Muito saber, poucas palavras
Dida Sampaio Gilmar Mendes entrega o comando do Supremo a Peluso em 23 de abril. Nos dois anos em que esteve à frente do cargo, o ministro ajudou a consolidar a corte como contraponto democrático à fragilidade do Congresso diante da força do Executivo. Daí surgiu o chamado "ativismo" do Supremo, que ocupou o vácuo deixado pelos parlamentares, sempre mais envolvidos com emendas e cargos do que com leis e debates. Nesse período, o STF tomou decisões formidáveis, como liberar o uso de células-tronco em pesquisas científicas, acabar com a autoritária Lei de Imprensa, que vigia desde a ditadura militar, e tentar pôr fim à infidelidade partidária. Peluso assume o comando num momento em que mais casos polêmicos se avizinham: o julgamento da legalidade das cotas raciais nas universidades e do casamento de homossexuais. Peluso tem envergadura jurídica e altivez de espírito para liderar esses difíceis processos. Ele já demonstrou essas virtudes quando foi convocado a dar sua opinião. Entre outros casos, relatou o processo contra o terrorista italiano Cesare Battisti, no qual seu denso voto a favor da extradição prevaleceu – embora, ressalve-se, Lula ainda possa deixá-lo no Brasil. Quem conhece Peluso faz apenas uma advertência: a maior virtude dele pode vir a ser um percalço. Pela natureza polêmica dos casos que tramitam na corte, Peluso terá de contrariar sua índole, deixar o silêncio e sair em defesa do Supremo. Diz um dos ministros mais influentes do STF: "A corte estará em boas mãos. Peluso é um grande juiz. No entanto, deverá se adaptar às exigências do cargo. Não se pode liderar o Supremo em silêncio".Os ministros do STF elegeram como próximo líder da corte
o reservado Cezar Peluso, um magistrado de reconhecida
formação intelectual, que prefere o silêncio ao holofote
Sofia KrauseDISCRIÇÃO
O novo presidente do STF, ministro Cezar Peluso: ele diz muito com poucas palavras
O menino Antonio Cezar Peluso sempre foi o primeiro da classe no Seminário São José, no interior de São Paulo. Disciplinado, persistente e corintiano, estudava para ser bispo quando crescesse. A vida conduziu-o por outro caminho, no qual encontrou Lúcia (sua mulher até hoje), o curso de direito e, ato contínuo, sua verdadeira vocação: a magistratura. Quarenta e quatro anos depois, ele será presidente do Supremo Tribunal Federal – o topo e a consagração da carreira para qualquer juiz. O paulista Peluso tem 67 anos, os últimos sete consagrados à lida no STF, por indicação do presidente Lula. Na semana passada, obedecendo à tradição de escolher seu líder pelo critério da antiguidade, os ministros do Supremo ratificaram o nome de Peluso para comandar a corte pelos próximos dois anos. Com o cargo, vem também a presidência do Conselho Nacional de Justiça, o prestigioso CNJ, que cresceu em importância nos últimos tempos ao jogar luz nos porões corruptos dos tribunais estaduais e estabelecer metas de produtividade para os juízes. Peluso, o ministro que fala pouco, produz muito e almoça no bandejão servido aos funcionários do Supremo, terá o desafio de substituir Gilmar Mendes, o ministro que não hesitava em emparedar quem confrontasse a corte – e que usou com competência a plataforma do cargo para fortalecer a Justiça.