Quanto valem 54 reais?
Na terça-feira passada, dia da estreia do Brasil na Copa, o presidente Lula deu uma boa notícia a 8,3 milhões de aposentados. Sancionou o reajuste de 7,72% para os beneficiários do INSS que recebem mais de um salário mínimo por mês. O índice é o dobro da inflação acumulada desde o aumento anterior e ficou acima do recomendado pela equipe econômica. Esse grupo recebe hoje, em média, 1 273 reais. Se o valor fosse reajustado pela inflação, como prevê a lei, essas pessoas passariam a receber 44 reais a mais por mês. Com o novo índice, os aposentados e pensionistas ganharão um aumento médio de 98 reais – ou 54 reais a mais do que teriam direito de fato. Os aposentados certamente farão troça quando receberem o "presentão" de 54 reais, quantia com a qual não se compra muito mais que uma pizza. Para as contas da Previdência, no entanto, o afago de Lula a esses eleitores representará um custo adicional de 4,5 bilhões de reais apenas neste ano. "Esse é um compromisso que impactará as contas públicas de maneira permanente, sem que o governo apresente uma fonte de receita adicional para financiar essa despesa", afirma o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas. Antes da sanção de Lula, os ministros Guido Mantega (Fazenda) e Paulo Bernardo (Planejamento) diziam que o índice de 7,72% era uma "afronta" à Lei de Responsabilidade Fiscal. O acordo que o governo havia fechado com as centrais sindicais no início do ano previa reajuste de 6,14% nos benefícios, índice já bem superior à inflação. Quando o projeto chegou ao Congresso, o valor subiu. Oposição e situação, em rara harmonia, alinharam-se em defesa dos 7,72%. De início, Lula reagiu e foi contra. Chegou a falar em vetar esse índice. O presidente, no fim das contas, só fez fita. Não iria se indispor com 8,3 milhões de eleitores (6% do total nacional). Especialista em tirar proveito para si dos projetos de terceiros, Lula deixou para sancionar o reajuste no fim do prazo legal. Buscou, assim, assumir sozinho a paternidade da bondade, aprovada semanas antes pelos congressistas. Provoca o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha: "É bom para eles aprenderem. Qualquer coisa que a oposição quiser capitalizar, no fim quem vai ganhar seremos nós do governo". O presidente, ao menos, teve o bom senso de vetar o fim do fator previdenciário, medida que também havia sido aprovada pelo Congresso. Sem esse mecanismo, essencial para evitar o aprofundamento no déficit do INSS, haveria um gasto adicional de outros 4 bilhões de reais apenas neste ano. De qualquer maneira, o governo precisará agora enxugar gastos para compensar a despesa extra que recairá sobre o Orçamento por causa do aumento das aposentadorias. Como invariavelmente ocorre em situações semelhantes, os investimentos públicos deverão ser a vítima. Bilhões valiosos, que poderiam ser usados na reforma de estradas e aeroportos, ampliando o potencial de crescimento do país, serão transformados em 54 reais a mais no bolso dos aposentados.No bolso de cada aposentado, esse dinheiro é bem-vindo,
mas muda pouca coisa. Nas contas da Previdência,
o estrago será imenso
Daniel Pereira e Marcelo Sakate• Quadro: Como 54 reais viram
4,5 bilhões de reais