do pleno desprezo pela ética básica dos cidadãos?
Será que, em nome de uma candidatura artificial e estranha às instâncias partidárias -a da ministra Dilma Rousseff-, cumpre defender não os interesses de um partido aliado, mas esta ou aquela personalidade sob o foco das investigações?
No fundo, reedita-se hoje um comportamento político que, há quase sete décadas, foi definido pelo sociólogo Sérgio Buarque de Hollanda no seu clássico "Raízes do Brasil".
Lula e seus "companheiros", Lula e seus aliados, seus acólitos, ou seja lá que nome tenham: tudo corresponde exatamente ao perfil do "homem cordial", traçado por Sérgio Buarque.
Princípios, valores, códigos e programas não importam nesse modo de viver a política.
O "cordial", no caso, não se refere às características próprias de amabilidade e simpatia que um político possa ter -sobram a Lula, faltam a Dilma Rousseff, pouco importa. Trata-se, sobretudo, do predomínio do favorecimento pessoal sobre o cálculo e a racionalidade de Estado.
Lula, Sarney, Mercadante e tantos outros abdicaram de valores e princípios. A política se transforma em acobertamento mútuo e camaradagem sem escrúpulo.
Naufragam nesse processo tanto o PT -antigo arauto da renovação social e ética no país- como o PMDB, valioso instrumento, se é que alguém se lembra, da luta contra a ditadura.
O que resta de toda a farsa? Talvez a atitude de alguns políticos que abandonam o partido; talvez as reações de uma aturdida opinião pública, que acompanha cada lance de desmoralização institucional e de vergonha pessoal vivida durante o governo Lula. Tempos cordiais. Tempos de retrocesso e de vexame.

CONTAS CONFUSAS
EDITORIAL
FOLHA DE S. PAULO
23/8/2009

AS CONTAS da Previdência Social apresentaram um déficit acumulado de mais de R$ 24 bilhões nos primeiros sete meses deste ano. A diferença entre desembolsos e receita ficou 13,4% acima da registrada em igual período de 2008.
A divulgação dos dados pelo Ministério da Previdência, na quarta-feira, foi marcada pela falta de clareza em relação aos números. Procurou-se dar maior evidência ao resultado equilibrado do setor urbano.
É sabido que o déficit previdenciário está concentrado no setor rural. Para cada R$ 10 em benefícios concedidos nesse segmento, apenas R$ 1,20 é arrecadado pelo governo.
A previdência urbana -o sistema tradicional do INSS, que atende aos trabalhadores com carteira assinada- é quase integralmente financiada pelas contribuições de empregados e empregadores.
A deficiência crônica de arrecadação do setor rural da Previdência evidencia a natureza assistencial desse tipo de benefício, que na prática constitui uma transferência de renda. Justamente em razão disso, faria mais sentido incorporar tal política ao programa de transferência de renda, o Bolsa Família. Desse modo, os benefícios da previdência rural poderiam ser desvinculados da evolução do salário mínimo, e seus critérios de concessão, revistos.
Enquanto o benefício médio do Bolsa Família atualmente é de R$ 80, as aposentadorias rurais alcançam o valor de um salário mínimo, hoje de R$ 465. Essa diferença atesta uma incongruência nas ações de transferência de renda do Estado brasileiro.
A fusão dos programas e a revisão de critérios seriam um passo importante na direção de maior justiça na concessão de benefícios. Além disso, trariam maior transparência em relação ao potencial de arrecadação do sistema previdenciário, tendendo a resultar em maior equilíbrio de suas contas.

A ESTRELA BRILHANTE
EDITORIAL
A GAZETA (ES)
23/8/2009

Há um forte simbolismo no recuo do senador Aloizio Mercadante, ao desistir de renunciar à liderança do PT. O retrocesso não é só dele, embora seja o principal alvo de desgaste. É do próprio partido que lidera no Senado – ocasionalmente, quando não vem determinação de "faça-se", emitida pelo Palácio do Planalto. Por extensão, o passo atrás atinge a prática política brasileira como um todo.

Foi o "faça-se" que atrapalhou Mercadante. Ele tentou não fazer, mas titubeou. E fez. Causou-lhe mal-estar a operação comandada pessoalmente pelo presidente Lula para salvar o ex-adversário e agora fiel aliado eleitoral José Sarney, mantendo-o no comando do Senado.

Várias vezes o senador petista tentou liberar os membros de sua bancada do compromisso sarneysista. Sempre que avançava nesse sentido era rechaçado pelo Palácio do Planalto. Chegou a ser reprimido publicamente pelo ministro José Múcio (Relações Institucionais), em nome do presidente Lula. Aceitou resignadamente essa situação, até anunciar em seu Twitter a hora em que discursaria no Senado anunciando a renúncia "em caráter irrevogável". Mas não discursou e nem renunciou. Na prática, preferiu revogar o irrevogável.

O episódio mostrou posição questionável da direção nacional. O presidente da sigla, Ricardo Berzoini, afirmou que o senador Mercadante não deveria renunciar e que a crise causada pela permanência de Sarney à frente da Alta Câmara tem ligação com a corrida eleitoral já em andamento visando à eleição de 2010.

A desistência de Mercadante em renunciar à liderança petista expressa o pragmatismo eleitoral acima de princípios, segundo a leitura do mercado político. O comentário corrente é de que ele teria feito a seguinte avaliação: a crítica agora pode ser esquecida ou não levada em conta por grande parte do eleitorado no pleito de 2010. Assim, o prejuízo eleitoral seria menor do que "se queimar" com o presidente Lula e com o PT – fatores que teoricamente dificultariam o desempenho nas urnas.

Presume-se que essa situação, por desdenhar de princípios éticos, fere os sentimentos dos petistas ditos autênticos. Deve estar causando inquietação de consciência, com sofrimento político. Deve até estar atordoando os petistas fiéis aos ideais que alicerçaram a formação do partido. Porém, infelizmente, esses não estão hoje no comando da agremiação. Daí o descarrilhamento.

Lamenta-se muito esse quadro. O Partido dos Trabalhadores não merece esse desgaste. Trata-se de uma jóia da constelação partidária brasileira. Nasceu de propostas honestas – e, nesse ponto, incomodou a muitos. O PT cresceu vencendo descrenças e até preconceitos. Durante muitos anos, enfrentou lutas desiguais, mas alcançou o máximo – a Presidência da República.

O partido não precisa se reinventar para continuar vigoroso. Não há necessidade de constranger sua índole selando alianças com adversários de ideologia refratária à sua, e historicamente referenciados por má conduta ética e moral. Essa miscelânia faz mal não apenas ao PT, mas a todo o organismo político brasileiro.

Lula, que personificou a identidade petista na sua ascensão política pessoal, deveria estar sendo alertado sobre a inconveniência de determinados caminhos. O vale-tudo pode ser temerário.

Hoje a estrela do presidente parece ofuscar a do seu próprio partido, mas o projeto eleitoral que ele está comandando rumo a 2010 não deve se distanciar do zelo à tradição do PT e aos princípios sadios da prática política na democracia.

VEM AÍ MAIS UM IMPOSTO
EDITORIAL
ESTADO DE MINAS
23/8/2009

Base aliada do governo quer aprovar logo a volta da extinta CPMF

Um novo golpe contra o bolso do contribuinte começa a ser preparado. O governo quer a todo custo ressuscitar a execrada Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), extinta em memorável sessão do Senado Federal em dezembro de 2007, quando a maioria da Casa ainda não se lixava e, principalmente, seguia o que queria a opinião pública. Era capaz de contrariar as ordens do Palácio do Planalto. Agora, se foi pequena a coragem do governo de pôr sua assinatura na antipática iniciativa de ampliar ainda mais o tanto que já esfola o contribuinte, é grande seu desejo de aprovar o projeto que cria a Contribuição Social para a Saúde (CSS), de iniciativa parlamentar, até o fim de setembro. Na verdade, o governo já tinha incluído esse projeto na lista das bombas que a base aliada deveria jogar no Legislativo para desviar a atenção da CPI da Petrobras. A nova tentativa de engordar o caixa da União em ano eleitoral, à custa do contribuinte, terá o reforço de um argumento que, apesar de ridículo, será usado para tentar ludibriar as pessoas de boa-fé.

A tropa governista no Congresso Nacional, que tem demonstrado ser capaz de coisa muito pior, vai argumentar com os gastos inesperados provocados pela gripe suína. Não importa que o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, tenha declarado ad nauseam, que a letalidade dessa pandemia é tão mais baixa que a da gripe comum, não havendo razão para preocupação maior. Não será, aliás, a primeira vez que a coerência e o compromisso com a verdade serão jogados no lixo pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pelos dois partidos que compõem o núcleo duro da base governista no Congresso: o dominante PMDB e o fragilizado, mais ainda decisivo, PT. As lideranças desses dois partidos firmaram acordo para pôr em votação nas próximas semanas e aprovar sob regime de rolo compressor na Câmara dos Deputados o projeto que cria a CSS. Vão dizer que as desonerações tributárias praticadas para enfrentar a crise econômica internacional fragilizaram a arrecadação federal e que todo o dinheiro do novo tributo será diretamente aplicado na saúde. Outro argumento: a alíquota será de apenas 0,1%, em vez dos 0,38% da extinta CPMF.

Gato escaldado, o contribuinte já ouviu essa história antes e sabe que é assim mesmo que tudo começa, mas não é como acaba. Naturalmente, ninguém dirá coisa alguma sobre a irresponsabilidade dos gastos com a máquina governamental, especialmente com a expansão dos quadros de pessoal e reforço de verbas para programas de evidente repercussão eleitoral, em prejuízo de investimentos na deficiente e comprometedora infraestrutura econômica do país. É indiscutível a prioridade que se deve dar à saúde pública, que, muito antes do fim da CPMF, já andava perto do colapso, com doentes expostos nos corredores dos hospitais que dependem de verbas federais. O governo impõe à sociedade uma das mais altas cargas tributárias do mundo e já passa da hora de melhorar a gestão dos negócios públicos e de cortar onde não for essencial. Antes disso, recriar um imposto que já foi rejeitado chega a ser falta de respeito.

PARA QUE O AR NÃO FALTE
EDITORIAL
CORREIO BRAZILIENSE
23/8/2009

A Associação Nacional de Jornais (ANJ) realizou semana passada, em Brasília, painel sobre a liberdade de imprensa, em comemoração dos 30 anos da entidade, fundada no ocaso do período de exceção. A efeméride já seria importante em si, mas adquiriu dimensão maior por acontecer num contexto de crescentes ameaças à livre circulação de ideias e informações.

Nem se trata aqui de comparar a situação brasileira a outras, de alguns vizinhos, onde esse direito democrático fundamental vem sendo repetidamente espezinhado, sempre a pretexto de garantir uma certa “democratização da comunicação”. Eis a terrível ironia. Os liberticidas e autoritários agora agem não mais escancaradamente, mas sob o manto da defesa de um tão suposto quanto hipócrita “viés democrático”.

Mas, se é fato que o Brasil não chega a ser, por exemplo, uma Venezuela, verdade também que algumas brisas preocupantes começam a soprar por aqui. Antes de tudo, a insistência com que algumas instâncias inferiores da Justiça ignoram cláusulas pétreas da Constituição e autorizam formas de censura prévia. O Supremo Tribunal Federal vem de se pronunciar seguidamente sobre o tema da anterioridade do direito à livre expressão, mas há resistências localizadas em níveis inferiores.

É algo que certamente exigirá em alguma hora manifestação definitiva da Suprema Corte. Como se sabe, a democracia entre nós ainda não deixou de ser plantinha tenra, cuja sobrevivência e consolidação dependem de permanente cuidado, de eterna vigilância. Especialmente quando crescem no Executivo e no Legislativo impulsos para cercear e tolher o trabalho dos jornalistas e veículos de comunicação.

O sonho de todo poder é agir com liberdade absoluta de movimentos, sem ter de prestar contas à opinião pública. Como isso não pode ser justificado dessa forma, abertamente, parte-se para a mistificação. O poderoso flagrado em ilícito ou imoralidade procura vitimizar-se, apresentando-se como alvo de campanha persecutória. Quando no mais das vezes quem o persegue nunca é a imprensa, mas os fatos.

Fez bem a ANJ de chamar a atenção da comunidade para o tema, bem ao comemorar três décadas de existência. Até porque a luta pela liberdade de imprensa não é principalmente do interesse dos jornais, jornalistas e veículos de comunicação. Ela é um patrimônio de toda a sociedade. Que costuma passar despercebido, como o ar que respiramos. Do qual só entendemos a importância quando nos falta.

282 ANOS DEPOIS
EDITORIAL
DIÁRIO DE CUIABÁ (MT)
23/8/2009

Por unanimidade – exceto o fato de que um dos 19 vereadores esteve ausente do Plenário -, a Câmara Municipal de Cuiabá aprovou, na semana passada, Projeto de Resolução apresentado em conjunto pela Comissão de Ética e Decoro Parlamentar e pelo vereador Antônio Fernandes (PSDB), que cria o Código de Ética do Legislativo da Capital. Depois de quase três séculos – para ser mais exato, 282 anos de fundação da Câmara -, esse será o primeiro documento do gênero aprovado e regulamentado pelo Regimento Interno da Casa.

O ineditismo da medida merece ser destacado, mas a questão primordial está no fato de que o Poder, ao longo de todos esses séculos, jamais dispôs de um documento que norteasse a sua ação, enquanto organismo fiscalizador, e estabelecesse normas de conduta para os seus integrantes.

Por sinal, a preocupação dos senhores vereadores com a aprovação e a implementação do novíssimo Código de Ética se deu justamente em função de um dos episódios mais lamentáveis da própria história do Legislativo Municipal. Obviamente, a referência é ao caso que envolveu o vereador Ralf Leite (PRTB), cujo mandato foi cassado por quebra de decoro parlamentar, no início do mês. No decorrer do processo, como se lembra, a Câmara utilizou, por analogia, os Códigos de Ética da Assembleia Legislativa e da Câmara Federal.

É opinião unânime que, se o Legislativo dispusesse de um Código de Ética próprio, o processo da cassação de Ralf Leite não teria se arrastado por quase seis meses. Além do mais, algumas questões prementes não teriam obstado a atuação dos vereadores, com as constantes intervenções da Justiça no processo disciplinar do então parlamentar. Ainda assim, comemore-se o resultado do trabalho da Comissão de Ética, que resultou numa resposta sensata à sociedade.

Doravante, o que se espera do Código de Ética da Câmara cuiabana é que ela se transforme, definitivamente, num instrumento que seja capaz de revelar à sociedade que o Parlamento, além de fiscalizar as ações do Executivo, também tem todas as condições possíveis e necessárias de fiscalizar a si mesmo.

É oportuno lembrar que o Código regulamenta a execução de processos disciplinares, além de nortear os trabalhos da Comissão de Ética e oferecer subsídios para que a Câmara analise se um membro cometeu ou não quebra de decoro parlamentar. Vale ressaltar que boas leis não garantem nada. É preciso que a sociedade se empenhe por sua aplicação e pela punição exemplar de quem confunde, por exemplo, a Câmara como palco de escândalos ou um balcão de negociatas.

“Código de Ética da Câmara deve mostrar que Poder pode fiscalizar a si mesmo e punir os maus exemplos”

PARA LER EM PÉ
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
23/8/2009

O livro e a leitura, finalmente, estão em alta no Brasil. Mais um pouco de esforço, e sorte, rivalizam em popularidade com as revistas de fofocas. Tal ibope, vale dizer, não se refere a vendas alavancadas ou a reviravoltas no letramento – embora haja notícias a esse respeito. Os bons ventos sopram graças à boa colocação do livro na agenda nacional, justo num momento em que, tristes trópicos, martelam-se os atos secretos de Sarney e a perplexidade diante da escolha de Lula pelo PMDB. O que é isso companheiro?
Noves fora, o próprio Lula – que no documentário Entreatos, de João Moreira Salles, tornou pública sua insegurança por ter baixa instrução formal – saiu da concha e declarou que livros marcaram sua vida. Não doeu nada. É consenso entre estudiosos de leitura que mal não faria se mais e mais políticos, empresários e artistas tornassem públicas não só suas viagens, paixões, restaurantes, plásticas e carros possantes, mas também sua rotina com os livros.
Alguns dirão que essas rotinas não existem e que ninguém precisa de mais mentiras nas terras do Jeca Tatu. Mas é verdade também que os homens e mulheres cortejados pela mídia precisam ser referência, ainda que mínima, de gosto pelo conhecimento. O contrário disso é imoral. Afinal, uma das frases mais ditas pelo menos desde 1700 neste país é que só a educação salva. Que seja, então, impressa na Bandeira Nacional.
A propósito, um dos assuntos em voga – ainda com base na pesquisa Retratos da Leitura no Brasil 2008 – é a urgência de programas de tevê – particularmente as novelas – assumam seu papel no fomento da leitura. A última vez em que um personagem de folhetim apareceu lendo numa trama, arrisca, foi Toni Ramos em Laços de Família, há nove anos.
Não é só muito tempo, é um descaso com uma clássica questão de fundo, do mesmo naipe que nepotismo, o patrimonialismo, o familismo, exploração sexual de crianças, para citar quatro das nossas tragédias. Além de quê, não faltam números confirmando os ganhos sociais dos países que investiram pesado na difusão do livro. Ignorar esse fato é lesa-pátria. Ou se incrementam os programas de leitura ou não se verá país nenhum.
Ainda sobre a súbita elevação de temperatura em torno do livro, vale inventariar que os livreiros estão se mobilizando para discutir a nova ordem trazida pela internet. O mercado da música dormiu no ponto e deu no que deu. Os jornais, idem, não chegam a um consenso entre a validade ou não dos conteúdos abertos e gratuitos, como se notícia custasse o mesmo que uma pedra de sabão caseiro. E os livros, em velocidade para além da capacidade de mobilização, estão caindo na rede. Como será? – bem perguntou o visionário Michael Dertouzos, ao questionar, já nos anos 90, o apartheid entre humanismo e tecnologia.
Pois Dertouzos já se foi e a discussão que propôs tem se dado, tardiamente, a fórceps, ou com as armas de Jorge. Para quem prefere nominar essa batalha com um termo técnico, pode chamá-la de Política Nacional do Livro e da Leitura. Com alguns anos de vida, ela acumula tropeços, mas não dorme na gaveta jamais. Um de seus ganhos recentes diz respeito à compra de livros didáticos. A dizer.
Essa transação já mobilizou quase 60% do mercado editorial, camuflando o desprezo geral da nação pela compra voluntária de livros. Nenhum setor pode sobreviver sem adesão do consumidor, mas as medidas paternalistas prevalecem, sufocando os livreiros. Pois de uns tempos para cá tem se falado, com afinco, na compra como uma política de Estado e não mais como programa de governo, eufemismo para repasse movido a lobby.
A informação é que estão sendo negociados 114,8 milhões de livros escolares, destinados a 36,6 milhões de estudantes de 100 mil instituições. Seria ingênuo negar a importância dessa transação. O alívio é que finalmente Brasília percebe que essa compra não pode se resumir a uma caixa de livros despachada para a biblioteca das escolas. Quer-se saber o que ocorre a folhas tantas. É o que se diz. Aguardemos os próximos capítulos.

PALAVRA DE ORDEM
EDITORIAL
GAZETA DO POVO (PR)
23/8/2009

Diz-se a torto e a direito que se lê pouco no Brasil. O último levantamento, de 2008, é do Instituto Pró-Livro, e deu um nó na cabeça dos pesquisadores, acostumados a índices subsaarianos, como o de 2000.
Naquela ocasião, como de praxe, a conta ainda era de 1,8 livro/ano por leitor – sendo 26 milhões de leitores ativos. Mas a metodologia foi mudada. Em vez de contar os leitores alfabetizados a partir dos 15 anos, a pesquisa mais recente considerou leitores a partir dos terceiro ano de escolaridade. O salto foi estrondoso.
O número de leitores saltou para 66,5 milhões e o de livros lidos por ano para 4,7 per capita, sendo 3,4 indicados pela escola. O novo método não é irresponsável nem matreiro. A grande sacada do estudo foi ter considerado o quanto no Brasil a leitura está vinculada ao ensino – desde o colégio dos pequenininhos.
Ao contar as leituras dos que ainda vestem uniforme azul-marinho, o instituto descobriu que o cenário melhorava. Esta é a boa notícia. A ruim é que o brasileiro tende a abandonar os livros à medida que entra na juventude e arruma emprego, com exceção dos que chegam ao curso superior. Moral da história: a escola sustenta o mercado de leitura, mas não o garante.
Os mais afoitos colocariam a culpa nos educadores. Mas é salutar considerar que o Brasil não é uma sociedade organizada em torno da cultura. Pesa muito sobre o nosso desempenho a apatia de setores como o mundo de trabalho, as igrejas e as famílias. Parece discurso de sempre, mas não é.
Semana passada, pegou fogo o embate entre o Ministério da Educação e o setor livreiro, para que esse faça sua parte na ampliação do mercado leitor. As editoras – isentas de contribuições federais como PIS/Pasep e Cofins – estão sendo convocadas a se mexer e a olhar para além dos 17% da população que compra livros. É palavra de ordem.

FRAGILIDADE ÉTICA
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
23/8/2009

O pragmatismo sem limites do presidente Lula, que constrange petistas históricos e que se insere na política nacional como um elemento de desvalorização da ética, é um fenômeno que não se restringe a um governante ou a um partido, mas que domina a própria estratégia de governabilidade. Neste sentido, precisa ser discutido à luz do interesse nacional e da busca de uma democracia que seja verdadeira, criadora e confiável. O fato de ser uma espécie de regra geral, pois coloca no mesmo saco de gatos partidos com programas e histórias distintas e até conflitantes, não significa que o pragmatismo deva ser justificado e que devam ser aceitos como naturais os atos cometidos em seu nome. Até mesmo o termo pragmatismo, nascido para identificar uma teoria filosófica e que passou a significar a busca do sentido prático ou do sentido útil das ações, acaba agora agregando um significado pejorativo de justificar o vale-tudo em matéria de alianças eleitorais ou de coalizões governamentais. A própria ética, ou falta de ética, se vê utilizada como um elemento mutável na geleia geral em que as convicções se transformaram.

Sempre que essas situações ocorrem, há uma tendência dos que as patrocinam de verem nos que as contestam uma atitude de falso moralismo. Desde os anos 50 do século passado, quando a velha UDN e sua banda de música apontavam os dedos acusadores para a degradação ética de alguns governos, a resposta simplista era de que o moralismo extremado representava um radicalismo indevido, de que os acusadores pregavam moral de cuecas e de que os governos só poderiam funcionar com alianças e estas muitas vezes tinham um preço. E, claro, o primeiro recibo dessa conta implicava fechar os olhos para atos de corrupção ou para quebras de princípios programáticos. Curiosamente, um daqueles então jovens udenistas está hoje na presidência do Senado e do Congresso, tendo suas irregularidades apontadas por políticos e por jornalistas aos quais é atribuído, mais uma vez, o epíteto pejorativo de moralistas. Entre esses dois momentos históricos, o país viu nascerem e murcharem alianças espúrias, governos baseados em barganhas indefensáveis e até em combinações que configuravam acordos criminosos. Todos os grandes escândalos recentes da República têm relação, direta ou indireta, com o enfraquecimento das convicções políticas e com a labilidade em relação ao que é certo ou errado.

Pois agora, com o horizonte eleitoral à frente, surgem novamente as pressões para que governos e partidos sucumbam à tentação de colocar a busca do poder acima de quaisquer valores políticos e éticos. Enquanto os princípios programáticos, as convicções políticas e os valores morais forem mercadorias que podem ser transacionadas em nome do pragmatismo, muito dificilmente o país poderá considerar-se uma democracia madura.

UMA SÚMULA PARA A LIBERDADE
EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
23/8/2009

A repetição de decisões atentatórias à liberdade de expressão, especialmente por parte de juízes de primeira instância, forçou a Associação Nacional de Jornais (ANJ) a propor um caminho para levar o Supremo Tribunal Federal (STF) a firmar jurisprudência contra essa prática. O objetivo é obter na mais alta corte judicial brasileira uma súmula vinculante capaz de, com a força desse instrumento, garantir a plena vigência da liberdade de imprensa. A ANJ quer encontrar o melhor meio de preservar o direito dos jornalistas, das empresas e da sociedade a exercitar a liberdade de expressão, sem no entanto interferir na prerrogativa dos juízes de qualquer instância. Na busca desse caminho legal para garantir uma liberdade que a Constituição garante e a opinião pública exige, a associação de jornais busca o apoio da Ordem dos Advogados do Brasil e outras organizações da sociedade civil.

Em levantamento recente, constatou-se que, dos 31 casos de agressão à liberdade de imprensa, 12 são decorrentes de censura prévia decretada por juízes, acatando provocação de pessoas ou entidades que não queriam ver determinadas notícias publicadas nos veículos de comunicação. É quase inconcebível que a censura provenha de decisão judicial, num paradoxo que apenas confirma a necessidade de mecanismos como a súmula vinculante. Por esse instrumento judicial, que só o STF pode criar, depois de reiteradas decisões no mesmo sentido, aos juízes de instâncias inferiores não seria facultada a opção de decretar censura prévia.

Não cabe aos meios de comunicação, nem a quaisquer outras entidades públicas ou privadas, a pretensão de sobrepor-se às leis, nem a intenção de usar sua condição para impor soluções à margem do Estado democrático de direito. Ao pleitear uma súmula protetora da liberdade, jornais e jornalistas agem, sim, no sentido de preservar o direito da sociedade a uma imprensa livre e responsável.

ESCOLAS DESPREPARADAS
EDITORIAL
JORNAL DO COMMERCIO (PE)
23/8/2009

O desaparelhamento de nossas escolas públicas é fato por demais conhecido, mas, em recente edição, voltamos ao tema a propósito especificamente da gripe A (H1N1), mais popularmente conhecida como suína, que assola o mundo neste momento. Nossa repórter Ciara Carvalho passou por várias escolas da Região Metropolitana, onde constatou a ausência de condições básicas de higiene como instalações conservadas, sabão, detergente, papel higiênico, água corrente. Dos estabelecimentos visitados por nossa reportagem, alguns estão entre os mais conceituados, aqueles que deveriam ditar normas aos demais, como Escola Estadual João Barbalho e o conjunto de quarteirão inteiro do Instituto de Educação de Pernambuco, construído há meio século numa época em que ainda se investia razoavelmente na área.
Como poderão assim seus alunos seguir as recomendações dos infectologistas para a prevenção do mal? A impossibilidade de obedecer a regras de higiene expõe os estudantes ao risco de contágio, inviabilizando o controle dessa gripe e de outras doenças contagiosas. Numa escola municipal com 900 alunos em Jaboatão dos Guararapes, a reportagem constatou o uso de utensílio comum para todos beberem água e a interdição dos sanitários existentes. “Quem aparece com febre ou gripado eu mando de volta para casa. Fora isso, é apostar na sorte”, diz a diretora de outra escola do mesmo município.
Todos os especialistas dizem que não há como prevenir a transmissão da gripe suína sem condições mínimas de higiene. E uma consequência positiva dessa pandemia pode ser uma maior conscientização sobre essa advertência, que poderá estabelecer um novo paradigma de comportamento quanto a higiene pública. Antigamente, quase ninguém, a não ser pessoas consideradas neuróticas, prestava atenção a detalhes como não tocar diretamente em torneiras (que podem estar sujas, infectadas) após lavar as mãos, e sim fechá-las segurando um pedaço de papel. Hoje já há torneiras que se fecham automaticamente para evitar o toque, o que é resultado de uma tomada de consciência.
O mais intrigante é que, apesar do que foi constatado e mostrado pela nossa reportagem, a Secretaria de Educação do Estado informou que está cumprindo todas as orientações da congênere da Saúde para prevenção da gripe, com ações educativas e de higiene no ambiente escolar. Mas não ficam aí os senões que atingem a área do ensino público entre nós. Tanto diretores de escolas como autoridades governamentais justificaram, ou melhor tentaram explicar, que banheiros interditados, falta de água e de material de higiene se devem a que alguns estabelecimentos estão passando por reformas.
Tornou-se uma regra não escrita há muito tempo, em administrações de diversas origens partidárias e ideológicas, que só se façam obras de conservação, reparo, reforma de escolas durante o ano letivo. Isso vem prejudicando os alunos, que às vezes perdem até um mês de aulas com procedimento tão anômalo. Por que não executar as obras necessárias durante as férias? Parece que razões do poder público ultrapassam em muito a nossa vã filosofia. Por outro lado, as obras públicas não são fiscalizadas de fato e quase sempre deixam a desejar, reaparecendo os mesmos defeitos em pouco tempo, como goteiras e infiltrações às primeiras chuvas mais fortes.
A filosofia da sociedade, daqueles que sustentam o Estado e lhe delegam poderes para executar a administração pública, seria mesmo vã? As ditas autoridades competentes sabem muito bem que tais ações estão erradas e prejudicam os interesses públicos. Mas nada muda, entra governo, sai governo. Várias entidades privadas oferecem parceria aos poderes públicos em diversas áreas, inclusive na de educação e ensino. Mas no geral, sem nos referirmos especificamente a nenhum governo, prefere-se entregar cargos públicos decisórios a políticos fiéis a esse ou àquele partido, sem maiores compromissos com o bem público, com os interesses da sociedade.

UMA CRUZADA JUSTA E NECESSÁRIA
EDITORIAL
A CRÍTICA (AM)
23/8/2009

Há muitos anos que o Poder Público em Manaus perdeu a capacidade ou a coragem de ordenar o crescimento e a ocupação dos espaços municipais. O resultado deste desleixo ou omissão foi o caos urbano que se observa nas ruas e, sobretudo, calçadas do Centro histórico.

Nestes lugares, que em outras plagas são devidamente preservados para servirem de atrações turísticas, o comércio informal tomou conta e fez deles sua morada. Sem regras, estética ou higiene, camelôs, ambulantes, flanelinhas transformaram o que é público em privado. Ocuparam calçadas com suas bancas, tamboretes, lonas e puxadinhas, num flagrante desrespeito as posturas mínimas que se devem observar na vida em sociedade. Usurparam do transeunte o direito de ir e vir, expoliaram do visitante o direito a contemplação de uma paisagem histórica e bela.

Neste contexto de conturbada ordem social devemos louvar a atitude e a coragem do Poder Público que na semana passada ousou desafiar esses pequenos poderosos e restaurar a autoridade do município, este entendido como o ente coletivo que representa toda a população.

Há aqueles que vão invocar o direito destes comerciantes informais a uma vida digna e a um trabalho, mas sempre devemos lembrar-lhes que um direito individual é menor do que um coletivo e no interesse maior da sociedade retirar bancas de venda de alimentos, de venda de frutas e verduras é um ato legítimo, correto e digno de aplausos.

Ressalte-se que para além da limpeza urbana tão necessária naquelas áreas históricas, uma ação de retirada desse tipo de comércio favorece a saúde da população, que não pode ficar exposta a comprar e consumir produtos alimentícios de origem duvidosa, pois em ato contínuo, pega por todo tipo de doença, acabaá se tornando cliente do já combalido Sistema Único de Saúde, cujo manutenção é feita igualmente pelos impostos pagos por todos.

Aos que insistem em se opor ao retorno da ordem cabe lembrar que existem outras oportunidades. A vida não é uma pistola com apenas uma bala. Buscar alternativas e para isso contar com o Poder Público é uma saída. O que esses comerciantes não podem fazer é recorrer a violência para fazer valer direitos que não os têm.

Que o Poder Público continue nessa cruzada, pois ela é justa e necessária.

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