Thursday, April 26, 2007

FHC, PSDB, princípios e unidade

No Estadão On Line. Volto em seguida:
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso criticou na quarta-feira seu partido, o PSDB, por estar se aproximando do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele disse ver com “com preocupação” o fato de tucanos subirem a rampa do Planalto, aceitando convites para conversas com o presidente. “O povo está olhando para nós e dizendo: o que vocês são, peixe ou carne de vaca? Que é que vocês são? Senão vamos dar a impressão de que não somos nada”, disse, em entrevista à noite ao Telejornal do Brasil, comandado pelo jornalista Boris Casoy na TVJB.
Este mês, o governador José Serra e o presidente do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE), estiveram com Lula. Serra disse que foi acompanhar prefeitos e falou sobre a possibilidade de ampliar o endividamento dos Estados. Tasso admitiu ter discutido o comportamento futuro do PSDB e se comprometido a ter postura “civilizada” nas CPIs do Apagão Aéreo - “sem xingar”, por exemplo, como ilustrou.
Na entrevista, FHC deixou claro que não aceitará convites de Lula para um café, principalmente considerando a forma como a relação dos dois evoluiu nos últimos anos. “Não vejo razão para ir. Se for por questões de amizade, já faz 5 anos. Porque não me convidou?”
Ele também afirmou que o momento não é de definir que tucano disputará a Presidência em 2010, mas sim de deixar claro à população a que o PSDB veio, numa referência a Serra e ao governador de Minas, Aécio Neves. FHC disse que o PSDB deve se orgulhar de ter dois possíveis candidatos para a vaga, mas avisou que ambos devem fazer um esforço para assegurar a união. “Tenho tentado dizer aos dois: ou vamos juntos ou vamos perder”, afirmou. “Cabe agora à direção do partido impor um rumo.” Serra, segundo ele, está num início de mandato e tem que provar que é um bom governador. Aécio, por sua vez, precisa reafirmar o sucesso obtido em seu primeiro mandato.
Afirmou que o PSDB tem de voltar a ter “conexão” com a sociedade e “assumir que é o partido da modernização”. “O PSDB tem que dizer: somos competentes, para fazermos andar, e a favor da população, do povo.” Na sua opinião, o PSDB se “acovardou diante do PT” quando Lula chegou à Presidência, demonstrando que não sabia se deveria ou não sair em defesa do que foi feito em seu governo. “Agora o PT chegou aí e fez lambança.”
Também se disse preocupado com a reforma política. “Eu não vejo possibilidade de reforma no quadro atual porque o governo não está empenhado.”

Voltei
FHC está certo. O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), presidente do PSDB, subiu a rampa para falar com Lula e, até agora, ninguém sabe o que eles conversaram. É evidente que conversa privada não é do interesse de ninguém. Mas eles não são homens privados. Um é presidente da República; o outro é presidente do maior partido de oposição. Mas e os governadores? Podem se encontrar com Lula? Devem. Mas, de novo, é conveniente que se saiba para debater o quê. O comportamento do PT em São Paulo, por exemplo, parece negar, na prática, um suposto entendimento entre o Serra e Lula. Ao contrário: o que está consignado em documento do partido é que é para fazer oposição sistemática.

A idéia de um entendimento é balela. No dia seguinte ao encontro de Lula com Tasso, o presidente subiu no palanque e atribuiu ao antecessor, pasmem!, a responsabilidade pela violência urbana. É esse o diálogo que Lula pretende? A questão Serra-Aécio também está corretamente abordada. Não há uma só corrente política no país que não considere, tudo mais ou menos constante, que se está diante de uma dupla imbatível para 2010 se estiverem juntos — seja lá em que arranjo for. Não sendo assim, o risco de desastre é grande de novo.

No jantar com os petistas, Lula cobrou unidade de seus “companheiros”. Disse, imaginem só, que o partido defende pouco o seu governo e que os petistas também são pouco solidários entre si. Tendo em mente a própria experiência e a de seus principais adversários, os tucanos, sabe o valor da coesão. O PT venceu as eleições de 2006 em razão de muitos fatores, mas essa unidade interna não foi o menor deles. Num dado momento, as críticas cessaram: da extrema esquerda à direita do partido, o discurso foi um só: “Os adversários querem dar um golpe”. Eleição de adversário passou a ser golpe!

Já os tucanos são um pouco diferentes. Leiam trechos na coluna de Dora Kramer de ontem, no Estadão:

Em comum com seu colega de São Paulo, a governadora do Rio Grande do Sul, a tucana Yeda Crusius, só tem o diagnóstico de que o partido de ambos vive um período particularmente infeliz em matéria de organização interna e atuação externa. Fora isso, a governadora destoa do governador na abordagem da problemática tucana e principalmente no tocante à candidatura presidencial: Yeda Crusius se posta claramente como integrante do “grupo do Aécio” e diz com todos os efes e erres que o PSDB em breve terá um “embate de gerações”, a partir do qual será definido o rumo do partido e a candidatura a presidente. De um lado, as lideranças novas, nascidas já na redemocratização. De outro, as forças mais antigas, cuja referência é a luta contra o regime militar.

Muito bem. Pelo visto, a governadora acha produtivo antecipar, em abril de 2007, a disputa de 2010. Mais: ela não escolhe esse ou aquele por conta dessa ou daquela propostas — até porque, que se saiba, não existem. Antes, ele parece julgar quem está e quem não está apto para o jogo. É rigorosamente o contrário do que fazem os petistas. É rigorosamente o contrário do que Lula cobrou de seus aliados. É rigorosamente o contrário do que recomenda FHC — que, afinal de contas, já venceu duas eleições presidenciais. Eu não duvido de que ela prestaria um melhor serviço à causa fazendo um bom governo no Rio Grande do Sul.

A triste verdade é que o PSDB, como partido, ainda não existe. Chegou ao poder com a cola da unidade garantida pelo Plano Real. E depois se desarranjou. A exemplo do que se viu na campanha presidencial passada, não sabe nem defender o seu passado. O emblema no erro, eu já disse aqui, foi uma nota de puro surrealismo: enquanto o candidato tucano vestia uma jaqueta com logomarcas de estatais, a propaganda de Lula fazia proselitismo da explosão do número de celulares no país, decorrência da privatização, contra a qual o PT lutou bravamente. Mais: aquela jaqueta só estava lá porque Lula acusava o PSDB de... privatista.

Uma boa arma contra o mau-caratismo do adversário é ter princípios.

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Por Reinaldo Azevedo | 15:10 | comentários (0)

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